Ela

Ela caminhava ao meu lado, seus cabelos escuros esvoaçando ao vento, como ela é linda. Usava apenas uma túnica de seda branca, que lhe descia pelas curvas tornando-a ainda mais bonita, se é que isso é possivel...

- Acorda Kaue.

- Nossa é incrível como toda vez que eu estou tendo um sonho bom você me acorda!

- Estava sonhando com ela não é?

- Para de falar besteira, menina.

- Não mente pra mim, se tem vergonha por que me contou sobre os sonhos?

- Nem eu sei.

- Mas contou, agora diga, estava sonhando com ela ou não?

- Você me conhece melhor que eu mesmo não é?

Irai só arqueou as sobrancelhas.

-Sim, eu estava sonhando com ela e você me atrapalhou de novo!

- Você quem me pediu pra te chamar, e tem mais, a neta da Ceci chega hoje.

-Imagino que deve ser insuportável. Ai, tomar banho no rio, cadê a luz elétrica? - Disse fazendo trejeitos.

Me levantei a contragosto e fui me lavar. Tinha trabalho a fazer.

Eu estava ajudando os outros a carregar os sacos com terra, que usaríamos para cercar a aldeia quando ela chegou . Não consegui parar de olhar para ela durante um bom tempo, até que ela desviou o olhar. Larguei o que estava fazendo e sai dali, não podia acreditar, era ela a Índia dos meus sonhos, ela existia.

Entrei como um lobo na oca, minha irmã estava lá e só se aproximou porque eu chamei.

- O que houve?

- É ela, Irai, a neta da Ceci...é ela.

- Não estou entendendo nada. Ela quem?

- A india que eu sonho.

- Deve ser impressão sua. Deve ser parecida.

- NÃO! É ela.

- Deve ser porque eu te acordei quando você estava sonhando...

- NÃO! Já disse, é ela.

- Vai lá e veja com seus próprios olhos se não é a mesma dos meus desenhos.

Nem precisou Irai sair, pois mal fechei a boca e ela entrou com sua avó.

- Vamos viver todos juntos aqui? - Perguntou.

-Sim, aquela é sua rede e essa aqui é do Antony.

-Ai meu Deus!

Todos olharam para ela e ela ficou vermelha como uma ameixa.

Pouco depois de se acomodar e guardar suas coisas num cesto ela saiu, como se fugisse de um leopardo. Alguns dias depois eu já não conseguia controlar minha vontade de falar com ela e pedi ajuda para minha irmã.

- Eu vou te ajudar, ela vai sempre na cachoeira, perto da colina.

- E você quer o que? Que eu chegue lá e diga: Então é que eu sonho com você desde criança e estou apaixonado.

- Não, claro que não. Não sei o que você faria sem mim.

- É...nem eu. - Disse revirando os olhos.

- Eu vou com você, chego na frente puxo conversa e após algum tempo você me chama. Eu chamo ela pra ir conosco.

- Pode ser.

-Então vamos, ela já saiu.

Caminhamos pela mata em silêncio, paramos a uma certa distância dela, que agora eu sabia se chamar Marina, minha irmã seguiu e eu fiquei observando e esperando a hora certa. Minha irmã conversou com ela por alguns minutos e então eu comecei a me aproximar.

- IRAI! IRAI! - Gritei.

Ambas desceram pela rocha e caminhamos pela floresta, mas quando chegamos a uma bifurcação, onde um tronco atrapalhava a passagem, eu e Irai pulamos, eu só ouvi o barulho . Não me aguentei e comecei a rir, mas qual não foi o susto que levei ao vê - la sangrando. Peguei ela no colo mesmo contra sua vontade e levei até a oca, onde meu pai cuidou dela com unguentos de ervas e imobilizou a sua perna. Ela acordou horas depois, meu pai insistiu para que eu saisse, mas eu disse que não. Fiquei ao lado dela o tempo todo, meu pai não permitiu que seu irmão ou sua avó entrassem. Ela se recuperou rapidamente, mas teimosa que é, não quis ficar guardando leito e saiu para a mata, foi até a queda d'agua onde gosta de ficar sempre, ela parece querer fugir do nosso mundo, mas não sabe como pode ser impressionante fazer parte dele. Eu fui atrás dela, só para garantir que não se machucaria de novo.

Não sei o que houve comigo, não pude me segurar, justo eu que sempre fui tão centrado, agora me deixava levar facilmente assim? Dei-lhe um beijo e fiquei surpreso ao ser correspondido, ela gosta de mim, tanto quanto eu dela. Não tivemos tempo para nos arrepender, pois ouvimos um barulho e fomos atrás para descobrir do que se tratava. Os madeireiros discutiam a respeito de alguém, Marina notou que se tratava de meu pai, porque alguém iria querer matar um homem só por causa de árvores? Só podem ser malucos. Marina me disse que isso envolve muito dinheiro, mas eu não consigo entender como para alguns o dinheiro é mais importante que a vida. A floresta tem vida, os espíritos dos nossos ancestrais vivem ali, seus corpos estão enterrados ali. Não vamos permitir que eles destruam o nosso lar. Não tivemos notícias dos lenhadores, ou madeireiros como Marina diz, ela disse que lenhadores cortam pouca madeira, os madeireiros que destroem as florestas. Ela até é bem esperta para quem veio da cidade.Na cidade eles não sabem aproveitar as coisas boas, só vivem correndo com o trabalho que não acaba nunca.vMarina é diferente, parece que ela realmente faz parte daqui.

- Vamos enganá-los Kaue.

- Como poderemos?

- Você não disse que a floresta tem vida?

- Sim.

- Vamos dar "mais"vida a ela.

- Oi? - Disse confuso.

- Vamos assustar eles, fazer com que pensem que há fantasmas na floresta.

- Não são fantasmas, são espíritos e devemos respeitar.

- Sim, mas primeiro, para eles são fantasmas e provavelmente eles tem medo e segundo, não poderemos respeitar os espíritos se eles ficarem sem lar.

- É, faz sentido.

-Então. Pronto?

- Sim. Ela veio na minha direção, havia uma pedra e ela tropeçou, parecia que a floresta estava sempre colocando ela perto de mim, porque ela caiu nos meus braços. A proximidade era grande, os olhos de Marina estavam fixados nos meus, nossos lábios a centímetros de distância. Não pude suportar, foi mais forte do que eu e a beijei novamente, só que ao contrário da outra vez, ela não correspondeu, me empurrou e gritou comigo.

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