5 - Babado Forte

No dia seguinte, Helena foi trabalhar, tentando fingir que nada aconteceu. Vestiu o seu melhor conjunto social para provar, pelo menos a si mesma, que era melhor do que aqueles dois. E também porque precisa acertar alguns detalhes da viagem.

Chegando lá, muitos a olhavam de forma muito estranha: uns davam risada, outros ficavam com pena e alguns com curiosidade. A profissional bem-sucedida e admirada por sua garra e competência, agora não passa de uma pobre coitada que levou um chifre pelo F******k. Chegou a ouvir os comentários:

"Se uma moça como ela não conseguiu segurar um namorado, então não há esperança para nenhuma de nós..."

“Coitada, ela não merece isso. Saber da traição do namorado pelo F******k não deve ter sido nada fácil para ela...”

“Sinceramente, aquele cara nunca me enganou...”

"Ela sempre se achou perfeita demais! Achou que nunca seria traída! Bem-feito para ela!"

"Agora que está solteira, podemos ter alguma chance! Vamos apostar quem é que consegue sair com ela primeiro!"

Como as pessoas eram egoístas!

Foi direto para sua sala, tentando ignorar aquele monte de comentários sem noção. Fechou a porta, sentou-se em sua mesa e abaixou a cabeça para tentar conter o choro, o que não adiantou. E para piorar, deu de cara com uma foto do Luiz em um porta-retrato. Ficou olhando para aquela foto que ela tirou em um torneio de artes marciais, quando bateram na porta.

— Dona Helena, a senhorita está bem? — Era Sr. José, o faxineiro.

— Entra Sr. José. — Não importa quem fosse, ela tratava todos bem.

— Está tudo bem com a senhorita?

— Sim, e com o senhor?

— Sim. Só queria saber se precisa de algo.

— Não obrigada... na verdade, preciso que jogue esse lixo fora. — Entregou a foto do Luiz. Por sua vez, o bondoso faxineiro encarou com ódio para o objeto nas mãos e despejou:

— Se a senhorita me permite, esse sujeito, filho de uma égua, nunca lhe mereceu! E a senhorita pode muito bem arrumar um bom partido, alguém do seu nível.

Até mesmo o porteiro sabia da postagem. Repetiu a mesma frase que seus pais e amigos sempre diziam a ela. Por mais triste que esteja, Helena apenas sorriu. 

— Obrigada pelo apoio Sr. José, mas realmente eu preciso que jogue isto fora e que me deixe sozinha. Preciso me concentrar no trabalho.

— Estou sempre à sua disposição, Dona Helena.

Mal o porteiro deixou a sua sala, veio Roberto Barroso, chefe do departamento jurídico da Shingen S/A. Ele sempre deu em cima dela desde a seleção de emprego na empresa e agora que está solteira, quer se aproveitar da situação. Assim que ele entrou, já imaginou o que ele queria, mesmo assim, o tratou educadamente:

— Bom dia Roberto, em que posso ajudá-lo?

— Helena querida, quero que saiba que estou do seu lado!

— Valeu, mas se você não veio falar de trabalho, prefiro que me deixe sozinha e ...

— Você merece alguém do seu nível, como eu. Eu sou advogado. Minha mãe é juíza. Meu pai é desembargador. E meu avô já foi um importante procurador da República e ...

Ela já ouviu aquela história da família dele umas centenas de vezes, sabia de cor e salteado. E ela sempre contava a sua, na brincadeira:

"Puxa que legal! Eu sou contadora. Meu pai já foi operário, ou peão de obras como dizem. Minha mãe já foi faxineira, mas os dois já fizeram de tudo um pouco na vida. E a minha avó é refugiada de guerra."

Mas naquele momento, ela não estava com disposição para ouvir, ainda mais ele. Precisou respirar bem fundo para não ser grosseira. Enquanto isso, ele continuava agarrado às mãos dela.

— Obrigada pela atenção, mas tenho que organizar o meu serviço antes de ir viajar. A propósito, você já preparou os contratos com as clausuras que tenho de levar?

— Sabia que pode colocar seu ex-namorado na justiça por danos morais e ainda exigir uma indenização? Posso cuidar de tudo para você! — A informou sem prestar a menor atenção na sua pergunta sobre os contratos, a deixando incrédula com o que acabara de ouvir. Ele estava se aproveitando da situação para conquistá-la.

Contudo, não pôde deixar de ouvir o conselho dele.

— Eu posso mesmo fazer isso?

— Deve. E você não precisa fazer nada, eu cuido de tudo para você.

— Eu não vou poder te pagar...

— Não precisa. Não vou te cobrar nada, é pela nossa amizade. Somos amigos de trabalho, não somos?

Até que Helena ficou muito tentada em se vingar de Luiz e daquela vaca da Núbia. Não seria exatamente vingança, mas sim justiça. Mas ela não era dada a vinganças e além do mais, sabia muito bem quais eram as verdadeiras intenções do "amigo de trabalho".

— Olha Roberto, eu realmente agradeço o seu apoio, de coração, mas eu preciso mesmo trabalhar e acertar algumas coisas antes da viagem. E também preciso de um tempo para processar tudo isso e ...

— Você bem que podia me dar chance. Sempre fui apaixonado por você desde o dia em que começamos a trabalhar aqui. Agora que o lutador te deu um chute, pensei que agora poderia ser a minha vez e ...

— SAIA JÁ DA MINHA SALA, AGORA!

— Mas eu ...

— AGORA, SENÃO CHAMAREI O SEGURANÇA!

Ela teve que empurrá-lo porta a fora. Em tempos de Redes Sociais, as notícias corriam rápido. Havia passado apenas 24 horas após a postagem e parece que o mundo inteiro sabia que ela levou um chifre. Ela queria morrer logo de uma vez, porque aquilo estava a matando aos poucos.

— Helena!

"Ah não!" Sabia e muito bem de quem era aquela voz. É a Olga, a velha secretária do presidente e dono da empresa, com quem se não simpatizava. As duas eram sempre muito profissionais uma com a outra, mas não disfarçavam a hostilidade.

— Pois não dona Olga? — Tentou ser o mais gentil possível, o que estava difícil. Parece até que todo mundo resolveu testar a paciência justamente naquele dia.

— Sr. Shingen quer te ver agora! — O tom de voz daquela mulher já era irritante, ainda mais falando daquele jeito, ficava ainda pior. Assim como todos, já estava ciente do ocorrido e claro, vai se aproveitar da situação para lhe tirar do sério. Mais uma vez precisou respirar bem fundo para não dar uma resposta àquela bruxa.

— Sim claro, já estou indo e...

— É bom mesmo. Sr. Shingen está muito irritado com a sua falta de profissionalismo

Aquele insulto foi a gota d'água. Já não bastou ter sido humilhada no F******k, agora ser acusada de não ser profissional, aí já foi demais.

— Escuta aqui sua vaca velha, se você tem algum problema comigo, diz logo! — Aproveitou a ocasião para descontar a sua ira e nem se importou com a multidão que se formou à sua volta.

— Só acho que depois do que o seu namorado fez, você não deveria mais trabalhar aqui, pois somos uma empresa séria!

— Ah que graça, tenho que sair do emprego porque o meu ex postou no F******k que está com outra! E se a empresa é séria, que porra você está fazendo aqui, hein sua velha malcomida?

Helena já não gostava de Olga. Depois daqueles desaforos, passou a gostar menos ainda. Não conhecia a tal da Núbia, mas sentia um profundo ódio por ela. E por Luiz então, mais ainda.

— O que está havendo aqui? — Uma voz grave perguntou, ecoando pelo ar.

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