Era uma vez uma fada.
Sim, eu sei. Essa história já começa errada. Não me bastava ser diferente, uma fada, ainda tinha que fazer tudo isso da forma mais distante possível da normalidade.
Meu reflexo, que eu podia ver nas águas do mar, mostrava uma garota arrasada, com cabelos extremamente cacheados. E, atrás dela, grandes e imponentes asas brancas e vermelhas.
Era assustador.
Eu estava deixando toda a vida que eu conhecia para trás e ela parecia cada vez mais distante, assim como a costa, que eu tanto amava, que já quase não dava pra ver no horizonte.
O desconhecido estava a minha espera e minha intuição dizia que era ainda mais amedrontador que asas brotando do nada nas minhas costas.
Bom, reza a lenda que nunca se deve duvidar das intuições de uma fada.
Capítulo UmA mudançaTrinta e seis horas antesO que eu faria agora?Encarei a quantidade de gente ao redor, sentindo que entraria em crise de choro bem em breve. Suspirei, dei a volta no quiosque, ficando escondida entre a parede e um ônibus estacionado, esperando que os passageiros subissem.Escorreguei pela parede até o chão e abri minha bolsa com cuidado. Eu não gostava de ficar parada ali, mas dentro da Central do Brasil era movimentado demais e sabia que cobravam para acessar os banheiros do subsolo. Então, contrariando meus instintos de proteção, tirei o celular da bolsa.Para quem ligaria? Era provável que minha mãe não quisesse me ver já que eu era um estorvo na vida daquela família. Tinha quase certeza que teriam preferido que eu tivesse morrido sozinha onde me acharam e que se arrependeram
Capítulo DoisO atrito— Não, Dona Júlia, ela não quer nem pensar em voltar.Eu acordei sentindo-me um pouco preguiçosa. Meus olhos não queriam se abrir, então apenas movimentei meus braços e fiquei escutando a voz do meu lindo namorado se propagar pelo quarto que cheirava a ele.Quase fui capaz sorrir.— Não, Mi está bem. E eu não vou levá-la pra casa enquanto ela não quiser. Ela vai ficar por aqui mpor quanto tempo ela quiser.Abri os olhos, finalmente entendendo o que estava ouvindo. Gui estava sentado na beira da cama, falando ao telefone e me olhando de forma protetora. Ele sorriu, quase triste, quando arregalei os olhos em sua direção.— Não é seqüestro, Dona Júlia. Ela não quer voltar pra casa e eu não vou obrigá-la. Acho que a senhora que dev
Capítulo TrêsA dor— Eu não queria te arrumar problemas, Gui – murmurei, duas horas depois, enquanto encarávamos mais um engarrafamento na ponte.Assim que saímos do apartamento, Guilherme me pusera dentro do carro, ligara a rádio e retornara. Ele me afastou da confusão e voltou sabe-se lá o porquê. Quase uma hora depois, estava de volta ao carro, o rosto fechado em uma carranca e mais algumas malas, demonstrando o quão duradoura seria sua estada na casa do pai. Talvez para sempre.Eu sabia que, além de deixar a mãe dele em maus lençóis, isso complicaria a sua vida. A faculdade e o estágio dele eram no Rio e enfrentar as barcas ou os engarrafamentos todos os dias, nos horários que deveriam ser feitos, não seria fácil.Claro, também tinha minha própria faculdade e o meu emprego. Mas
Capítulo QuatroO desconhecidoO sol já estava alto quando despertei, incomodada com a claridade. A princípio, não abri os olhos, fechando-os com mais força por reflexo, ainda sensível às dores e incomodada com a disformidade do local em que estava deitada, minhas costas ardendo ao contato com a superfície. E, além de tudo, estava enjoada.Tinha algo muito errado com o lugar onde estava deitada. Ele balançava.Abri os olhos e me sentei no sustoe, mostrando espanto ao perceber onde estava. Era um pequeno barco de pesca de madeira em meio ao alto mar. Estava na parte de trás, meu violão aos meus pés e o garoto estava à frente, sem a toca e com a mão na água.— Ei, calma lá, garota – olhou para mim quando o barco balançou demais por ter me sentado. Ao reparar o meu pânico, mudou a feiç
Capítulo CincoA permissão— Michelle. Michelle, Acorde!Eu não estava nem um pouco afim de acordar, então grunhi.— Gui, me deixe dormir mais – resmunguei com a cara enfiada na almofada – Estou cansada.Em resposta, fui apenas sacudida com mais força. Senti uma pontada nas costas e parei por alguns segundos, achando que tinha algo errado comigo.E tinha.— Não sou Gui – abri os olhos e encarei os olhos verdes de Kieran, enquanto ele se preparava pra subir em minha cama e me sacudir ainda mais. – Quem é esse?— Quem é Gui? – uma voz desconhecida me perguntou.Sentei-me em um pulo, tentando ajeitar meu cabelo, provocando risadas em Kieran. Tudo provocava risadas nele.Por alguns segundos, estive sem entender o que era todo aquele lugar, então o dia anterior veio a mim e fiquei com v
Capitulo SeisO novo mundoNão era exatamente difícil me acostumar com a ideia de morar naquele lugar mágico. Tudo era mais acessível para mim, já que eu a princesa. Tinha um quarto imenso com uma minicozinha onde minhas refeições apareciam magicamente, um banheiro bem espaçoso e a vista da janela atrás da minha cama dava para os jardins de Castelo Alado, que estonteante e completamente diferente de qualquer outro que já tivesse visto. Se pudesse, jamais sairia do meu quarto, mas, infelizmente, tinha um mão cheia de compromissos idiotas.Aí estava grande parte do problema. Precisava estudar feito uma louca desvairada para que não me matassem. Tinha que frequentar todas as aulas, cinco aulas por dia, todos os dias, exceto na sexta, que me davam uma folga com apenas três matérias no dia. Todas as outras garotas em treinamento tinham apenas tr&e
Capitulo SeteA conversa— Seu horário mudou — Kieran disse.E essa foi a minha recepção na primeira aula do dia, na qual estava milagrosamente adiantada porque minha fadinha tinha pulado na minha testa até que eu acordasse e cortasse pedacinhos de maçã para ela comer.— Mas o quê? — perguntei. Odiava meu horário louco e estava a cada dia mais difícil lidar. E, para piorar, os Você vai se adaptar! de todos só me deixavam com mais raiva.Kieran me guiou até o lugar que costumávamos sentar. Estava me acompanhando em quase todas as aulas, embora evitasse a biblioteca e as aulas rosas. Três semanas haviam se passado desde nossa conversa na floresta e ele havia me contado algumas histórias da infância com nosso pai. Mas, sobre nossa mãe, nada mudara.Nos sentamos e ele me passou um p
Capítulo OitoO segredo— Mas o que houve com você? – Siena abriu a porta de seu quarto com essa pergunta.Acredito que estivesse um pouco desarrumada, mas isso não foi problema no caminho até ali, já que as pessoas imaginavam que eu estava na floresta.Kieran me enchera de perguntas, mas o ignorara dizendo não queria conversar. Ele olhou-me magoado, mas não estava me sentindo muito do tipo que se importa com a chateação dele por uma frase dita de forma errada. Eu tinha coisas maiores pra pensar.Então entrei no quarto de Siena sem cerimônias, mesmo nunca tendo estado ali. Ela fechou a porta, balançando a cabeça e olhou-me estranhamente. Sentei-me na cama, sem ser convidada e enfiei minhas mãos no cabelo.— Oh-ou – Siena estalou os lábios e abaixou-se à minha frente. – O que está