Entrei na mansão aonde os meus pais trabalhavam há mais de trinta e cinco anos. Estava tudo silencioso, o que era bastante normal para um sábado, tendo em vista que já era noite e que os funcionários já deviam ter se recolhido a ala destinada a estes dentro da casa.
Como em todos os domingos o senhor Rodolfo, que era o dono da mansão e portanto, patrão dos meus pais, dava folga para a maioria deles, alguns já deviam até mesmo ter ido para suas respectivas casas.
O João Pedro havia me enviado uma mensagem mais cedo, chamando-me para ir até o seu quarto. Era algo normal, mas eu evitava encontros com a mãe do meu melhor amigo e então, consequentemente, eu evitava entrar na mansão.
A senhora Marta, que era esposo do senhor Rodolfo e mãe do João Pedro, não gostava de mim e apesar de nunca ter me destratado, eu sabia que ela não concordava nenhum pouco com a minha amizade com seu filho mais novo, pois ela não disfarçava o desagrado por me ver sempre ao lado do João Pedro.
Nós éramos melhores amigos desde sempre e ela nunca conseguiu afastá-lo de mim. Diferentemente do seu outro filho, o João Felipe, que fazia de tudo para não ter contato algum comigo, para não contrariar os desejos de sua mãe.
Apesar de crescermos juntos, o João Felipe sempre fez de tudo para me manter distante, o que sempre me deixou triste com isso. E apesar de me deixar muito magoada, eu nunca deixei transparecer os meus sentimentos. Nem mesmo o João Pedro sabia ao certo quais eram os meus pensamentos sobre essa distância imposta por seu irmão e respeitava a minha reserva e não insistia nesse assunto, o que eu ficava muito grata.
Quando eu era criança, que não entendia direito as ações das pessoas e as suas motivações, vivia insistindo em ficar junto ao Felipe, o considerava meu amigo. E assim foi até que um dia ouvi uma conversa entre ele e seus amigos da escola, combinando uma festinha na piscina da casa do Ricardo Alcântara, o qual era seu amigo inseparável.
O Ricardo pedia para que ele não me levasse na tal festa. As palavras que ouvi naquele dia me machucavam até hoje e me fez entender o meu lugar na vida dos que considerava como iguais a mim, até aquele momento.
- Vai ser a melhor festa na piscina que você já foi! Todo mundo vai estar lá. - Falou o Nicolas Alcântara, que era primo do Ricardo e também amigo do João Felipe.
- Mas você não pode levar a filha dos empregados não, está ouvindo João Felipe? E se o João Pedro insistir, eu retiro o convite que fiz a ele. Aquela menina não pertence ao mesmo meio social que nós. Não devemos nos misturar com ela. - O Ricardo falou.
- Não precisa nem se preocupar, Ricardo! Jamais passou pela minha cabeça levar aquela garota nesta festa! Eu vou com a Alicia e ela odeia a Vivi. - Respondeu o João Felipe com expressão de nojo.
Ouvir a forma como eles falavam de mim me deixou totalmente sem chão! Não consegui nem ouvir o restante da conversa, pois saí de maneira sorrateira em outra direção a que eles estavam, para que não me vissem e a minha humilhação fosse ainda maior.
Eu fiquei tão triste, que durante alguns dias não quis ir as aulas. A decepção foi tamanha que fiquei até com febre e de cama. Eu tinha então dezesseis anos e o João Felipe dezenove. Ele era três anos mais velho que seu irmão, o João Pedro.
A partir daquele dia eu entendi de uma vez por todas que eu não era um deles e nunca seria.
Depois disso, fiz de tudo para me afastar dos filhos dos patrões dos meus pais e procurei fazer novas amizades, com alunos que fossem mais próximos a minha realidade econômica, como os alunos bolsistas.
Apesar das minhas tentativas de afastamento, o João Pedro nunca aceitou a distância que eu tentava colocar entre nós, e mesmo com toda a implicância da sua mãe e suas outras amizades insistirem que ele não deveria me levar em todos os lugares, pois eu não fazia parte do círculo social deles, nós éramos melhores amigos até hoje.
Optamos até pela mesma faculdade, apenas cursos diferentes, pois ele estava cursando administração enquanto eu havia escolhido serviço social e nós continuávamos a considerar um ao outro como irmãos.
Chego ao quarto do João Pedro e já vou girando a maçaneta da porta, sem nem mesmo bater. Nós tínhamos esse nível de intimidade.
Ele estava deitado em sua cama, vendo TV. Seu quarto era enorme, com uma cama King Size bem no centro, e era todo decorado em tons de cinza e azul marinho. Era tudo bem masculino, e eu gostava bastante do estilo do João Pedro, que apesar de todo o luxo e riqueza, não era fútil nem se deixava levar por aparências.
- Até que enfim você chegou. - Falou, me olhando de cara feia e levantando-se da cama.
- Não me venha com reclamações! Você sabe que detesto entrar aqui na mansão. Ainda venho por amizade a você, seu mal-agradecido. - Falei exasperada, mas sorrindo internamente. - O que aconteceu? Por que todo esse drama?
- Só que eu estou entediado dentro de casa e quero sair e me divertir. Sábado à noite não é dia de ninguém ficar em casa, vendo TV, muito menos um cara como eu, gato e descolado. - Falou com um grande sorriso no rosto. - E eu já falei que você pode vir aqui a hora que você quiser! Tem toda a liberdade pra isso. Meu pai sempre garantiu seu acesso a tudo que nós temos, você que vive cheia de orgulho.
- Mas você é muito cara de pau mesmo viu, João Pedro! Me fez vir até aqui só pra falar isso? Por que não falou por mensagem? Poderíamos ter combinado tudo sem que eu viesse pessoalmente aqui! - Falei sorrindo.
Eu amava sair com o João Pedro, a gente se divertia muito.
- E sobre vir aqui, o seu Rodolfo é uma pessoa especial e gosto muito dele, mas a sua mãe não me suporta e eu não gosto quando ela fica me olhando de cara feia.
- Te chamei aqui por quê queria que você me ajudasse a escolher um look que valorize toda a minha beleza. E sobre a Dona Marta, você sabe que meu pai sabe lidar muito bem com ela.
Eu o olhei e só acreditei que o que o assunto que ele considerava urgente era a escolha de sua roupa, por que se tratava do meu amigo. Os anos passavam, mas parece que tudo continuava igual. Nem adiantava dizer a ele que eu não era boa no aasunto, pois o João Pedro dizia que eu era mulher e sabia do que as mulheres gostavam.
- Então vamos lá. Por quê já são mais de 20 horas e eu não gosto de sair tarde...
Escolhemos a roupa do João Pedro e ainda ficamos terminando de ver o seriado que ele estava assistindo quando cheguei. Nós éramos fãs e sempre estávamos vendo reprises dos episódios daquela série.
Quando percebi que já eram mais de vinte e uma horas, saí às pressas do quarto dele e voltei para minha casa, disposta a me arrumar.
Chegamos na balada já passava das vinte e três horas. Era impressionante como João Pedro demorava tanto para se arrumar, muito mais que eu mesma
Mas pensando bem, eu não tinha tantas opções de roupa assim, para demorar tanto tempo escolhendo. Ele às vezes até reclamava e insistia em querer me comprar roupas, mas eu não aceitava. Já bastava tudo o que seu pai fazia por mim.
Agora ele não mais precisava pagar por meus estudos, pois eu havia entrado em uma universidade pública, mas sempre tinham custos e a forma que ele encontrou de continuar a me ajudar, foi me presenteando com uma poupança no meu aniversário de 18 anos e eu não me senti bem em recusar, até por que seria muito bem vinda aquela ajuda para os anos seguintes, durante a faculdade.
Havíamos combinado de encontrar alguns amigos dentro da boate e foi com certa dificuldade que localizamos eles, pois estava muito cheio, mas nada fora do normal para um sábado à noite.
Nós tínhamos combinado de sair com a nossa turma de amigos de sempre, que eram a Cecília, o César e a Júlia.
- Vocês demoraram! - Foi logo reclamando a Cecília.
Ela estudava administração com o João Pedro e era o que se considerava um "mulherão", com seu corpo bem torneado pelos exercícios físicos constantes, pois era "viciada em academia", nas suas próprias palavras. Eles haviam se conhecido desde o primeiro semestre e acabamos nos tornando bons amigos.
Ela trabalhava como modelo fotográfico e era linda, com seus longos cabelos cacheados de um loiro natural e tinha belíssimos olhos claros, em um tom de azul que se destacava no rosto.
- Ah, amiga. Reclama aqui com o JP. Ele que é culpado da nossa demora. - Eu falei alto, tentando me fazer ouvir por cima do barulho do som e das conversas ao nosso redor.
- Normal! JP sempre cheio das frescuras. - Reclamou o César.
O César era nosso amigo já há muitos anos, pois havia estudado junto conosco durante toda a escola, na mesma sala que nós e só nos separamos quando optamos por universidades diferentes. Ele estava terminando o curso de Direito em outra instituição e era um moreno muito bonito, um pouco mais baixo que o João Pedro, que passava dos 1,85 de altura.
- Concordo com você, César! Não sei por que tanta demora para escolher uma roupa. - Falei levantando os olhos para o alto. - Eu visto a primeira que aparecer na minha frente.
- Gente, vocês hoje estão mais chatos que de costume. Vamos beber que a noite é uma criança. - João Pedro falou, enquanto olhava atentamente para o outro lado da boate.
- Isso mesmo JP. Vamos parar de enrolação e vamos beber. - Julia gritou, parecendo já bastante animada.
A Júlia era uma amizade recente, pois nós a conhecemos através da Cecília, há um ano e desde então que ela sempre estava conosco. Elas eram amigas de infância, quando moravam em uma cidade do interior do estado e dividiam um apartamento aqui em São Paulo desde que a Júlia veio estudar em uma faculdade paulistana.
A Júlia era uma baixinha muito bonita e extrovertida, que fazia amizade muito facilmente. Tinha longos cabelos pretos e olhos castanhos claros muito expressivos. Um amor de menina, sempre de bem com a vida.
- Concordo com você, Júlia. Vamos beber e esquecer desses chatos. - João Pedro falou, depois que parou de observar o que quer que seja do outro lado da boate, perto do bar. E foi o que aconteceu.
O clima continuou descontraído enquanto nos divertimos entre amigos, pois já estávamos todos acostumados com a personalidade de cada um.
VivianeEu não estava bebendo, pois sempre que saia com o João Pedro, nos revessávamos na direção. Hoje ele poderia beber a vontade que eu iria dirigir.Como eu não tinha carro, apesar da insistência do senhor Rodolfo em querer me presentear com um veículo, eu jamais poderia aceitar um presente tão caro e ele sabia disso tão bem, pois conhecia os meus pais desde que era um jovem ainda. Meus pais concordavam comigo e eu vivia das caronas que o JP me dava e hoje estávamos com o carro dele.O meu amigo estava lá no bar já algum tempo, conversando com um cara que eu não reconheci, imaginei então que já havia feito uma nova amizade, algo que ele sempre fazia. Decidi ir ao banh
João FelipeAcordei com uma dor de cabeça terrível. Nada fora do normal, pois eu tinha exagerado na bebida ontem e sabia que haveriam consequências. Sempre tinha, quando o assunto era bebida em excesso.Cheguei à cozinha a procura de alguém que pudesse me dá um analgésico, mas apesar de estar tudo em ordem, não havia ninguém por lá. Lembrei então que era domingo, dia de folga de quase todos os funcionários da casa.Subi a procura do meu irmão, bati em sua porta e chamei repetidas vezes, mas ele não respondeu. Tentei a fechadura e vi que estava apenas encostada.Ao entrar em seu quarto e ver que ainda estava dormindo pesado, pensei que ele devia ter exagerado na bebida tanto quanto eu.Suspirei e fui até o seu banheiro, a procura de algum remédio que pudesse aliviar essa dor infernal na minha c
João FelipeDeixei o carro na garagem e entrei em casa muito irritado.Estava chegando em frente à minha casa, quando me deparo com a Viviane abraçando e beijando um idiota dentro de um carro parado. Ela desceu rapidamente após isso, com um sorriso enorme, o que quase me fez ir até eles e dizer alguma besteira.Era por estas coisas que eu preferia me distanciar. Não aguentaria ver essas cenas e não fazer nada. Eu era uma pessoa controlada, mas o forte sentimento que tinha por aquela garota me deixava fora de orbita.Joguei as chaves em cima de um aparador ao lado da porta da sala de visitas com certa f&
João FelipeDepois da saída da Vivi, meu irmão tentou me passar um sermão sobre educação e como devemos tratar as pessoas bem, todo um discurso que ele sempre insistia em fazer, em todas as vezes que não gostava da forma como eu tratava sua amiguinha.Acabamos discutindo e eu saí sem me importar realmente com o que ele falava. Afinal, eu estava começando a me perguntar se eles não tinham nenhum tipo de relacionamento amoroso mesmo.A festa na casa da Alicia já estava acontecendo quando cheguei lá e eu iria aproveitar para tentar encontrar alguma mulher para sairmos juntos. Em outras palavras, alguma mulher para me fazer esquecer a Vivi que encontrei ao retornar ao Brasil. Uma Viviane já totalmente mulher, cheia de curvas e c
VivianeMeus pais haviam recebido dois dias de folga, pois os Mendes de Albuquerque tinham viajado para o Guarujá e dispensado todos os funcionários da mansão, com exceção dos seguranças, é claro.Aproveitando essa oportunidade, eles decidiram ir passar sua folga em Jundiaí, visitando minha tia Soraia, irmã da minha mãe.Aproveitei o dia todo para estudar e quando a noite chegou, fui a cozinha apenas pegar alguma coisa para comer e voltei a me dedicar aos estudos.Já passava das vinte e três horas quando eu decidi descansar e depois se tomar mais um banho, fui deitar. A noite estava bem quente e abafada e fiquei rolando na cama, tanto devido ao calor, como pelos pensamentos que não me deixavam em paz.Quando eu estava estudando, conseguia não pensar no João Felipe e aquele sentimento incômodo que sent
VivianeNós estávamos nos beijando! Como para confirmar que aquilo era mesmo real, e não apenas mais um sonho como tantos outros que eu já havia tido com o João Felipe, me agarrei ainda mais ao seu corpo, sem conseguir acreditar totalmente no que estava acontecendo naquele momento.Eu sentia suas mãos em todos os lugares ao mesmo tempo e a sensação era maravilhosa.Mesmo negando os meus sentimentos, eu sempre esperei por este momento, só nunca quis aceitar que, mesmo diante de tantas mágoas causadas pelo João Felipe, eu ainda pudesse sentir algo de bom por ele.E foi exatamente por lembrar de suas palavras, de tantas coisas que saíram de sua boca e que me magoaram, que eu tentei me afastar.- Me larga, João Felipe! - Falei, me desvencilhando dele.- Eu quero você e não aguento mais fingir que n&atild
João Felipe Acordei sentindo um corpo quente aconchegado ao meu, olhei em torno e vi que estava em meu quarto, na mansão dos meus pais em São Paulo. Rapidamente lembrei de tudo que havia acontecido ontem, depois que cheguei do encontro com meus amigos em um barzinho da capital. Olhei para Vivi, que ainda dormia tranquilamente, com braços e pernas por cima de mim. Foi uma noite maravilhosa e um sexo espetacular, mas, apesar de eu ter calculado meus passos e saber que fiz o que estava com vontade há muito tempo, eu sabia que aquilo não era o certo. Eu não poderia assumir uma relação com a Viviane. Minha mãe jamais me perdoaria. Também não queria me manter afastado da Vivi, principalmente agora que experimentei do seu corpo e vi o quanto somos bons juntos. Decidi que poderíamos manter nosso envolvimento em segredo e que eu a teria comigo, sem precisar estragar os meus planos para o futuro.<
João FelipeEstava terminando de me vestir e ainda não sabia como faria para pegar a Viviane sem que a colocasse em uma situação desconfortável. Não poderia simplesmente pedir para que ela me esperasse na esquina! Jamais faria uma sugestão como essa para ela. Tampouco poderia arriscar todos os meus planos para o futuro, me colocando em uma situação em que algum conhecido pudesse nos flagrar juntos.Que saia justa!Ainda estava em frente ao espelho, analisando toda a situação e tentando chegar a uma "solução" para meu impasse, quando mamãe entrou em meu quarto.- A porta estava aberta, mesmo assim eu ainda bati e você não me ouviu. - Ela explicou ao ver minha expressão questionadora. - Está muito pensativo esses dias. Algo na empresa?Minha mãe era uma belíssima mulher, na