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Capítulo 5 - A Valsa das Aparências

Emma

A orquestra passa para uma música mais ritmada, convidando os recém-casados à pista de dança. Todos os olhares se voltam para nós: Peter e eu, o casal do dia, a grande atração. A expectativa é que façamos a primeira dança juntos, uma apresentação pública do nosso “afeto”. Sinto o estômago embrulhar, mas não há escapatória.

Meu pai aproxima-se com um sorriso tenso, seguido por James Blackwood. Eles trocam alguns comentários sobre a festa, elogiando a decoração, a música, o buffet. Minha mãe e Margaret Blackwood também estão por perto. Todos parecem satisfeitos com o progresso do evento, ignorando o turbilhão pessoal que vivo.

— Emma, Peter, é hora da dança — diz meu pai, num tom que não aceita recusa.

Peter se aproxima, esboçando um sorriso que não atinge os olhos. Eu encaro seu rosto, lembrando-me do tapa que dei nele, do beijo com segundas intenções. Ele não comenta nada, apenas me estende a mão, de forma desafiadora. Engulo a raiva, aceito sua mão e seguimos para o centro do salão, onde um espaço é aberto para nós.

A música começa suave, e Peter me conduz. Sua mão na minha cintura emana calor, mesmo sobre o tecido do meu vestido. A outra segura minha mão com leveza. Não trocamos palavras no primeiro momento, apenas nos movemos ao som da melodia e eu evito seus olhos verdes, que perscrutam minha face. Os flashes das câmeras disparam, fotógrafos contratados para registrar o momento. Precisamos parecer um casal feliz, correto?

Meus pés obedecem à cadência, minha postura é impecável. Mesmo dilacerada por dentro, mantenho a máscara. Ao girar, vejo os rostos dos convidados: sorridentes, entusiasmados. Eles acreditam no espetáculo. É isso o que importa para as famílias. Aparências. Negócios. Uma imagem a zelar.

Peter se inclina ligeiramente, murmura algo:

— Você está estranhamente quieta, Emma. E outra coisa. Por que me bateu? E por que me beijou?

Eu o encaro surpresa. Por que ele tinha de falar do beijo? Encontro o sorriso debochado de sempre.

— Não tenho nada a dizer — respondo, a voz baixa, mas firme, virando meu rosto. — Vamos apenas cumprir nosso papel.

Ele aperta minha mão um pouco mais, seu toque em minha cintura me puxando mais para perto. Talvez também esteja inquieto, pensando se eu o vi com Jessica. Por enquanto, mantenho o silêncio sobre isso, mas esquecerei. Apenas não aqui, não agora, quando temos uma plateia nos observando.

Um arrepio me percorre a espinha novamente, quando o ouço murmurar em meu ouvido:

— Acho que estão esperando um beijo.

Minha respiração fica suspensa por um minuto e torno a encará-lo. E lá está o sorrisinho de lado, me provocando, me desafiando.

O beijo anterior foi um ímpeto. Apenas aconteceu antes que eu pensasse. Mas, nunca o beijaria deliberadamente. Ainda mais depois do que presenciei entre ele e Jessica.

— Você bem que queria, não é? — é minha vez de provocar.

Engulo em seco quando os olhos dele pousam em minha boca e ele diz com voz baixinha e suave.

— O que eu tenho a perder?

Nossos olhos se encontram e ficam presos por alguns longos segundos.

Com uma súbita coragem que vem não sei de onde, me aproximo lentamente, notando as pupilas dele se dilatarem.

 — Só nos seus sonhos.

O risinho que ele solta junto ao meu pescoço, irritamente me provoca um calafrio no estomago.

A dança termina com aplausos. Nós nos separamos e começamos a tirar as fotos oficiais. Primeiro as fotos do casal, depois com os pais, padrinhos, parentes próximos. Cada flash é uma pequena punhalada, lembrando-me da falsidade desse momento. As poses são ensaiadas, os sorrisos forçados. Peter que me abraça mais que o necessário e eu sei que isso é somente para me provocar. O fotógrafo pede um sorriso mais aberto, e eu obedeço. Sou uma atriz presa a um papel que não escolhi.

Depois das fotos com as famílias unidas, chegam as fotos mais descontraídas, com amigos, colegas de negócios. Olho ao redor, buscando Jessica. Ela está no canto do salão, conversando com alguém, mas seus olhos encontram os meus por um segundo, desafiadores. Lembro-me de suas palavras cruéis. Aperto a mandíbula, mantendo o sorriso para a câmera.

Concluída a sessão de fotos, Peter e eu somos conduzidos a uma mesa principal, onde seremos alvo de um pequeno discurso. Meu pai e James tomam o microfone. Meu pai fala sobre o quanto essa união significa para as empresas, para a família, como marca uma nova era de prosperidade. James ressalta a importância da parceria e o quão sortudo seu filho é por ter me encontrado. Palavras vazias.

Depois dos discursos, brindes são feitos com champanhe. Eu ergo a taça, tocando levemente o cristal com a de Peter. Ele me observa de canto de olho, como se tentasse decifrar meus pensamentos. Sabe que algo não está certo, mas não sabe o quê. Eu, em contrapartida, sei muito bem o que se passa: ele tem uma amante, e essa amante não é outra senão uma mulher que considerava minha amiga.

Os pais se aproximam novamente, agora mais discretos. Meu pai encara Peter, e James me encara, alternando olhares. Minha mãe e Margaret Blackwood nos cercam, formando uma roda de conselhos silenciosos. Meu pai pigarreia:

— Lembrem-se, agora vocês representam as duas famílias. Os olhos do mercado estão sobre nós. A imagem é tudo.

James concorda, balançando a cabeça:

— Peter, Emma, mantenham-se impecáveis. Não podemos permitir que rumores ou escândalos manchem o que construímos aqui.

Minha mãe se inclina para mim, a voz fria:

— Emma, seja inteligente. Não deixe transparecer nada. De agora em diante, vocês são um casal perfeito aos olhos de todos.

Margaret Blackwood sorri com serenidade exagerada:

— Lembrem-se da lua de mel. Será um ótimo momento para estreitarem laços e garantirem que a imprensa veja a harmonia entre vocês.

As palavras deles pesam sobre meus ombros. Tenho que manter a farsa, não posso desmoronar. Ao mesmo tempo, a raiva e a tristeza me consomem. Sinto-me uma marionete, manipulada por todos. Mas não há saída. A dependência financeira da minha família me prende a essa situação.

Sorrio e aceno com a cabeça, calando-me. Peter faz o mesmo. Não falamos nada que contrarie o discurso de nossos pais. É um acordo tácito: somos o casal modelo, e assim devemos permanecer.

A orquestra muda o tom mais uma vez, e os convidados se dispersam para comer, beber e conversar. Estamos livres do centro das atenções momentaneamente, mas não podemos baixar a guarda. Em algumas horas, iremos para a lua de mel, e aí será outro desafio encenar união e felicidade.

Tenho vontade de correr para um canto, arrancar esses sapatos apertados, tirar o vestido sufocante e gritar. Mas só posso manter o semblante tranquilo, disfarçando qualquer ferida. Aqui, no meio deste mar de sorrisos, estou sozinha com meus pensamentos dolorosos.

Peter toca minha mão de leve, como se quisesse dizer algo, mas eu a retiro com delicadeza, fingindo que arrumo o véu. Não há como ter uma conversa honesta agora. Ele precisa saber que não estou cega, que não sou ingênua. Mas contarei meu trunfo na hora certa.

A partir desse ponto, a noite corre como um rio de falsidades douradas. Bebidas, risadas, músicas. Todos acreditam no “amor” entre as famílias, na solidez da união. Ninguém desconfia do veneno por trás dos bastidores.

Somos peças de um jogo de poder e dinheiro, e nossa imagem vale mais do que nossa felicidade. Apesar da dor e da indignação, não tenho saída. Vou continuar fingindo, sorrindo para as câmeras, dançando conforme a música, enquanto a chama da revolta arde dentro de mim.

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