Ivy não dormiu o resto da noite. O frio parecia ter se infiltrado em sua pele, mas não era apenas por causa do vento que soprava pelas frestas das janelas. Era algo mais profundo, algo que vinha de dentro. Ela não sabia explicar por que aquela cena a afetava tanto—Grace e Lucian, juntos, naquela troca silenciosa de conforto. Mas a verdade era que doía. Porque Ivy nunca tinha visto Lucian daquele jeito. Ele não era apenas um soldado vitorioso, um inimigo perigoso ou um aliado imprevisível. Naquela noite, ele parecia apenas um homem. Um homem que acabara de perder alguém. A manhã chegou antes que ela percebesse, e Ivy se forçou a se levantar. Ao mansão ainda estava mergulhado em silêncio, como se o peso da guerra tivesse deixado suas marcas até mesmo nas paredes. Ela desceu as escadas devagar, o coração apertado. Não esperava encontrar Lucian tão cedo, mas lá estava ele. Sozinho, sentado à mesa do salão principal, girando entre os dedos um pequeno copo com algum líquido escuro.
O mundo girava ao redor de Ivy, mas ela não conseguia sentir nada além da dor cortante que tomava seu peito. Seus pés moviam-se sozinhos, impulsionados pelo desespero. A respiração era curta, entrecortada, como se a qualquer momento o ar fosse lhe faltar. As torres de pedra da fortaleza pareciam mais sombrias do que nunca quando ela se aproximou da entrada das masmorras. A madeira pesada do portão estava entreaberta, e ali, parado como uma sombra na escuridão, estava Lucian.O olhar dele encontrou o dela no instante em que Ivy parou diante da porta. — O que você está fazendo aqui?— A voz de Lucian era firme, mas havia algo estranho nela. Algo denso, contido. — Onde está Ethan? — O coração dela batia tão rápido que doía. — O que aconteceu? Eu preciso ver meu irmão!Lucian não respondeu de imediato. Seus olhos estavam sombrios, pesados de algo que Ivy não conseguia decifrar.O silêncio foi pior do que qualquer palavra. Ela não esperou por uma explicação. Passou por ele, ignoran
A dor era um buraco negro dentro de Ivy, sugando tudo ao redor, deixando apenas um vazio sufocante. Seu corpo estava ali, ajoelhado ao lado de Ethan, mas sua mente se recusava a aceitar.As mãos trêmulas acariciavam os cabelos dele, como se aquele gesto pudesse trazê-lo de volta. Seus dedos apertavam sua pele fria, tentando arrancá-lo da escuridão para onde havia ido.— Por favor… — sua voz era um sussurro quebrado. — Volta pra mim…Seu olhar vagou pelo rosto do irmão, buscando algo que ainda estivesse ali. Alguma centelha de vida. Mas não havia nada. O leve franzir das sobrancelhas que ele fazia quando estava confuso. A curva sutil do sorriso torto que ela conhecia tão bem. Nada. Apenas a quietude vazia de alguém que já não pertencia àquele mundo.As mãos dela tremiam quando deslizaram sobre os dedos dele, frios e levemente fechados, como se ainda tentassem segurar algo que havia escapado. A dor bateu com força total, deixando-a sem ar.A cela era pequena, sufocante, mas Ivy sentia c
O vento frio carregava o cheiro de terra úmida e madeira queimada, misturando-se ao silêncio pesado que pairava sobre o campo sagrado.Fileiras de tochas iluminavam a clareira onde a cerimônia aconteceria, o brilho trêmulo dançando sobre os rostos abatidos daqueles que vieram prestar suas últimas homenagens.Os corpos estavam alinhados lado a lado, cobertos com mantos cerimoniais. Guerreiros, irmãos, amigos. E, entre eles, Ethan.Ivy observava em silêncio, os braços cruzados sobre o peito, como se isso pudesse conter a tempestade que se agitava dentro dela. Seu olhar passeava pelos corpos, mas sempre voltava para um só. Ethan. Ali, entre os guerreiros caídos. A ironia queimava dentro dela. Ele, que passou a vida inteira fugindo dos lobos daquela alcateia, agora descansava entre eles, entre aqueles que ele foi ensinado a odiar.“Você odiaria isso, Ethan.”Seus dedos apertaram-se em punhos.“Mas não foi você quem escolheu esse destino, não é?”A multidão se expandia a cada minuto, memb
A tensão era sufocante enquanto Ivy encarava daquele homem para Lucian, o coração completamente acelerado. Até que, lentamente, o homem recuou, os ombros tremendo com um soluço de raiva e dor.Ivy respirou fundo, sentindo o peso daquele momento. Seus olhos encontraram os de Lucian. Havia algo ali. Algo feroz, algo que queimava como brasas sob a pele.E então ela percebeu.Não importava quem a culpasse. Não importava o que Alaric soubesse. Lucian estava ali. E ele não deixaria que nada a atingisse.E isso foi confirmado porque logo após aquela cena, a cerimônia prosseguiu sem mais interrupções. Embora o ataque a Ivy tenha deixado um clima tenso no ar, ninguém ousou desafiá-la novamente depois da ameaça de Lucian.Aliás, o luto pairava sobre todos, enquanto as tochas tremulavam ao vento e os cânticos da alcateia ecoavam pela floresta.Ivy permaneceu em silêncio durante todo o ritual, seus olhos presos ao corpo de Ethan, agora coberto pelo manto cerimonial.Depois que as chamas consumira
Ivy abriu a boca, mas nenhuma palavra saiu. Seu peito subia e descia rapidamente, como se seu corpo tivesse esquecido como respirar.Lucian a observava, imóvel, a expressão ilegível.— Você está livre. — Ele repetiu, mais baixo dessa vez.Ivy engoliu em seco.Quando Lucian disse aquelas palavras, Ivy sentiu como se o chão tivesse sumido sob seus pés. Ela esperou tanto por esse momento. Durante noites sem fim, imaginou sua liberdade, sonhou com o dia em que poderia simplesmente partir.Mas agora que a oportunidade estava diante dela, tudo que sentia era um vazio esmagador.Ela afastou-se da cama de repente, como se estivesse fugindo de algo que não conseguia nomear.— Você está brincando comigo?Lucian arqueou uma sobrancelha, estudando-a com aquela expressão calma e irritante.— Eu pareço estar brincando?Ivy sentiu a raiva borbulhar em sua pele.— O que aconteceu com o acordo? — Ela perguntou, cruzando os braços como se aquilo pudesse protegê-la da confusão dentro de si.. — Você me t
Ivy continuava imóvel, os olhos fixos na porta entreaberta. Seu coração martelava no peito, a respiração curta, descompassada.Ela deveria ir embora. Esse sempre foi o plano. Então por que não conseguia se mover?As palavras de Lucian ainda ecoavam em sua mente. Se for ficar… é porque quer.Um arrepio percorreu sua espinha, e antes que pudesse se conter, seus pés tocaram o chão frio. Como se movidos por uma força que ela se recusava a nomear, a levaram até a porta.Ela parou no batente, hesitante. O corredor estava mergulhado na penumbra, iluminado apenas pela luz fraca que vinha de algum cômodo distante.Lucian estava ali. Ela sabia.E então, o viu.Ele estava encostado na parede, um pouco à frente, de costas para ela. O terno impecável, a postura rígida, os dedos passando lentamente pelo maxilar, como se tentasse conter algo.Por um instante, Ivy pensou em recuar. Fechar a porta. Fingir que nunca havia se levantado.Mas já era tarde.Lucian virou o rosto, o olhar sombrio encontrando
Capítulo 68Grace soltou um suspiro dramático e lançou um olhar divertido para Ivy.— Bom, mas já está tarde. Acho que é melhor deixarmos essa conversa para amanhã. — Ela sorriu como se tudo estivesse sob controle, e talvez estivesse.Ivy, exausta demais para discutir, apenas assentiu. Seu corpo doía com o peso do dia, sua mente já nublada pela exaustão.— Ótimo — murmurou, desviando o olhar de Grace e de Lucian. — Eu vou para o meu quarto.Ela se virou, sentindo o olhar de ambos queimando em suas costas. Ao passar pelo corredor em direção ao quarto, captou fragmentos de uma conversa sussurrada.— Você tem certeza? — A voz de Grace era baixa, mas carregava um tom enigmático.— Acha mesmo que eu tenho mais controle de algo? — Lucian respondeu, seco.Ivy poderia ter parado para ouvir mais, poderia ter tentado entender, mas naquele momento, tudo o que queria era distância de mais uma confusão.Suspirando, empurrou a porta do quarto e a fechou atrás de si.O silêncio a envolveu, mas sua