Quando estava prestes a sair, o celular vibrou sobre a mesa. Pegou o telefone sem muita expectativa, mas seu coração disparou ao ver o nome na tela.
Era uma mensagem de seu pai. Franziu a testa. Mensagens do pai eram raras, especialmente àquela hora. Ao abrir a notificação, as palavras na tela a fizeram congelar no lugar. "Mariana, eles me encontraram. Estão ameaçando ir atrás de você se eu não pagar. Não posso perder você. Por favor, me ajuda!" Ela leu e releu a mensagem, o coração acelerando e a respiração ficando irregular. A realidade da ameaça pairava diante dela como uma nuvem densa. O que seu pai havia feito desta vez? As apostas? As dívidas? O desespero subiu à garganta, sufocando-a. Agora, o perigo não era apenas uma possibilidade distante; era iminente. Sem pensar muito, ela apanhou a bolsa e saiu do apartamento de Gabriel apressada, o som de seus saltos ecoando pelos corredores vazios. O ar da noite era fresco, mas ela mal sentia enquanto seu corpo inteiro era tomado por uma mistura de medo e urgência. "Por que ele fez isso de novo? Como vou resolver isso?" Pensamentos colidiam em sua mente, e ela sentia o peso das escolhas erradas de seu pai caindo sobre seus ombros. Ao chegar em casa, viu as luzes acesas. Um nó se formou em sua garganta enquanto abria a porta com cuidado, o coração batendo forte. — Pai? — chamou, sua voz um misto de preocupação e medo. Roberto estava sentado no sofá, a cabeça baixa, mãos entrelaçadas. Ele ergueu os olhos para Mariana, visivelmente abatido. O olhar de culpa era quase insuportável de se encarar. — Mariana... — começou ele, com a voz fraca, carregada de arrependimento. Mariana entrou na sala, sentindo a tensão aumentar a cada passo. — O que está acontecendo? — perguntou, tentando controlar o pânico em sua voz. — Quem são essas pessoas que estão atrás de mim? Roberto passou as mãos no rosto, exausto. — Eu fiz uma besteira, filha... — Ele suspirou, derrotado. — Me envolvi de novo com apostas, com gente perigosa... e agora eles querem o dinheiro que eu não tenho. Disseram que, se eu não pagar, vão atrás de você. Eu tentei resolver, juro que tentei, mas... Mariana ouviu as palavras como facadas. Ela sabia que o problema com apostas do pai nunca havia sido resolvido, mas isso... cinquenta mil reais? Como ela conseguiria resolver isso? — Cinquenta mil? — repetiu, incrédula. A cabeça de Mariana girava. As contas já estavam se acumulando, e o trabalho extra como cuidadora não cobriria nem de longe aquele valor. Mas o que mais a deixava paralisada era a ameaça direta à sua própria segurança. Ela respirou fundo, tentando encontrar alguma solução. — Eu vou tentar resolver isso, pai, mas você tem que prometer que isso nunca mais vai acontecer — disse, a voz firme, mas com o peso da responsabilidade visível em seus olhos. Roberto assentiu rapidamente, mas Mariana sabia que as promessas dele eram frágeis. Ele já havia feito promessas antes, e sempre as quebrava. Enquanto pensava em suas opções, Mariana pegou o celular novamente, rolando pelos contatos, mas sem encontrar ninguém a quem pudesse recorrer de imediato. Ela sabia que estava sozinha nessa. Ela se levantou, caminhando até a janela. O ar da noite parecia frio e distante, refletindo seu estado de espírito. Precisava de um plano, de uma solução, e rápido. Mas a única pessoa que poderia resolver isso era ela mesma. Deixando o celular de lado, Mariana sentou-se à mesa, o cansaço finalmente tomando conta do seu corpo. A noite anterior com Gabriel ainda pairava em sua mente, mas os eventos recentes a afastaram completamente desse momento. Ela precisava descansar, mas sabia que seu sono seria leve. O som do despertador tocou no dia seguinte, mas Mariana já estava acordada. A luz do sol filtrava pelas cortinas do quarto, mas a sensação de cansaço não havia desaparecido. Ela se levantou devagar, sentindo o peso do dia anterior ainda em seus ombros. Tinha o dia livre, mas isso não trazia alívio. Pelo contrário, seu dia seria preenchido com a tentativa de resolver o que fosse possível antes de seu plantão na casa de Matheus Vilela à noite. Mariana preparou um café simples, mas seu apetite estava fraco. Sentou-se na mesa da cozinha, encarando a xícara como se esperasse que ela trouxesse alguma solução mágica para seus problemas. Sabia que o trabalho de cuidadora não seria suficiente para cobrir a dívida, e ainda tinha que encontrar uma maneira de lidar com isso. Após terminar o café, ela decidiu organizar sua agenda e resolver o que pudesse durante o dia. Primeiro, tentou fazer algumas ligações, buscando uma saída para a dívida, mas as respostas não foram animadoras. Cada passo parecia uma tentativa inútil de escapar de uma situação que só piorava. E, apesar de tudo, ela sabia que, naquela noite, teria que se concentrar em Dona Elisa e deixar seus próprios problemas de lado por algumas horas. Às 18h, Mariana já estava pronta para seu plantão. Vestiu-se de forma prática e confortável, pegou a bolsa e olhou para o celular, esperando alguma resposta que não veio. Ela suspirou profundamente antes de sair de casa. Mais uma vez, estava sozinha na luta contra as consequências dos erros de seu pai. Mas ela não tinha escolha. Precisava seguir em frente, um passo de cada vez.Às 19h em ponto, Mariana tocou a campainha da mansão dos Vilela. As luzes externas iluminavam a fachada imponente, conferindo um ar ainda mais grandioso ao local. Embora já estivesse acostumada com a sofisticação daquela casa, sempre sentia um frio na barriga ao passar pela imensa porta de entrada.Dessa vez, foi Matheus quem a recebeu.— Boa noite, Mariana — disse ele, com um sorriso discreto, mas atencioso. — Minha mãe teve um dia tranquilo, mas as noites, como sempre, são mais agitadas.— Boa noite, Sr. Vilela. — Mariana sorriu, tentando manter o tom profissional. — Pode deixar que eu cuido dela.— Eu sei que sim — ele respondeu, observando-a por um breve momento, antes de gesticular para que ela entrasse.Mariana se dirigiu ao quarto de Dona Elisa, e Matheus a seguiu em silêncio. Ao chegarem, encontraram a idosa sentada na poltrona perto da janela, o olhar distante, mas sereno. Mariana começou a conversar com ela suavemente, preparando o ambiente para que a senhora se sentisse m
O relógio marcava 7h30 da manhã quando Mariana entrou no hospital. O ritmo frenético do bloco cirúrgico já era evidente. Médicos e enfermeiros andavam de um lado para o outro, cada um cumprindo suas funções com precisão. Ela sabia que seu turno seria longo, mas a intensidade do trabalho ali sempre a mantinha alerta.Após a troca de plantão, Mariana começou a revisar os prontuários dos pacientes. A cirurgia mais delicada do dia estava marcada para a sala 3 — remoção de um tumor cerebral. Sem perder tempo, ela começou a organizar o espaço, preparando tudo para a chegada do Dr. Gabriel Alencar, o neurocirurgião responsável pelo procedimento.Enquanto verificava os equipamentos, sentiu uma leve agitação na sala. Gabriel havia acabado de entrar. Mariana o percebeu imediatamente, mas não levantou o olhar. Ele caminhou com passos firmes até o centro da sala, passando instruções precisas à equipe. Sua voz era firme e segura, e ele parecia completamente focado no trabalho. Mas havia algo no
Mariana terminou de organizar os prontuários e deu uma rápida olhada no relógio. O plantão estava prestes a acabar, e a expectativa do evento à noite começava a crescer dentro dela.Gabriel ainda estava na sala de cirurgia, mas ela sentia que ele a observava de vez em quando, como se a tensão entre eles estivesse se acumulando a cada momento.Assim que a equipe começou a se dispersar, Mariana aproveitou para dar um último toque nos equipamentos. Gabriel saiu da sala, ainda com a máscara no rosto, e se dirigiu a ela.— Bom trabalho hoje — disse ele, com um tom neutro. — O paciente está estável.Mariana sorriu, satisfeita com o reconhecimento.— Obrigada, Dr. Alencar. Fiz minha parte, mas a equipe trabalhou bem em conjunto.Ele a observou por um momento, um leve aceno de aprovação surgindo.— É bom ouvir isso. Vamos continuar assim.Com isso, ele se despediu e saiu, deixando Mariana sozinha com seus pensamentos. Ela respirou fundo, tentando afastar os sentimentos confusos que ele desper
— Está acompanhando o Lucas, suponho? — disse Gabriel, com a voz baixa, mas firme, aproximando-se devagar. Mariana, surpresa com a presença dele ali, hesitou por um momento antes de responder. — Estou... mas não é como você está pensando — disse ela, tentando explicar. Gabriel a encarou, com um leve sorriso frio no canto dos lábios. — Eu não penso, Mariana. Eu só observo. A resposta dele a deixou sem palavras. Era típico de Gabriel não se envolver emocionalmente, apenas assistir de longe, sem revelar muito. Ele se aproximou um pouco mais, ficando perigosamente perto dela. — Você parece desconfortável — comentou ele, quase casualmente, mas sem desviar o olhar. Mariana sentiu o calor subir ao rosto. Havia algo na maneira como ele a observava, como se soubesse exatamente o que estava acontecendo, mas preferisse deixar as palavras não ditas. — Talvez — respondeu ela, tentando manter a compostura. Gabriel não disse mais nada. Ficou ali por alguns segundos, observando-a de
Mariana chegou à casa dos Vilela pontualmente às 19h. Ela gostava da rotina e da previsibilidade de cuidar de Dona Elisa, especialmente após os dias tumultuados no hospital. Era seu momento de paz e trabalho, algo que a mantinha focada. Ao atravessar o portão e entrar na mansão, sentiu o familiar ar de tranquilidade que o lugar proporcionava. Ao entrar pela porta da frente, notou de imediato Matheus e Gabriel sentados na sala de estar. A iluminação suave da sala dava um tom acolhedor, mas a presença de Gabriel a deixou levemente desconcertada. Ele estava ali, ao lado de Matheus, com uma postura relaxada, mas o olhar sério e atento de sempre. Mesmo fora do hospital, ele parecia carregar aquela aura de controle e distanciamento. Mariana respirou fundo, ajustando-se ao ambiente. Não esperava encontrar Gabriel ali, embora soubesse que os dois eram próximos. Caminhou em direção aos dois, mantendo uma postura educada e formal. — Boa noite, senhor Vilela, doutor Alencar — disse ela,
Mariana mal teve tempo de respirar após deixar a casa dos Vilela e já estava no hospital. O relógio ainda marcava 6h50, mas o ambiente já pulsava com o movimento típico da manhã. Ela trocou de roupa rapidamente, ajustou o cabelo e seguiu diretamente para a ala de cirurgias. O cansaço da noite anterior ainda estava em seu corpo, mas ela manteve o foco. Ao virar o corredor, Patrícia, sua supervisora, estava ali. Como sempre, com o olhar crítico de quem esperava encontrar algo fora do lugar. — Mariana, que bom que você chegou. Temos um dia cheio hoje, e espero que esteja preparada — disse Patrícia sem nem ao menos levantar o olhar das fichas que segurava. Mariana assentiu, mantendo a calma. — Claro, estou pronta. O que temos? Patrícia a encarou por um breve segundo, como se calculasse cada palavra. — Você vai ficar na sala 3. Dr. Gabriel Alencar tem uma cirurgia às 9h, mas quero que você revise todos os preparativos antes. Não podemos ter nenhum erro — falou Patrícia com um
Mariana mal notou o carro de Gabriel se aproximando até que ele parou ao seu lado. O vidro se abaixou lentamente, revelando sua expressão impassível.— Entra no carro — disse ele, sem rodeios.Mariana parou e o encarou por alguns segundos, processando a situação. Seus pensamentos estavam lentos, e ela sabia que parte disso era o cansaço extremo.— Não precisa, doutor. Eu... eu só vou pegar o ônibus e vou direto pra casa. Estou bem — respondeu ela, tentando manter um tom firme, embora fosse óbvio que estava exausta.Gabriel ergueu uma sobrancelha, o olhar penetrante como sempre.— Você está longe de estar bem, Mariana. Entra no carro. Não vou repetir.Havia algo no tom de voz dele que não deixava espaço para discussão. Era uma ordem, e ela sabia que discutir com ele não levaria a lugar algum.Ela suspirou fundo e cedeu, entrando no carro. Ele não disse mais nada enquanto ela colocava o cinto, apenas acelerou e seguiu pela rua.O silêncio entre eles era pesado, mas não desconfortável. G
Os trovões ribombavam, e a chuva batia com força contra as janelas. Mariana tentava se acalmar, mas o medo que sempre sentira de tempestades começava a se intensificar. Encolhida debaixo das cobertas, ela apertava os olhos, tentando ignorar os relâmpagos, mas a cada trovão, seu corpo tremia. O som da tempestade lá fora não parecia dar trégua, e logo ela percebeu que não conseguiria dormir. Tomando uma decisão impulsiva, Mariana saiu da cama, envolta em um cobertor, e foi em direção ao quarto de Gabriel. Estava hesitante, mas algo a empurrava para frente. Sabia que ele não era do tipo que oferecia conforto, mas a ideia de ficar sozinha naquela situação era insuportável. Parando à porta do quarto dele, ela bateu levemente. Por um momento, pensou em voltar, mas antes que pudesse decidir, ouviu a voz baixa e direta de Gabriel. — Entre. Mariana entrou devagar, ainda segurando o cobertor em volta do seu corpo. Gabriel estava sentado na cama, com o notebook no colo. Ele levantou os ol