A noite do tão esperado jantar de gala na mansão St James Hall foi estrelada e com uma linda lua crescente. Uma brisa suave de verão brincava com as toalhas e cortinas do salão, cujas portas francesas abriam-se para o jardim, magnificamente iluminado com pequenas lanternas chinesas penduradas nas árvores.
Cada um dos convites enviados foi aceito imediatamente. Nada menos que a nata da sociedade britânica estaria ali naquela noite para prestigiar a primeira recepção da nova condessa de Hallen. Os Hakim, Raymond e Evelyn estavam presentes, assim como lorde e lady Siems.
Amie foi cumprimentada e elogiada por todos.
Pouco antes do jantar, Connor tocava para seus convidados quando, passeando os olhos pela plateia embevecida, parou abruptamente, levantou-se e curvou-se apoiando um joelho no chão. Entendendo o que aquele gesto significava, a pequena multidão dividiu-se ao meio, criando uma passagem at
Dois dias depois, Connor e Amie embarcaram em um navio mercante chamado Ártemis.—O navio é lindo, Connor, mas ainda não me disse para onde vamos.—Não mesmo. – Sorriu inocente. – Bem, acho que vai continuar sem saber minha querida, pois não vou lhe dizer, nem ninguém da tripulação.—Ora essa! Isso não é justo milorde!—Encare como uma surpresa, milady. – Ele a abraçou e beijou-lhe a curva do pescoço. – Quero que relaxe e aproveite a brisa marinha e o sol, quando chegar o momento, você saberá.A condessa de Hallen suspirou resignada e pousou a cabeça no ombro do marido, enquanto observavam o porto tornar-se cada vez menor no horizonte. Fora mais difícil do que ela esperava despedir-se de Ethnee e da pequena Annabel.Após vários minutos de confortável silêncio
Inglaterra, 1886.A morte rondava os desventurados de Londres naquela noite de dezembro, mesmo os que tinham a sorte de contar com um teto sobre suas cabeças. Mas, apesar do frio, em uma das muitas pequenas vilas de imigrantes em White Chapel, um pequeno grupo de amigos reunia-se no pátio, próximo à janela da moribunda. Ali, onde tantas culturas se misturavam e nem sempre homogeneamente, senhoras idosas vestidas de preto, crianças, jovens e adultos rezavam, cada um em sua própria língua e religião, por aquela alma tão querida. Todos sabiam que aconteceria em breve, e a tristeza marcava os rostos amigos que faziam a vigília.O médico, por fim, saiu do pequeno cômodo, olhar contrito, o chapéu nas mãos.Anne Thèrese Templeton não mais estava neste mundo. As pessoas que moravam naquela vila, crianças e velhos, jovens e adultos, de
Londres, dois anos depois.Quando a Sra. Howard fora chamá-la em seu quarto, dizendo que alguém desejava vê-la, Ártemis Templeton franziu o nariz, já antecipando o que lhe esperava: um velho, pomposo e rabugento mordomo, cheirando à água de colônia, que viera em nome de seu senhor, o lorde qualquer-coisa, para contratá-la. Nunca era muito diferente disso! Mas, mesmo diante de tal perspectiva, ela tinha de receber a pessoa. Depois que os Stratkery haviam se mudado para Kent, ela ficara desempregada, e, em pouco tempo, também ficaria sem dinheiro. A Sra. Howard era muito boa, mas dependia dos aluguéis para viver. Também não podia voltar para a vila, pois lá, não a deixariam pagar por suas despesas, o que Amie não considerava justo.Seguida de perto pela dona da pensão, desceu a velha escada de madeira rumo à sala de visitas. Involuntariamen
—Tudo acertado, amigo. Ethnee já tem uma nova acompanhante. – O conde levantou os olhos dos papéis que lia para dar atenção ao seu secretário. – Mandarei uma carruagem buscá-la amanhã.—Perfeito. Obrigado, Jesus.—Precisa comunicar à sua mãe...Connor fez uma expressão hilária de desgosto e largou novamente os papéis.—Tem razão.—Vou mandar um criado chamá-la.—Não precisa. Irei até lá.—E eu, vou me esconder.Jesus fez o possível para esconder seu espanto diante da atitude de seu patrão, já que, como dissera à governanta, ele raramente deixava a biblioteca. Durante o dia, pelo menos.Lorde Hallen riu e saiu para o corredor, rumo ao salão rosa, onde certamente encontraria a mãe.A condessa de Hal
Que linda mulher era aquela! Sentado à sua escrivaninha, com uma enorme pilha de papéis esquecida sobre o tampo polido, Connor Saint James, o conde de Hallen, não conseguia parar de pensar na mulher que contratara para cuidar de sua sobrinha e que, estranhamente, parecera-lhe familiar.Não pudera ver-lhe os cabelos, pois ela usava uma touca de linho branco, mas o rosto era harmonioso, lembrava um coração. A pele era de um branco perolado e os olhos eram da cor do crepúsculo. Ele jamais vira beleza igual em sua vida! Mas os olhos... Vinha sonhando com olhos como os dela há muito tempo... Com efeito! Não era nisso que deveria estar pensando! Coisas mais urgentes mereciam sua atenção. Connor franziu as sobrancelhas, tentando concentrar-se em coisas mais importantes.—No que está pensando, meu amigo?—Para ser franco, Jesus, na governanta.—Ela &eacu
No relógio do hall soaram as doze badaladas da meia-noite e Amie revirou-se novamente na cama.Não conseguia conciliar o sono, e, como de costume, ficar na cama não adiantaria nada.Resolveu então, ir até a biblioteca de lorde Hallen e procurar um livro que a fizesse dormir, ou, pelo menos, ajudasse a passar o tempo. Apertando bem o penhoar de tecido fino em torno do corpo, desceu as escadas, empunhando um pesado castiçal. Seria uma invasão, ela sabia, mas se ele não ficasse sabendo...Não parecia haver luz dentro do aposento. Ela entrou, agradecendo à Sra. Fitzwaring pelo ótimo trabalho na conservação das dobradiças.As prateleiras de livros ocupavam todas as paredes, exceto onde estavam as janelas em arco, que conferiam uma luminosidade agradável à biblioteca durante o dia. Uma grande lareira de mármore azul e branco dominava o ambiente
O brilhante sol da manhã terminou por despertar Connor do que ele julgava sua melhor noite de sono em anos.—Ah! Finalmente acordou!A voz do amigo e secretário soou por trás do cortinado quando o conde se espreguiçou ruidosamente na cama.—Jesus? Que horas são?Abrindo as cortinas, Connor viu o amigo confortavelmente instalado em uma das poltronas escuras. Pilhas de papéis espalhavam-se pelo chão e em seu colo.—Passa das onze, milorde. Sua mãe deve estar feliz esta manhã! Está agindo como o nobre que é! – zombou o enorme rapaz de pele escura.— Cale a boca, Jesus! Nem você vai me tirar do sério esta manhã!—Você nunca está tão feliz assim logo que acorda. A que se deve esse fabuloso estado de espírito?—À Ártemis! – disse o conde simplesmente.
Mais tarde, naquela mesma noite, a Sra. Fitzwaring foi visitar a convalescente, trazendo-lhe uma bandeja com chá e bolo.—Boa noite, miss Templeton. Sente-se melhor?—Oh, sim! Muito melhor, obrigada.—Que bom. Fiquei preocupada quando desmaiou na cozinha.—Eu peço desculpas. Acho que causei a maior confusão lá em baixo. O conde foi muito gentil e atencioso durante toda a tarde.—Milorde sempre foi assim. Preocupava-se com todos, desde pequeno.—A senhora está aqui há muito tempo, não é, Sra. Fitzwaring?—Sim. Quarenta e cinco dos meus sessenta anos foram dedicados à família St. James.—Quarenta e cinco?! Mon Dieu! É uma vida inteira!—De fato. Mas foi uma vida muito feliz. Minha mãe era a governanta antes de mim. Eu comecei como ajudante de cozinha aos quinze anos.&mda