Eu e o hospital parecemos ter uma estranha ligação. Nos últimos seis meses, toda vez que meu coração ficava frio como gelo, os bancos do hospital sempre me faziam companhia.No silêncio da madrugada, o som desordenado de passos quebrou a tranquilidade do hospital.O que aconteceu com Bruno e Gisele finalmente chegou aos ouvidos da família Henriques.Karina, à frente de um grupo de seguranças vestidos de preto, veio em minha direção com passos rápidos.Se fosse antes, eu não teria dúvidas de que ela me daria um grande abraço e, preocupada, perguntaria se eu estava machucada.Mas, depois do que aconteceu da última vez, a relação entre mim e Gisele nunca mais poderia ser consertada. Afinal, Karina era a mãe biológica de Gisele, não a minha.Como esperado, a calma e elegância desapareceram, substituídas por ansiedade e uma testa franzida. Ela logo parou à minha frente e, com uma postura autoritária, perguntou:— Onde eles estão?Levantei os olhos levemente e olhei na direção da sala de cir
Karina desviou o olhar, sem me encarar enquanto falava. Disse: — Era filha de uma amiga, por que todo esse alvoroço? Depois de responder, soltou um suspiro e continuou. — Não vá se envolver com esse seu trabalho, se você ainda quer viver bem com a família Henriques, deve pedir demissão. Posso te apresentar a pessoas da alta sociedade, para você fazer amizades com jovens da sua idade. Olha como você está envolvendo a família Henriques nisso, Pietro tem passado várias noites sem dormir. O médico disse que a saúde dele piorou. Você quer o matar de preocupação? Agora que Gisele e seu irmão estão passando por isso. Ana, tenho sido boa com você, não é? Mas parece que você está aqui para cobrar dívidas! As mulheres da casa são o elo que une a família, mas você, olha o que fez!Ela falava com tristeza, deixando cair algumas lágrimas.Cerrei os dentes, realmente não queria brigar com ela na frente dos outros, mas se ela não se importava em jogar a culpa em mim, eu não ia aguentar calada!— Foi
O hospital era sombrio, com corredores silenciosos, e a luz amarelada ainda não havia sido trocada pela clareza do dia. Apenas sombras, tão tênues que pareciam prestes a se dissipar, me acompanhavam enquanto eu, trôpega, correu até o quarto privado no andar superior.Meu corpo, que havia esperado a noite inteira, começava a aquecer-se com o batimento acelerado do coração; meus pés frios recuperavam lentamente a sensação. Dentro do quarto, um homem estava tossindo, e eu lutava internamente: quando entrasse, deveria ou não levar um copo d’água para Bruno?Enquanto pensava, minhas pernas pareciam se desconectar do restante do corpo. Uma sensação intensa de formigamento subia dos pés, a ponto de eu não conseguir me mover. A tosse de Bruno persistia.Desesperada, ergui a barra do vestido, como se apenas ao olhar para os pés pudesse me certificar de que ainda estavam ali. Comecei a pisar lentamente sobre o espesso carpete, sem saber qual era a dor mais insuportável: a que atravessava me
Novo? Certo, Bruno ficou tão frio por tantos anos, e agora que se tornou uma chama ardente, cada momento ao seu lado seria uma experiência mágica. Como poderia não ser novo? Ri de mim mesma, lembrando-me de como tentava controlar meus sentimentos para não me afundar nisso, enquanto Bruno, como um explorador, armava armadilhas que considerava interessantes ou novas, tentando me puxar para dentro. Se eu caísse, tudo bem; eu via aquilo como um jogo adulto, aceitando a situação. Mas no final, tudo que obtive foi a revelação de que tudo era por Gisele. Ele estava brincando comigo por Gisele, apenas achando que eu era algo novo no processo. Aconteceu que Bruno era ainda mais habilidoso em esconder seus verdadeiros sentimentos. Acreditava que tinha armado um plano elaborado para irritar Gisele, buscando sua punição, mas percebi que Bruno tinha um esquema ainda mais sofisticado. Sua gentileza, seu carinho e suas declarações a meu respeito eram partes essenciais desse jogo. Tudo
Quanto mais nervosa, mais fácil cometia erro. Eu queria tanto fugir que, na pressa, esqueci de levantar a barra do vestido, e acabei caindo, envolta completamente no tecido, no chão. Maia ouviu o barulho e saiu correndo do quarto. — O que aconteceu? Você se machucou? — Ela perguntou, vindo me ajudar. — Cuidado! Se você se machucar, Bruno vai ficar preocupado. Baixei a cabeça e limpei as lágrimas com força; ao erguê-la de novo, sorri para ela e disse um "obrigada". Sabia que estava cheia de falhas naquele momento, mas minha personalidade competitiva me impediu de mostrar fraqueza diante da cúmplice que me humilhava. — Nada, já nos conhecemos, somos amigas, certo? Maia sorriu, empurrando-me na direção do quarto de Bruno. Não conseguia descrever o que sentia ao caminhar em direção a ele, passo a passo; meu coração parecia tremer. Eu não sabia quais palavras ainda mais dolorosas ele poderia me dizer. Era como ser levada a um verdadeiro tribunal de humilhação! Respirei fun
Fazia tempo que não via Bruno me olhar assim. Há algumas horas, sua expressão era suave, cheia de ternura, mas agora ele me encarava com os olhos semicerrados, a impaciência evidente. — Você estava ouvindo lá fora? Respirei fundo, forçando um sorriso despreocupado. — O que já foi dito, não deveria ser problema se outros ouvirem, ou será que o que você disse foi só por medo de que eu soubesse? Observava aquele rosto que conhecia tão bem, sentindo uma mistura de emoções complexas. Amor? Não, isso não se aplicava, pois meu coração já havia sido ferido demais por ele. Ódio? Também não, eu sabia que tinha minhas falhas e não esperava que ele me amasse de verdade. Talvez fosse a humilhação de me achar esperta, mas ainda assim ser enganada que me machucava tanto. Eu devia estar tão irritada com ele que meu coração doeu tanto ... tão desesperada ... O tempo entre nós parecia ter parado, e eu o encarei por um longo tempo, até que cheguei a uma conclusão. Um homem como Bruno
Bruno estava em uma situação extremamente difícil, mas eu não tive coragem de olhar para trás. Temia ver seu rosto pálido, com aqueles olhos escuros perdendo completamente o brilho. Com o pouco de racionalidade que me restava, chamei uma enfermeira, sem sequer pensar se uma enfermeira tão pequena conseguiria ajudar um homem tão alto. Saí do hospital em meio ao desespero, o mais rápido que consegui.As pétalas laranjas tremulavam ao vento. Além do túmulo dos meus pais, não sabia aonde ir para chorar livremente. Adultos pareciam assim: até para chorar, precisavam de uma razão, de um lugar adequado. Acreditei que conseguiria me libertar completamente. Mas quando realmente me encontrei de joelhos diante do túmulo deles, a intensidade da minha raiva e da minha angústia se tornaram suaves. O mais triste era que parecia que eu havia perdido a capacidade de chorar. Ou talvez essa relação disfuncional com Bruno fosse algo que eu não me atreveria a contar aos meus pais, restando-me apenas
De repente, tudo à minha frente começou a escurecer. Apoiei a cabeça no túmulo, sentindo uma dor lancinante, como se uma agulha prateada tivesse perfurado meu cérebro. Algumas memórias esquecidas começaram a ressurgir...Maia. Por isso eu achava seu rosto tão familiar, por isso sentia que já a havia visto em algum lugar. Bruno era bonito, vinha de uma família rica, e ao longo da vida, nunca consegui contar quantos admiradores ele teve, nem me importei. Quando era jovem, sempre pensava que um homem tão arrogante e distinto jamais poderia ser alcançado por alguém comum.Mas houve uma exceção. Uma vez, ele salvou uma garota que estava sendo intimidada pelos colegas. Depois disso, para protegê-la, ele permitiu que ela se aproximasse mais, até a apoiou em sua viagem ao exterior... Eu achava que ele era não só lindo, mas também gentil. E a garota era Maia...Gisele falou com uma indiferença despreocupada.— Comparada a ela, prefiro você. — Ela sorriu, lembrando sua antiga inocência. — Ana