Parte 1...
Eu estou cansado. Os últimos três meses foram bem cansativos, tanto fisicamente quanto emocionalmente.
Meu pai morreu.
Eu já esperava, afinal, ele vinha lutando contra um câncer há mais de um ano e era muito agressivo. Foi tomando todo o seu corpo com uma rapidez que até a equipe médica ficou surpresa.
Tentaram todos os tratamentos possíveis, mas infelizmente meu velho não resistiu. Acho que posso dizer que isso foi bom para ele, de certa forma.
É melhor morrer e se libertar, do que viver com dor e sofrimento por anos, sabendo que uma hora tudo vai acabar. Acho que foi melhor assim, ele ter morrido.
Apesar de nossas diferenças e problemas, eu o amava. Ele era meu pai e foi o único que ficou depois da separação. Minha mãe apenas sumiu no mundo com um amante. Não parou um minuto para pensar em mim, apenas seguiu sua vida e me largou na casa de meus avós.
Quando meu pai soube disso ele voltou para o Brasil às pressas, mas nada pode fazer diante do abandono de sua esposa.
Eu ainda me lembro muito bem da cara de tristeza dele ao ir me buscar na casa de meus avós, que muito sem jeito, não conseguiam explicar porque minha mãe havia feito isso com ele. E comigo.
Mas, é assim a vida. E agora eu tenho que continuar a minha.
Depois do meio-dia eu tenho que ir me encontrar com Roberto para acertar o testamento que meu pai deixou. Creio que deva ser algo rápido e depois posso seguir em frente.
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Eu nem sei se posso dizer o que sinto mais. Se é raiva ou se é surpresa pela leitura do testamento.
Eu queria xingar, mas seria inadequado que fizesse isso ali, no meio da reunião com outras pessoas presentes, inclusive minha prima Diana que me olhava com um sorriso descarado naquele rosto entupido de maquiagem.
Tudo bem, me segurei. Eu posso controlar minhas emoções. Aprendi desde pequeno. Continuei ouvindo a leitura enquanto Roberto explicava cada coisa descrita ali.
Eu sabia que meu pai tinha um testamento, só não sabia que ele tinha colocado também minha prima nele. E nem faz sentido.
Claro, eu sei que ele tinha uma boa relação com ela, mas não pensei que iria me colocar em uma situação dessa.
Respirei fundo e ajeitei minha postura na cadeira, olhando direto para Roberto. Depois que ele encerrou a leitura, esperei que os outros presentes saíssem da sala e marquei com ele um encontro sozinhos em minha cobertura.
Eu não vou aceitar essa decisão assim, sem tomar uma atitude séria.
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Mais tarde na cobertura...
— Eu não vou aceitar isso, Roberto. Não tem cabimento.
Entreguei a ele um copo com uísque e gelo. Agora posso falar com calma e sem me importar se alguém vai ouvir.
A varanda aqui da frente é muito boa. Ampla, com um conjunto de cadeiras muito confortáveis e uma vista excelente do mar à minha frente. Lá embaixo o barulho dos carros passando de um lado para outro.
Creio que em algum ponto da orla deva ter um show acontecendo, porque dá para ouvir o som de uma banda tocando.
— Está seguro de que não pode mudar essa parte do testamento? - questionei Roberto, provando um gole de minha bebida.
— Infelizmente para você, estou sim - ele balançou a cabeça assentindo — Já dei uma olhada de trás pra frente depois que vocês saíram da reunião... Não tem como mesmo.
— Porra... Isso é um absurdo!
Me senti roubado por meu próprio pai. Era até ridículo que eu tivesse que obedecer uma vontade tão absurda como essa.
— Bem, eu não sei exatamente o que seu pai queria, mas acho que tenho uma ideia - ele girou o copo devagar na mão.
— Sei... E pode me esclarecer, por favor?
— Está óbvio que essa sua vida de solteirão não agradava a Leandro - ele fez uma cara de desaprovação — Sabe que ele sempre foi um homem que acreditou muito no casamento e prezava a família.
Eu soltei o ar devagar, me sentindo levemente irritado com isso.
— Pois é... Era tão a favor do casamento que se tornou um boneco nas mãos de minha mãe e acabou sendo abandonado - eu torci a boca em descontentamento — Isso sem falar na humilhação que foi, ter sido traído mais de uma vez. Foi um fraco.
— Ele amava sua mãe, Luca.
Eu dei uma risadinha.
— E de que adiantou esse amor? - tomei um gole grande da bebida gelada — Minha mãe nunca soube valorizar nada do que meu pai fazia por ela.
— Bem, você pediu minha opinião e eu acho que é por aí - ele de ombros.
— Vai ver que ele estava fora da sanidade mental, devido a doença que o consumiu.
— Nada disso, Luca - ele balançou a cabeça — O seu pai estava bem lúcido quando fez o testamento. E existem testemunhas. Tudo foi feito de acordo com o que a lei prevê - ele apontou o dedo para mim — E não reclame, eu sei fazer meu trabalho muito bem.
Eu sei que ele é um excelente profissional, senão eu não o teria como meu advogado, além de amigo. Mas essa questão está ridícula.
— Roberto, minha prima não tem porquê ficar com essa parte da herança. Meu pai já deixou até mais do que ela merece - puxei o ar fundo — Isso foi um erro dele.
— Olha, eu sei que você tem razão. Eu também não vou muito com a cara da Diana, mas é algo que não posso mudar - ele gesticulou — Se você quiser ficar com a propriedade, vai ter que fazer o que manda o testamento de Leandro.
Parte 2...Me deu até vontade de jogar o copo contra a mureta de proteção da varanda, mas não sou tão maluco de fazer isso. Só apertei o copo mesmo.A propriedade que Roberto se refere, é o lugar mais importante para mim, desde que me entendo como gente, por assim dizer. Na verdade é uma grande área na Itália, na região da Toscana.Lá tem um castelo de mais de mil anos e que é cheio de história. Tem também mais duas grandes casas, com pouco mais de setecentos anos, que foram construídas depois que o castelo mudou de dono. Tem oito hectares de plantação de oliva e quatro de uva, que produz um dos melhores vinhos da região e que é muito lucrativo. O local é maravilhoso. Depois que fui morar um tempo com meus avós paternos, para que meu pai pudesse ter liberdade e tranquilidade para continuar a trabalhar, as melhores recordações de minha vida são de lá.A beleza do lugar é incomum. Morei com meus avós em uma das casas, mas o castelo era meu lugar preferido. Meus avós o deixavam aberto p
Parte 1...Hoje amanheci um pouco lenta. Choveu a noite toda e eu tenho pavor de trovão. Me enfiei na cama e me encolhi bem no cantinho até que acabei dormindo. Vou trabalhar sem muita vontade, mas eu preciso. Não posso me atrasar e nem quero. Gosto de chegar um pouco antes porque assim posso me organizar e me preparar para a chegada de meu chefe.Luca Bertolini.Meu Deus, o que ele tem de bonito, tem de ignorante. O homem tem um jeito rude de tratar as pessoas e acho que eu sou sua vítima preferida.Trabalho para ele diretamente há dois anos, mas na empresa já estou há cinco anos. Gosto muito de trabalhar lá, só não curto muito ser secretária dele, mas o salário é muito bom.A empresa me dá algumas vantagens, como plano de saúde, que cobre quase tudo e também tenho plano dentário. Eu até já usei por duas vezes, quando tive um problema em um dente e que me deixou presa em casa por quatro dias.Pude descansar porque a empresa cobre esse tipo de situação. Sou muito agradecida ao meu em
Parte 2...Nossa, que homem grosso. Logo de manhã e já dando coiçe. Respirei fundo. Preciso do empregro, não posso esquecer.— Não, senhor - dei um sorriso meio sem graça — É que não o vi chegar.— E iria ver como, se estava batendo perna por aí? - me encarou de modo feio — A santinha demorou a chegar hoje.Eu não suporto que ele me chame dessa forma, ainda mais que sei que é de modo irônico. Já tem uns seis meses que começou a me chamar assim.— Eu não estava batendo perna, estava no banheiro e...— Me poupe - ele ergueu a mão — Não quero saber o que você fazia. Pegue logo essa papelada espalhada e traga para mim o que tenho que assinar. Vê se não demora, lenta.Eu assenti com a cabeça, fazendo que sim, mas só Deus sabe como estou chateada com esse começo de manhã.— Leve meu café - ele disse e entrou na sala de novo.Respiro fundo. Me abaixei e catei logo tudo que estava espalhado. Na volta eu faço a separação novamente. Agora tenho que levar o café dele.** ** ** ** ** ** **Bati n
Parte 3...Volto apressada para a sala, tentando não derrubar nada pelo caminho. Bati na porta e quando o ouvi responder, abri quase deixando o pacote cair. Vi que ele fez uma cara feia.Dei um sorriso educado para Roberto que estava sentado em frente da mesa dele e deixei tudo em cima, arrumando perto do notebook.— Está bem assim - abanou a mão para mim como se estivesse espantando um animal.— O senhor vai querer algo mais?— Eu não sei - fez uma cara irônica — Se quiser eu a aviso. Saia!Eu fiz um gesto com a cabeça e saí o mais rápido que pude, nem olhei para trás. Credo, o homem é rude demais. Parece que vive aborrecido.* Luca— Que coisa, Luca... Você é muito grosseiro com a garota - Roberto comentou.— Ah... Eu não tenho paciência para ela.Abriu o pacote com a comida e olhei dentro, cheirando e fiz uma careta. Vai isso mesmo.— Pois deveria ter, ela é uma ótima pessoa. Além de ser sua secretária. Sabe que existe uma coisa chamada processo? - Roberto riu — Cuidado!— Ah, que
Parte 1...* CarinaEu estava encerrando o arquivo no notebook quando meu celular vibrou. Era Roberto. Ele disse que em dez minutos estaria no estacionamento me esperando.Agora a curiosidade me bateu um pouco. Mas só vou saber indo com ele. Luca já não está na empresa. Não sei o que pensar, vai ser a primeira vez que vou a sua casa. Só espero que ele seja um pouco mais educado lá do que ele é aqui na empresa.Dei uma geral para ver se não esqueci nada aberto, desliguei o notebook, peguei minha bolsa e mesmo nervosa, respirei fundo e segui para o estacionamento.Roberto me esperava dentro do carro. Bati no vidro e ele abriu a porta.— Oi - sentei meio sem jeito. Nunca peguei carona nenhuma — Podemos ir.— Ótimo - ele sorriu — Você é pontual.— Bom, não tinha outro lugar para ir, a não ser para casa - dei de ombro.— Uma coisa que gosto em você, Carina, é que você diz o que pensa.— Quando eu posso falar, né - dei uma risadinha — Às vezes é melhor ficar calada.— Eu sei - ele balançou
Parte 2...Para mim ele nem ofereceu, mas mandou que eu sentasse. Tinha um pequeno sofá perto da mesa grande de madeira e sentei, bem na ponta. Pensei que qualquer coisa eu poderia sair correndo pela porta.Roberto sentou em uma cadeira perto e ele sentou na mesa. Tomou um gole olhando para mim, o que me deixou sem jeito. Respirei fundo, apertando a bolsa no meu colo.— A senhorita santa bebe uísque?Fiquei surpresa que perguntou. Fiz que não com a cabeça.— Bom, então vai ser refrigerante mesmo.Ele foi até um frigobar e pegou uma latinha de guaraná, abriu e me entregou. Nossas mãos se tocaram e eu abaixei o olhar, agradecendo.— Posso começar? - Roberto perguntou.— Vai logo, homem - Luca ergueu o copo.— Bom... Fazendo um resumo da situação, vocês dois estão em uma situação delicada.Eu olhei para ele erguendo as sobrancelhas, esperando o que viria aí. Luca também mantinha a expressão curiosa.— Luca, você precisa de uma mulher que faça de conta que é sua esposa, assim pode receber
Parte 3...— Quanto tempo seria? - Luca questionou — Eu não quero ficar preso.— E por acaso eu quero? - mexi os ombros — Eu não tenho a menor vontade de passar mais tempo ao seu lado.Eu sei que não deveria estar soltando a língua assim, afinal, ele é meu chefe, mas é uma loucura isso. Estou tão nervosa que meu corpo até treme um pouco.— Ótimo - ele dá um sorriso cínico.— Gente, eu sei que é chato ter que fazer algo que não estava no seu plano, ainda mais assim, que envolve duas pessoas tão diferentes como vocês dois são.— É bem óbvio isso, amigo - ele anda até a porta grande de vidro e fica olhando para fora um instante, depois se vira — Mas acho que entendo o que você quer dizer - suspira fundo me olhando — Só não sei se isso pode dar certo como imagina.— Isso só depende de vocês dois - Roberto respondeu — A ideia é simples, embora um pouco complicada - ele meneou a cabeça — Só que dá para ser feito e no final vai ser vantajoso para ambos.Luca caminhou até nós e parou, encaran
Parte 1...Eu tenho quase certeza de que me fodi com essa ideia de Roberto. Nunca tive vontade de me casar, sei bem que casamentos são apenas uma desculpa para a sociedade.Eu posso ficar com quem quiser e não preciso me preocupar em justificar isso. E nem tenho que explicar meus motivos para terminar também, basta dizer acabou e pronto. Não tenho motivo para querer embarcar em algo que é só uma ilusão da sociedade. Meu pai foi meu maior exemplo. Ele nunca mais se casou depois que minha mãe o traiu e o abandonou. Passou anos deprimido.Eu não quero isso para mim. Prefiro minha vida de solteiro e se algum dia eu quiser ter um filho, é só arranjar uma barriga de aluguel e pronto, sem drama.Uma das vantagens de ter dinheiro sobrando é poder estar acima das escolhas comuns da sociedade. Eu ser solteiro até ficar mais velho me dá status e não sou discriminado como um homem comum, que é forçado a criar uma família ou vai perdendo o poder de escolha com o tempo.Eu até gosto das mulheres