PeterO escritório de Jessica está silencioso quando entro, ignorando os protestos de sua secretária. Ela ergue os olhos de sua mesa, um sorriso satisfeito brincando em seus lábios vermelhos.— Sabia que viria — ela diz, recostando-se em sua cadeira.— Chega de jogos — atravesso a sala em três passadas. — O que está tentando fazer?— Tentando? — ela acaricia a barriga ainda lisa. — Estou apenas lidando com as consequências dos nossos atos.— Que atos? Nada aconteceu naquela noite!Jessica se levanta lentamente, contornando a mesa.— Oh, Peter — sua voz é quase piedosa. — Você estava tão bêbado. É natural que não se lembre.Algo gelado desce por minha espinha.— Do que está falando?— Daquela noite no hotel — ela se aproxima. — Depois que tentou se consolar comigo no corredor. Você voltou, lembra? Depois de todas aquelas doses de uísque...— Não — balanço a cabeça. — Eu voltei para o quarto.— Primeiro veio ao meu — ela toca meu braço e me afasto como se queimasse. — Estava tão perdido
EmmaO salão do Metropolitan está deslumbrante, como sempre acontece no baile anual de caridade. Cristais cintilam, vestidos de grife rodopiam, taças de champanhe tilintam em brindes superficiais.E aqui estou eu, de braço dado com meu marido, sorrindo como se meu mundo não estivesse desmoronando.— Você está linda — Peter sussurra, e odeio como meu corpo ainda reage à sua voz.Estou usando uma de minhas próprias criações, um vestido azul meia-noite que demorei semanas para desenhar e fazer. Antes de tudo desabar, planejava que esta noite fosse especial. Nossa primeira aparição oficial como um casal realmente apaixonado.Que ironia.— Não precisa fingir quando não tem ninguém por perto — murmuro de volta, mantendo o sorriso social.— Não estou fingindo.Antes que possa responder, minha mãe se aproxima, arrastando alguma socialite que precisa conhecer "o casal do momento".— Emma, querida! — a mulher exclama, me analisando dos pés à cabeça. — Que vestido magnífico! É um Valentino?— É
Emma ParkerA música suave tocada pelo quarteto de cordas ecoa pelas paredes de pedra da catedral, reverberando nos bancos e altas colunas. Caminho lentamente pelo corredor central, meu braço entrelaçado ao do meu pai, Albert. O vestido branco que visto parece pesar toneladas, não tanto pelo tecido, mas pelo fardo que ele carrega: hoje, estou prestes a me casar com Peter Blackwood, um homem que não escolhi. A cada passo, sinto o olhar atento dos convidados, todos aguardando o momento em que direi “sim” e selarei o acordo que minhas famílias teceram.Meu coração está apertado, minha respiração, instável. Eu não quero esse casamento. Nunca quis. Vi Peter poucas vezes, e, embora ele seja um homem muito bonito, nunca houve nenhuma afinidade real entre nós. Ele sempre traz um sorriso debochado e arrogante nos lábios. E sei que faz sucesso entre as mulheres, mas eu não sou uma dessas. Eu acredito no amor genuíno e relacionamentos monogâmicos. Antiquado? Talvez. Mas sou assim. No entanto, pa
EmmaA atmosfera no salão da catedral é de celebração contida. Os convidados agora se movimentam, preparados para seguir até o local da recepção, onde fotos, discursos e brindes os aguardam. Estou parada perto de uma coluna, tentando digerir o que acabei de testemunhar. Peter beijando outra logo após nos casarmos. Uma traição escancarada, consumada segundos após a cerimônia. Meu marido. Minha amiga de longa data, ou ao menos alguém que eu considerava próxima. Quanta ironia.Eu me mantenho imóvel, o buquê ainda entre os dedos, a respiração curta. Minha mãe passa por mim, disfarçando, e sussurra em tom baixo:— Não faça um escândalo agora, Emma. Lembre-se do que está em jogo.Ela segue adiante, cumprimentando alguém. Estou sozinha com minha raiva e minha humilhação. Deveria confrontá-los? Deveria gritar? As palavras do meu pai ainda ecoam na minha cabeça: não estrague tudo, ou perderemos o que temos. Maldita chantagem emocional.Então vejo Peter se aproximar. Vem da direção do corredor
Peter Não acredito em casamentos arranjados. Na verdade, passo minha vida desprezando a ideia de me unir a alguém por mera conveniência. Cresci como o filho de James Blackwood, herdeiro de uma fortuna e de uma empresa colossal, mas também entendo cedo que esse tipo de vida exige sacrifícios, e geralmente não são os meus desejos pessoais que importam. Ainda assim, quando meu pai me comunica, meses atrás, que devo me casar com Emma Parker para garantir a fusão entre nossas famílias, eu resisto com toda a minha energia. Argumento, discuto, nego. No fim, percebo que não tenho escolha: ou aceito esse “acordo” ou perco meu lugar na empresa, além de todo o apoio financeiro que mantém meu estilo de vida.Minha fama de playboy talvez faça as pessoas pensarem que encaro este casamento sem problemas. Afinal, sou Peter Blackwood, o típico herdeiro que poderia exibir uma esposa perfeita em público, enquanto me divirto por aí. Mas não consigo me sentir bem com isso. Nunca fui santo, claro, mas tam
EmmaA recepção do casamento acontece em um salão anexo à catedral, decorado com arranjos florais majestosos e lustres cintilantes. Convidados conversam euforicamente, taças de champanhe circulam, e o cheiro de canapés refinados permeia o ar. Tudo parece perfeitamente planejado, como se nada pudesse macular a harmonia deste momento tão importante para as duas famílias.Entro no salão, ainda sentindo o gosto amargo da traição na garganta. Minha mente gira em torno das últimas cenas: Peter com Jessica no camarim, o tapa que dei nele, a reação estupefata do meu “marido”. O beijo... Preciso manter a compostura, mas um fogo arde dentro de mim, clamando por justiça.Quando avisto Jessica, parada próxima a uma mesa ornamentada, sinto o estômago contrair. Ela está mais distante dos pais de Peter, conversando com duas mulheres que não conheço. Dou alguns passos em direção a ela. Preciso falar, nem que seja apenas para deixar claro que sei o que aconteceu. Antes, contudo, olho ao redor, certifi
EmmaA orquestra passa para uma música mais ritmada, convidando os recém-casados à pista de dança. Todos os olhares se voltam para nós: Peter e eu, o casal do dia, a grande atração. A expectativa é que façamos a primeira dança juntos, uma apresentação pública do nosso “afeto”. Sinto o estômago embrulhar, mas não há escapatória.Meu pai aproxima-se com um sorriso tenso, seguido por James Blackwood. Eles trocam alguns comentários sobre a festa, elogiando a decoração, a música, o buffet. Minha mãe e Margaret Blackwood também estão por perto. Todos parecem satisfeitos com o progresso do evento, ignorando o turbilhão pessoal que vivo.— Emma, Peter, é hora da dança — diz meu pai, num tom que não aceita recusa.Peter se aproxima, esboçando um sorriso que não atinge os olhos. Eu encaro seu rosto, lembrando-me do tapa que dei nele, do beijo com segundas intenções. Ele não comenta nada, apenas me estende a mão, de forma desafiadora. Engulo a raiva, aceito sua mão e seguimos para o centro do sa
EmmaA madrugada avança e, finalmente, os convidados começam a partir. A maior parte das formalidades já foi cumprida: danças, fotos, brindes, conversas superficiais. Agora, antes de seguirmos para o aeroporto, preciso voltar ao camarim para trocar de roupa. Peter está ocupado conversando com o pai e alguns sócios, garantindo que tudo pareça perfeito até o último segundo.Caminho pelos corredores silenciosos rumo ao camarim. O som da música diminuiu, apenas um murmúrio distante. Ao chegar lá, vejo meu reflexo no espelho: o vestido branco, antes um símbolo de pureza, agora parece um manto pesado de mentiras. Minha maquiagem permanece impecável, mas meus olhos mostram cansaço e desilusão. Pego um lenço e o passo de leve no canto do olho, tentando não borrar a maquiagem.De repente, a porta se abre. Minha mãe entra, fechando-a suavemente atrás de si. Esperava encontrar algum gesto de conforto dela, mas é pura ilusão. Seu olhar frio me avalia, estudando cada detalhe. Por um segundo, penso