Cogito afastá-lo, impedir que algo a mais aconteça, mas estou exausta e quero isso. Quero o beijo e suas mãos em mim, nos sentir juntos como se estivéssemos no gazebo de novo, e não como ele me beijara para sanar minha crise de pânico, ou para dar ar aos meus pulmões na beira do lago.
Relaxo os músculos e permito que Noah me tome para si, a mão aperta minha cintura com a mesma intensidade que retribuo o beijo molhado e repleto de um desejo ardente. Eu queimo e pela primeira vez em muitos dias, o fogo não vem das cicatrizes. Sua fonte são nossas línguas se encaixando uma na outra em um ritmo ansioso e voraz, famintas.
Sou conduzida para a pia, sem que nossos lábios descolem. O mortal passa os braços por debaixo das minha pernas e as fecho ao redor dos quadris dele, as mãos agarrando minha bunda. Desvio de sua boca para abrir os olhos e virar a cabeça minimament
— Tempos desesperados pedem medidas desesperadas. – Argumenta e meneia o queixo quadrado para mim. — Tire. – Ordena e o encaro com um dos meus piores olhares, em seguida me sinto culpada por ter colocado a malicia em primeiro lugar, desconsiderando a parte curandeira da coisa. De qualquer maneira, tirar a roupa para ele está fora de cogitação, mesmo que eu quase a tenha tirado para Noah minutos atrás. — Precisa estar com as costas descobertas se quiser que a pomada funcione!— Eu pensei nisso. – Respondo.Chego um pouco para frente na cama, liberando um espaço para que o feérico se sente às minhas costas e tenha uma visão e um acesso melhor das linhas inflamadas expostas pelo decote da camisola. Espero pelo toque áspero da textura da pomada e a aplicação faz cócegas nas áreas sensíveis ao longo das cicatrizes avermelhadas. Arquejo
Finalmente consegui dormir essa noite, sem sonhos por sorte, apenas um sono profundo até as oito da manhã. Acordo sozinha e a preguiça me consume, bloqueando qualquer ideia de sair do meio dos cobertores quentes e confortáveis. O amanhecer parece tímido e nuvens cinzas cobrem o sol, pelo pouco que posso distinguir do céu pela fresta da porta da varanda entreaberta. Está nublado e frio e o outono definitivamente chegou com seus ventos fortes balançando as copas dos pinheiros da floresta e derrubando seus galhos finos e folhas em uma canção que me mantém hipnotizada por infinitos minutos, encarando as cortinas balançando lentamente com vislumbres do lado de fora. Checo as horas no relógio sobre a mesa de apoio ao lado da cama e afundo a cabeça nos travesseiros, praguejando por ser obrigada a deixá-los. Se enrolar mais, vou acabar atrasando todos para o evento fúnebre de hoje. Então, jogo os edredons de lado e os pelinhos do tapete fazem cócegas em meus pés descalços. S
— Pare de me analisar! Cansei de ter minha privacidade invadida por sua magia pervertida! – Afundo as unhas na direção e piso um pouco mais no acelerador, voltando a atenção para a curva sinuosa a frente. — Ótimo! Além de psicopatas de asas, leem as mentes também! – Noah suspira recostando no banco. — O que mais fazem? Não, não quero saber. O olho novamente pelo retrovisor e a quietude persiste até o estacionamento do cemitério. Passamos pelo enorme portão de vigas de ferro prateado e antigo, com marcas de ferrugem aqui e ali nos arabescos e no enorme corvo que ficava ao centro dele, acima de tudo, observando com seus olhos de metal quem entra para sair e quem nunca mais sai. O cheiro dos canais é mais forte nos arredores, se mesclando com o aroma amadeirado dos pinheiros e da terra úmida. Uma fina garoa começa, enquanto passamos pelas centenas de corredores com lápides fincadas no solo – esculpidas com os nomes dos falecidos, suas datas de nascimento e morte
Freya me guia pelas ruas enfeitadas de Nova Orleans até sua casa. O dia das bruxas se aproxima na mesma velocidade em que as folhas das árvores caem alaranjadas e marrons para o concreto do asfalto e os humanos se recusam a perder tal comemoração, o que, é no mínimo contraditório quando analisamos a diferença de suas crenças religiosas com a verdadeira origem pagã do halloween. Hipócritas! Penso ao guiar o carro pela rua estreita cheias de cortiços coloridos franceses, decoradas com correntes de flores sazonais entrelaçada nas vigas de metais das varandas. Samambaias pendem dos tetos e luzes penduradas iluminam a manhã nublada, chuvosa e melancólica. Estaciono de frente à casa da bruxa e descemos para a rua, o Jazz ecoando ao fundo, vindo de algum dos apartamentos acima. Seguimos Freya pelos curtos degraus de entrada e ela destranca a porta de madeira com um quadrado de vidro craquelado em várias cores na altura de nossas cabeças. Entramos para um interior
— Isso é ridículo, pois, se ela quer tanto, que procure outra bruxa! – Freya responde um tanto indiferente e se move, preparando-se para se levantar. Mas, o garoto sai da poltrona e vai até ela, antes que o faça. — Por favor, Freya. – Pede acomodando-se ao lado dela, as mãos segurando as da outra. — Tenho até a lua de sangue, ou vou perder alguém importante para mim. — Desculpe, é mais complicado do que pensa, Noah. Somente a bruxa que fez o feitiço pode quebra-lo. Não posso ajudar. – A morena completa livrando-se dos dedos do mortal e colocando-se de pé. Me distraio da cena quando Terence para ao meu lado sem avisar. Olho para cima e ele se inclina para sussurrar algo em meu ouvido. — É perda de tempo. – A respiração faz cócegas na bochecha e envia um arrepio tronco abaixo. — E o que sugere? – Retruco irritadiça com a voz mais baixa que consigo. O flagro sorrindo pelo canto do olho e sinto seu toque em minhas costas, quando passa por
— Ótimo! – Freya bate uma palma e as chamas das velas e o fogo crescem, esquentando ainda mais o ambiente. — Aparentemente meu ritual de lua de sangue sofrerá certas mudanças inesperadas. Então, um de vocês seja gentil e nos traga algo para o almoço.— Freya. – Entrelaço os dedos uns nos outros, contendo a ansiedade. — Tem mais uma coisa que precisa saber. – Busco pelo dourado das irizes do feérico e as encontro um tanto apreensivas. Meneio em um sim com o queixo e ele anda até a mesa de jantar, onde todos nos reunimos em pé para analisar o mapa das chaves se abrindo magicamente. — Esse mapa mostra outros objetos com o mesmo poder do que o que está na caixa. Duvessa tem um deles, nós estamos com dois em mãos, teoricamente.— Porém? – Ela ergue uma das sobrancelhas negras, cheias e bem delineadas.<
Noah A porta se fecha e me arrepio com o simples pensamento de ficar sozinho com a bruxa, enquanto Amara se afasta com o feérico detestável. Posso sim, estar confuso em relação a como me sinto com toda essa situação, mas meus sentimos por ele são verdadeiros. O detesto mais que tudo e algo me diz, que é mutuo. Não confio nada em Terence. Afinal, por que confiaria? — Ela ficará bem, não se preocupe. – Freya para às minhas costas. Meu corpo reage ao susto e percebo o tanto silenciosa que ela é. Como um gato com passos leves e quietos e respiração lenta e baixa. Mal a ouvi chegar perto de mim e se quisesse me matar, já estaria morto a essa altura. Ao menos, esse pensamento me tranquiliza. O resto deles, grita em meio a uma guerra dentro da cabeça, lutando para serem ouvidos e refletidos. — Como você sabe? – Pergunto olhando em seus olhos amendoados e serenos, totalmente contraditório com a tensão dos ombros estreitos. —
— Eu não posso morrer, tolinho. – A bruxa arregaça as mangas da blusa preta e revela pequenos símbolos dourados como cicatrizes quase invisíveis em sua pele morena. As formas rodeiam seus punhos como uma algema. Ela espera que eu os veja com clareza e os cobre novamente. Seus olhos brilham como carvão agora, escurecidos pelas chamas das velas e da cortina de fios castanhos caindo ao redor das bochechas ressaltadas até os largos quadris.— O que significam? Os símbolos? – Quero saber mesmo temendo que a resposta seja ruim como a expressão em seu rosto.— Eles significam muitas coisas. – A voz de Freya é embargada em dor, mágoa e raiva e seus olhos estão distantes, vagando no passado. Com um piscar dos cílios longos que sombreiam as maçãs do rosto ela retorna e começa a equilibrar as coisas que juntara em seus braços. —