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Caminhos Cruzados.

Encontros Silenciosos

O café estava movimentado naquela manhã. Clara Moretti caminhava pelo centro da cidade grande com passos decididos, uma cidade que ela havia jurado nunca mais voltar. Mas desta vez, Valentina, sua irmã mais velha, havia insistido em se encontrar pessoalmente. O motivo? A exposição de Clara seria uma das principais atrações da galeria que Valentina gerenciava. E, embora relutante, Clara sabia que não podia continuar fugindo do passado para sempre.

Ela apertou a mão de Luna, sua filha de 6 anos, que andava ao seu lado. A menina estava animada e curiosa, observando cada detalhe ao redor. Para ela, tudo na cidade era novidade — diferente da vila tranquila onde sempre viveram.

Assim que chegaram ao café, Clara parou por um instante na entrada. Uma sensação estranha percorreu seu corpo, como se tivesse cruzado um portal invisível para um momento perdido no tempo. E foi quando ela o viu.

Miguel Alencar estava diante dela. Ele segurava um copo de café e ajeitava o paletó com a mão livre, exatamente como ela se lembrava — e ao mesmo tempo completamente diferente. Os anos haviam passado, e ele parecia mais sério, mais distante, mas aqueles olhos ainda eram os mesmos que ela nunca conseguiu esquecer.

Por um momento, Clara congelou, incapaz de se mover. O coração bateu forte no peito, uma mistura de choque e saudade invadindo cada célula de seu corpo. Luna, alheia à tensão da mãe, segurou o braço dela e olhou curiosa para o homem parado à frente.

Miguel levantou os olhos para Clara e Luna. Ele franziu a testa, como se algo nele reconhecesse aquela mulher, mas sua mente não conseguia encontrar nenhuma memória concreta. Por que ela parecia tão familiar?

— Com licença... — Miguel murmurou, educado.

Clara deu um passo para o lado, abrindo espaço para ele passar. Seus lábios tremiam levemente, mas ela se manteve em silêncio. Apenas o observou enquanto ele passava por ela, sentindo o coração afundar com a certeza de que ele não a reconhecia.

Miguel seguiu seu caminho, sem olhar para trás. Ele sentia algo estranho, como se estivesse deixando algo importante para trás, mas sacudiu o pensamento e seguiu em frente, perdido em suas próprias inquietações.

Clara respirou fundo, apertando a mão de Luna para se recompor.

— Vamos, querida. — murmurou para a filha, abrindo a porta do café.

Assim que entrou, avistou Valentina em uma mesa ao fundo, acenando para ela. Clara levou Luna até a mesa e se sentou, forçando um sorriso para a irmã.

— Finalmente você chegou! — disse Valentina, ajeitando os óculos de sol no cabelo. — Precisamos resolver os últimos detalhes da exposição. Você já pensou na ordem das fotos?

Clara pegou o cardápio para disfarçar a emoção que ainda latejava no peito.

— Sim... Acho que está tudo pronto. — respondeu, embora sua mente ainda estivesse do lado de fora do café, presa naquele encontro silencioso com Miguel.

— Clara? Tá tudo bem? — Valentina perguntou, franzindo a testa. A irmã conhecia Clara o suficiente para saber quando algo a perturbava.

Clara sacudiu a cabeça, tentando afastar a imagem de Miguel.

— Sim, tá tudo bem. — Clara deu um sorriso forçado. — Vamos resolver logo isso. Preciso voltar para casa.

Mas, no fundo, ela sabia que algo havia mudado. Depois de todos aqueles anos, Miguel estava ali — e a forma como ele não a reconheceu foi como uma faca no coração. Mesmo assim, ela não estava pronta para confrontá-lo. Não ainda.

O encontro tinha sido breve, quase insignificante aos olhos de quem visse de fora. Mas para Clara, os fragmentos de uma história que nunca foi encerrada acabavam de se realinhar.

O dia no escritório de Miguel Alencar estava agitado. A reunião havia acabado, mas sua mente continuava distante. A sensação estranha daquele encontro no café não saía de sua cabeça. Aquele olhar da mulher com a criança... Por que parecia tão familiar?

Miguel tentou se concentrar no trabalho quando a porta do escritório se abriu sem aviso. Cecília Monteiro entrou como um furacão, espalhando sua presença por todo o ambiente. Ela era uma mulher exuberante, sempre vestida com as roupas mais caras e chamativas. Seu perfume doce impregnava o ar, e sua voz animada ecoava pela sala.

— Amor! Adivinha o que eu fiquei sabendo? — Cecília exclamou, jogando a bolsa Chanel na poltrona e indo direto até Miguel.

Miguel suspirou, fechando a pasta com os documentos e passando a mão pelo rosto, tentando esconder o incômodo. Cecília era filha de um empresário influente, amigo pessoal do falecido pai de Miguel. Antes de morrer, o pai dele havia feito questão de arranjar esse noivado, acreditando que isso consolidaria uma aliança estratégica entre as duas famílias.

Miguel nunca se importou o suficiente para lutar contra o acordo. Ele não sentia nada por Cecília, mas como não tinha ninguém em sua vida que realmente importasse, simplesmente aceitou o noivado por conveniência.

— O que foi agora, Cecília? — perguntou, com a voz baixa e cansada, enquanto ela o rodeava cheia de entusiasmo.

— Tem uma exposição de arte incrível que todo mundo está comentando! — ela disse, empolgada. — E eu quero ir! Vai ser na galeria da Valentina Moretti, você conhece?

Miguel franziu a testa. O nome Moretti soava vagamente familiar, mas ele não conseguia se lembrar de onde.

— Não estou muito a fim de ir. — ele respondeu, voltando a abrir a pasta, tentando cortar o assunto por ali.

Mas Cecília não desistia fácil. Ela se aproximou dele, cruzando os braços com um ar teatral.

— Ah, para, Miguel! Vai ser divertido! Todo mundo importante vai estar lá, e você precisa aparecer! — Ela lançou um sorriso sedutor, sabendo que Miguel não tinha energia para discutir.

Ele soltou um suspiro longo e resignado.

— Tudo bem. Eu vou. — ele murmurou, mais para encerrar o assunto do que por vontade própria.

— Sabia que você ia concordar! — Cecília bateu palmas, radiante, e se jogou na poltrona de couro. — Você vai ver, vai ser incrível.

Miguel apenas balançou a cabeça, tentando ignorar o desconforto que crescia no peito.

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