Eu fungo, tentando conter o medo que se espalha pelo meu corpo.— Por que tá me tratando assim? Por que me trouxe desse jeito, como se eu fosse uma criminosa? — tento investir na minha falsa inocência.Ele se aproxima de mim, arfando. Seu corpo todo parece tenso, como se estivesse se segurando para não explodir.Até quando? Me pergunto.Ele ainda segura meu rosto. Sua respiração quente sopra as mechas do meu cabelo caídas sobre meu rosto.— Para com essa encenação. Esse rostinho de vítima não combina mais com você. Meu Deus, eu devia ser muito otário mesmo!— O que você tá dizendo?Ele me solta bruscamente, como se tivesse nojo de mim.— Cale a boca. Ronilson, traz a bolsa. — Ele urra.Meu coração dispara. Droga! Minha insígnia policial, meus documentos... Estão todos ali.Ronilson, um homem de estatura mediana e corpo forte, entra e lhe entrega a bolsa. Dante a abre e, em segundos, seus dedos encontram minha insígnia. Ele aperta o distintivo contra meu rosto, como se quisesse carimba
DanteEstou angustiado. Pela primeira vez na vida, não sei o que fazer. E essa incerteza me irrita.Encaro Ronilson e Leleco, que me olham como se esperassem uma ordem definitiva, uma sentença de morte, talvez. Eles querem que eu resolva essa merda do jeito que sempre resolvo. Com frieza. Com eficiência. Mas não posso. Não agora.— Ronilson, entra lá e leva um copo d’água pra ela. E você, Leleco, pega o carro e vai na cidade comprar uns mantimentos. Vou te passar uma lista. Aproveita e compra umas roupas pra ela também, pelo menos uma muda de cada e uma camisola.— Dante, na moral, tu não pode manter essa mulher aqui. Resolve logo essa parada. Tu só precisa dar a ordem. Que porra tá acontecendo contigo? — Leleco retruca, inconformado.Respiro fundo, forçando minha expressão a permanecer inabalável. Mas por dentro, um furacão me devasta.— Que porra está acontecendo comigo? — repito, minha voz saindo como um trovão abafado. — Eu preciso de um tempo. Só isso. Não quero agir de qualquer
IsabelaOlho para fora pelos vidros sujos da janela gradeada do quarto. A sensação de impotência me sufoca. Estou em um lugar afastado, cercado por mata e silêncio.A casa em si não é ruim. Para um esconderijo no meio do nada, até que é bem estruturada. Tem cheiro de lugar fechado, mas está claro que é usada de vez em quando. Os lençóis da cama estão limpos, o banheiro organizado, o chão sem poeira. Isso me diz que alguém preparou tudo para minha chegada.Ouço a porta rangendo ao se abrir. Meu corpo enrijece, e me viro devagar. Dante entra segurando alguns pacotes.— Trouxe umas roupas pra você — diz, jogando os pacotes na cama.Minha respiração se acelera.— O que você quer com isso? — minha voz sai cortante, carregada de medo. — Me mantendo presa desse jeito… você sabe onde isso vai dar, né? No final, vai acabar me matando.Os músculos da mandíbula dele se contraem.— Não quero que pense nisso — responde, num tom duro.Seco uma lágrima com raiva e disparo:— Como não pensar?A facha
Eu me afasto da janela, sentindo um peso inexplicável apertando meu peito. A frustração é uma constante, como um nó que não consigo desfazer. O calor me incomoda, e a exaustão me invade. O banheiro tem chave, e isso é o que me dá coragem para tomar um banho e tentar descansar.Levo tudo para o banheiro, organizo as coisas no balcão e volto para o quarto para pegar uma camisola. Ela é grande, de flanela, e me traz um alívio silencioso. Coloco a calcinha, pego a toalha e vou para o banheiro. Tranco a porta com a chave, como se pudesse, com esse simples gesto, afastar um pouco de tudo o que me sufoca.Tiro as roupas que já estão coladas no meu corpo suado e me deixo envolver pelo jato forte da água. O calor se dissipa dos meus ombros tensos, mas a tensão interna permanece. Fecho os olhos e uma tristeza profunda toma conta de mim. A lembrança do último banho que tomei em minha casa me bate como uma onda. Ali, eu sentia segurança. Agora? Agora sou uma peça dentro de um jogo que não posso c
IsabelaA noite passou de forma estranha. Apesar de tudo, dormi como uma pedra, como se meu corpo, exausto pelo estresse e pela tensão, tivesse se rendido por completo ao cansaço.Levanto-me antes do amanhecer, os primeiros raios de sol ainda tímidos no horizonte. O silêncio ao redor é inquietante, e cada pequeno ruído soa mais alto do que deveria.Vou até o banheiro e me troco, vestindo o vestido de algodão branco que ele comprou para mim. O tecido é leve e macio contra minha pele, mas a sensação de usá-lo me incomoda. Parece uma lembrança constante de que não estou no controle aqui.Olho para os tênis ao lado da cama, mas decido não calçá-los. Não há motivo. Não vou sair. Para quê me dar ao trabalho?Caminho até a janela e me apoio nas grades de metal que cercam o pequeno espaço. Elas estão ali, como uma parede invisível entre mim e a liberdade, me lembrando a cada segundo de onde estou e da realidade que me aprisiona. O sol começa a nascer lentamente no horizonte, lançando seus pri
IsabelaInfelizmente, não consegui ouvir mais nada. O barulho do carro ligando e depois sumindo abafou as últimas palavras de Dante ao telefone. E então, o silêncio.Ando de um lado para o outro no quarto, inquieta. Meu corpo está tenso, como se meus músculos estivessem travados numa constante prontidão para a fuga. Fecho os olhos e respiro fundo várias vezes, tentando domar o caos dentro de mim. Mas não adianta. Eu ainda estou aqui. Ainda sou prisioneira de um homem que não deveria me afetar.Minutos depois, o cheiro de café fresco se espalha pela casa, mas em vez de conforto, ele traz uma estranha antecipação. Não demora muito para o som da chave girando na fechadura se fazer presente. Meu coração salta uma batida quando Dante entra.Ele está diferente. Não é só a calça jeans e a camiseta branca que tornam sua presença mais marcante. A barba mais aparada, os cabelos ainda úmidos do banho… Mas o que realmente me paralisa é a expressão em seu rosto. Há cansaço. Algo sombrio. Algo que
— Para com isso, Leandro! Se eu estou dizendo que estou bem, estou bem. Não se preocupem comigo. Agora vou desligar, meu pai está me chamando.Antes que minha voz me traia, encerro a chamada.—Está feliz agora? —Eu pergunto para ele, com raiva.Dante retira os aparelhos da minha mão devagar, mas firme. Seus dedos tocam minha pele por um instante a mais do que o necessário antes de retirar o chip dos dois celulares, quebrá-los e esmagar os aparelhos com o pé.Seus olhos, então, se voltam para mim, me analisando, absorvendo cada detalhe da minha expressão.— "Meu amor?" — Ele repete as palavras de Leandro, sua voz carregada de sarcasmo e algo mais profundo, algo que ele não quer admitir. — Então é assim que ele te chama?Eu abro a boca para responder, mas Dante avança, me encurralando contra a parede antes que eu possa dizer qualquer coisa. Ele está perto, perto demais. Seu corpo exala calor, e seu cheiro amadeirado, misturado com o frescor do banho, invade meus sentidos, me deixando to
LeandroO silêncio na sala pesa como uma sombra espessa, sufocante. Seguro o telefone com força, meus dedos cravando no aparelho. O que acabei de ouvir... não faz sentido. Não parece certo.— Ela ligou. — Minha voz sai firme, mas dentro de mim, há um caos furioso.Carlos ergue os olhos do tablet, interessado.— O quê? Isabela?Assinto, mas não me sinto aliviado. Meu coração bate forte, e não de um jeito bom.— Sim. Disse que está na fazenda do pai. Que precisa de um tempo.Carlos solta um suspiro, recostando-se na cadeira.— Então pronto. Ela está bem.Meu maxilar trava.— Não, não está.Ele franze a testa.— Como assim? O que ela disse exatamente?Cruzo os braços, tentando organizar os pensamentos, mas está tudo embaralhado. A voz dela. O tom. O jeito apático.— Ela falou que precisava de um tempo, que estava segura… mas a voz dela, Carlos. Não parecia a Isabela.Ele me observa com atenção, mas ainda não parece convencido.— Talvez ela só esteja cansada. Você sabe, depois de tudo…Ba