6- O peso do silêncio.

Ainda longe do meio dia, a casa dos Molina era preenchida pela voz de Miranda, que irritada, tentava convencer o marido a não lhe deixar. Dentro do quarto, Clara tentava não se abalar pela mais recente briga dos pais.

Guardava esperança de que seu pai reconsideraria e que ficassem todos junto. Sua mãe não sofreria e sua família seguiria unida.Talvez fosse imaturo pensar assim, mas não perdia a esperança na família já foram.

— Então é isso, vai mesmo sair de casa e me deixar? — Embora estivesse vendo as malas que ele carregava, Miranda não conseguia acreditar que seu casamento estava acabado, ainda amava o marido e esperava resolver as divergências. — Vai deixar a sua família, não se preocupa nem um pouco com a sua filha? — Voltou a questionar.

Tinha as mãos na cintura, e o nervosismo estampado no rosto.

— Miranda, entenda por favor. Esse casamento não está dando certo. — Miguel-Angel rebateu. Fazia gestos pausados e realmente esperava que ela compreendesse. — Não quero magoar você, sabe que lhe quero muito bem. Mas pense e verá que estou certo, nosso casamento acabou faz tempo. — Acrescentou.

Angel era um homem alto, possuía o cabelo negro com algumas poucas faixas acinzentadas, e trabalhava com petrolífera. Estava caminhando para a reforma que exigia a profissão, então se dedicaria ao negócio de carros que vinha planejado.

— Quando foi isso, quando acabou, porque para mim até ontem nosso casamento tinha salvação. — Bradou a professora. Usava Chanel no cabelo loiro, e tinha o hábito de pintar os lábios de vermelho.

— Eu sinto muito que não tenha sido claro, mas isso realmente acabou. — Miguel-Angel proferiu. Pegou na mala para sair quando ouviu o som do telefone da casa, e por algum motivo parou.

— Alô. — Ácida, Miranda respondeu levando o aparelho ao ouvido. Do outro lado, estava Anderson. — Como? — Questionou espantada. — É claro, avisarei. — Concordou. Confuso, Miguel-Angel, esperava que desligasse o telefone para saber o que estava acontecendo. — Sinto muito Anderson, de verdade. — Proferiu antes de desligar.

— Era o doutor d'Almeida? — Nervoso com as últimas palavras da esposa, Angel não evitou perguntar. — Fale Miranda, para com o suspense. — Retornou perante o silêncio e atitudes estranhas da esposa.

Ela olhava o telefone de forma insistente, e por momentos acreditou que era de sua vontade entrar nele.

— A mãe da amiga da Clara, foi encontrada morta ontem de tarde. — Contou.

— O quê? — Foi tudo o que o homem conseguiu dizer.

— Preciso avisar minha menina. — Miranda comentou meio desnorteada começando a marchar para o quarto da filha. Sabia que veria a filha sofrer, mas era necessário.

— Mãe. — Abaixando os fones de ouvido quando a mãe tocou seu ombro, Clara.Tinha

marias-chiquinhas na cabeça e usava uma vestido rodado na cor azul.Boneca, assim a chamava seu pai. — Tudo bem, o papai se foi? — Questionou curiosa.

— Não, ele não foi. — Miranda respondeu o que sabia ser verdade, pois ainda se lembrava da imagem do homem em sua sala.Clara sorriu, abriu os braços e satisfeita se jogou sobre a cama. — Mas aconteceu uma coisa muito má querida, preciso que seja forte. — Acrescentou.

Murchando a expressão feliz, a menina voltou a se sentar temendo o que lhe diria a seguir sua mãe. Mas desconfiava fortemente fosse o que fosse, não a deixaria nada feliz.

[...]

Na casa dos d'Almeida, Kimberly, notava o esforço que os irmãos faziam para se manter em pé.

Então, com paciência, os acompanhou no café, falando quando se fizesse necessário.

Mas depois, Elizabeth se afastou deixando-os a sós.

Esfregando as costas de Theo, observou o quanto ele parecia cansado. Brincava com a colher que antes usou para adoçar seu chá, e mal olhava em sua cara.

— Precisa de alguma coisa? — Kimberly perguntou pousando uma mão em seu ombro, enquanto a outra fazia cafuné em sua cabeça.

— Não. — Theodor respondeu. Qualquer coisa que lhe dessem, não seria o bastante, porque sua mãe havia sido assassinada, e em breve também ficaria sem sua namorada.

— Queria fazer mais por você, qualquer coisa que te ajudasse a ficar melhor. Me dói tanto te ver assim, ver o quanto sofre. — Kimberly comentou tristemente. Theo fungou o ar. — E eu estou vendo, você tenta suprimir sua dor, não faça isso. — Aconselhou com ternura.

— Então, deveria me deixe cair? O que acontece com a minha irmã então? — Theodor devolveu. Não havia sido ele a lhe avisar sobre o ocorrido, não tinha forças para tal, mas quando Kimberly apareceu em sua porta lhe abraçando, não se importou em perguntar quem havia ou não lhe avisado.

Estava grato por tê-la ali.

— Entendo que sinta essa necessidade de proteger a sua irmã. — Comentou a artista. — Mas você quer carregar o mundo, quando o seu está desmoronando, isso não vai fazer bem. Para nenhum dos dois. — Prosseguiu ganhado para si toda a atenção. — Eu acho que ao invés de tentar carregar o mundo, se apoie nela, e deixe que ela se apoie em você também. Não tente carregar tudo, sejam uma unidade, estejam lá um para o outro. — Sugeriu lhe acariciando a face.

— Perdi a minha mãe, como devo prosseguir agora? — Theo questionou cheio de dor. Havia lágrimas em seus olhos, e não se preocupou em esconder. — Como devo acordar todos os dias sabendo que não vou ouvir sua voz doce me chamando para o café, como vou me habituar a não lhe ouvir falar do trabalho? — Voz embargada, e olhos marejados, queria que alguém lhe dissesse como mandar embora toda aquela dor.

— Eu sinto muito, querido. — Kimberly choraminguou não podendo dar as respostas que ele queria. — Vai ser difícil, mas você é forte. Vai ficar tudo bem.— Garantiu lhe abraçando com toda sua força.

[...]

Quando Anderson e Ana voltaram para casa, foram atropelados por cartões de condolências, que na maioria, eram de pessoas desconhecidas para eles.

O dia foi se arrastando, Anderson foi informado que só poderiam realizar o enterro no dia seguinte, e então saiu três vezes.

Avisou ao filho que estaria resolvendo algumas coisas para o funeral, e pediu ao melhor amigo de Mariana que recebesse os cartões de condolências que chegavam a casa.

Elizabeth e Theo se sentaram do mesmo lado. Silêncio cortante, e olhares distantes. Não viam as pessoas, não ouviam as vozes, apenas seguravam a mão um do outro e deixavam Ana lidar com as pessoas que queriam lhes consolar.

Alguns amigos de Elizabeth apareceram, ela trocou duas ou três palavras e depois fingiu estar dormindo para não continuar ouvindo deles o quanto Mariana era uma boa pessoa, e como todo o bairro sentiria falta.

Os amigos de Theodor apareceram também, e nesse momento ele se afastou. Sentou com eles na grama do jardim, e Kimberly fez café para quem ainda estava na casa.

Elizabeth não queria, mas chegou a sentir raiva daquelas pessoas. Porquê eles estavam ali se aquilo significava que sua mãe não estaria?

Haviam tantos rosto, mas em momento algum viu o tão conhecido de Clara. Foram tantas tentativas falhas de comunicação, que chegou a pensar que a alguma coisa havia acontecido com a loira.

— Liz querida, Clara está aqui. — Elizabeth estava deitada sobre o sofá quando seu pai anunciou. Instantaneamente, Elizabeth sentou deixando espaço para que Clara se sentasse do seu lado. E assim ela o fez.

— Oi. — Clara saudou baixinho. Era tanto silêncio e falta de jeito, que Clara se perguntou se deveria dar os pêsames a amiga, e ela por sua vez, se perguntou se deveria contar que sua mãe estava morta.

— Oi. — Elizabeth retribuiu. O cabelo bagunçado e olheiras espessas, mas não se importava. Nem em estar apresentável, ou ser sociável.

— Eu...eu... — Clara começou, nervosa esfregava as mãos umas nas outras. Respirou fundo se concentrando. — Vamos tomar alguma coisa. — Sugeriu. Elizabeth assentiu com a cabeça. — Que tal chá? — Perguntou incerta. — Vamos? — Clara estendeu a mão.

— Vamos. — Segurando a mão da amiga, Elizabeth foi guiada até a cozinha. Olhou o cenário, e só conseguiu pensar em como sua mãe gostava que tudo estivesse bem organizado. E de facto, estava.

Mariana não reclamaria se lá entrasse.

E como Elizabeth queria que entrasse.

— Ortelã. — Clara anunciou colocando água na jarra elétrica.

— Cidreira. — Elizabeth contrapôs ocupando lugar a mesa.

— Cidreira é horrível. — Clara se mostrou indignada. Elizabeth nada disse, apenas pressistiu em olhar o pano florido que cobria a mesa. — Seu paladar está precisando de ajustes. — Soltou notando o quanto sua amiga estava distraída.

O que poderia fazer para que ficasse melhor?

— Você precisa de ajustes. — Elizabeth rebateu. — Fazemos assim, eu tomo cidreira e você toma ortelã. Fim do problema. — Ofereceu sem disposição para defender a honra do chá.

— Certo. — Clara concordou. Elizabeth colocou os olhos nela, estava pálida, cabelo livre percorrendo as costas, e um vestido de linho verde musgo.

— Sumiu hoje. — Elizabeth comentou vendo-a distribuir a água fervente pelas chávenas, e em seguida a respectivas saquetas de chá. Não estava triste ou magoada, na verdade não sabia o que sentia quanto a distância, mas precisou comentar.

— É. — Clara afirmou constrangida. — Uma colher de açúcar, certo? — Perguntou direcionando o olhar para a amiga, que fez que sim com a cabeça. — Aqui. — Lhe entregou enquanto se sentava a sua frente.

— Obrigado. — Elizabeth agradeceu.

— Sinto muito não ter aparecido antes. — Clara pediu após um breve silêncio.

— Hm. — Balbuciou a anfitriã.

— Na verdade eu... — Clara parou colocando a chávena sobre a mesa. - Não consigui acreditar no que está acontecendo, foi demais para mim. — Confessou baixando o rosto. — Não é como se sentissem mais do que vocês, mas eu... — Clara engoliu o choro. — vou sentir a falta dela. — Com a voz chorosa, falou.

Elizabeth colocou a mão por cima da dela, e em um esforço conjunto, lágrimas não foram derramadas.

— Entendo você. Se pudesse, também sairia daqui. — Elizabeth desabafou bebendo um pouco mais do chá.

— Liz, sei que nada do que dizer vai ser suficiente, mas eu vou estar aqui com você. Eu sempre estarei aqui. — Afirmou a loira.

— Obrigado. — Sussurou Elizabeth.

— É uma pergunta estúpida, mas como você está? — Clara se mostrou cautelosa.

— Nada bem. Sinto como se uma parte minha tivesse morrido junto com ela. — Elizabeth admitiu abandonando a chávena sobre a mesa. — Vou ficar melhor assim que o assassino estiver preso. — Determinou não evitando as lágrimas. — Ela não merecia isso. — As palavras deslizavam de sua boca arrastadas pela dor que sentia.

— Não se preocupe, justiça vai ser feita. — Clara garantiu tentando lhe transmitir força. Elisabeth fungou o ar e secou o rosto. — Já têm alguma pista de quem possa ser o culpado? — Inqueriu.

— Não. Bom, eu não sei.— Distraída, os olhos de Elizabeth acompanhavam Theodor que acabava de adentrar a cozinha. — O que está procurando? — Questionou vendo-o abrir e fechar algumas gavetas.

— Café. — Theodor respondeu.

— No armário de cima. — Clara contou ajeitando o cabelo para trás da orelha. Olhava para a amiga com olhinhos doces de quem o mundo queria curar.

— Obrigado.— Theodor agradeceu assim que localizou o frasco. — Vão querer também? — Perguntou buscando a cafeteira.

— Não obrigado. — Clara recusou erguendo sua chávena, quanto a Elizabeth, a pequena flor de seu tio, se limitou ao usual "não".

Theodor preparava a bebida em uma concentração absurda, Clara pensava em como tudo seria estranho dali para frente, e Elizabeth tinha questões demais em sua cabeça.

— Há que horas é o funeral? — Elizabeth questionou pouco tempo depois. O ar ficou mais pesado, e o tempo pareceu parar, ao menos seu irmão parou diante da pergunta.

— Às 10. — Theo respondeu sem emoção alguma na voz.

— Seu tio não vem? — Clara perguntou.

Mas Theodor não liguou, não se importou. Só sentiu o chão, novamente sumir. Inspirou afastando as lágrimas que já sentia chegar e então lembrou que precisava responder.

— Don vai perder o funeral. — Respondeu adoçando o café. Um silêncio pesado pairou no ar. Elizabeth fechou os olhos pensando que chegava a hora do último adeus, e Clara não sabia o que dizer.

Theo beberricou do café, e depois saiu da cozinha para se isolar em seu caos particular.

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