Sem toda a farda, Peter era um tipo bastante atraente. Helena, uma garota, viva e meiga, fora do Deserto, caminhava agarrada ao braço de Peter. Ela já não morava perto da base tinha muito tempo. Peter gostava da nova vizinhança dela, cheia de senhorinhas curiosas e pequenas famílias. Era um bem viver.
— O que quer cozinhar? - Peter perguntou. — Você quem sabe. Eu faço fotossíntese. - Ela brincou mas Peter sabia que havia alguma verdade naquilo. - Vou ali na farmácia, me espera. — Analgésicos? - Ele perguntou. — No! Preservativos para a noite toda. - Ela provocou. Escandalizando duas velhinhas que o encararam, coradas. Helena o constrangida, descaradamente. Peter perdia a compostura, envergonhando-se. Maneou cabeça em um aceno para as velhas que desviaram o olhar dele. Ela levou algum tempo para sair dali, com um pequeno pacote na mão. - Pronto! Preparado! - Ela gargalhou, divertia-se às custas do amigo. — Você me mata, sabia? - Peter disse, sem jeito. No mercado, ela pegou alguns ingredientes para uma pasta e três garrafas de vinho, alguma carne e uma quantidade consistente de doces. Não era a criatura mais saudável que Peter conhecia. - Só come comida balanceada na base? — Exatamente! - Ela se divertia com pipocas coloridas na fila do caixa. - Só vou cozinhar porque você está de babá. Se não, fora de cogitação. - Ela levou a mão ao celular, para pagar, mas Peter foi mais rápido. Na tela dela: "Amigo do Deserto. 3 mensagens." Peter se enciumava. Ele não aceitaria ser deixado para trás na guerra por aquele coração selvagem dela. Há anos esperava por uma oportunidade como aquela, via-a se afundar cada vez mais profundamente em uma espiral que o preocupava. Não era controladora, mas era aviltante, fazia o que bem entendia, ignorava protocolos e amava as atividades de campo. Ele preferia ordem e controle, o que o tornava um líder eficaz e que raramente aceitava ser desafiado. Sempre admirou Helena, não apenas por sua habilidade e força, mas também por sua determinação e resiliência, qualidades que Peter considerava raras. Sua paixão por ela começou de forma silenciosa, mas se intensificou com os anos. No fundo, era marcado pela inveja e pela frustração de nunca ter conquistado o amor dela. Ele nunca soube de alguém antes de Hebert, apesar de saber que já era divorciada de um alguém, sem nome que considerava um rival, porque já teve o coração de Helena, algo que Peter desejava para si. Mesmo sua amizade com Hebert Brown, o finado marido de Helena, o fazia guardar uma lealdade superficial, mas secretamente nutria ressentimento por Hebert também ter estado mais próximo de Helena do que ele. O acidente foi um evento devastador para ela, na mesma noite, um caminhão desgovernado levou o marido e o filho em seu ventre, nos estágios finais da gravidez. Ela dirigia. Peter tentou encontrar os pais deles, que só souberam do acidente muito tempo depois. A licença dela durou meses. Peter a ajudou a encontrar o apartamento, vender a casa, doar as coisas de Hebert e do filho não nascido. Ela passou dias entrando e saindo da emergência, à beira de comas alcoólicos. Ele esteve firme ao seu lado por todo esse tempo, quando retornou ao trabalho, ele já era major. Ela jamais se ressentiu daquilo, gostava dele como chefe, se sentia livre para agir, o exato oposto do resto das equipes. Havia um rumor de que eram envolvidos romanticamente, mas nada frutificou muito tempo, era algo que ia e voltava, de tempos em tempos. — Querida, esse "Amigo do Deserto" é o mexicano que a trouxe de volta? - Peter era sutil para perguntar. — Bem dizer, me salvou, Pete. - Ela se virou, encostando o quadril no sensor da fechadura, que se abriu. Brincava no ar, empurrando a porta com o corpo. - Sem esse cara, acho que não ia dar nem para zoar você outra vez. - Ela foi para o balcão da cozinha. - E se prepare para comer a pior comida italiana de todos os tempos. - Ela riu. Apesar da aparente naturalidade, ele sabia que estava desconfortável. Desde Hebert, ela havia perdido os laços com os pais e os sogros. Os contatos de rotina eram feitos pelo departamento de pessoal, mas nada além disso. Helena se pôs a cozinhar. Abriu uma das garrafas de vinho, engolindo os comprimidos com a bebida. — Está doida, Helena? - Peter se surpreendia. - O que é isso que está tomando com a bebida? — Pete, não estressa. Anticoncepcional, vitaminas e remédio para o estômago. O meu melhor coquetel. - Ela seguia com a culinária. Aquilo não era como as gororobas da base. Por mais que fosse balanceado, nada tinha aquele aroma. Vegetais se transformavam em uma sopa de tomates assados, regada com vinho. A pasta recebia um tempero suave, a base de carne e molho de tomate. Torradas com azeite e ervas e um creme suave de sobremesa. Helena era brincalhona, mas levava a sério receber bem o amigo, o último que lhe restava. Aos poucos, ele a viu se isolar. Ela serviu a mesa e se por a preparar um pequeno frasco. "Colírio." Ele constatou. Ela deixava a mistura na geladeira. Trouxe o vinho e as taças, já era visível que estava corada com a garrafa consumida entre o preparo do jantar e ela. — Você está alta. - Peter constatou. — Não! Estou temperada! - Ela o serviu. A comida estava deliciosa. Peter raramente comia algo tão bom, a menos que pagasse muito caro. — Vou mudar para cá. - Ele afirmou, farto, depois do jantar, recebendo a sobremesa das mãos dela e um café amargo. — Por quantos dias? - Ela já estava alta. — Enquanto tiver comida. - O vinho já o tornava espirituoso. — Mas já vai? Achei que ia aturar minha ressaca! - Ela era expressiva relaxada. Uma face que o encantava. — Você é linda. - Peter deixava a confissão escapar, livre de suas travas morais rígidas. — Você está bêbado, comandante! - Ela se divertiu. Levantou-se para recolher a mesa. Peter a ajudou com a tarefa, apesar de firme, andava em passos lentos, já estava alterada. Sem pensar, Peter a pressionou contra o balcão da pia, inalando o cheiro perfumado de sua pele. Helena sentiu o corpo dele contra suas costas. Era reconfortante. Ela fechou os olhos, suavemente. "Deus! Como isso é bom..." Ela pensou, aproveitando aquele carinho.— Seu cheiro é tão gostoso, Helena. - Peter disse baixinho, segurando as mãos dela contra a pia. Com o queixo, afastou os cabelos dela e lhe mordiscou o pescoço. Sentia o corpo daquela mulher estremecer. — Pete. - Ela disse séria. - Se a gente continuar com isso, não vai ter volta. - Ela arqueou-se sob aquele domínio, com a mordida em seu ombro, mais firme. Sentia-o quente, pressionando seu corpo contra o dela, excitado.— Você não quer, minha doce Helena? - Ele rosnou, entre os dentes. - Podemos ser amigos ainda, no café da manhã. — Pete. - Ela gemeu, sentindo a ponta da língua daquele homem percorrer o desenho de sua orelha. Por cima da blusa, via os mamilos excitados dela, ela já estava tomada pela luxúria. Peter perdeu os sentidos com o contexto, girou Helena sob seu comando, a colocando de frente para si. Ele beijou sua boca, era doce, com os lábios mornos do vinho. Ele intensificou a exploração do manancial que lhe saciava a sede daquele beijo, tão necessário em sua vida. Hele
— O que são todas essas coisas? - Peter notava Gregory separar os frascos e cartelas em grupos. — Remédio para dormir, calmantes, indutores de sono, antialérgicos, remédio para digestão, cardíacos. - Ele identificava grupo. - Com álcool, apagam um elefante, individualmente. Em conjunto, são pior do que entorpecentes sintéticos. Faz sentido ela desmaiar com frequência. - Ele analisou.— Isso me preocupa, Greg. Como ter uma líder entorpecida? - Peter se percebia: poderia não ter havido vazamento de informações, mas falha de cálculo, na execução do planejamento dos riscos. Helena poderia estar dopada quando pôs a estratégia em ação. - Preciso voltar para o escritório, Capitão? - Peter se levantou, atordoado, retornando ao escritório. Em seu gabinete, solicitou os documentos de planejamento e os relatórios da operação. Revisava, fase por fase. Apesar de tudo, o plano era perfeito, não havia erro. Restava a segunda hipótese: a operação havia sido sabotada, fosse por erro na execução ou u
Helena deu seu jeito de entrar no transporte intermunicipal, rumo oeste. Havia um motel, investigado um sem número de vezes naquela rota, em um lugar ermo, fora das rodovias principais. Cruzar a fronteira a identificaria e ela sentia aquela angústia de voltar ao deserto. Não raciocinava. Não teve dificuldades para chegar, ainda que fosse incapaz de fechar os olhos, secos e dolorosos. A dor, pelo corpo, a torturava. Tinha a garganta seca e aquela angústia de chegar ao deserto. As rotas oficiais estavam fora de cogitação. Estava confusa e aquela única noite de descanso genuíno, sob os cuidados do "Amigo do Deserto", fora algo vital para ela. No motel, pagou a dinheiro, sem perguntas. Não era um lugar luxuoso, mas estava fora dos radares oficiais. Ela tomou um longo banho, comprou um maço de cigarros e uma garrafa de tequila e ligou seu celular. As mensagens caiam, enlouquecidas, ela as deixou entrar, sem, contudo, desbloquear o aparelho. Tanto Dario quanto Peter recebiam a notificaçã
Peter esperou ela se acalmar. Afastou o rosto dela do peito, ambos os olhos estavam tomados pelo sangue, era difícil de encarar a mulher. — Me diz o que consegue ver, bebê. - Ele pediu. — Nada, Pete. - Ela enxugou o nariz com o braço, estava muito sensível. - São borrões de cores e manchas. Eu... - Ela voltava a se emocionar. - Pete, eu não sei o que fazer. Cega, estéril, sozinha. - Ela voltava a chorar. - Não quero virar uma veterana apodrecendo num asilo, esperando a morte me buscar. Eu prefiro morrer. - Ela se agarrou a camiseta do homem. — Aceita um pouco de ajuda deste palhaço aqui, Helena. - Ele suplicou. - Vou ligar para o Greg. — Não! Ele vai me enfiar numa clínica psiquiátrica, não quero viver assim. - Ela se agitava, a cor sumia dela. — Calma, Helena. Respira. Você vai desmaiar assim. - Ele aconselhou. - Respira comigo, gatinha. - Ele cadenciava a respiração. Helena o obedecia, sem pensar. - Isso! Assim. Continua. Se eu o fizer prometer que não vai arrastar você par
— Alguns pequenos coágulos. - Disse o médico a Helena. - Vamos resolver imediatamente. Vai levar alguns dias para que volte a enxergar algo. - Ele informou, fazendo uma série de recomendações que Helena tentava memorizar. Em pouco tempo, a agulha no canto de cada olho e algo que parecia que iria sugar seu olho para fora do rosto. Estava completamente cega, na mais absoluta escuridão. - Mantenha os olhos fechados, Senhora Brown. - A mão do médico lhe afagava o rosto, fechando as pálpebras. - Será mais confortável. Se for possível, mantenha o mais absoluto repouso. — Obrigada, Doutor. - Helena agradeceu. — Nos vemos amanhã, para o acompanhamento. - O médico indicou. Em minutos, voltavam para casa. Bacon informou o Major e o Capitão. Recebia instruções. — Tenente, entendo seu orgulho como mulher e como superior. Fui designada para auxiliar a Senhora. Gostaria de algo? Um banho? Uma refeição? Que eu busque algo mais tarde? - A soldado ofertava. — Cigarros, Bacon. - Helena retrucou.
— Onde está a Tenente, Soldado? - O Capitão exigia. — No banho, Senhor. - A jovem lhe rendia continência. Peter se orgulhava do comando de sua Helena, em horas havia disciplinado a novata mais rebelde da base. Ela tinha o jeito. Peter, sem uma única palavra, entrou pela casa. Ouvia o chuveiro ligado. — Querida? - Ele bateu à porta. Não houve resposta. Decidiu entrar. Com fones, Helena se banhava. O corpo atlético, já com algumas cicatrizes da vida, esguio e bem modelado era acariciado pela água, a música alta chiava para fora dos fones. Cabelos molhados, olhos fechados. Devagar, tateava o lugar. Encontrou a toalha. Ele estava ali, com ela nua, parado a poucos centímetros dela, excitado. — Maria? - Ela perguntou, tirando os fones. Percebia a respiração quente que vinha de um ponto mais alto. — Quem é Maria? - Peter perguntou, refreava, tenso, o instinto de agarrar aquela mulher e a devorar ali mesmo. — Oh! Pete. - Helena se enrolou na toalha. - Me desculpe, eu precisava dis
— Gosto de estar com você. A base só seria mais prático enquanto se recupera. - Ele a via, olhos fechados. - Me deixa ver seus olhos. - Ordenou, suave. O sangramento cedia, pequenas ramificações e a vermelhidão nos cantos era o que restava. - Vou pegar o colírio na sua geladeira. - Ele se levantava, nu. Ela via apenas o borrão, disforme, diante de si. Voltava, com água e o colírio. - Tome, um pouco de água para recuperar o fôlego. Vem cá. - Ele determinava, o cuidado, terno, tão necessário, era um conforto, que há muito não sentia. Ela se sentou na beira da cama, ele lhe abria os olhos, um após o outro, e pingava aquela mistura, o alívio imediato era algo que a fazia relaxar. — Caraca! Isso é bom! - Ela solfejou. - Carlos tinha razão. - Ela disse, aliviada, sem perceber como Peter reagia. — Carlos é o "Amigo do Deserto"? - Ele perguntou, disfarçando o ciúme na voz, máscula e grave, que falava suavemente com ela. — É sim. Não acho que seja esse nome, mas me salvou de virar comida
— Estou aqui, Tenente. - Bacon respondeu sob o olhar severo do Major, que fechava a camisa, alinhando-se. — Volto para almoçarmos juntos, querida. - Ele foi até Helena, selando seus lábios, suavemente. Ela estava perfumada, tinha o hálito de menta que ele gostava. "Morangos e champagne." Ele identificou. - Obrigado por seus serviços, soldado. Descansar. - Ele disse, recebendo a continência dela, firme, alinhada. Peter saiu, a valise e o blazer na mão. Helena se aproximava, mais lentamente. Maria preferia não perguntar. Helena lhe estendeu a mão. Tinham portes parecidos. — Bom dia, Maria. - Ela sentiu a mão da moça tocar a sua. - Como foi a noite? — Certamente, muito mais tranquila que a sua, Helena. - A jovem brincou. Sentia-se à vontade como aquela mulher. Por mais que fosse inadequado, Helena lhe parecia um manancial de resistência e resiliência. Alguém com quem se abrir. Helena sorriu, era linda, de aparência rica. Uma mulher fina, forte e bem sucedida. Tornava-se um exemplo p