Cativa do Duque
Cativa do Duque
Por: Sandra Rummer
A babá

Tempo presente, Inglaterra

Natália

Urg!

Que frio.

Entrego o ticket ao funcionário do porto e caminho pela grande embarcação, puxando minha mala de rodinhas. O cheiro salgado do mar e o ranger suave do barco me envolvem, aumentando a sensação de que estou deixando para trás tudo o que conheço.

Encontro um lugar próximo à janela e me sento. Mesmo dentro do barco, o frio é cortante. Aperto o casaco ao redor do corpo e inspiro profundamente, preparando-me para a travessia até Cornualha.

O sudoeste do Reino Unido é pontilhado por castelos e vilarejos pacatos, lugares que parecem suspensos no tempo. Cada ruína, cada pedra, carrega histórias antigas, como sussurros do passado ainda ecoando pelo presente.

O castelo para onde estou indo é parte desse cenário. Considerado uma das seis "Nações Celtas", preserva tradições únicas e um ar de mistério. Ele pertence ao Duque de Cornualha, Ryan Luke Crawford Terceiro. Um homem recluso, mas cuja fama de mulherengo o precede.

Não quero ser escolhida pelos motivos errados. Não quero que meus atributos físicos chamem a atenção do Duque, como se eu fosse apenas um objeto a ser observado numa vitrine. Quero ser reconhecida por minhas qualificações, pela minha capacidade de cuidar de Catarina, sua filha.

Uma garoa fina começa a cair, tornando o dia ainda mais frio e nebuloso. Aperto os lábios. A imagem cinzenta diante de mim só piora minha ansiedade. Estou prestes a entrar em um território completamente desconhecido.

Ah, como eu gostaria de estar em um lugar quente, segurando uma caneca de chocolate quente... Mas não posso me dar ao luxo de recusar oportunidades. Preciso trabalhar. E, segundo Rose, o Duque paga bem.

Fecho os olhos e me deixo levar por lembranças recentes...


Carly e eu estamos na pequena sala do meu apartamento. A tevê está ligada no noticiário. Na tela, Luke aparece dando uma entrevista sobre o estado do castelo que administra. Ele veste óculos escuros, e seu físico atlético se destaca. O sol brilha em seus cabelos negros, ressaltando ainda mais sua aparência imponente.

Ao lado dele, uma ruiva deslumbrante segura seu braço com uma possessividade explícita. Aperto as mãos no colo.

— Esse homem é um deus grego — Carly suspira, encantada.

Não respondo. Ela me encara, desconfiada.

— O que foi?

Eu hesito por um segundo, depois solto de uma vez:

— Eu não te disse, mas serei a babá da filha dele.

O queixo de Carly cai. Literalmente.

— Nãaaaaaaao!

Meu coração dispara. Um arrepio sobe pela minha espinha.

— Simmmmmm. Está tudo acertado. Em duas semanas, estarei morando no castelo — digo, sentindo o sangue pulsar sob minha pele.

— Meu Deus! Você vai me ligar todos os dias para contar as novidades.

— Carly, eu vou a trabalho. Não crie expectativas.

— Você sabe a fama que esse homem tem?

Eu arqueio uma sobrancelha.

— Como se alguém pudesse não saber...

— Então tome cuidado com seu coraçãozinho, ou ele será arrebatado pelo furacão Luke.

Solto uma risada incrédula.

— Eu? Me envolver com esse homem? Eu sou uma simples plebeia, da classe trabalhadora. Ele, a realeza. Nunca olharia para mim desse jeito. E, de qualquer forma, vou usar roupas bem austeras. Ele nem vai notar minha presença.

— Com esse rosto? Esses cabelos? Sugiro um óculos de grau discreto e cabelo sempre preso. Só as roupas não vão adiantar.

— Eu sei me proteger. Minhas roupas serão apropriadas para o trabalho, nada mais. Não tenho medo dele.

— Você sabia que ele quer entrar para a política? Se candidatou para a Câmara Baixa.

— Sei. E está muito mal nas pesquisas.

Carly ri.

— Também, com essa fama de playboy... Quem levaria a sério? Ele está com essa ruiva agora, mas duvido que durem muito tempo juntos.

O choro de uma criança me puxa de volta para o presente. Tento afastar os pensamentos sobre o Duque, mas é difícil ignorar a fascinação que ele exerce. O carisma dele, somado à beleza e ao charme, criam uma combinação explosiva. E, claro, há também a sua inegável presença de líder.


Luke

A chuva cai fina sobre o para-brisa enquanto observo o castelo com satisfação ao longe. As nuvens baixas o envolvem como um véu, tornando a paisagem ainda mais dramática.

Solto um suspiro longo.

Aqui, eu me sinto em casa.

Mais à frente, alguns aldeões me veem e acenam. Paro o carro, pego um grande pacote de doces e abaixo o vidro da Ferrari. Thomas, um garoto esperto, já sabe do que se trata. Ele se aproxima com um sorriso e pega o pacote, os olhos brilhando de expectativa.

Piso no acelerador, deixando para trás os olhares curiosos das crianças que acompanham o rastro do carro. Elas sabem que sempre me lembro delas.

Suspiro novamente.

Agora estou aqui, tentando esquecer o desastre da minha campanha política após a saída de Isabela. Preciso descansar. Aproveitar o tempo com Catarina. Hoje, também marquei a entrevista com a nova babá. Rosa não está dando conta. Minha pequena, agora com dois anos, já quer explorar tudo, recusando-se a ficar no carrinho.

Kate, minha assessora, não gostou nada da minha decisão de tirar essa semana para mim.

Deus! Aquela mulher respira minha candidatura. Se pudesse, venderia a alma para me ver na política. E, de fato, minha meta é maior: quero ser Primeiro Ministro. Mas minha imagem de playboy e Casanova está arruinando minhas chances. E agora, com o escândalo envolvendo Isabela, tudo piorou.

Caso? Quase rio.

Se soubessem a verdade... Se soubessem que, entre nós, nunca houve nada...

Meu maxilar enrijece ao lembrar do confronto que tive com Raed semanas atrás no hospital.

— Você a deixou sozinha no meio da noite? Que tipo de homem faz isso?! — ele rugiu, os olhos faiscando de raiva.

Endireitei-me, sem paciência.

— Ela estava com você, Raed. Achei que fossem se entender.

Ele se aproximou, irado.

— Você dormiu com ela, seu desgraçado?!

Deus... Quase ri. A verdade feriu meu orgulho:

— Dormir? Aquela mulher é um freezer. Nunca tivemos nada.

O choque em seu rosto foi pior do que se eu o tivesse socado.

—Eu a contratei para ser uma companhia pública. Você esteve com ela esse tempo todo e ainda não a conheceu? Ela é louca por você, seu imbecil!

Meus pensamentos são interrompidos por um bode que surge de repente na estrada. Freio bruscamente. Ele me encara por um instante antes de se afastar lentamente. Respiro fundo e sigo caminho.

Ao longe, o castelo surge imponente entre as montanhas, cercado pela névoa fria. Aqui, entre as ribanceiras rochosas e os campos salpicados de urze, é onde pertenço.

Aumento o volume do som e deixo Pearl Jam preencher o carro. E então, canto junto, tentando afastar os fantasmas do passado.

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