Um dia no trabalho e o relatório da ação indicava falha na ação. Em seu escritório recebia o comandante, com o braço que repousava, fora da tipóia, sobre a mesa.
— Como está, Helena? - Renard perguntou, fechando a porta atrás de si. — Ah, Peter! Cara! Tive muita sorte. - Ela suspirou. - Fomos emboscados. Ou errei feio nos cálculos do planejamento ou vazou informação. De qualquer forma, a sindicância vai encontrar o problema e me cortar ou achar o boca aberta. Fiz o que pude para livrar a equipe. No time, só eu não tenho família. Sabe como é difícil dar notícia de "Morto em Ação" para quem sobrevive. — Helena, mesmo assim, deveria ser mais cautelosa com esses imprevistos. - Peter a repreendia, suave e amistosamente. — Vou tentar na próxima, Peter. - Ela respondeu, massageando os olhos sob as pálpebras. — Complicadas essas queimaduras nos olhos. Coçam um inferno. - Ele puxava conversa. — Começou aqui. No deserto, esse cara que me resgatou, tinha um colírio que foi excelente. - Ela respondeu. — O tal Carlos? - Ele investigava. — É. Meu "Amigo do Deserto". Cara estranho, teve toda oportunidade do mundo de tirar uma "migra" de campo e me deu abrigo, cuidado digno, respeito. - Ela pensava sobre aquilo, os olhos ardiam. - Você está mais perto. Pode pegar o colírio na minha bolsa? - Ela pediu. Peter abriu a pequena bolsa: identificação, arma carregada, batom, cigarros, isqueiro e colírio, enfim, tudo o que uma dama precisava na vida. Ele se aproximou dela, que tateava o ar, encontrando a mão dele. - Obrigada. — Deixa que ajudo você. - O comandante se pôs diante dela, que inclinou a cabeça, deixando exposta a linha do pescoço. Por mais que o uniforme fosse formal e sisudo, ela tinha um algo, em si, que lhe chamava a atenção. Se Hebert Brown ainda fosse vivo, certamente, ele ainda seria um admirador secreto. O comandante lhe abriu o olho e pingou o colírio, ardia como pimenta, ela pressionou os olhos, para absorver aquilo. - Lamento, querida, sei que não deve ser fácil. Aguente só mais um. Relaxe para eu poder fazer isso. - Ela aliviava a expressão, voltando a pressionar outra vez, massageou os olhos, como o Amigo do Deserto havia feito. Aquilo aliviou muito a queimação, ela se manteve de olhos fechados, os lábios, levemente entreabertos. Tentadora. Peter se afastou enquanto sua força de vontade era capaz de vencer a provocação que Helena representava. - Helena, tenho percebido suas ações. Está ficando cada vez mais ousada e arriscando demais sua vida, mesmo com riscos calculados quanto ao time. - Ele guardou o colírio na bolsa. - Já falei que esse negócio de fumar ainda vai te matar. — E que diferença faz, Peter? - Ela se mantinha, até que a medicação fizesse efeito. - Nessa altura, enterrar um cadáver saudável está fora de cogitação. — Supondo que a gente tenha um cadáver, Helena. - Ele suspirou e se sentou. - Por que tem que ser tão determinada? — Porque jurei, bebê. - Ela sorriu, tinha a boca bem desenhada, sob o batom de cor de vinho, acetinado, que lhe dava um bonito destaque. — Fumar acaba com o fôlego, de qualquer maneira. - Ele disse, paternal. — Mas dei conta de correr e manter marcha por umas boas milhas. - Ela ainda sorria. — Helena, me preocupo com você. Depois do Hebert, você ficou ainda mais atrevida. Tem certeza de que já não é tempo de sair um pouco da sua bolha? - Peter expressou. — Pete, você fala de um jeito como se eu ainda estivesse de luto. Aquele acidente foi uma fatalidade. - Ela perdia o brilho do sorriso. - Para mim, a vida continuou, independente de tudo. — Você o amava? - Ele ousava. — Inferno! Sim! - Ela respondeu, suave, em uma interjeição típica daquela região. - Mas eu o matei, não dá pra exigir muito. Matei os dois caras mais importantes da minha vida aquela noite. - Ela se punia. — Não se culpe tanto. Quem ia adivinhar que aquele caminhão ia perder o controle? - Peter a consolava. — De qualquer forma, não sou a única reclusa nesta sala. Desde que se separou da Karen, está vivendo tanto de cama em cama que ainda me faz perguntar porquê tem uma casa na base. - Ela era ácida. A morte do marido e do filho ainda pesavam para ela. Tinha menos de dois anos da perda. — Gosto de variedade. - Ele retrucou, amistoso. - Eventualmente, conquisto a mulher dos meus sonhos. — Hum. E ela está sabendo disso? - Ela voltava a sorrir, divertindo-se em zombá-lo. — Já falei algumas vezes, mas não há meio de ela acreditar em mim. - Ele respondeu. - Se não se sentir bem, vá para casa. É uma ordem. — Estou bem, Major. Fique tranquilo, comandante. Ficar em casa, sozinha e sem fazer nada, passando mal ou ficar aqui, passando mal, na companhia de gente que apostou na minha morte? Decisão difícil. - Ela gracejou, irônica. - Fico com minhas cobras aqui. — Vou pedir para seu sargento vir para seu escritório. - Ele anunciou. — Deixa o cara quieto, Pete. Todo mundo ainda está frustrado com a falha. - Ela abriu os olhos azuis, acinzentados, da cor de uma geleira e o olhou. A figura diante dela estava turva, a cabeça leve. - Pete, acho que vou desmaiar. - Ela disse, firme, antes de desmoronar, se chocando contra o chão. Peter correu até ela. A mulher respirava superficialmente, ofegante. O pulso acelerado. — Chamem ajuda aqui. - Ele gritou enquanto passava com ela nos braços, a camisa branca maculada de sangue, que lhe minava do nariz. Helena acordou no hospital, a mão de Peter sobre a sua. "Estou imaginado coisas. O Sol me cozeu o cérebro." Ela pensou, esforçando-se para se sentar. Peter acordou, sobressaltado, com o movimento. — Helena, por Deus! Você acordou. - Ele saltou da poltrona e a abraçou, aliviado. — Pete, está me machucando. - Ela disse, sufocando com o abraço daquele homem imenso. — Me desculpe. Fiquei apavorado quando Stuart, sem nenhuma cerimônia, subiu na sua maca e começou uma manobra cardíaca. - Ele suspirou. - Achei que... — Hey, garotão! Pare! Sou eu! Hellish Joker Brown! Se nem o deserto me matou, não vai ser um mal estar, num escritório que vai dar conta. - Ela brincou. - Ainda que o trabalho no gabinete seja chato o suficiente para isso. - Ela o fez rir, ainda que brevemente.Peter a fez companhia. Stuart foi chamado e chegou o quanto antes, examinou Helena. Parecia bem. — Tenente Brown, a senhora está esgotada e passou por eventos importantes recentemente. - Ele informou, friamente. - Minha dificuldade está em traçar o claro limite entre Burnout e TPT. - Ele disse, direto. — Impossível, Capitão. - Peter interveio. - Ela estava bem ontem. — Ontem? Eu apaguei vinte e quatro horas? - Helena perguntou, impressionada. — Aí é que estamos. - Stuart pontuava. - Você já tinha passado mal assim antes, quando seu marido morreu e você, por pouco, não foi a terceira vítima daquele caminhão. O que a fez saber que ia desmaiar? - O médico investigava. — Senti um desequilíbrio, minha visão turvou de uma vez, como se eu estivesse, não sei, flutuando no ar. - Ela respondeu. — Você precisa tirar algum tempo para si. - Stuart recomendou. - Encontre algum apoio, talvez o comandante. Ao que me parece, são amigos chegados. - O médico se virou para Peter. - Certifique-s
Helena e Dario passaram a tarde conversando sobre a vida no Deserto. Ele dizia ser Geólogo. Estudava áreas como aquela, desérticas, o que fazia sentido para ele. Ela era formada em filosofia, algo inusitado para uma militar. Riam daquilo. Quando Peter chegou, Helena parecia bem melhor, mais alegre também. — Vejo que o Capitão estava certo. - Peter parou na porta. Em seu uniforme, para o escritório, era um homem irremediavelmente bonito, aparência impecável que refletia sua posição de autoridade, algo, de pouco mais de um metro e oitenta de altura, postura ereta e disciplinada, resultado de anos no serviço militar. Os cabelos, castanho-claros, sempre bem penteados, já começavam a mostrar sinais de grisalho nas laterais, adicionando um ar de maturidade elegante. Seus olhos azuis, penetrantes, carregam uma mistura de autoridade, luxúria e mistério, com a expressão, geralmente, séria. Havia aquele charme nele, que Helena achava encantador. Peter sempre foi cuidadoso com sua imagem púb
Sem toda a farda, Peter era um tipo bastante atraente. Helena, uma garota, viva e meiga, fora do Deserto, caminhava agarrada ao braço de Peter. Ela já não morava perto da base tinha muito tempo. Peter gostava da nova vizinhança dela, cheia de senhorinhas curiosas e pequenas famílias. Era um bem viver.— O que quer cozinhar? - Peter perguntou.— Você quem sabe. Eu faço fotossíntese. - Ela brincou mas Peter sabia que havia alguma verdade naquilo. - Vou ali na farmácia, me espera.— Analgésicos? - Ele perguntou. — No! Preservativos para a noite toda. - Ela provocou. Escandalizando duas velhinhas que o encararam, coradas. Helena o constrangida, descaradamente. Peter perdia a compostura, envergonhando-se. Maneou cabeça em um aceno para as velhas que desviaram o olhar dele. Ela levou algum tempo para sair dali, com um pequeno pacote na mão. - Pronto! Preparado! - Ela gargalhou, divertia-se às custas do amigo. — Você me mata, sabia? - Peter disse, sem jeito. No mercado, ela pegou alguns i
— Seu cheiro é tão gostoso, Helena. - Peter disse baixinho, segurando as mãos dela contra a pia. Com o queixo, afastou os cabelos dela e lhe mordiscou o pescoço. Sentia o corpo daquela mulher estremecer. — Pete. - Ela disse séria. - Se a gente continuar com isso, não vai ter volta. - Ela arqueou-se sob aquele domínio, com a mordida em seu ombro, mais firme. Sentia-o quente, pressionando seu corpo contra o dela, excitado.— Você não quer, minha doce Helena? - Ele rosnou, entre os dentes. - Podemos ser amigos ainda, no café da manhã. — Pete. - Ela gemeu, sentindo a ponta da língua daquele homem percorrer o desenho de sua orelha. Por cima da blusa, via os mamilos excitados dela, ela já estava tomada pela luxúria. Peter perdeu os sentidos com o contexto, girou Helena sob seu comando, a colocando de frente para si. Ele beijou sua boca, era doce, com os lábios mornos do vinho. Ele intensificou a exploração do manancial que lhe saciava a sede daquele beijo, tão necessário em sua vida. Hele
— O que são todas essas coisas? - Peter notava Gregory separar os frascos e cartelas em grupos. — Remédio para dormir, calmantes, indutores de sono, antialérgicos, remédio para digestão, cardíacos. - Ele identificava grupo. - Com álcool, apagam um elefante, individualmente. Em conjunto, são pior do que entorpecentes sintéticos. Faz sentido ela desmaiar com frequência. - Ele analisou.— Isso me preocupa, Greg. Como ter uma líder entorpecida? - Peter se percebia: poderia não ter havido vazamento de informações, mas falha de cálculo, na execução do planejamento dos riscos. Helena poderia estar dopada quando pôs a estratégia em ação. - Preciso voltar para o escritório, Capitão? - Peter se levantou, atordoado, retornando ao escritório. Em seu gabinete, solicitou os documentos de planejamento e os relatórios da operação. Revisava, fase por fase. Apesar de tudo, o plano era perfeito, não havia erro. Restava a segunda hipótese: a operação havia sido sabotada, fosse por erro na execução ou u
Helena deu seu jeito de entrar no transporte intermunicipal, rumo oeste. Havia um motel, investigado um sem número de vezes naquela rota, em um lugar ermo, fora das rodovias principais. Cruzar a fronteira a identificaria e ela sentia aquela angústia de voltar ao deserto. Não raciocinava. Não teve dificuldades para chegar, ainda que fosse incapaz de fechar os olhos, secos e dolorosos. A dor, pelo corpo, a torturava. Tinha a garganta seca e aquela angústia de chegar ao deserto. As rotas oficiais estavam fora de cogitação. Estava confusa e aquela única noite de descanso genuíno, sob os cuidados do "Amigo do Deserto", fora algo vital para ela. No motel, pagou a dinheiro, sem perguntas. Não era um lugar luxuoso, mas estava fora dos radares oficiais. Ela tomou um longo banho, comprou um maço de cigarros e uma garrafa de tequila e ligou seu celular. As mensagens caiam, enlouquecidas, ela as deixou entrar, sem, contudo, desbloquear o aparelho. Tanto Dario quanto Peter recebiam a notificaçã
Peter esperou ela se acalmar. Afastou o rosto dela do peito, ambos os olhos estavam tomados pelo sangue, era difícil de encarar a mulher. — Me diz o que consegue ver, bebê. - Ele pediu. — Nada, Pete. - Ela enxugou o nariz com o braço, estava muito sensível. - São borrões de cores e manchas. Eu... - Ela voltava a se emocionar. - Pete, eu não sei o que fazer. Cega, estéril, sozinha. - Ela voltava a chorar. - Não quero virar uma veterana apodrecendo num asilo, esperando a morte me buscar. Eu prefiro morrer. - Ela se agarrou a camiseta do homem. — Aceita um pouco de ajuda deste palhaço aqui, Helena. - Ele suplicou. - Vou ligar para o Greg. — Não! Ele vai me enfiar numa clínica psiquiátrica, não quero viver assim. - Ela se agitava, a cor sumia dela. — Calma, Helena. Respira. Você vai desmaiar assim. - Ele aconselhou. - Respira comigo, gatinha. - Ele cadenciava a respiração. Helena o obedecia, sem pensar. - Isso! Assim. Continua. Se eu o fizer prometer que não vai arrastar você par
— Alguns pequenos coágulos. - Disse o médico a Helena. - Vamos resolver imediatamente. Vai levar alguns dias para que volte a enxergar algo. - Ele informou, fazendo uma série de recomendações que Helena tentava memorizar. Em pouco tempo, a agulha no canto de cada olho e algo que parecia que iria sugar seu olho para fora do rosto. Estava completamente cega, na mais absoluta escuridão. - Mantenha os olhos fechados, Senhora Brown. - A mão do médico lhe afagava o rosto, fechando as pálpebras. - Será mais confortável. Se for possível, mantenha o mais absoluto repouso. — Obrigada, Doutor. - Helena agradeceu. — Nos vemos amanhã, para o acompanhamento. - O médico indicou. Em minutos, voltavam para casa. Bacon informou o Major e o Capitão. Recebia instruções. — Tenente, entendo seu orgulho como mulher e como superior. Fui designada para auxiliar a Senhora. Gostaria de algo? Um banho? Uma refeição? Que eu busque algo mais tarde? - A soldado ofertava. — Cigarros, Bacon. - Helena retrucou.