Sophie Al-Fayez
Desde a visita de Collin Blackwood, havia uma inquietação em minha mente, algo que eu não conseguia afastar, mesmo enquanto cuidava das tarefas do dia. Minha família parecia ainda mais animada do que o normal, como se a simples presença do conde tivesse iluminado a atmosfera da casa. Minhas irmãs, em particular, não paravam de comentar sobre ele. – Você viu como ele olhou para mim, Yasmin? – comentou Amal enquanto ajustava um broche de pérolas na gola do vestido. – Ele mal te olhou, Amal. Estava ocupado demais admirando minha nova pulseira – rebateu Yasmin, fazendo todas as outras rirem. Elas eram lindas, minhas irmãs, com seus traços finos e personalidades vibrantes. Eu as amava, mas não podia deixar de sentir que havia uma linha invisível que me separava delas. Não era apenas minha visão limitada que me fazia diferente, mas também o modo como eu enxergava o mundo. Enquanto elas sonhavam com romances grandiosos e vestidos luxuosos, eu me contentava com a simplicidade – uma caminhada no jardim, um livro antigo entre minhas mãos. Ainda assim, havia algo em Collin que despertara minha curiosidade. Ele não era como os outros homens que já haviam cruzado nosso caminho. Ele parecia... quebrado. E isso me intrigava. Naquela manhã, enquanto ajudava minha mãe a organizar os panos de seda recém-chegados do mercado, fui chamada ao escritório de meu pai. Era um espaço que eu raramente visitava, pois ele costumava reservá-lo para seus negócios e conversas privadas. Ao entrar, fiquei surpresa ao encontrar Collin sentado em uma das poltronas de couro escuro. Ele se levantou ao me ver, curvando-se levemente em um gesto de respeito. – Sophie, querida, sente-se – disse meu pai, apontando para a cadeira ao lado do conde. Obedeci, mas meu coração batia rápido. Algo estava acontecendo, algo que eu não entendia ainda. – O conde Blackwood tem algo importante a discutir com você – continuou meu pai, cruzando as mãos sobre a mesa. Collin voltou sua atenção para mim, seu olhar sério e intenso. Ele parecia escolher suas palavras com cuidado antes de finalmente falar: – Senhorita Al-Fayez, vou ser direto. Preciso de uma esposa. A declaração caiu sobre a sala como uma pedra lançada em um lago calmo. Pisquei, incerta se havia ouvido corretamente. – Uma esposa? – repeti, mais para ganhar tempo do que por real dúvida. – Sim. E acredito que você seja a escolha certa. Minha boca se abriu para responder, mas nenhuma palavra saiu. Havia uma franqueza em sua voz que me desarmava, uma honestidade que era ao mesmo tempo intrigante e assustadora. Meu pai interveio, talvez para aliviar a tensão. – Sophie, o conde explicou sua situação. Ele precisa de um casamento rápido e prático, e acredito que esta seja uma oportunidade para você também. Olhei para meu pai, tentando entender suas intenções. Não havia crueldade em sua expressão, apenas preocupação – uma preocupação que reconheci como genuína. Para ele, essa era minha chance de escapar da vida limitada que minha condição poderia me impor. Voltei meu olhar para Collin. – Por que eu? – perguntei, minha voz mais firme do que eu esperava. Ele inclinou a cabeça, como se ponderasse a resposta. – Porque você é diferente. E porque acredito que podemos oferecer algo um ao outro. Diferente. A palavra pairou no ar entre nós, carregada de significados. A conversa continuou por mais algum tempo, mas minhas respostas foram evasivas. Eu precisava de tempo para pensar, para entender o que essa proposta realmente significava. Quando finalmente deixei o escritório, minhas irmãs estavam esperando no corredor, seus olhos brilhando de curiosidade. – O que ele disse? – perguntou Yasmin, quase pulando de excitação. – Nada que vocês precisem saber – respondi, tentando manter minha voz calma. Elas resmungaram, mas não insistiram. Talvez tivessem percebido que algo mais sério estava em jogo. À noite, sentei-me no jardim, deixando a brisa fresca acalmar minha mente. O céu estava claro, e as estrelas brilhavam com uma intensidade que sempre me encantava. "Você é diferente." As palavras de Collin ecoavam em minha mente, provocando sentimentos conflitantes. Eu sabia que ele não era um homem comum. Sua aparência marcada pela guerra era apenas um reflexo das batalhas internas que ele enfrentava, assim como eu enfrentava as minhas. Mas um casamento por conveniência? Era uma escolha prática, talvez até lógica. Mas e quanto ao amor, à conexão verdadeira? Eu seria capaz de viver sem isso? Do outro lado da cidade, Collin também refletia sobre o dia. A proposta havia sido arriscada, ele sabia disso. Sophie era uma mulher inteligente, e ele podia sentir que ela não tomaria essa decisão levianamente. – O que achou dela? – perguntou Richard, entrando no escritório de Collin com uma taça de vinho na mão. Collin suspirou, passando a mão pelo rosto. – Ela é... interessante. Richard riu. – Interessante não é exatamente um elogio, meu caro. – Não é um insulto também – rebateu Collin, balançando a cabeça. – Ela é diferente. Não tenta agradar ou se exibir como as outras. Richard assentiu, sentando-se em uma poltrona próxima. – Então você acha que ela é a escolha certa? – Acho que ela é a escolha que faz sentido. Houve um silêncio enquanto ambos ponderavam a situação. Finalmente, Richard falou: – Espero que você saiba o que está fazendo, Collin. – Também espero – respondeu ele, com um leve sorriso. Nos dias seguintes, meu pai insistiu para que eu considerasse seriamente a proposta de Collin. Ele falava sobre estabilidade, sobre segurança, sobre como um casamento assim poderia me proteger de um futuro incerto. Mas foi apenas quando recebi uma carta de Collin que comecei a ver as coisas sob uma nova luz. Sophie, Entendo que minha proposta foi abrupta e talvez até insensível. Mas quero que saiba que não estou buscando apenas uma esposa para cumprir um dever. Estou buscando alguém com quem possa construir algo, mesmo que isso comece de maneira prática. Você tem uma força que admiro, e acredito que, juntos, podemos encontrar uma forma de fazer isso funcionar. Com respeito, Collin Blackwood. As palavras eram simples, mas sinceras. Havia algo nelas que tocou meu coração, algo que me fez reconsiderar minhas próprias reservas. Uma semana depois, aceitei sua proposta. Meu pai estava radiante, e minhas irmãs, embora surpresas, tentaram esconder sua inveja com abraços e sorrisos falsos. Collin veio pessoalmente para formalizar o acordo, trazendo consigo um anel simples, mas elegante, que encaixava perfeitamente em meu dedo. – Espero que isso seja o suficiente – disse ele, com um sorriso hesitante. – É mais do que suficiente – respondi, sentindo um calor estranho em meu peito. Enquanto os preparativos para o casamento começavam, percebi que minha vida estava prestes a mudar de maneiras que eu nunca poderia imaginar. E, embora ainda houvesse dúvidas em meu coração, havia também uma esperança crescente de que talvez, apenas talvez, esse casamento por conveniência pudesse ser o começo de algo mais.Collin BlackwoodOs dias que se seguiram ao aceite de Sophie foram um turbilhão de preparativos. Não para o casamento em si – isso seria uma cerimônia modesta, dada a natureza pragmática de nossa união –, mas para ajustar minha vida à ideia de ter uma esposa.Desde meu retorno da guerra, minha casa havia se tornado um reflexo de mim: sombria, silenciosa e funcional. Não havia flores no jardim, nem risadas ecoando pelos corredores. E agora, em poucos dias, eu teria alguém ao meu lado, alguém com quem dividir esses espaços vazios.Meu administrador, Thomas, entrou no escritório com um monte de papéis.– Precisamos revisar os contratos para a união – disse ele, colocando os documentos sobre a mesa.– Contratos? – perguntei, arqueando uma sobrancelha.– Sim, senhor. É necessário estabelecer os termos. Especialmente porque a senhorita Al-Fayez vem de uma família mercante influente.Suspirei, esfregando o rosto.– Eu não quero que este casamento se torne uma transação comercial.Thomas me o
Sophie Al-Fayez BlackwoodA viagem até Blackwood Hall parecia interminável. Sentada ao lado de Collin, percebia cada solavanco da carruagem e o barulho incessante das rodas contra o chão de terra. Apesar da beleza das paisagens britânicas, minha mente estava longe dali.Por mais que eu tentasse me preparar, nada poderia suavizar o peso do que eu estava deixando para trás: minha família, minha vida em Londres, e até a liberdade que, por mais limitada que fosse, eu tinha como mulher solteira. Agora, como Lady Blackwood, eu teria responsabilidades que ainda não compreendia totalmente.Collin estava ao meu lado, mas era como se estivéssemos a mundos de distância. Ele não era um homem de palavras desnecessárias, e seu silêncio parecia enraizado tanto na formalidade quanto em algo mais profundo que eu ainda não entendia.– Está confortável? – ele perguntou de repente, sua voz grave quebrando o silêncio.Virei-me para ele, surpresa com a gentileza inesperada.– Estou, obrigada.Não era verda
Sophie Al-FayezA luz filtrava-se pela grande janela do salão, criando padrões dourados no chão de mármore polido. O aroma de chá de hortelã e pétalas de rosas perfumava o ambiente, misturando-se ao som abafado das conversas femininas que ecoavam à distância. Minhas irmãs, lindas e sempre risonhas, preparavam-se para mais uma tarde de visitas.Sentada em um canto discreto, puxei a agulha com cuidado, guiando o fio de seda pelo delicado tecido em minhas mãos. Bordar era uma das poucas tarefas em que eu ainda conseguia me destacar. Embora minha visão não fosse nítida, eu sabia sentir a textura e os contornos, confiando mais nas mãos do que nos olhos.– Sophie, querida, você deveria vir conosco hoje – sugeriu Yasmina, minha irmã mais jovem, ajeitando um broche no vestido creme. – Mamãe sempre diz que precisamos nos exibir, ou nunca encontraremos um bom pretendente.Se ela notou a ironia no próprio comentário, disfarçou bem. A verdade, no entanto, era óbvia: enquanto Yasmina e as outras e
Collin BlackwoodO estalo das rodas da carruagem contra as pedras da estrada era um som monótono, mas reconfortante. Para alguns, poderia ser um lembrete da vida seguindo seu curso. Para mim, era apenas mais um ruído no silêncio constante que minha mente parecia impor. As cicatrizes em meu rosto ardiam levemente, uma lembrança constante da explosão que quase tirou minha vida durante a guerra."Herói de Bath", era como alguns insistiam em me chamar. Um título vazio que apenas mascarava a verdade: eu era um homem partido, tanto física quanto emocionalmente. As queimaduras não apenas desfiguraram meu rosto, mas também enterraram qualquer chance de viver uma vida normal.Agora, eu precisava de uma esposa.Era um pensamento amargo, mas inevitável. Sem um herdeiro, meu título e terras poderiam ser contestados, e eu não suportava a ideia de que tudo pelo qual minha família lutou fosse perdido. Assim, permiti que meu fiel amigo e conselheiro, Richard, organizasse um jantar naquela noite, conv