Assim que me visto, desço para o andar de baixo e pego as chaves do meu carro. Me despeço da minha família e, antes de abrir a porta da frente para ir trabalhar, escuto minha mãe falando:
— Alex, a reserva do restaurante é às 21 horas. Não se atrase! — Okay, mãe, eu não vou me atrasar. Encontro vocês lá. Tchau, te amo. Só de pensar que terei que ficar devendo horas no meu trabalho para poder ir às bodas de casamento dos meus pais me dá uma raiva. Toda vez que eles resolvem comemorar à noite, acaba em conflito, porque nesta família a gente não sabe ser adulto o suficiente para se comportar em público. Mas, de toda forma, é tradição, então não posso fazer nada para mudar. Assim que chego perto do centro da cidade, vejo bastante movimento. Hoje tem a feira da cidade, então há muitos shows ao vivo e comida de graça. Uma pena eu ter que ir para o bar nessa hora; eu adoraria ficar aqui e comer tudo sem precisar pagar nada. Chego na rua de trás do bar e estaciono meu carro ali mesmo. Sempre entro pelos fundos, pois é mais prático. Assim que entro, já noto aquela bagunça imensa e me arrependo de ter aceitado vir limpar isso, mas não podia deixar Tobias, meu chefe, na mão. Espero que pelo menos ele me pague as horas extras que vou ficar aqui, pois meu turno é à noite, não de dia. Ligo o som e coloco uma música para tocar. Fico pensando em qual horário o Josh viria aqui para conversar comigo, mas não vou ficar aflita; vou deixar ele ter seu tempo. Pego uma pá e uma vassoura e começo a limpar os vidros quebrados. Aqueles homens são uns brutamontes; onde já se viu quebrar copos assim? Pelo menos Tobias fez eles pagarem cada centavo. Tobias pode ser gentil, mas é um valentão, e todo mundo respeita ele por aqui, até porque o bar dele é bastante conhecido. A cidade toda vem aqui. Olhei no relógio e vi que já haviam se passado algumas horas e nada do Josh aparecer. Começo a ficar preocupada, pois ele está agindo diferente e não me dá notícias. Escuto um barulho de porta batendo e vou ver quem pode ter entrado no bar, já que ele ainda não foi aberto. Ao chegar na porta principal, vejo Josh com uma expressão de espanto, segurando uma caixa que parecia ser do trabalho dele. — Josh, o que aconteceu? Você foi demitido? Foi por isso que me ligou mais cedo? Josh me olha friamente, como se eu tivesse cometido um crime, mas ao mesmo tempo ele parece triste. — Alex, a gente precisa ter uma conversa séria, e precisa ser agora. Sinto uma crise de ansiedade começar a crescer, pois Josh está fazendo muito mistério. Começo a temer o que pode ser tão importante para ele ficar assim, tão sério. Limpei uma mesa e o chamei para sentar. — Olha, Alex, eu não tenho tempo para enrolar, então vou ser direto. Espero que você entenda com clareza tudo o que vou te contar. Isso não é brincadeira; é algo de vida ou morte. Fico espantada. Como Josh pode dizer isso e achar que vou ficar tranquila? Sinto minha respiração encurtar e meu coração acelerar. — Josh, seja o que for, diga logo. Já estou nervosa com tanto mistério. — Alex, você sabe que sou jornalista, certo? Talvez eu nunca tenha entrado em muitos detalhes da minha profissão com você, e acredito que, ao longo da nossa amizade, foi melhor assim. Mas vou ser direto e acabar com sua curiosidade. Ele faz uma pausa, respirando fundo. — Na semana passada, o diretor do meu setor pediu que eu reabrisse uma investigação sobre um caso encerrado há muito tempo. Esse caso é chamado The Tyrant. Algumas das famílias mais ricas e influentes de Vermont estavam sob suspeita de envolvimento em lavagem de dinheiro e tráfico de drogas. Mas não é só isso. Descobrimos que pessoas foram "apagadas" por saberem demais. Vai muito além de dinheiro e drogas. Josh pausa novamente, olhando para a caixa ao seu lado. — Eu investiguei a fundo e tive que ir até a cidade vizinha para encontrar um informante da polícia. Ele me entregou essa caixa com provas reais de que a operação The Tyrant ainda está ativa. E o pior: essas provas mostram que muitas famílias de alto escalão estão envolvidas. Ele pega um envelope de dentro da caixa, como se quisesse me mostrar. — Eu abri esse envelope e encontrei uma carta com um destinatário desconhecido. O texto mencionava uma família central nessa operação, envolvida em lavagem de dinheiro e tráfico há décadas. Havia uma foto dessa família. Josh respira fundo, hesitando. — Alex, o que estou prestes a te contar... é sério. Quando vi a foto, a família na imagem era a sua, Alex. A família King. Seus pais, seus tios... alguns rostos desconhecidos também. Pelo que descobri, eles foram peças-chave dessa organização criminosa. Meu coração acelera, e uma sensação sufocante me envolve. Tento organizar meus pensamentos, mas cada palavra de Josh ecoa, se misturando com as memórias da minha infância e da minha família. — Alex, eu sei que é difícil — ele diz, a voz mais suave agora, quase um sussurro. — Mas você precisa entender a gravidade disso. Eu balanço a cabeça, ainda tentando absorver tudo. — Mas... como você descobriu isso, Josh? — pergunto, a voz baixa. — Onde estão essas provas? Ele desvia o olhar por um momento, como se estivesse relutante em compartilhar mais. — Trabalhei nesse caso durante meses, Alex. Foram coletados documentos, escutas telefônicas, transações... — ele hesita antes de continuar, parecendo escolher as palavras. — E uma das últimas gravações traz a voz do seu pai... confirmando sua participação. Sinto o chão desaparecer sob meus pés. A ideia de que meus pais, sempre tão amorosos e cuidadosos, poderiam estar envolvidos em algo sombrio... parece absurda, impossível.— Não... não pode ser — murmuro, quase para mim mesma. — Meus pais sempre foram pessoas boas. Trabalhavam duro. Tudo o que temos é por causa disso... Josh me encara, e vejo um lampejo de compaixão em seus olhos. — Eu não estou dizendo que foi fácil pra eles — ele diz, lentamente. — Mas, Alex, às vezes as pessoas que mais amamos têm lados que nunca imaginamos. Fecho os olhos, sentindo as lágrimas começarem a se formar. — O que eu devo fazer agora, Josh? — minha voz sai fraca, quase quebrada. Ele se aproxima, colocando uma mão em meu ombro. — Precisamos descobrir o que realmente aconteceu, Alex. E a única maneira de fazer isso é encontrar as respostas que eles esconderam. Se você estiver disposta a me ajudar... talvez possamos descobrir toda a verdade.Eu sai rapidamente do bar em direção à floresta O céu estava nublado naquela tarde, e uma fina neblina cobria o ar enquanto eu me enfiava na floresta atrás de respostas. Cada passo no caminho coberto de folhas secas parecia
Volto ao cômodo dos fundos e procuro o quadro de energia. Consigo religá-lo, e a luz da casa volta ao normal. Retorno para a cozinha para ver se minha família deixou algum recado. Assim que entro, noto alguns copos quebrados perto do corredor e quadros caídos no chão. Não tinha reparado nisso antes, por causa da escuridão. Meu coração dispara. Algo está errado. Objetos quebrados, fora do lugar… Minha cabeça está a mil com as informações sobre meus pais, e o fato de ninguém dar sinal de vida só aumenta minha ansiedade e medo. Me aproximo devagar do corredor, cada passo fazendo o chão ranger. Quando chego à sala de jantar, tudo parece fora do lugar, como se o tempo tivesse parado. Então, vejo o horror.Meu coração para por um instante. Ali, ao redor da mesa, estão todos — minha mãe, meu pai, meus irmãos e até meus sobrinhos. Estão imóveis, silenciosos, com os rostos pálidos e os olhos fechados. Todos mortos. Meu corpo se recusa a se mover. É como se minhas pernas tivessem sido a
Cada passo é uma luta. Minhas roupas molhadas e pesadas grudam no corpo, e o frio da noite parece se infiltrar em meus ossos. Meus pés afundam na terra molhada enquanto continuo a caminhada, com o corpo exausto, mas a mente em alerta. A floresta, embora quieta, ainda guarda ecos dos gritos dos homens que deixei para trás. Não consigo evitar olhar por cima do ombro, sentindo que eles poderiam aparecer a qualquer momento. Depois de caminhar por quilômetros, vejo um brilho fraco no horizonte. Uma estrada. É uma visão surreal, quase inacreditável, e sinto uma pequena onda de alívio ao saber que estou perto de alguma forma de civilização. Me aproximo rapidamente e avisto, na beira da estrada, um telefone público. Sem hesitar, corro até ele e, com as mãos trêmulas, coloco algumas moedas que encontrei no bolso. Disco o número de Josh, e, após alguns segundos, ele atende. “Alô?” A voz dele soa cansada, mas familiar. Um alívio imediato me invade. “Josh… sou eu. Alex.” Minha voz sai quase co
Olho em volta, tentando localizar algum ponto de referência na escuridão. A floresta à minha volta é um labirinto de sombras, mas sei que preciso continuar. Josh pode estar por perto, ou pelo menos é o que eu espero. A ideia de perdê-lo também, depois de tudo, é insuportável.Caminho lentamente, com os músculos tensos e os sentidos em alerta. Cada folha que se move com o vento parece um sussurro ameaçador. Minha mão instintivamente vai até a faca presa ao meu cinto – é tudo o que tenho para me defender.“Josh!” chamo, minha voz saindo mais alta do que eu pretendia, cortando o silêncio da noite. Nada. Nem um eco. Apenas o farfalhar das árvores e o som distante de um riacho. Tento de novo, dessa vez mais hesitante: “Josh, sou eu... Alex.”Por um momento, penso ter ouvido algo. Um estalo, como um galho se partindo. Congelo no lugar, segurando o cabo da faca com força.“Alex?” A voz é baixa, quase um sussurro, mas reconheço na hora. Meu coração dispara, e viro na direção do som.“Josh!” c
Às vezes me pergunto como eu, uma pessoa tão ambiciosa, ainda moro em Vermont. A cidade é bela, a natureza salva minha alma, mas aqui nada é diferente, é sempre a mesma coisa. Sou dançarina e estudo na Escola de Artes de Stowe. Quando não estou em aula, vou para o bar do Tobias, onde trabalho. Passo poucas horas em casa e, para ser honesta, prefiro assim. São tantas pessoas morando lá que me pergunto se é possível manter a sanidade mental com meus sobrinhos chorando o dia todo. A casa onde moro tem cheiro de madeira antiga e, ao mesmo tempo, de terra molhada — deve ser porque fica em frente ao Lago Richard. O lago é patrimônio da cidade, e é incrível a vibe que traz morar em frente a ele e viver praticamente dentro da maior floresta de Vermont. A casa tem dois andares, dez cômodos, e nela vivem nove pessoas, com nenhum espaço pessoal. Essa é a minha vida. Moro com meus pais, meus irmãos, meus sobrinhos e, de brinde, meu tio recém-divorciado. São seis adultos, três crianças e outros