7º Capítulo

Já fazia um tempo que Ametista estava morando sozinha. Estava com dezoito anos de idade e, sentia que ainda algo faltava na sua vida. Queria fazer faculdade e tornar-se Juíza. Para isso precisava voltar a estudar, pois ainda precisava terminar o último ano do ginásio. Assim, precisava reestruturar a sua vida, pois não era fácil trabalhar em uma loja, ainda mais se tivesse que esticar o seu horário para os estudos, mas assim, ela faria se fosse necessário. Era somente um cômodo, num edifício que parecia abandonado, localizado no centro da cidade. Contudo, uma pequena alegria brotava de dentro do seu peito, ela tinha o seu lar, que podia deixar organizado assim como deixou quando saiu antes de ir trabalhar. E foi ali que aprendeu muitas coisas na cama com Bruno.             

          Certa vez, sentiu-se enjoada no trabalho, Beth que era mãe de uma menina logo compreendeu. Ametista fez o teste de gravidez que comprou na farmácia e, tão logo ela ficou boquiaberta com o que viu, ela estava grávida. Porém, mesmo diante do desespero que estava a sua vida, ela tocou na sua barriga e por alguns momentos imaginou que ter um filho serviria ainda mais para unir Bruno e ela... já que nos últimos tempos ele pouco tinha lhe procurado, como se ela já não lhe parecesse mais tão interessante como antes. Conversou com a vizinha, dona Sandra, que era uma anci’ã, viúva que residia sozinha, depois que os filhos haviam crescido e ido morar fora.

          − Ah, é daquele teu namorado... ah, minha filha, fala logo para ele, vai ficar feliz. Disse a vizinha, tão convalescente. 

          Todavia, o que Ametista ouviu foi:  

          − Esse filho não é meu. Gritou Bruno, enquanto pegava em dos seus pulsos. 

          − Como assim, do que tu tá falando, cara?

          Ametista pensou não ter compreendido o que Bruno havia dito, por mais que já houvessem se desentendido algumas vezes, ele estava de modo cruel, como se ela que um dia foi a sua princesa, agora fosse uma prostituta. 

          − Pensa que eu não sei, piranha! 

          Só se ouviu o estalo no rosto de Bruno... pelo tapa que Ametista havia dado nesse. Bruno logo fez-se o semblante engelhado de raiva e, não hesitou em revidar, deu um tapa no rosto dela... Ametista chorou a noite inteira. Não teve tempo de descansar, pois no outro dia teria que trabalhar. E a vergonha do olho roxo? Antes de sair, ela fez uma maquiagem pesada para disfarçar, com a maquiagem barata que possuía.

          Passaram mais alguns meses e, Ametista não conseguia esconder de todos que não estava bem, o seu quadril estava maior, e ela havia engordado bastante... Beth todos dias a indagava e, dizia “menina, menina, se seu Jaime souber vai te demitir...”. Ametista ficava apavorada com a possibilidade de ser demitida, ela precisava fazer alguma coisa. Entre os desmaios, Ametista, tentando recuperar o seu fôlego, confessou então, que estava grávida. Beth imediatamente deu-lhe uma solução.  

          Ametista sangrava sentada próximo à privada, deitava de modo fetal, enquanto gritava de dor, seus pairavam no corredor do prédio... mas não havia ninguém em volta, porque os dois quartos ao lado não estavam alugados e, dona Sandra havia viajado para visitar a filha que morava na Venezuela. 

          A embalagem do cytotec estava em cima da pia do banheiro. Beth conseguira com uma amiga que vendia para mulheres abortarem. Remédio que havia sido fabricado para prevenção de úlceras gástricas, era vendido no mercado negro para abortar crianças indesejadas.

           Enquanto Ametista gritava sentindo a maior dor que havia sentindo na vida, querendo que alguém a pegasse no colo e, tirasse a sua dor. O sangue nas suas mãos lhe dava pavor. Nunca na vida ela havia sentindo tanta vontade de morrer como naquele momento. Havia saído em pedaços na privada, a cabecinha, os bracinhos, as perninhas... com seus vários meses de gestação... o havia sucumbido, assim, como um sugador de lixo, pois ele havia sido dilatado para expulsar-lhe o ventre, como se Ametista tivesse entrado em trabalho de parto... sem ninguém por perto... Era uma menininha. 

          Por que Beth não havia lhe informado que era assim? Por que a havia deixado sozinha? Ainda se recordava dela dizendo: “Consegui esse remédio com a minha amiga só porque quero te ajudar, colega... Eu mesma já tomei duas vezes, porque fiquei grávida de dois canalhas por duas vezes... Então, é isso... eu só quero te ajudar”.

          Uma infecção uterina deixou Ametista hospitalizada durante dias, não houveram irmãos e nem parentes para socorre-la. Seus pais que moravam no interior do Mato Grosso do Sul, nunca souberam sobre. Quem serviu de acompanhante foi dona Sandra, que chegou da Venezuela no dia seguinte que Ametista ficou hospitalizada. A sorte de Ametista foi que o zelador que passava com um balde e um rodo ouviu os seus gritos de socorro. Dona Sandra disse-lhe:

          − Por que fez isso? Se tivesse me contado... Eu teria criado essa criança. 

          − Como? A senhora já está com uma idade... 

          − Eu dava um jeito, filha. 

          Ametista só entornou o rosto, porque inicialmente não tinha palavras para dizer para dona Sandra, só com o tempo pode discernir o que havia feito. 

         Depois de quase morrer, à noite, tinha frequentes pesadelos. Ouvia choro de uma criança distante, como se houvesse em algum lugar no velho edifício. Ametista chorava sozinha... E assim, foram noites com pouco sono. Ametista começou a sair com amigos para beber, porque assim, só por alguns momentos poderia sentir-se alegre e, não sentir a dor que lhe aniquilava tão disfarçadamente, mesmo que por instantes todos que tivessem a sua volta percebessem. Então, decidiu sair dalí, mudar-se e ter uma vida nova, longe das lembranças sórdidas. Ametista acabou sendo demitida, e se esse era um dos receios de lhe acontecer porque teria um filho... Só dona Sandra para lhe socorrer, demitida, sem direitos trabalhistas, ajudando com alimentação, mas o dono da sua humilde moradia, que era nada mais, nada menos que um único cômodo, deixou-a ficar, até conseguir um novo emprego. 

         E do silêncio que aprisionou seus sentimentos, Ametista conseguiu recuperar aos poucos a sua vida. 

         Foi morar numa quitinete, em um bairro próximo ao centro, que possuía somente dois cômodos, tinha que subir duas escadas até o terceiro andar, o que se tornava um suplício quando ela tinha diversas sacolas pesadas de compras para carregar. Sentia-se sozinha, porque a sua mãe nunca ligou, a não ser um dia... 

         Certo dia ligou para casa de uma vizinha, porque era assim que naquela época ela conseguia ter notícias da família, soube através de uma das irmãs, que seu pai, Afonso padeceu depois de uma briga em um bar. Ametista não chorou e, muito menos viajou até Corumbá para participar do enterro, além do tempo que seria profícuo que perderia até chegar a Corumbá. Ela não se importou por não ter comparecido ao enterro, só lhe veio a recordação das diversas traições e de toda perversidade do seu pai... Entretanto, por tempos por aqueles que conheceram Afonso, ela iria ouvir: “Tu tem um temperamento forte como do teu pai”. 

         Antes da sua mudança para a quitinete, Bruno quando soube do terrível ocorrido, voltou a lhe procurar e, a questionar por que ela havia feito aquilo. 

         “Porque me abandonou”. Foram as palavras que surgiram na sua mente. 

         − O que tu quer de mim? ─ Foi o que ela disse. 

         − Agente podia ter conversado mais sobre isso, princesa. 

         “Princesa”, ela havia tornado a ser sua princesa mais uma vez.

          − Some da minha vida. Tu foi a coisa mais triste que já me aconteceu. 

          Discutiram. E entre farpas, Bruno pegou a chave no novo fusca que tinha trocado pela moto e, foi embora. Ametista nunca mais o viu.

          E Beth quando soube que ela quase morreu, não se importou. Só respondeu: “Eu não tenho culpa de nada, fez porque quis”. Tão omissa! Por anos, Ametista diria para si: “Foi a melhor coisa o que tu fez, Ametista”.  

          Ah, a paixão, há momentos que tudo parece ser um sonho, porém, tão brutal é a intenção daqueles que não sabem amar. 

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