Haviam dias que ela sentia vontade de morrer, porque não conseguia dar a coisa mais preciosa que Pedro desejava: ter um filho. Estavam casados há cinco anos e, nada. Entre tantas tentativas fracassadas, Pedro começou a jogar na cara de Ametista porque ela havia feito um aborto, pois toda dificuldade para engravidar, segundo Dr. Santos adivinha disso. Além de quase morrer naquele período, ela ainda por cima tinha que ouvir isso do homem que amava. Chegou a sugerir uma adoção ao marido, porém, ele não queria de modo algum. Ametista não compreendia como ele poderia ter ser tão mal ao recusar uma adoção.
− Você sabe como eu me sinto um fracassado que não tem nenhum filho... E o que os meus parentes vão dizer.
− Não interessa o que eles vão dizer.
Ametista estava revoltada com Pedro por ser mesquinho e, se importar mais com as pessoas dizem do que com ela, que era a sua esposa.
− Eu só quero pelo menos um, Ametista. Que tenha o meu sangue... Será que você não consegue entender isso?!
Pedro antes de Ametista sonhava em ter uma família grande, quatro filhos, assim como seus pais, que sempre lhe foram a referência.
Pedro era do Exército, procedente de Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Ametista o conhecera através de uma das suas irmãs quando ainda ele servia como soldado no Exército, em Campo Grande. Ametista havia ido visitar a sua família, mas por alguma coisa mal resolvida que havia ali, ela não se sentiu bem em casa, e foi para Campo Grande, ficar de férias na casa de uma das suas irmãs. Ele era apenas dois anos mais velho que ela, ela tinha vinte e quatro anos de idade e, ele vinte e seis. A empatia que os avassalara foi instantânea, e, como Dom Juan DiMarco que era na época, nunca queria compromisso, mas Ametista, com sua voz firme, e o seu jeito forte o impactou. Namoraram apenas cinco meses, ele então, a chamou para ela ir morar com ele no seu apartamento. Pedro havia conseguido transferência do Exército para Manaus, tudo por causa de Ametista, derrubando todas as barreiras para ficarem juntos.
Juntos eles se amaram. Nem de longe tinha uma família grande como a de Ametista, no entanto, para os tempos atuais sonhava com uma família grande. Por toda a sua vida, nunca conhecera a mulher ideal para constituir isso, até que viu em Ametista a mulher que procurava. Trabalhadora, também sempre mantinha a sua casa com zelo, apesar que vez ou outra ela lhe cobrava para que ele pudesse compartilhar com ela de algumas tarefas.
E tão logo ele desejou ter um filho. Quando Ametista lhe contou pela primeira vez sobre o aborto que havia feito, por mais que aquilo o tivesse chocado tão repentinamente, ele não a culpou, porém, os anos começaram a passar... Então, um dia, ele a culpou.
Depois de uma de tantas brigas, Ametista chorou tanto, desceu o prédio desesperada, entrou no carro e, em vão tentou dirigir, mesmo que Ametista naquele período ainda não tivesse tirado a habilitação. O carro não saiu do lugar. Não tardou e, eles se reconciliaram.
Os problemas haviam. A noite dos dois terminou na delegacia, fazendo boletim de ocorrência. Quando estavam em um show de samba, o carro foi furtado. Pedro ficou furioso, e ficou durante semanas de mau humor, bebia sozinho no bar, para descontar a frustração.
Entre transferências, depois de anos, Pedro passou no concurso público para Policial Militar, em Campo Grande, pois queria voltar a ficar próximo da sua família e parentes. A sua mãe, Iara, os convidou para irem participar de um momento de oração da casa deles. A família de Pedro sempre fora religiosa, porém, ele sempre foi às avessas com isso, considerava a religião algo desnecessário, contudo, naquele dia seu coração estava contrito. Não foi de repente, mas aos poucos, pela primeira vez, Ametista conversou profundamente e pessoalmente com Deus e, pela primeira vez também pediu perdão pelo o que fizera no passado, cometido no ato de desespero e inocência. E não era somente o aborto a ferida a ser curada. Ela ainda guardava mágoas profundas do seu pai. Ela precisava perdoá-lo, mesmo que já tivesse falecido.
Todos os domingos, ela e Pedro passaram a ir à missa e a ler a Bíblia e, conversar sobre a passagem lida. Ametista entregara-se não somente a religião, porém, ao um novo estilo de vida. Ela ia no Parque das Nações Indígenas passear com as amigas que conhecia na igreja ou mesmo com a suas amigas do trabalho, pois que trabalhava como auxiliar administrativa em uma universidade. Enquanto isso, o sonho de tornar-se universitária foi ficando distante, mesmo ela trabalhando em uma.
Cinco anos de casamento foi suficiente para Ametista sentir-se deprimida porque não conseguia ter filhos, mesmo que a descoberta de Deus tivesse transformado a sua vida, o vazio ainda era latente em seu coração e, ela sentia-se tão pequena num mundo tão gigante que parecia querer esmaga-la. Amestista sentia-se péssima. Pedro, aos poucos não quis mais lhe acompanhar na igreja, porque dizia “Deus não faz nada para nos ajudar”. E qualquer problema entre o casal, era suficiente para que houvesse discórdia e, eles brigassem e ainda argumentava “vai para igreja, mas é desse jeito comigo, nem de longe é uma santinha, dona beata”. Foi quando Ametista se deu conta que nem de longe Pedro era o homem dos seus sonhos, porém, talvez a culpa fosse sua porque ela não conseguia dar-lhe filhos.
Entre as lágrimas escondidas de todos, quando estava trancada no banheiro e, às súplicas para Deus, um dia Ametista ficou enjoada, ela estava finalmente grávida. Era uma menina. Era final de semana, estava sozinha em casa e, Pedro havia ido jogar e beber na casa de um dos amigos, quando fez o teste de gravidez de farmácia, sozinha, à noite, enquanto passava um programa na TV. Ficou tão feliz que não sabia o que fazer, ela caminhava pela casa sem rumo, então, foi até o pátio e, depois um pequeno jardim, sem muitas plantas, mas um gramado e uma árvore, mais algumas orquídeas de diversas tonalidades, no tronco. Olhou para o céu quando se defrontou com algo que nunca havia visto até então, ou que havia visto em algum momento, porém, passara-lhe desapercebido: uma estrela cadente ou um cometa. Teve certeza de uma coisa, que seria uma menina, assim, como a criança que abortou um dia.
Promessas, às vezes, são quebradas e, justo ela que disse que nunca daria um nome diferente para a sua filha, assim o fez também, como a sua avó e a sua mãe. Ametista recordou-se do velho álbum de fotografias da família, os seus antepassados negros e brancos... E pareceu-lhe que uma nova história estava formando com a sua filha, Estrela.
Estrela que irradia, porém, abria um sorriso se de algum modo a pessoa que a tivesse cativado. Estrela havia se tornado o ser mais importante da vida de Ametista, um amor intransponível que antes ela não sabia que existia. Ficou questionando-se se algum dia, sua mãe a amou como ela amava a sua filha.
− Se a tua mãe nunca encontrou um homem que lhe ame como merece, você vai encontrar, minha filha, porque não vou deixar que qualquer um mau feitor se aproxime de ti. Disse enquanto trocava a frauda de Estrela que sorria tão doce com as perninhas erguidas para cima.
Ametista agradeceu a Deus pela filha que teve, e, que a guiaria no caminho do Senhor. Por isso, desde criança Estrela foi cercada de todo cuidado, sem excessos de mimos, mas com a educação e afeto que era necessário, mais as orações a noite, antes de dormir.
Tão logo, Ametista, foi visitar seus parentes no Norte levando a pequena Estrela, contudo, sem Pedro, que estava trabalhando. A menina estava por volta dos dois anos de idade.
Orquídea que estava em Manaus, passando uma temporada na casa dos seus irmãos, foi a primeira que a pegou no colo, olhou para aqueles olhos castanhos claros, e os cabelos cacheados e loiros. Ficou por alguns instantes analisando a criança que apenas a encarava sem compreender o que a avó estava fazendo.
− Mãe, o que tu tá fazendo?
O sotaque de Ametista logo tornava-se tão parecido quando outrora ela morava no Norte.
− Esta tua filha parece com a Maria Carolina.
Como Orquídea poderia esquecer de Maria Carolina! Orquídea que contou para os filhos tantas vezes sobre a proprietária branca de sua antepassada.
− A Maria Carolina, não te lembra dela? A dona da minha bisavó Tomasia?
− Ah, sim, mãe, a Maria Carolina! Lembro dela.
Ametista sabia que no fundo, a sua mãe guardava ressentimentos de uma menina que já nem existia, por conta de um passado sombrio da História no Brasil. Parecia loucura, mas esta era a verdade. Amestita rezou nos seus pensamentos para que tal ressentimento não recaísse sob a sua filha.
− A mãe do Pedro é loira.
− É. Mas não foi só do Pedro não que veio a aparência dessa menina, provavelmente do teu pai também. Retorquiu Orquídea.
A sua mãe tinha razão. E Ametista naquela altura já não se importava se ela ou a filha tinham algo de Afonso, porque vez ou outra ela pedia a Deus que tirasse a dor que ainda guardava do falecido pai, e que agora para ela só eram memórias, e que ela não sentia mais vontade de chorar.
Orquídea soltou Estrela no chão, que permanecia calada, sem compreender o que os adultos conversavam. A pequena tentava entender: quem eram Tomasia e Maria Carolina?
Com dois anos de idade, Estrela foi morar no bairro Santo Antônio, próximo à avenida Júlio de Castilho, com a sua família. A casa era pequena com dois quartos, possuía uma pequena árvore na entrada, mas que cobria a casa com uma sombra, onde era possível às vezes colocar uma cadeira de praia na frente e ficar sentada conversando com a vizinha ao lado, a única que de fato conheciam. Estrela poucas vezes saia, ia para escola, para natação, para igreja ou para jogar vídeo game com Lilian, a filha da vizinha. Estrela quase sempre perdia para Lilian. Lilian não gostava de brincar de boneca, então, Estrela brincava de boneca sozinha. Estrela possuía sonhos incomuns, na infância queria conhecer a Inglaterra, o País de Gales ou a Escócia. E quem sabe, a rainha! &nbs
Estrela permaneceu muda por alguns dias. Quem olhava na sua face via um semblante triste e pesado e, principalmente que queria se esconder. Não quis falar com ninguém, nem com Amestista. Ainda se lembrava daquelas palavras, ele a humilhou, a machucou. E como o seu pai era policial militar foi tão fácil de resolver.Mas tudo antecedeu... “Como ela foi burra!”, remoía nos pensamentos.Victor: oi, linda!Estrela: oi, Victor! Como vc está?Victor: Estou bem! Quero uma foto da minha linda!Estrela: eu não gosto de tirar fotos. Rsrs&
Estrela gostava de animais. Além de Leão, ela tinha um peixe e um raminster. Contudo, a primeira vez que Estrela teve um raminster, ela ficou tão preocupada em cuidar bem do bichinho, que o alimentou muitas vezes e, o ratinho morreu. Foi aí que percebeu que cada animal, assim, como as plantas, tinham um jeito particular de serem cuidados. E a mesma coisa ocorria com as pessoas. Estrela soube que a Congregação era a mesma que a tia Branca fazia parte. Quanta coincidência! Ela refletiu. Com frequência ia visitar as irmãs. Havia começado a fazer o vocacional com as irmãs, contudo, o que ela mais gostava era quando ia para um centro para crianças e jovens com necessidades especiais. Ali ela via risos das pessoas mais carinhosas que existiam, assim, Es
Um dia Estrela compartilhou com a mãe o desejo de estudar fora, aliás foram tantas vezes que se pegou falando sobre tais sonhos. − Minha filha, você precisa amadurecer um pouco a ideia. Não é tão fácil morar em outro país como você pensa. Além da passagem e do curso para você pagar, tem a sua estadia.− Poderia lavar prato.− Estrela!− O que? Eu lavo prato aqui em casa sem ganhar nada, posso lavar prato num restaurante ou numa lanchonete sendo paga.− Vocês jovens acham que é tudo fácil. 
A Porta MágicaBeatriz morava num apartamento junto com a família. Havia muito barulho em volta, uma zona de prostituição e, assaltos eram corriqueiros. Não haviam flores, não haviam árvores, apenas a sua imaginação querendo ter um lindo jardim em volta. Ela já havia lido o livro Alice no País das Maravilhas, Peter Pan, e muitos livros de fantasia, talvez o seu refúgio diante das diversas brigas dos pais. Beatriz era quieta e, havia se tornado mais ainda desde que havia entrado na puberdade. A escola era um lugar que ela não gostava, pois ela tinha quinze anos, era muito magra e, achava que era feia, porque seus próprios irmãos diziam que ela era. Beatriz acreditava e, se importava muito o que pensavam sobre ela. Às vezes, sonhava que um dia abriria a porta e, fugiria de casa, para então, quem sabe morar em outro país
A Congregação utilizava a tradição de ter o sino para acordar as meninas e a todas as irmãs, de manhãzinha. Era a superiora quem o batia rigidamente as cinco horas da manhã. Obviamente que quem estivesse escalada para aprontar o café da manhã, acordava antes do sol nascer. Aos domingos, as meninas podiam dormir meia hora a mais, para então, irem participar da missa. A vida religiosa era assim, regrada. E as irmãs diziam “um grande problema da sociedade atual é que as pessoas não possuem regras”. As regras, às vezes, para Estrela, pareciam tão pesadas de carregar, tão difíceis de conseguir cumprir. E na semana que precisava cozinhar, era tão difícil, porque era algo a mais que precisava fazer. Ela permaneceu salgando a comida por um bom tempo, mas aos poucos estava se aperfeiçoando, melhorando, e, qu
A Metamorfose da BorboletaHá muitos anos atrás, por volta do ano de 1900, havia um povo invisível... Ieda, uma princesa borboleta de asas azuis, nasceu entre o povo Geda que habitava um bosque. O povo Geda era um povo invisível para os humanos, porque elas eram lindas e frágeis borboletas e, era somente assim que os humanos os viam. Eles possuíam traços humanos, contudo, com olhos, cabelos e asas de diversas colorações. Os seres humanos não podiam ver a semelhança. A explicação para isso é que as borboletas no início da civilização precisaram se disfarçar e tornar-se pequenas, pois seus encantos e beleza causavam curiosidade nos humanos daquela época. Porém, alguns humanos tinham a permissão de descobrir esse segredo, se alguma borboleta resolve
A casa era grande, possuía inúmeros quartos. Os quartos das meninas ficavam em um corredor, os das irmãs outros. Conceição e Luiza sempre diziam que tinham medo de caminhar a noite pela casa, já com luzes apagadas, tal como já se sabe, tal lugar havia sido um hospital. Obviamente que só podiam caminhar até antes de dar a hora delas irem dormir. Estrela não tinha medo desse tipo de coisa. No entanto… certo dia, à noite, depois do jantar, enquanto ela estudava em uma das salas, subitamente a luz apagou. Havia faltado energia elétrica na casa. Estava sozinha, no último quarto. Um medo repentino apoderou-se dela. Estrela com passos rápidos e pesados, foi em direção ao salão e subiu as escadas no escuro, sem ter que cuidado que poderia tropeçar. Ela ouviu barulhos estranhos, o que lhe apavorou mais ainda. Então, depo