— Você fez o quê?! — Perguntou Ethan após eu mencionar tudo o que ocorreu na noite anterior.
— Ela precisava de ajuda, eu não podia deixá-la.
Ele me puxa para o canto.
— Não deve confiar na Gisele, em ninguém aqui!
— E em você? Devo não confiar? — Cruzo os braços.
Ethan suspira e desvia o olhar, ele sempre fazia isso quando sabia que eu tinha razão.
— Se eu não confiasse não o teria. — Minhas bochechas pegam fogo quando ele sorrir sutilmente de canto. — A questão é, eu só ajudei ela ontem, não estou dizendo que somos melhores amigas.
Ele pensa por alguns instantes e suspira.
— Certo. Se você diz.
Teve uma pequena parte que não disse a ele, Gisele estava grávida de um de seus clientes, se May soubesse daria cabo dela assim como fez com Amanda.
Mordo o lábio inferior.Não sabia como ela iria resolver essa questão e me sentia brava por ainda pensar em ajuda-lá, ela nunca faria isso por mim.— Tem mais algo?
— Hum?
— Você parece pensativa desde cedo.
— Ter visto ela tão fragilizada me lembrou que poderia ser eu ali.
Ethan olha para os lados e se aproxima de mim, tanto que faltavam poucos centímetros para um beijo.
— Não era e não vai ser. — Ele leva sua mão até minha mandíbula. — Antes que qualquer coisa aconteça vamos estar bem longe daqui.
Ouvimos passos no corredor, Ethan me largou e pegou de volta o esfregão. Vicent passou por nós mirando seus olhos em mim.
Voltei a limpar as mesas cheias de bebida derramada. May me deu o trabalho de ajudar Ethan a limpar a boate diariamente, eu não reclamava, pois, adorava passar o máximo de tempo com ele, me distraia de toda merda que vivo. Às vezes quando acabavam os serviços ele me contava coisa sobre sua vida na Inglaterra, antes de vir parar aqui por necessidades. Fazíamos planos, muitos planos.Seria belo se não fosse trágico.— Vou levar você para tomar chá com a vista do big bang ou prefere ir a Paris? Lá tem croissant. — Perguntou ele sentado ao meu lado.
— Já comeu um antes?
Ele sorrir e assenti.
— Bem, quero conhecer o lugar que você nasceu primeiro.
— E depois? — Perguntou com os olhos brilhando.
— Quero morar na Virgínia, podemos dividir a mesma casa. Sempre quis um cachorro. — Falo entusiasmada.
— Prefiro gatos. — Admitiu.
— Podemos ter os dois. Podemos fazer o quisermos.
Deito minha cabeça sobre seu ombro.
Observamos o salão limpo sendo iluminado apenas por uma lâmpada no centro e rachaduras da parede que faziam o sol raiar.Ethan une nossas mãos, peço mentalmente que ele não sentisse o quanto elas estavam frias, porém ele sentiu e as colocou em seu pescoço fazendo pressão em cima com a cabeça para me aquecer.— Promete-me que vamos morar juntos na Virgínia, ter um cão e um gato? — Pergunto.
— Prometo, Jade. — Sussurrou de volta.
Nossos olhos se encontraram, dessa vez ele não fugiu, mas meu coração disparou como sempre. Ethan desviou o olhar apenas para meus lábios que se abriram sozinhos, meu corpo suplicava por um beijo seu. Ele levou sua mão até minha bochecha e passou o polegar no lugar, senti minhas pernas amolecerem.
Quando seus lábios finalmente tocaram os meus, borboletas faziam festa no meu estômago, eu podia voar naquele momento. O beijo não passou disso, mas foi o suficiente para me deixar ainda mais apaixonada por ele.Por fim, ele deitou sua cabeça sobre a minha, ficamos ali até May aparecer me dando mais ordens.O que mais doía era saber que nossos planos morreriam conosco caso tentássemos sair daqui, porém May não podia nos impedir de sonhar.• • •
Mais tarde Gisele passava maquiagem para cobrir seu olho roxo, May não se importou, pois, era comum haver clientes agressivos. Gisele podia ser sua preferida, mas não fugia da regra.
Por alguns instantes enquanto eu me preparava para minha apresentação, ficamos sozinhas, senti uma extrema necessidade de perguntar se ela estava bem. Contive-me.Ela vestia um biquíni cavado, não estava conseguindo amarrar a parte de trás, me prontifiquei com as mãos trêmulas. Dei um nó tentando não focar meus olhos no local onde limpei líquido seminal na noite anterior. Quase gorfei.
— Não pense que somos amigas devido ao que aconteceu ontem. — Indagou ela.
— Eu disse algo? — Aperto o nó com força e ela fecha os olhos.
— Disse ao seu amiguinho faxineiro? — Limpou o batom borrado no canto de seus lábios.
— Não. Ethan não sabe que você está... bem. — Pigarreio.
Gisele me lança um olhar feio e olha para os lados.
— Não fale sobre isso!
— Você não vai conseguir esconder isso para sempre, Gisele.
— Pensa que eu não penso nisso toda hora? — Sua voz embarga.
— Desculpe...
Ela respira fundo e enxuga seus olhos delicadamente para não borrar a maquiagem.
— Já tem algum plano?
— Se tivesse não seria da sua conta.
Dou de ombros.
— Me tratar mal não vai mudar esse fato.
Olho novamente no espelho antes de sair, mas Gisele começa a falar.
— Amanda falou sobre um médico que faz abortos, é mais comum do que pensam.
— Por que não faz?
— Não tenho dinheiro, mesmo com o que May me dá não chega nem na metade do valor. — Ela respira fundo. — Você tinha razão, Jade. Somos iguais. Vamos morrer uma hora ou outra aqui dentro.
Saio da sala com um peso no peito, pela primeira vez não me senti bem por estar certa. Gisele não conseguiria esconder a gravidez por mais tempo, sendo assim ela teria o mesmo destino que Amanda: a morte. Mais uma vez coloquei na minha cabeça que não era da minha conta, Ethan tinha razão.
Me apresentei cantando At Last da Etta James, dessa vez meu público estava atônito, todos esperando pela tão esperada apresentação sensual de Gisele.— Sai daí, deixa a gostosa dançar! — Alguém gritou da plateia.
Continuei a cantar, eu só precisava finalizar aquela música.
— Quando você vai tirar a roupa, gata? — Gritaram outra vez tirando risadas dos outros.
Fiz o último agudo da música ouvindo as pessoas gesticulando sobre Gisele. Me senti enojada por só ouvir, imagino sua dor, deve se sentir um objeto.
Saí do palco sufocada, nunca conseguiria achar aquela situação normal. Dessa vez não vi sua apresentação, preferi ficar nos bastidores me recompondo e me esgueirando do Ethan, pois nosso beijo me deixou ainda mais tímida.Fui para o quarto onde eu escondia meus míseros trocados, dentro de um buraco na parede repleto de notas amassadas de tudo que já ganhei por aqui. Quando escondia dentro do meu travesseiro, certa vez algumas notas sumiram, então tive que mantê-las em um local mais seguro.
Não sabia haverem tantas, talvez fosse o suficiente para ajudar a Gisele.
Não. Pensei.Larguei o dinheiro no chão. Não era da minha conta, esse dinheiro seria para minha fuga.Passei as mãos no rosto com força.Ethan me repreenderia, ele teria razão, mas ele também não é obrigado a dar seu corpo a homens estranhos todas as noites. Gisele não merecia, mas ela continuava sendo uma mulher desesperada, e se eu pudesse ajudar faria.Escondi as notas dentro do meu vestido. Esperei longas horas no corredor, era nítido que ela teria muitos clientes hoje. Sentei-me no chão com minhas pernas fracas, antes que eu fechasse meus olhos ela finalmente apareceu com um cigarro entre os dedos, cambaleando pelo corredor.
Levantei e tirei as notas amassadas, estendi para ela que franziu o cenho.— Pegue. — Estendo novamente.
Ela ficou algum tempo tentando assimilar, balançando a cabeça, com os olhos vermelhos.
— Jade...
— Pegue. É tudo o que tenho. Faça o que precisar.
Gisele me surpreendeu com um abraço apertado, não correspondi de início, mas depois dei batidinhas na sua costa.
— Não sei como agradecê-la, trabalharei em dobro para pagá-la. — Falou emocionada.
Balanço a cabeça.
— Não precisa.
Tudo que eu menos queria era que ela se esforçasse mais.
Gisele me abraça mais uma vez, dessa vez eu correspondo.Não conseguia concentrar sem pensar no Heitor quando subia ao terraço. Me perguntava por onde ele estava, o que fazia. Queria vê-lo mais uma vez, nunca vi ninguém com olhar tão intenso. Talvez ele não lembrasse de mim, mas eu nunca esqueceria dele.Penso em Ethan.Não falamos sobre o beijo, mas ontem depois da minha apresentação ele me puxou novamente, dessa vez foi mais demorado, as mãos dele chegaram a descer ate minha cintura, elas estavam mais frias e tremulas que as minhas, foi o momento mais quente que já vivi ate agora. Vicent apareceu estragando tudo. Fizemos como antes: fingir que nada aconteceu.Hoje Gisele faria o tal aborto, o médico viria como um cliente então faria tudo em um dos quartos. Eu sentia medo por ela, durante essas semanas parecia feliz enquanto eu pensava em todas as possibilidades de dar errado.— Finalmente te encontrei. — Gisele aparece no terraço com um cigarro entre os dedos.— Que susto, Gisele. — Levo a mão ate o peito.Ela sorrir. Entao se aproxima de
No dia seguinte, a noite anterior parecia nunca ter acontecido. Gisele tentava agir de forma natural enquanto eu não conseguia disfarçar que quase a vi morrer. Essas coisas só reforçavam que temos de fugir daqui. Não seria a última vez que isso ocorreria, mas eu prometi a mim mesma não me envolver mais, pois tenho certeza que não suportaria outra noite como a de ontem.Sua pele ainda estava pálida, assim como os lábios secos, mas ela continuava sem expressão.Ethan parecia mais preocupado que eu, ele mal prestava atenção nos copos que limpava, diversas vezes quase os deixou cair.May aparece no salão usando óculos escuros de oncinha e um vestido vermelho verniz, seu gosto era questionável. Ela olha para Gisele e puxa os óculos a altura do nariz.— Gisele, querida, você está bem?Ela assentiu depois de muito tempo.— Parece que está morta. — Olho para Ethan. — Hum! Suponho que você precisa de uma folga, trabalhou duro esses dias.Vejo Gisele serrar os dentes tencionando a mandíbula.—
May levou Gisele para o hospital após muita insistência minha, não consegui contar toda a história, mas o que disse foi suficiente para May me olhar como se quisesse nos matar. E ela iria.Não consegui fechar os olhos na noite anterior, a cama dela ainda estava suja com seu sangue, a imagem dela permanecia na minha cabeça, mal pensei no que seria de mim a partir de agora, só queria que Gisele ficasse bem. Apenas isso.As meninas pareciam não entender o que aconteceu, nem eu entendia direito também, mesmo que Gisele não aparentasse estar bem eu preferia acreditar que tudo iria se encaixar, mas não foi o que aconteceu.— Jade? — Maria me chama.— Oi? — Olho para ela.— Está bem? Estou falando com você há tempos...Passo as mãos no rosto.— Não é nada. Estou cansada, a noite foi conturbada.Ela olha para os lados.— Sabe o que aconteceu com a Gisele? — Perguntou.Só de falar em seu nome eu sentia vontade de chorar, a culpa estava me consumindo, estávamos sem notícias há horas.— Eu não s
— Vamos, levanta daí! — Ordenou uma voz, pareceu tão interna que pensei ser coisa da minha cabeça.A claridade fez meus olhos arderem, eu mal conseguia enxergar quem estava na porta. Senti mãos segurando em meus braços, não tive forças para reagir. Quando finalmente abri meus olhos vi Vicent, ele estava me carregando, me levando para fora daquele quarto após mais de uma semana presa.Tentei me soltar, porém, ele me domava com facilidade.— Para onde está me levando? — Perguntei.— Não faça perguntas, canário.Passamos pela porta onde ficava o quarto das meninas, depois pelo salão, estávamos indo para o escritório da May. O que eles fariam comigo agora? Terminariam o serviço, com certeza, e depois eu seria jogada no mesmo buraco que jogaram Amanda e Ethan. Ethan... diversas vezes eu o vi dentro daquele quarto imundo comigo, me dizendo que não morrera e que viria me salvar, porém, era um delírio, de certa forma foi menos doloroso.Voltei a me debater, tentei por diversas vezes socar Vic
Eu estava frente a frente com o homem que meses atrás me fez uma promessa, agora eu sentia um misto de sentimentos tristeza, felicidade, um pingo de esperança e muita raiva. Heitor me olhava como se eu fosse um bolo de notas altas, enquanto eu não decidi o que expressar. Ele não mudou desde que nós conhecemos, na verdade, atrás dessa mesa parecia ainda mais rígido, demonstrando seu poder, eu estava certa, ele não era qualquer pessoa.Meus olhos buscavam um ponto para concentrar enquanto o silêncio entre nós só aumentava.— Estou confusa. — levo a mão até a testa. — Você... me comprou?— Não foi exatamente o que aconteceu.Não conseguia me concentrar em respirar.Ele atrás dessa mesa parecia ainda mais rico, usando uma camisa social, provavelmente da Burberry enrolada até os antebraços e uma calça social preta. Eu comecei a prestar atenção no padrão de homens que iam à boate, sempre vestiam roupas de marca, o que diferia Heitor dos outros era a juventude.— Sinto muito pela demora, tiv
Acordei tendo a certeza de que não era um sonho, eu ainda estava na prisão vermelha que Sebastian me colocou.Se eu ficasse muito tempo parada pensava em Ethan, então comecei a desbravar os livros na estante do quarto, eram todos de capa dura com histórias conhecidas, nenhuma que me tirasse o foco.Finalmente abri a porta do banheiro, lá dentro tinha uma pia branca com espelho acima, vaso sanitário e uma banheiro, isso mesmo, uma banheira.Levei as mãos até os lábios.Pensei que fosse coisa de filme, porém ela estava bem ali na minha frente e o melhor de tudo: tinha água encanada. Na boate, para tomar um banho tínhamos que aparar água em um balde, May não gostava que tomássemos banho no banheiro dos quartos.Liguei a torneira dourada, a água começou a invadir a banheira. Levei a mão até debaixo da toneira, estava gelada, mas boa o suficiente para um banho.Fechei a porta do banheiro, tirei a camisola alça por alça, o tecido de seda escorregou pelo meu corpo, eu não tinha curvas para m
Enrolei o máximo que pude, não queria voltar para o quarto, aqui eu teria mais chances de fugir, porém, Marília, muito menos os seguranças não abaixaram a guarda momento algum, enquanto eu me matava de comer pão.Anna saiu da casa muitos minutos depois, eu soube porque foi quando Sebastian voltou para a sala de jantar. Ele franziu o cenho assim que me viu.— O que ela ainda faz aqui? — Perguntou para o segurança como se eu não estivesse lá.— Não queria que eu comesse, majestade?Percebo suas narinas ressaltarem.— Marília, leva a Jade pra cima, por favor.— Ainda estou comendo. — Alego.— Ainda temos o almoço, prometo a você que a comida não vai acabar. — Respondeu num tom de voz sarcástico.Reviro os olhos e levanto.Marília me escoltou de volta para o quarto, como de costume passou a chave pelo lado de fora.Sentei no sofá encarando o nada, aquela moça de mais cedo me deixou com um nó na cabeça. Era perceptível que ela e Sebastian tinham algo mais.Deito a cabeça no braço do sofá.
Sebastian não me levou para dentro, ao invés disso ele bateu a porta do carro me deixando lá sozinha, foi até um segurança e o puxou pela gola da camisa. Observei a cena inteira com lágrimas nos olhos. Ele brigando com todos enquanto apontava na minha direção, essas pessoas estavam pagando pelo que eu fiz.Ele finalmente entra. Um dos homens vem até o carro e abre a porta para mim, então me leva no colo até em casa. Sento no sofá enquanto eles pareciam atônitos procurando por algo gelado para colocar no meu tornozelo. Marília finalmente aparece com uma bolsa de gelo e coloca em cima do meu tornozelo.— Seu único trabalho era evitar que isso acontecesse, Marília! — Gritou Sebastian.Ela permanece de cabeça baixa.— Eu saio por poucos minutos e a Jade já vira a casa inteira do avesso. Como uma menina magricela como ela conseguiu ultrapassar todos vocês?! — Ele passou as mãos no rosto. — Caralho, não posso ficar longe nem por uma hora!Suspirei e olhei para o chão.Marília continuou pre