Catarina
A chuva cai intensa, atrapalhando todo o meu cronograma. Arthur anda insuportável com relação ao andamento do projeto, como se um complexo residencial ficasse pronto em um mês.
Sim, um bendito mês inteiro em que ele se mantém com um humor dos infernos, por complicações no Olimpo. Ou Reino, como diz César. Descobri por Maria Emília que o problema é com outro cliente da empresa e não é pessoal.
O que ela entende como pessoal, quando o homem praticamente diz que meu projeto está como o do Raphael? Jura?
Daquele dia em diante, meu humor espelhava o dele e fiquei suscetível a uma briga. Ele desconhecia completamente o sentido da palavra “expediente” e me mandava mensagens infinitas parecendo ser proposital.
Ontem Rebeca não resistiu e, ao ouvir o som do telefone, respondeu a mensagem. Assim, de
Arthur – Maria! – Grito da minha mesa, assim que Carolina vai embora. – Sim, chefinho? – Apenas me explica. – Catarina precisou deixar uma pasta e entrou. Por quê? Carolina te pegou desprevenido? Não se preocupe, Cata não vai contar para ninguém. – Essa não é a questão. – Então qual é? – Que as pessoas não podem entrar na sala das outras sem bater. – Conta outra, você faz isso todos os dias. Quero ver se um dia pega Catarina em uma situação dessas na sala dela. – E com quem ela ficaria numa situação dessas, Maria Emília? – Digo impaciente. – Não sei. A mulher é solteira, bonita e até eu, se não fosse hétero, ia querer. Zero defeitos e sei que qualquer pessoa com um neurônio sabe ver e não perderia uma oportunidade com esse espetáculo de mulher. Meu mês foi terrível e essa situação que acaba de ocorrer, apenas a coroou. Lutei como um entusiasta para jamais esquecer
Catarina O universo anda de parabéns quando o assunto é me desviar da rota. Qualquer rota. A rota do ônibus, da carona, do horário, dos meus planos e, decididamente, da minha recém-tomada decisão: Bem longe de Arthur Ferraço. Contra todas as possibilidades, ele decide seguir minha maldita carona e se tornar minha única opção segura de chegar em casa sem precisar fazer ensopadinho de Rebeca e Catarina. Ótimo momento para não ter habilitação, insisto. Fui teimosa, eu sei. Deveria pensar que, para Beca, seria melhor chegar mais rápido em casa, do que passar pelo caos do trânsito em uma viagem desconfortável. Deveria pensar que essa carona foi bem-vinda, mesmo se tivesse uma namorada dele aqui dentro. Não tem. Devo-te essa, universo. Mas a situação constrangedora em seu escritório, parece ter ligado uma sirene obstinada em meu cérebro e ela ecoa, ecoa e ecoa até que eu tenha vontade de socar aquela cara bon
Arthur Lembro-me perfeitamente de em diversos momentos da minha vida afirmar que o destino não é falho. Ele demora, enrola bastante, pega caminhos que muitas vezes eu desconheço, mas o resultado é sempre bom. Como nesse momento, em que estou fazendo figuras de sombras com as mãos para que uma animada Rebeca possa adivinhar. E eu sequer precisei planejar isso, quando tudo apenas aconteceu. Meu surto com Catarina em sua sala, ela me flagrando com Carolina, a raiva crepitando em seus olhos, a malfadada carona com o Tio Fábio, uma chuva torrencial e eu aqui. Tudo bem, o destino teve uma tarefa árdua, mas tudo compensou para esse momento de calmaria com esse pinguinho de luz. Ela é falante como Guilherme era e possui seu sorriso. A forma de pegar no queixo da gente para chamar a atenção ou firmar as duas mãozinhas e evitar que possamos olhar para o lado. Manias que seu pai tinha, não aceitando dividir espaço
Catarina Por um momento cogitei pedir que repetisse aquelas palavras. Desde que o reencontrei, me peguei lendo aquele bilhete algumas vezes, incrédula que aquele homem que o escreveu, de fato fosse aquele ser a quem eu chamava chefe. O homem que o escreveu trazia consigo uma admiração que não podia ser ocultada e, agora, sei que ele pode fazer ser assim quiser. Os olhos que ele tanto admirou são os mesmos, diversa no entanto, a natureza da mulher que o leva. Eu era livre e sem vínculos quando tudo aconteceu e depois que me tornei mãe, me resumo a ser mãe e arquiteta. Resumos demais para aquela mulher que se deixou ser livre junto ao homem com olhos de águia. Quando finalmente decido encará-lo, depois de a insônia me ter feito companhia, qualquer barreira arduamente construída e toda minha determinação em me afastar, rui. Como um castelo de cartas, dando vazão ao desejo cru que o instinto predador em nós faz flor
Arthur Ter despertado essa manhã sem precisar sair correndo e deixá-la sozinha na cama mais uma vez, me pareceu um prêmio. Havia muito tempo que estar com alguém não era tão... perfeito. Foi tudo absolutamente perfeito, desde que abri minha boca grande e ela se rendeu ao nosso inevitável reencontro. Por alguns momentos senti como se fossemos destinados a estarmos ali, naquele momento e daquela forma. Ela pegou no sono, exausta, após eu adorar seu corpo das formas mais incríveis que eu pude. Mas eu não. Eu não quis dormir tão cedo, avançando pela madrugada admirando seus traços na penumbra. Seu semblante pacífico me presenteava com um sorriso besta que não saía da minha cara. Em algum momento, achei frágil o nosso contato e a puxei para que se deitasse em meu peito. Ela veio, sem reservas e como se fosse comum me utilizar como porto seguro. Assim que o primeiro sinal de claridade despontou pela janela, enviei uma
Catarina Parabéns Catarina Assis. Você dormiu com um homem comprometido que aparentemente não possui nenhum remorso em trair a namorada. Nenhum mesmo e cada partezinha do meu corpo me confirma isso. Eu estava disposta a fingir que nada aconteceu ou que foi um deslize. Interagiria com ele profissionalmente e tentar não me sentir a pior das mulheres da face da terra. Aquela que dá trela ao pior homem. Toda minha determinação ruiu quando fui obrigada a encarar a mulher quase se jogando em cima de Arthur, completamente perdido em nos ver no mesmo ambiente. De novo. Mas também, o que você queria, Catarina? Resolveu ter um momento "recordar é viver" com um homem que você flagrou aos beijos com outra. Se for mais tonta do que isso, desiste da vida, amada! Ultraje maior foi ele ter saído claramente puto comigo da minha casa hoje de manhã quando eu resolvi ter uma crise de consciência. O que ele esperava
Arthur Estar àquelas horas sozinho, me deu tempo suficiente para pensar. Tive um jantar com a observadora Odeth que logo suspeita quando algo está acontecendo. Joguei qualquer desculpa no trabalho, mas logo tudo ruiu quando Rebeca me mandou uma mensagem. Não tem como não sorrir feito um besta, com uma coisa linda daquelas me convidando para jantar de uma forma tão fofa. Eu agora tenho usado muito a palavra fofa. Acabei contando sobre a filha da minha cooperadora, sem mencionar nosso parentesco. Vovó até ouviu, mas seu objetivo era mesmo a mãe. Perguntou a idade, o nome, estado civil, tempo que trabalha comigo e que gostaria de conhecê-la, pois parece ser uma moça muito agradável. Ela concluiu isso sem eu nada dizer sobre a pessoa de Catarina, apenas porque a filha é um encanto. Ela acha que não entendi o caminho de suas intenções. Mas o que me balançou, logo após isso, foi o fato de que a direção da imaginação inventiva
Catarina O sábado está ensolarado e perfeito para uma ida ao parque, pegar o máximo de vitamina D possível e gastar um pouco da energia da Rebeca. Ela tenta se equilibrar em sua bicicletinha, enquanto me chama para exibir sua proeza. Maria Emília e Joaquim nós acompanharam, já que nós mamães teremos folga essa noite. Camila optou em dormir como merece, pois sono é a última coisa que quer sentir essa noite. Nós mães sabemos conviver com o sono como se fosse um segundo filho. Inconscientemente encaro a tela do meu celular pela terceira vez em uns minutos. – Está esperando alguma ligação urgente? – Não, por quê? – Talvez porque a tela parece muito interessante? – Flagrei Rebeca mandando um áudio para ele hoje cedo. Essa coisa da senha do celular ser um desenho já não me parece tão útil. Sorte que descobri a tempo de apagar antes que ele ouvisse. – O que ela disse de tão terrível?