POV: Elara
Eu já estava farta de tudo aquilo. Enfurecida, saí do quarto e fui correndo para Draven, que caminhava tranquilamente apesar de nossa discussão tensa segundos atrás: — O que são essas marcas? — perguntei, segurando meu próprio pulso com força. Draven ficou em silêncio por um longo momento. — Responda! Estou aqui como sua refém, apesar de você insistir que não é o caso, mas eu quase morri há pouco tempo atrás e agora ISSO apareceu! Como se algum feitiço houvesse sido recitado, as marcas começaram a desbotar e desvanecer. Minha pele agora estava lisa novamente. Arfei e encarei minhas duas mãos, apenas para confirmar que realmente tinham desaparecido. — Você não deveria tê-las ainda. Minhas sobrancelhas se uniram em uma expressão de pura frustração. — Isso não responde minha pergunta! — Dei um passo à frente. — Você disse aos outros dragões que eu fazia parte de uma profecia. E até agora não me explicou nada sobre isso. Exijo que me responda! Não havia diversão em seus olhos quando o Rei finalmente me respondeu: — A verdade pode ser um fardo pesado demais, Elara. Era a primeira vez que ele dizia o meu nome. Apesar de tudo, amei o som que saiu de sua garganta ao pronunciá-lo… Antes que minha expressão facial vacilasse, refutei: — Engraçado, porque o peso da ignorância já está me esmagando! O músculo em seu maxilar se contraiu, e percebi que ele estava segurando sua própria irritação. — Então tudo bem. Mas esteja ciente de que, uma vez que eu começar, não há como voltar atrás. Engoli em seco, mas mantive a postura. — Eu não quero voltar atrás. Draven me avaliou por um instante, como se estivesse considerando se deveria mesmo me contar. Então, ele soltou outro suspiro, passando uma das mãos pelos cabelos escuros. — Venha comigo. Mais uma vez, me senti oprimida entre as paredes do palácio do rei Dracônico. Alguns dos olhares dos passantes havia mudado; era mais curiosidade que julgamento. Claro que ainda tinha aqueles que só faltavam me devorar de tanto ódio explícito. Chegamos a um salão cavernoso, bem espaçoso e cheio de quinquilharias que eu conhecia bem: livros de magia, guias de herbalismos, cristais, objetos astronômicos… e, bem no meio de tudo, destoando do ambiente, uma enorme piscina de lava fervente. Cheguei perto, mas não muito. A punição do fogo havia me deixado com mais medo ainda de qualquer tipo de calor. Como se observasse um lago cristalino enquanto pensava nas melhores palavras, Draven finalmente começou: — Essa profecia foi recitada a mim muitas vezes — sua voz estava mais baixa, mas ainda carregada de autoridade. — Eu me lembro de todas as palavras de cor. Fiquei em silêncio, esperando que ele continuasse. Seus olhos se encontraram com os meus, intensos e cheios de segredos. — Sob a última lua vermelha, o fogo devorará o sangue real. Da morte surgirá a escolhida, destinada a unir ou destruir. O coração do rei de chamas despertará, mas sua escolha decidirá o futuro. Se aceitar o destino, os dragões renascerão. Se o rejeitar, a eternidade será seu fardo." O silêncio que se seguiu foi esmagador. Meu corpo inteiro se retesou. Eu senti um arrepio percorrer minha espinha. — O fogo devorará o sangue real… — minha voz saiu trêmula. — Eu sou de sangue real. Draven não respondeu. Mas ele também não precisou. Minha respiração ficou presa na garganta. — Então… a profecia fala de mim? Ele desviou o olhar, o maxilar travado. — Ainda não sabemos. — Ainda não sabem?! — Exclamei, sentindo uma onda de indignação tomar conta de mim. — Eu fui queimada viva! Eu deveria estar morta! Então foi isso o que quis fazer, não foi? Me testar. Coloquei as mãos na cabeça e comecei a andar de um lado para o outro. Apesar de aquilo fazer certo sentido, era muito difícil de acreditar. Eu, sendo parte de uma profecia dracônica? Antes que ele pudesse responder, um novo som interrompeu nossa conversa. A porta da câmara se abriu, e Kael entrou sem cerimônia, os olhos dourados dançando entre mim e Draven. — Espero não estar interrompendo um momento intenso — ele disse com um meio sorriso, embora sua postura mostrasse que ele sabia exatamente o que estava acontecendo. Draven apenas suspirou, parecendo cansado. — O que você quer, Kael? O meio-dragão inclinou a cabeça. — Ouvi o rei finalmente mencionando a profecia. Tive que ver com meus próprios olhos. Me virei para ele, ainda processando tudo. — Você sabe sobre isso também? Kael me lançou um olhar divertido. — Todo mundo sabe. Pelo menos, todo mundo que importa. Cruzei os braços. — Mas ninguém achou necessário me contar. — Claro que não — ele deu de ombros. — Draven nunca foi fã de dividir segredos. O rei lançou um olhar mortal a Kael, que apenas riu baixinho. — Isso não é uma brincadeira. — Eu sei. Mas você precisa admitir que deixar a garota no escuro não foi a melhor decisão. Draven cerrou os dentes, mas não retrucou. O meio-dragão então se virou para mim, seu olhar agora mais sério. — Quer saber por que todo mundo conhece essa profecia? Porque é a base da nossa história. A última lua vermelha apareceu cem anos atrás… e foi quando tudo mudou para os dragões. Meu coração deu um salto. — Cem anos atrás? Ele assentiu. — Foi quando o rei anterior morreu. E quando os humanos traíram os dragões. Engoli em seco. Isso era muita informação para processar de uma vez. — E onde você se encaixa nisso tudo? — perguntei, tentando entender. Kael sorriu de lado, seu olhar ficando ligeiramente melancólico. — Eu sou apenas alguém que nasceu no meio do caos. Meio humano, meio dragão. Nunca fui totalmente aceito por nenhum dos lados. Mas Draven… ele me deu um lar. Fiquei surpresa. Não esperava que os dois tivessem uma história tão profunda. — Então vocês são amigos? Kael riu, lançando um olhar para Draven. — Eu gosto de pensar que sim. Ele gosta de pensar que eu sou uma pedra no sapato. Draven revirou os olhos, mas não negou. — Kael é meu guerreiro mais leal. O meio-dragão sorriu com satisfação. — Agora você está me elogiando? Isso é o que chamaria de um dia histórico. A tensão no ar diminuiu um pouco com a brincadeira, mas minha mente ainda estava presa à profecia. E antes que eu pudesse pressionar Draven por mais respostas, a porta foi aberta de maneira brusca. — ISSO É UMA FARSA! Eu me virei a tempo de ver Lysara entrando, os olhos ardendo em fúria. — Essa humana não é a escolhida! Apontando para si mesma com certo orgulho, apesar de pânico nas feições, ela disse algo que eu definitivamente não esperava ouvir: — EU sou! Kael e Draven se olharam, totalmente confusos. Lysara avançou, seus olhos brilhando com uma mistura de raiva e certeza absoluta. — Essa profecia sempre falou sobre mim. Não sobre ela! Meus olhos encontraram os de Draven, esperando alguma reação. Mas, pela primeira vez, ele parecia verdadeiramente… surpreso.POV: ElaraEu podia sentir a tensão crescendo entre todos nós, como um incêndio prestes a consumir tudo. Lysara ofegava, os punhos cerrados ao lado do corpo. Seus olhos refletiam a chama que ardia dentro dela.— E o que te faz ter tanta certeza? — Minha voz soou mais fria do que eu pretendia. Lysara ergueu o queixo, a postura erguida como a de uma rainha. — Porque eu fui criada para isso. Desde criança, me ensinaram que meu destino era estar ao lado do Rei Dragão. Que a profecia falava de mim, da minha conexão com ele! — Seus olhos dispararam para Draven, que permaneceu em um silêncio impenetrável. — Você sabe disso, Draven! Você sempre soube! Ele não respondeu de imediato. Seus olhos âmbar estavam fixos nela, mas havia algo mais ali… um cansaço oculto, um peso nos ombros. Então a dragonesa que me queria morta também era uma… candidata a ser parte da profecia? Aquilo era demais pra minha cabeça…E obviamente, Draven havia deixado aquele “pequeno” detalhe de fora. Que surpres
POV: DravenO vento gélido cortava o céu escuro enquanto eu, na forma dracônica, e Kael, montado em minhas costas, avançávamos em direção à fronteira. Não trocamos palavras; o silêncio entre nós era carregado de tensão. Havia um peso em meu peito que eu tentava ignorar — uma combinação de raiva reprimida, um pressentimento desagradável e… algo mais. Algo que tinha olhos tão intensos quanto o fogo e que agora estava trancada em meu castelo.Quando nos aproximamos das torres de vigia da fronteira, avistamos o caos que se desenrolava ali. Soldados de Solaris estavam encurralados, cercados por meus guerreiros dracônicos. O cheiro de sangue humano pairava no ar, misturado ao fedor do medo.— Malditos invasores… — murmurei, cerrando os dentes.Kael manteve o silêncio. Ele sabia o que aquela visão me fazia lembrar: o cerco, a traição, o massacre que destruiu tudo o que eu amava.Assim que pousamos, nossos homens fizeram uma reverência rápida, mas eu não estava interessado em formalidades. M
POV: ElaraO coração batia com força enquanto eu caminhava apressada pelos corredores do castelo. Cada passo ecoava como trovões em meus ouvidos, impulsionado pelo pânico que crescia em meu peito. As palavras de Kael, o olhar sombrio de Draven antes de partir para a fronteira… algo estava errado. Muito errado. Cedric. Ele tinha invadido o território dos dragões. Eu nunca soube de qualquer inimizade que o rei usurpador nutrisse pelos dragões, mas era senso comum que éramos inimigos e não deveríamos confraternizar. O que será que ele queria? Será que sabia que eu estava aqui?Afinal de contas, eu fui vista sendo salva, pelo reino todo, por um dragão.Apressando o passo, ignorei os olhares curiosos dos guardas e servos. Eu precisava de respostas. Precisava de Draven. Ao virar o último corredor, ouvi vozes exaltadas vindas de uma enorme porta dupla à minha frente. O brasão dracônico estava esculpido na madeira maciça — a sala do conselho. Sem pensar, empurrei a porta e entrei.
POV: DravenA escuridão me envolvia como um manto sufocante. Eu não via nada, mas sentia.O cheiro de fumaça, de carne queimada, de sangue…Gritos ecoavam ao meu redor, misturando-se ao rugido furioso das chamas. O calor era insuportável, consumindo tudo. Eu tentava me mover, mas meu corpo estava preso, como se correntes invisíveis me segurassem.Então eu a vi.Elara, ajoelhada no meio do fogo, as vestes escuras chamuscadas, os olhos arregalados em terror. Ela tentava se levantar, mas algo a impedia.Um vulto surgiu das sombras. Cedric.Ele sorriu para mim antes de enfiar a lâmina através do peito dela.Eu gritei.Acordei ofegante, o coração martelando contra as costelas. Um suor frio escorria pela minha pele. Passei as mãos pelo rosto, tentando afastar a imagem da minha mente.Mas que merda.Levantei-me, sentindo um peso insuportável no peito. Eu precisava sair dali, respirar, afastar aquele maldito pesadelo.Saí do quarto, percorrendo os corredores em silêncio. O castelo estava merg
POV: Elara Olhei para meu reflexo no espelho de corpo inteiro. Eu estava linda.Meu vestido de noiva, branco com detalhes dourados, não era mais lindo apenas que o sorriso no meu rosto. O grande dia tinha chegado, afinal!— Sua Alteza! — chamou minha serva, entrando no quarto. — A cerimônia finalmente vai começar! Está na hora.. . .De braços dados com meu pai, cercada pelos convidados reais e também muitos de meu povo, caminhei até meu noivo. — Você está linda, meu amor. — Seus olhos azuis estavam radiantes. — Será uma honra ser seu marido e tomar conta deste reino.Tímida, sussurrei de volta enquanto nos voltávamos para o cerimonialista.— Estamos esperando desde crianças. Mal posso acreditar, Cedric!Com lágrimas de felicidade ameaçando cair, ele tomou minha mão e respondeu:— Sim, querida. Eu também mal consigo me conter de felicidade.O casamento terminou ao pôr do Sol. Éramos oficialmente marido e mulher.. . .— Não! — gritei em pânico, me lançando de joelhos no piso da enfe
POV: ElaraO silêncio era esmagador. A escuridão da cela que me envolvia só não era pior do que o cheiro de umidade e ferrugem que impregnava o ar. Minha pele estava coberta de poeira e suor, e meus pulsos latejavam com os hematomas causados pelas correntes que me prendiam. Mas nada doía mais do que a traição. Cedric. Eu o amava. Eu sempre o amei. Desde crianças, quando corríamos pelos campos, quando ele prometia que me protegeria para sempre. Quando ele dizia que eu era a única pessoa no mundo que ele queria ao seu lado…Meu corpo estava exausto, mas minha mente não me deixava descansar. Porque assim que meus olhos se fechavam, o pesadelo começava. O fogo. Os rugidos dos dragões. A sombra colossal pairando sobre mim. E a marca em minha testa, queimando como se fosse parte das chamas. . . .Acordei com um solavanco quando um jato de água gelada foi atirado contra meu rosto. Ofegante, tremendo, tentei abrir os olhos e enxergar através da névoa de confusão e frio. —
POV: Elara Acordei assustada, com a pele fria e embebida em suor. Olhei para os lados e vi que não estava numa cela escura e fétida, e não havia cordas ou grilhões me atando às paredes. Na verdade, eu estava num belo quarto. O lugar era quase tão lindo como meu antigo quarto no palácio. Eu estava deitada numa cama enorme, onde cinco pessoas poderiam dormir tranquilamente, com roupa de cama vermelha e fios de ouro nos travesseiros. Como se houvesse escutado meu arquejo assustado ao despertar, a porta se abriu e um homem surgiu. Não. Ele definitivamente não era um homem. Era muito alto, tinha pouco mais de dois metros facilmente. Sua pele era bem escura, como um céu noturno sem estrelas, e os olhos cor de laranja brilhavam como a mais quente das chamas. Ele era muito forte e musculoso, e as orelhas pontudas, parcialmente escondidas pelos cabelos trançados para trás, lembravam muito as de um elfo. “Princesa.” A sua voz era profunda e grave. Poderia facilmente se tornar intimidadora,
POV: ElaraO silêncio que se seguiu foi tão intenso que pude ouvir minha própria respiração acelerada. O salão parecia ter congelado no tempo, mas logo o som de passos ecoou pelas paredes de pedra. Os séquitos de Lysara, impassíveis, começaram a vir na minha direção.Minha pele arrepiou. Eu estava desarmada, em território inimigo, e algo me dizia que minha morte não seria nada rápida…Mas antes que qualquer um deles pudesse me tocar, a voz fria do Rei Dragão ressoou no ambiente: — Parem.Foi apenas uma palavra, mas carregada de um poder tão inegável que os guerreiros hesitaram no mesmo instante. Draven ainda não havia se movido de seu lugar, e nem precisava. Sua autoridade era total. Seus olhos âmbar estavam fixos em Lysara, estreitados em um olhar gélido. — Vossa Majestade não deve ser tocada. Houve um murmúrio de choque. Até mesmo Lysara piscou, atordoada, antes de soltar uma risada baixa e descrente. — Você só pode estar brincando. — Não brinco com coisas sérias. — O r