Os corredores da Torre Masculina da Dívisa Guardiã eram austeros, de pedras escuras e frias, iluminadas apenas por tochas presas às paredes. Havia umidade no ar, carregada com o cheiro de pergaminhos antigos e ferro das espadas embainhadas nos cintos dos guardiões.
Poucos homens eram aceitos aqui. A maioria eram maridos, filhos ou irmãos das Guardiãs, e aqueles que não tinham um vínculo de sangue ou aliança precisavam ser escolhidos a dedo para permanecer.
Sete dias. Esse era o tempo que ficaríamos na torre.
Sete dias até que Malac’h decidisse revelar a razão de nossa presença.
Meu pai não costuma compartilhar segredos comigo. Ele não compartilha nada com ninguém.
Malac’h é um Deus recluso.
Ele vem e vai quando quer, passando a maior parte do tempo trancado em seus aposentos, observando em silêncio a pintura de uma deusa morta.
Afasto os pensamentos ao ver Emmy Zack atravessar os portões da Torre Feminina.
Os portões eram altos e imponentes, decorados com inscrições antigas e símbolos de proteção. Os desenhos cravados na madeira pareciam quase pulsar com energia própria, como se resguardassem segredos que não deveriam ser revelados.
Emmy não era alta — devia ter cerca de 1.60 de altura — e sua silhueta era marcada por curvas que desafiavam a inocência do vestido verde floresta que abraçava seu corpo.
Mas algo nela estava diferente.
Ela tremia.
Seus olhos azuis cravaram-se em mim por um instante, mas sua expressão não era para mim.
Segui seu olhar e então vi Isaac.
Ele surgiu ao meu lado, tocando meu braço com descaso. Meu irmão do meio carregava consigo aquele mesmo olhar presunçoso de sempre. Cabelos castanhos puxados para o dourado, olhos castanhos quentes e uma altura de 1,84, sendo um amontoado de músculos.
Ele mordia uma maçã com um sorriso de canto.
E Emmy estremeceu.
— O que você fez? — minha voz saiu baixa, mas firme.
Isaac riu, saboreando a fruta antes de responder com desdém.
— Eu? — arqueou uma sobrancelha. — Por que acha que fiz alguma coisa?
Antes que eu pudesse responder, Emmy veio na nossa direção.
Seu corpo estava tenso. Seus passos eram rápidos, apressados, como se quisesse fugir da própria sombra.
— Que a Deusa abençoe suas manhãs, senhores… — ela murmurou em uma reverência forçada, desviando o olhar, pronta para passar direto.
Mas Isaac segurou seu braço.
— Volte aqui, amor… — sua voz pingava ironia. — Por que a pressa, querida?
O corpo de Emmy enrijeceu.
Ela forçou um sorriso para os aprendizes que passavam carregando pilhas de livros, tentando agir naturalmente.
— Senhor… — sua voz vacilou. — Suas brincadeiras não serão toleradas pelas anciãs, então, por favor, fingirei que nada aconteceu.
Ela puxou o braço e se afastou rapidamente.
Mas Isaac não deixou passar.
— Brincadeira? — ele repetiu, observando-a partir.
Meu olhar deslizou para ele novamente.
— Por Malac’h, o que diabos você fez?
Isaac riu de canto, jogando o resto da maçã fora.
— Entrei no sonho dela.
Meu sangue gelou.
Ele começou a andar. Seguindo Emmy.
— Isaac! — chamei, mas ele não parou.
Eu o segui. Alguma coisa me dizia que isso não terminaria bem.
Alguns minutos depois, encontramos Emmy em uma horta escondida entre os corredores internos.
Ela estava ajoelhada entre as ervas, colhendo folhas e as depositando em um pequeno cesto. Seu corpo estava rígido, os ombros contraídos.
E Isaac se aproximou sem hesitar.
— O que você quis dizer com “fingirei que nada aconteceu”? — sua voz era baixa, mas havia um tom perigoso ali.
Emmy não o olhou. Apenas continuou cortando ervas, como se ele não estivesse ali.
— O senhor não deveria ter entrado no meu quarto.
Isaac inclinou a cabeça.
— Você se lembra de tudo?
Seus dedos deslizaram para o rosto dela, roçando a pele com gentileza, acariciando sua bochecha.
Ela engoliu em seco, fechando os olhos e então se levantou saindo do meio das ervas.
— Não. — sua voz saiu baixa. — Não importa. Não foi real.
Isaac seaproximou e abaixou lentamente, encurralando-a contra a parede de pedra.
O ar entre eles mudou.
Era denso. Quente. Carregado de eletricidade bruta.
— Você quer que seja real, Emmy?
A pergunta pairou no ar.
Ela tremeu.
— Isso… não podemos.
Isaac rosnou.
Seu lobo emergiu, ecoando pelo elo mental entre nós.
Então ele a beijou.
Suas mãos deslizaram pela linha da mandíbula dela, subindo até os cabelos, segurando-a com posse.
Ela não resistiu.
Pelo contrário.
Emmy agarrou seus cabelos, puxando-o para mais perto.
Eles estavam perdidos um no outro.
Alec surgiu ao meu lado, cruzando os braços.
— Ele… a reivindicou? — sua voz era um sussurro carregado de interesse.
Meus olhos se estreitaram, observando a cena.
— Sim.
— Tem mais alguém assistindo.
Segui seu olhar e vi.
Um loiro alto parado na entrada secundária.
Ele estava imóvel, mas sua mandíbula travada traía sua fúria.
Aquele cara a conhecia.
Alec riu.
— Isso vai dar merda.
E então, o loiro se moveu.
Ele atravessou a horta e puxou Isaac pela gola da camisa, acertando-lhe um soco direto no queixo.
— Que porra você tá fazendo, Emmy?! — ele rugiu, segurando o braço dela. — Por que tá beijando esse cara?!
O nome dele escapou dos lábios de Emmy.
— Devon…
Isaac se levantou, lambendo o sangue no canto da boca.
E sorriu.
— Devon, né?
Ele ergueu a mão, as garras brilhando à luz do sol.
— Se eu fosse você… — seu tom era gélido. Letal. — Caía fora.
Mas Emmy segurou o braço dele.
— Por favor, Isaac... — ela respirou fundo — Não machuca ele.
Devon cerrou os punhos.
— Você tá com esse imbecil, Emmy?
— Isso é da sua conta? — Isaac rosnou.
Dei um passo para interferir, mas senti a mão de Alec no meu ombro.
— Não vamos tornar isso maior do que já é.
Devon soltou um riso nervoso.
— É sim. — seus olhos se estreitaram. — Sou o namorado dela.
O silêncio caiu como um trovão.
Alec soltou uma gargalhada.
Mas Emmy apenas sussurrou, sem conseguir encará-lo.
— Ex, Devon.
Emmy lançou um olhar triste antes de passar entre os dois e apressar os passos. Ela praticamente nos atropelou ao passar entre mim e Alec.
Me obriguei a disfarçar, mas assistir Emmy beijando Isaac mexia comigo — com meu lobo, especificamente. E eu precisava entender isso junto aos outros.EMMY ZACKTropecei duas ou três vezes, amaldiçoando a mim mesma por toda essa situação. Só me dei conta de como estava transtornada ao chegar a uma das salas de leitura vazia.Tranquei a porta e deixei algumas lágrimas caírem, me perguntando o que estava acontecendo comigo.Afinal de contas, aquele era o nosso lugar.Meu e do Devon.Até não significar mais nada. Mas agora, era como uma ferida aberta. Algum tipo de vergonha percorria meus poros.Eu cedi àquele lobo… Isaac.Naquele momento, foi como se eu respirasse através da minha pele, e minha pele pedisse por ele. Como se ele fosse o ar necessário para me manter viva.O cheiro dele impregnava meu vestido. Um aroma amadeirado, e fresco.Menta.A porta se abriu, mas continuei sentada no chão, perto da estante.— Olá, criança… — Adélia Bosckow me analisou. — Você está bem, Emmy?Levantei-me rapidamente, alinhando o vestido e abaixando a cabeça. Estendi as mãos à frente do corpo, levemente, em reverência a uma das guardiãs mais import
Matteo FieldsNão completamos nem um dia na Divisa Guardiã, e Isaac já arrumou problemas.Observo, atônito, enquanto Chase termina de contar a última confusão em que nosso ímã de encrenca se meteu.Zayn ri, mastigando os biscoitos que roubou da cozinha da torre. Alec permanece calado.— O que diabos você estava pensando? — solto, indignado. — Ela é uma aprendiz de guardiã! E não qualquer uma… é filha de uma guardiã superior!Alec percebe minha revolta e se coloca entre mim e Isaac, como sempre sendo o pacificador das nossas discussões.— Isaac, você já passou da idade de fazer tanta merda! — perco o controle, gritando.— O que a idade tem a ver com isso? — Zayn, o caçula resmunga.Chase esfrega o rosto, visiv
Isaac FieldsAcordo sentindo um toque leve deslizar por minha bochecha. Suas unhas arranham suavemente meu queixo, e quando abro os olhos, encontro seu sorriso me acolhendo. Ela me puxa para um beijo, e o calor de seu corpo nu contra o meu me enraíza na realidade daquele momento.O quarto ao nosso redor parece grandioso, mas indistinto. Cortinas roxas envolvem a cama imensa, o veludo ondulando como sombras vivas. À frente, uma mesa ornamentada exibe cálices e ervas espalhadas ao lado de velas queimando lentamente. Símbolos solares se espalham pelas paredes de pedra clara, como se capturassem a essência de algo divino.— Está bem, amor? — sua voz chega até mim como um sussurro envolvente, seus olhos azuis cintilando com uma luz que parece própria.— Sim, minha deusa. — Respondo sem hesitação, encantado pela visão dela. Seus longos cabelos caem ao redor do rosto, uma moldura perfeita para sua beleza etérea.— Prefiro quando diz o meu nome. — Ela murmura antes de roçar os lábios em meu q
Isaac Fields"Nem acima dos céus, nem abaixo deles houve criatura tão bela quanto ela.Aquela que deu luz às estrelas." Desperto com o corpo em chamas. Cada músculo pulsa de dor, como se tivesse sido despedaçado e remontado de forma errada. O chão frio sob mim é áspero, duro. Minha respiração está pesada. Tento me mover, mas um peso invisível parece me prender. Ergo o olhar e vejo a sala ao meu redor. No centro, um pilar se ergue, irradiando uma energia densa, sufocante. Algo está errado. Há corrupção ali, algo vil, algo que me enfraquece. Então, o cheiro me atinge. Sangue. Meu coração acelera. Viro o rosto e vejo Emmy caída. O desespero me impulsiona para frente. Me arrasto, ignorando a dor que me atravessa, e alcanço seu corpo frágil. Meu peito aperta quando toco sua pele fria. — Emmy! Minha voz ecoa na sala vazia. Toco seu rosto, tentando despertá-la. Os segundos se arrastam como séculos. Então, finalmente, ela se move. Os olhos dela se abrem, confusos, nublados. — I
Chase Fields Madison chora enquanto caminha pelos corredores da torre. Ignoro. Se eu deixar que isso desperte qualquer resquício de compaixão, estarei enfraquecendo minha posição. Não quero machucá-la, nunca machucaria ninguém sem necessidade. Mas sei que não nos entregarão Emmy e Isaac de maneira voluntária. — Pare de chorar. — ordeno, sem paciência. — Diga tudo o que sabe. Ela hesita, então a pego pelo pescoço novamente, minhas garras roçando perigosamente contra sua pele frágil. — Ela está ali… atrás daquela porta. — sussurra, apontando. Meus olhos se fixam na enorme lua desenhada na porta. A energia emanando dali me arrepia a espinha. — O que tem ali? — pergunto, desconfiado. — É uma prisão lunar, feita pela deusa Iazi'ch. — sua voz treme. Minha mandíbula trava. Sei que meu rosto agora carrega uma expressão sombria e ameaçadora. — Emmy e Isaac estão dentro dessa prisão? Madison assente, hesitante. — É só isso que sei. Antes que ela possa dizer mais alguma coisa, um
EMMY ZACKSegui Chase e Isaac em silêncio pelos corredores sombrios da torre. Cada passo ecoava como um presságio, uma contagem regressiva para algo que eu não conseguia evitar. O medo fazia minhas mãos tremerem, e eu tentei controlá-las, fechando os punhos ao lado do corpo. Mas quando percebi a direção que tomávamos, meu corpo inteiro começou a estremecer.O Salão dos Julgamentos.O terror subiu pela minha garganta em forma de náusea. O simples pensamento de entrar naquele lugar, de encarar o que quer que estivesse por trás dessas portas, me paralisava.— O que faremos? — perguntei, a voz fraca e trêmula.Um sorriso irônico se desenhou nos lábios de Chase.— O que foi, loirinha? — ele zombou, inclinando a cabeça. — Dá pra sentir o cheiro do seu medo daqui.Meu estômago se revirou.— O que vocês vieram fazer aqui? — as palavras escaparam num sussurro aflito, como se fossem mais uma súplica do que uma pergunta.Chase lançou um olhar para Isaac, e seu suspiro veio carregado de frustraçã
Chase FieldsAs bochechas macias de Emmy me distraíram por um breve momento. O toque dela, por mais delicado que fosse, parecia capaz de amansar a fera enjaulada dentro de mim. Era estranho, quase desconcertante. Mas não por muito tempo.— Traga Hyialia. — Ordenei a Zayn, minha voz firme como aço.O salão se encheu de murmúrios tensos. As guardiãs trocaram olhares alarmados, algumas recuaram instintivamente, mas antes que qualquer tumulto ganhasse força, uma figura atravessou o limiar da grande porta. Brysa, outra sacerdotisa de Malac’h, surgiu na porta, sua expressão impassível como mármore.— Senhor, trouxe o que pediu. — Sua voz era controlada, mas seu olhar traía a hesitação enquanto se aproximava, segurando uma caixa média.Sorri, sentindo o gosto amargo do medo delas no ar.— Oh, Brysa, bem na hora... — A antecipação dançava em minha voz enquanto deslizava os dedos pela tampa da caixa, abrindo-a com um gesto casual.O silêncio no salão se adensou como neblina quando introduzi
EMMY ZACKO manto branco desliza suavemente sobre meus ombros, e a pelagem macia parece leve como o toque de uma pena. O cheiro que emana dele é reconfortante, uma mistura sutil de ervas e algo amadeirado. Isaac ajusta o tecido ao redor do meu corpo, seus dedos firmes e hábeis, e então dá um passo para trás para me observar.Ao me virar, vejo a torre da Dívisa Guardiã erguendo-se contra o céu nublado. Um calafrio percorre minha espinha, mas a dor real começa no meu ventre, irradiando-se como lâminas quentes por todo o meu corpo, meu estômago se contrai, e fecho os olhos por um instante, respirando fundo para acalmar o turbilhão interno.— Emmy... — A voz grave de Chase me chama de volta à realidade. — Sabe montar a cavalo?O peso do seu olhar faz meu coração acelerar. Baixo os olhos, balançando a cabeça em negação.— Tudo bem... — Ele se aproxima e acaricia meu rosto com ternura, o polegar deslizando levemente sobre minha pele. — Você pode ir com um de nós.Lanço um olhar incerto às s