O vento frio carregava o cheiro de terra úmida e madeira queimada, misturando-se ao silêncio pesado que pairava sobre o campo sagrado.Fileiras de tochas iluminavam a clareira onde a cerimônia aconteceria, o brilho trêmulo dançando sobre os rostos abatidos daqueles que vieram prestar suas últimas homenagens.Os corpos estavam alinhados lado a lado, cobertos com mantos cerimoniais. Guerreiros, irmãos, amigos. E, entre eles, Ethan.Ivy observava em silêncio, os braços cruzados sobre o peito, como se isso pudesse conter a tempestade que se agitava dentro dela. Seu olhar passeava pelos corpos, mas sempre voltava para um só. Ethan. Ali, entre os guerreiros caídos. A ironia queimava dentro dela. Ele, que passou a vida inteira fugindo dos lobos daquela alcateia, agora descansava entre eles, entre aqueles que ele foi ensinado a odiar.“Você odiaria isso, Ethan.”Seus dedos apertaram-se em punhos.“Mas não foi você quem escolheu esse destino, não é?”A multidão se expandia a cada minuto, memb
A tensão era sufocante enquanto Ivy encarava daquele homem para Lucian, o coração completamente acelerado. Até que, lentamente, o homem recuou, os ombros tremendo com um soluço de raiva e dor.Ivy respirou fundo, sentindo o peso daquele momento. Seus olhos encontraram os de Lucian. Havia algo ali. Algo feroz, algo que queimava como brasas sob a pele.E então ela percebeu.Não importava quem a culpasse. Não importava o que Alaric soubesse. Lucian estava ali. E ele não deixaria que nada a atingisse.E isso foi confirmado porque logo após aquela cena, a cerimônia prosseguiu sem mais interrupções. Embora o ataque a Ivy tenha deixado um clima tenso no ar, ninguém ousou desafiá-la novamente depois da ameaça de Lucian.Aliás, o luto pairava sobre todos, enquanto as tochas tremulavam ao vento e os cânticos da alcateia ecoavam pela floresta.Ivy permaneceu em silêncio durante todo o ritual, seus olhos presos ao corpo de Ethan, agora coberto pelo manto cerimonial.Depois que as chamas consumira
Ivy abriu a boca, mas nenhuma palavra saiu. Seu peito subia e descia rapidamente, como se seu corpo tivesse esquecido como respirar.Lucian a observava, imóvel, a expressão ilegível.— Você está livre. — Ele repetiu, mais baixo dessa vez.Ivy engoliu em seco.Quando Lucian disse aquelas palavras, Ivy sentiu como se o chão tivesse sumido sob seus pés. Ela esperou tanto por esse momento. Durante noites sem fim, imaginou sua liberdade, sonhou com o dia em que poderia simplesmente partir.Mas agora que a oportunidade estava diante dela, tudo que sentia era um vazio esmagador.Ela afastou-se da cama de repente, como se estivesse fugindo de algo que não conseguia nomear.— Você está brincando comigo?Lucian arqueou uma sobrancelha, estudando-a com aquela expressão calma e irritante.— Eu pareço estar brincando?Ivy sentiu a raiva borbulhar em sua pele.— O que aconteceu com o acordo? — Ela perguntou, cruzando os braços como se aquilo pudesse protegê-la da confusão dentro de si.. — Você me t
Ivy continuava imóvel, os olhos fixos na porta entreaberta. Seu coração martelava no peito, a respiração curta, descompassada.Ela deveria ir embora. Esse sempre foi o plano. Então por que não conseguia se mover?As palavras de Lucian ainda ecoavam em sua mente. Se for ficar… é porque quer.Um arrepio percorreu sua espinha, e antes que pudesse se conter, seus pés tocaram o chão frio. Como se movidos por uma força que ela se recusava a nomear, a levaram até a porta.Ela parou no batente, hesitante. O corredor estava mergulhado na penumbra, iluminado apenas pela luz fraca que vinha de algum cômodo distante.Lucian estava ali. Ela sabia.E então, o viu.Ele estava encostado na parede, um pouco à frente, de costas para ela. O terno impecável, a postura rígida, os dedos passando lentamente pelo maxilar, como se tentasse conter algo.Por um instante, Ivy pensou em recuar. Fechar a porta. Fingir que nunca havia se levantado.Mas já era tarde.Lucian virou o rosto, o olhar sombrio encontrando
Capítulo 68Grace soltou um suspiro dramático e lançou um olhar divertido para Ivy.— Bom, mas já está tarde. Acho que é melhor deixarmos essa conversa para amanhã. — Ela sorriu como se tudo estivesse sob controle, e talvez estivesse.Ivy, exausta demais para discutir, apenas assentiu. Seu corpo doía com o peso do dia, sua mente já nublada pela exaustão.— Ótimo — murmurou, desviando o olhar de Grace e de Lucian. — Eu vou para o meu quarto.Ela se virou, sentindo o olhar de ambos queimando em suas costas. Ao passar pelo corredor em direção ao quarto, captou fragmentos de uma conversa sussurrada.— Você tem certeza? — A voz de Grace era baixa, mas carregava um tom enigmático.— Acha mesmo que eu tenho mais controle de algo? — Lucian respondeu, seco.Ivy poderia ter parado para ouvir mais, poderia ter tentado entender, mas naquele momento, tudo o que queria era distância de mais uma confusão.Suspirando, empurrou a porta do quarto e a fechou atrás de si.O silêncio a envolveu, mas sua
O silêncio que pairava no salão era sufocante, mas dentro de Ivy, tudo gritava. Seu coração batia forte, a cabeça girava com a revelação.— Amanhã? — Sua voz saiu embargada, mas logo se firmou. — Por que tem que ser tão rápido?Ela olhou ao redor, buscando respostas nos rostos ao seu redor. Nenhum dos anciões desviou o olhar.Foi um deles, um homem de cabelos grisalhos e olhar severo, quem respondeu:— Ouvimos rumores de uma revolta ainda maior.Ivy franziu a testa, sentindo um arrepio na espinha.— Maior?O homem assentiu.— A morte de Ethan despertou uma raiva que não podemos conter por muito tempo. Muitos acreditam que essa foi a gota d’água. E se não fizermos algo rápido, perderemos o controle.Ivy sentiu o estômago revirar ao ouvir o nome de Ethan.— E acham que esse casamento vai mudar alguma coisa?Dessa vez, foi Grace quem respondeu:— Esse casamento precisa ser grande e público. Deve ser um símbolo.— Um símbolo de quê? — Ivy questionou, a voz levemente trêmula.— De unidade.
Por um instante, o mundo inteiro pareceu se dissolver ao redor de Ivy. Tudo que restava era a respiração quente de Lucian contra sua pele, os olhos dele perfurando os seus, e aquela confissão que ainda pairava entre eles como um fio prestes a se romper.Ela podia sentir o próprio coração martelando no peito, como se quisesse pular para fora. Sua mente gritava para se afastar, mas seu corpo hesitou. Havia algo na maneira como Lucian a olhava, como se ela fosse a única coisa que ainda o mantinha de pé.Seus dedos tremeram ao lado do corpo, e por um breve segundo, Ivy sentiu a tentação de se inclinar, de ceder, de ver até onde aquele momento poderia levá-los.Mas então...— Ivy!A voz de Grace rompeu o ar como um estalo, arrancando Ivy daquele transe perigoso. Ela se afastou de Lucian num reflexo, sentindo seu coração ainda pulsar contra as costelas.Lucian permaneceu imóvel, seus olhos ainda fixos nela, como se pudesse ver algo que nem mesmo ela entendia. Mas não houve tempo para nada m
O silêncio era quase absoluto, quebrado apenas pelo som da respiração irregular de Ivy.Lucian segurava seu corpo frágil com um cuidado incomum, os músculos rígidos como se qualquer movimento brusco pudesse quebrá-la. Ele a deitou sobre a cama lentamente, mantendo os olhos fixos em seu rosto pálido.— Ivy... — ele chamou, a voz carregada de algo que parecia preocupação genuína.Ela piscou algumas vezes, tentando focar a visão. A vertigem ainda pesava sobre seus sentidos, como um resquício da tempestade que tomara sua mente momentos antes.Lucian deslizou a mão por seu rosto, afastando uma mecha de cabelo grudada à sua pele suada. Seus olhos analisavam cada detalhe, cada respiração superficial, cada tremor em seu corpo.— O que aconteceu com você?A pergunta veio baixa, quase um murmúrio, mas carregada de intensidade.Ivy queria responder, mas como? Como explicar algo que nem ela mesma entendia?Ela engoliu em seco, ainda sentindo o eco daquelas palavras em sua cabeça. Ele não pode ter