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Entre Segredos e Desafios

O dia amanheceu com uma leve garoa que escorria pelas janelas do prédio da Moretti Jewels. Alexander chegou cedo ao depósito, vestindo novamente seu uniforme simples e assumindo sua identidade como Alex Rocha. As dores no corpo ainda eram evidentes, um lembrete constante do trabalho exaustivo que seus funcionários realizavam diariamente. Ele estava começando a entender o peso daquela rotina.

Ao entrar, encontrou Jorge, o supervisor, conversando com dois homens de terno. Eles seguravam pastas e pareciam analisar papéis com cuidado. A auditoria havia começado. Alexander notou a tensão no ar. Funcionários se moviam com mais cuidado, e as conversas eram murmuradas.

— Alex, venha aqui! — chamou Jorge, gesticulando para ele se aproximar.

Alexander apressou o passo e parou ao lado do supervisor.

— Esses são os auditores responsáveis pela inspeção. Eles vão revisar o estoque, e precisamos ajudá-los com o que for necessário. Pegue essas caixas e organize-as nas prateleiras, começando pelas que têm a etiqueta verde. Qualquer erro na contagem pode dar problema.

Alexander assentiu e começou a trabalhar. Enquanto movia as caixas, ouvia fragmentos das conversas entre os auditores e Jorge. Parecia haver uma preocupação com o estado dos equipamentos e a organização dos registros.

— Se continuarmos assim, vamos precisar justificar atrasos nas entregas. O sistema está defasado, e isso afeta a produtividade, disse um dos auditores, com um tom severo.

Alexander sentiu um incômodo crescente. Ele era o CEO dessa empresa, mas estava aprendendo mais sobre seus problemas em dois dias de disfarce do que em anos na liderança.


No meio da manhã, enquanto organizava as prateleiras, Alexander viu Clara passar com seu carrinho de limpeza. Ela parecia distraída, os olhos voltados para o chão enquanto empurrava o carrinho lentamente. Algo em sua expressão chamou sua atenção. Ela não tinha o brilho habitual que ele notara nos dias anteriores.

Alexander largou o que estava fazendo e foi até ela.

— Oi, Clara. Tudo bem?

Ela ergueu os olhos, surpresa pela abordagem.

— Oi, Alex. Sim, tudo bem. Só um dia mais cansativo do que o normal.

— Tem certeza? Você parece preocupada.

Clara suspirou e olhou ao redor, certificando-se de que ninguém estava por perto.

— É só que... essa auditoria me deixa nervosa. Ouvi dizer que, quando vêm aqui, sempre encontram algo para cortar. Um amigo meu perdeu o emprego da última vez. Não quero que isso aconteça comigo.

Alexander sentiu um nó na garganta. A realidade era mais dura do que ele imaginava. Enquanto ele pensava em balanços financeiros e expansão, seus funcionários temiam pelas próprias subsistências.

— Tenho certeza de que você não tem com o que se preocupar. Pelo que vi, você trabalha duro e faz tudo com perfeição. Não vão encontrar problemas.

Clara sorriu levemente, mas seus olhos ainda mostravam incerteza.

— Espero que você esteja certo. Obrigada, Alex. Você é gentil.

Antes que ele pudesse responder, Clara foi chamada por outra funcionária e se afastou. Alexander ficou parado por alguns instantes, absorvendo as palavras dela. Ele precisava fazer mais do que apenas observar.


Durante a tarde, a pressão no depósito aumentou. Jorge estava cada vez mais agitado, correndo de um lado para o outro para garantir que tudo estivesse em ordem. Alexander trabalhou ao lado de Pedro, que mantinha seu ritmo impressionante, mas também demonstrava sinais de cansaço.

— Esses caras sempre aparecem para procurar problemas. Nunca vi uma auditoria que não acabasse com alguém perdendo o emprego, comentou Pedro, enquanto empilhava caixas.

— Eles fazem isso com frequência? — Alexander perguntou, fingindo curiosidade.

— Uma vez por ano, pelo menos. Da última vez, cortaram metade da equipe de embalagem. Disseram que era para reduzir custos, mas depois contrataram um monte de gente temporária por menos dinheiro.

Alexander sentiu um peso no peito. As decisões que ele tomava no topo, baseadas em relatórios e planilhas, tinham consequências reais para pessoas como Pedro e Clara. Ele nunca havia realmente pensado nisso.

Quando a auditoria terminou, os auditores chamaram Jorge para uma reunião na sala de supervisão. Alexander percebeu que os funcionários ao redor estavam tensos, sussurrando entre si. Ele queria saber o que estava acontecendo, mas sabia que seria arriscado tentar se aproximar.


No final do turno, Alexander encontrou Clara novamente. Ela estava encostada em uma parede, o carrinho de limpeza ao lado, olhando para o chão como se tentasse organizar os próprios pensamentos.

— Clara? Está tudo bem?

Ela levantou os olhos lentamente, e Alexander viu que estavam marejados.

— Acho que vou ser cortada, Alex. Ouvi Jorge comentando algo sobre redução de custos no setor de limpeza. Eles vão contratar uma empresa terceirizada.

Alexander sentiu um misto de raiva e impotência. Ele queria dizer que aquilo não aconteceria, que faria algo para impedir, mas não podia revelar sua verdadeira identidade.

— Isso não está decidido ainda, certo? Talvez não seja tão ruim quanto parece.

— Espero que você esteja certo. Mas, no fundo, acho que eles não se importam com a gente. Somos apenas números para eles.

As palavras de Clara ecoaram na mente de Alexander enquanto ele voltava para casa naquela noite. Ele sabia que ela estava certa. E era isso que precisava mudar.

Sentado no sofá de seu apartamento, Alexander refletiu sobre os dois últimos dias. Ele havia aprendido mais sobre sua empresa e seus funcionários do que jamais aprendera em reuniões de diretoria. Mas saber não era suficiente. Ele precisava agir.

E, para isso, teria que ir ainda mais fundo.

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