Emma
A recepção do casamento acontece em um salão anexo à catedral, decorado com arranjos florais majestosos e lustres cintilantes. Convidados conversam euforicamente, taças de champanhe circulam, e o cheiro de canapés refinados permeia o ar. Tudo parece perfeitamente planejado, como se nada pudesse macular a harmonia deste momento tão importante para as duas famílias.
Entro no salão, ainda sentindo o gosto amargo da traição na garganta. Minha mente gira em torno das últimas cenas: Peter com Jessica no camarim, o tapa que dei nele, a reação estupefata do meu “marido”. O beijo... Preciso manter a compostura, mas um fogo arde dentro de mim, clamando por justiça.
Quando avisto Jessica, parada próxima a uma mesa ornamentada, sinto o estômago contrair. Ela está mais distante dos pais de Peter, conversando com duas mulheres que não conheço. Dou alguns passos em direção a ela. Preciso falar, nem que seja apenas para deixar claro que sei o que aconteceu. Antes, contudo, olho ao redor, certificando-me de que não causei alarde até agora.
Jessica nota minha aproximação. Seus olhos se arregalam por um segundo, talvez surpresa com a minha coragem de chegar tão perto. Ela estava evitando me encontrar, tenho certeza. Sempre a conheci como alguém sorridente, doce, que me elogiava nos jantares, perguntava sobre meus gostos. Era, até pouco tempo, uma conhecida agradável, alguém que eu poderia chamar de amiga. Ou ao menos achava isso.
— Emma… — ela começa, a voz tensa.
— Não diga meu nome assim, Jessica — corto, mantendo o tom baixo, para não atrair a atenção dos outros convidados. — Se preferir, use o nome da mulher que você traiu hoje, quando beijou meu marido no camarim.
Ela empalidece. Seus lábios se entreabrem, mas nenhuma palavra sai de imediato. Seus olhos desviam por um instante para ver se alguém nos observa. A orquestra toca uma valsa lenta, casais dançam lá no fundo. Nós duas estamos próximas a uma mesa lateral, parcialmente escondidas por arranjos de flores. Um lugar perfeito para um confronto contido.
— Emma, não foi… não é o que você pensa — a voz de Jessica falha.
— Não é? Você está dizendo que eu não vi você nos braços do meu marido? — retruco, mantendo a máscara de elegância no rosto, apesar da fúria. — Nós sempre fomos cordiais uma com a outra, Jessica. Por que fez isso?
Ela respira fundo, endireitando a postura. Algo muda no olhar dela: sai do papel de menina culpada e assume um tom defensivo, talvez até agressivo.
— Você não entende, Emma. Vocês podem ter se casado, mas isso é só um acordo. Não há amor entre vocês. Peter e eu… nós temos uma história — diz, com uma ponta de desdém.
Meu sangue ferve. Ela está me jogando na cara que não sou nada além de um obstáculo? Que as alianças em nossos dedos não significam nada? Mantenho minha voz baixa, mas firme:
— História ou não, você sabia que estávamos prestes a nos casar. Sabia que isso não foi ideia minha. Ainda assim, escolheu trair minha confiança. Por quê? Precisa tanto dele que não pode respeitar nem o dia do meu casamento?
Jessica aperta os lábios, sua expressão endurece. Está nervosa, mas não recua:
— Não se faça de inocente, Emma. Você sabe que esse casamento é só um papel assinado pelas duas famílias. Não há sentimento entre vocês. Peter e eu não começamos hoje, e não é um acordo empresarial que vai mudar os sentimentos dele. Você será a esposa no papel, eu serei a mulher que ele ama.
Suas palavras me atingem como um soco no estômago. Ela praticamente confessa que acredita ser a escolhida do coração dele, enquanto eu sou apenas a peça colocada no tabuleiro pelos nossos pais. Sinto meus olhos marejarem, mas não deixo a lágrima cair. Não, não na frente dela.
— Você era minha amiga, Jessica. Ou ao menos eu pensava assim — digo, com a voz trêmula de raiva e decepção. — Eu não pedi por esse casamento, não pedi por essa farsa. Mas ainda assim, você decidiu trair minha confiança, aproveitar-se da situação para tomar o que não é seu.
Ela cruza os braços, jogando o cabelo para trás com um movimento rápido.
— Era sua amiga, sim. Mas não podia fazer nada se as nossas famílias decidiram isso. Ou você acha que estou feliz com essa situação? Eu e Peter… nós nos amamos há tempos. Só que vocês o amarraram a um contrato. E você, o que fez? Aceitou sem lutar. Agora quer posar de vítima?
Engulo em seco. Ela me acusa de não ter lutado? Ela, que se escondeu nas sombras, esperando o momento de assaltar o camarim do noivo? Minha raiva cresce, mas me lembro do que está em jogo. Minha família depende desse casamento. E, se eu fizer um escândalo, quem sofre as consequências sou eu.
— Eu não tive escolha — respondo, a voz contida, as unhas cravando na palma da mão que segura o buquê. — Não se atreva a me culpar por algo que nunca pedi. E não venha me dizer que é inocente. Você me machucou, feriu a amizade que tínhamos. De agora em diante, não tente fingir cordialidade comigo.
Jessica arqueia a sobrancelha, um sorriso frio surge em seus lábios:
— Amizade? Emma, você nunca foi minha prioridade. Eu amo Peter. Você só chegou para estragar tudo. E saiba de uma coisa: você nunca será o amor dele. Casados ou não, será apenas no papel. Você é um adereço, uma peça de barganha. Ele não vai te amar. Pode se esforçar, fingir que não viu nada hoje, se tornar a esposa perfeita. Nada disso mudará o fato de que o coração dele não é seu.
Essas palavras finais dela cortam fundo, como lâminas. Nunca será meu, ela diz. Sou apenas uma mulher com um título, sem amor, sem real conexão. Sinto a garganta apertar, mas não vou chorar. Não na frente dela. Se ela quer me ver fraca, não darei esse prazer.
Respiro fundo, viro o rosto e me afasto, pisando firme no chão. Meu vestido arrasta-se pelo piso encerado. Preciso me recompor antes de enfrentar as fotos, a dança, a lua de mel. Jessica permanece parada, provavelmente vitoriosa por ter dito o que queria.
Caminhando pelo salão, sinto a presença de Peter em algum lugar. Ele está conversando com convidados, sorrindo aqui e ali, fingindo que tudo está perfeito. Tento não olhar, manter a cabeça erguida. As palavras de Jessica ecoam em meus ouvidos: “Você nunca será o amor dele.”
Nada mais poderá arruinar essa noite, pois ela já está arruinada. Sou refém de um casamento sem afeto, refém de uma traição já no primeiro dia. Minha “amiga” provou ser uma inimiga, apunhalando-me com a verdade cruel. Mas se ela pensa que vou me curvar, está enganada. Vou suportar, vou resistir. Tenho que ser forte, mesmo que cada minuto doa.
Jessica se mostrou quem é. Eu sei quem Peter realmente deseja. E eu? Eu me encontro presa nesse contrato, sem amor, mas com muita coisa em jogo. Não posso sair, não posso desistir. Tenho que manter a postura, custe o que custar.
EmmaA orquestra passa para uma música mais ritmada, convidando os recém-casados à pista de dança. Todos os olhares se voltam para nós: Peter e eu, o casal do dia, a grande atração. A expectativa é que façamos a primeira dança juntos, uma apresentação pública do nosso “afeto”. Sinto o estômago embrulhar, mas não há escapatória.Meu pai aproxima-se com um sorriso tenso, seguido por James Blackwood. Eles trocam alguns comentários sobre a festa, elogiando a decoração, a música, o buffet. Minha mãe e Margaret Blackwood também estão por perto. Todos parecem satisfeitos com o progresso do evento, ignorando o turbilhão pessoal que vivo.— Emma, Peter, é hora da dança — diz meu pai, num tom que não aceita recusa.Peter se aproxima, esboçando um sorriso que não atinge os olhos. Eu encaro seu rosto, lembrando-me do tapa que dei nele, do beijo com segundas intenções. Ele não comenta nada, apenas me estende a mão, de forma desafiadora. Engulo a raiva, aceito sua mão e seguimos para o centro do sa
Emma ParkerA música suave tocada pelo quarteto de cordas ecoa pelas paredes de pedra da catedral, reverberando nos bancos e altas colunas. Caminho lentamente pelo corredor central, meu braço entrelaçado ao do meu pai, Albert. O vestido branco que visto parece pesar toneladas, não tanto pelo tecido, mas pelo fardo que ele carrega: hoje, estou prestes a me casar com Peter Blackwood, um homem que não escolhi. A cada passo, sinto o olhar atento dos convidados, todos aguardando o momento em que direi “sim” e selarei o acordo que minhas famílias teceram.Meu coração está apertado, minha respiração, instável. Eu não quero esse casamento. Nunca quis. Vi Peter poucas vezes, e, embora ele seja um homem muito bonito, nunca houve nenhuma afinidade real entre nós. Ele sempre traz um sorriso debochado e arrogante nos lábios. E sei que faz sucesso entre as mulheres, mas eu não sou uma dessas. Eu acredito no amor genuíno e relacionamentos monogâmicos. Antiquado? Talvez. Mas sou assim. No entanto, pa
EmmaA atmosfera no salão da catedral é de celebração contida. Os convidados agora se movimentam, preparados para seguir até o local da recepção, onde fotos, discursos e brindes os aguardam. Estou parada perto de uma coluna, tentando digerir o que acabei de testemunhar. Peter beijando outra logo após nos casarmos. Uma traição escancarada, consumada segundos após a cerimônia. Meu marido. Minha amiga de longa data, ou ao menos alguém que eu considerava próxima. Quanta ironia.Eu me mantenho imóvel, o buquê ainda entre os dedos, a respiração curta. Minha mãe passa por mim, disfarçando, e sussurra em tom baixo:— Não faça um escândalo agora, Emma. Lembre-se do que está em jogo.Ela segue adiante, cumprimentando alguém. Estou sozinha com minha raiva e minha humilhação. Deveria confrontá-los? Deveria gritar? As palavras do meu pai ainda ecoam na minha cabeça: não estrague tudo, ou perderemos o que temos. Maldita chantagem emocional.Então vejo Peter se aproximar. Vem da direção do corredor
Peter Não acredito em casamentos arranjados. Na verdade, passo minha vida desprezando a ideia de me unir a alguém por mera conveniência. Cresci como o filho de James Blackwood, herdeiro de uma fortuna e de uma empresa colossal, mas também entendo cedo que esse tipo de vida exige sacrifícios, e geralmente não são os meus desejos pessoais que importam. Ainda assim, quando meu pai me comunica, meses atrás, que devo me casar com Emma Parker para garantir a fusão entre nossas famílias, eu resisto com toda a minha energia. Argumento, discuto, nego. No fim, percebo que não tenho escolha: ou aceito esse “acordo” ou perco meu lugar na empresa, além de todo o apoio financeiro que mantém meu estilo de vida.Minha fama de playboy talvez faça as pessoas pensarem que encaro este casamento sem problemas. Afinal, sou Peter Blackwood, o típico herdeiro que poderia exibir uma esposa perfeita em público, enquanto me divirto por aí. Mas não consigo me sentir bem com isso. Nunca fui santo, claro, mas tam