Parte 4...
Camila
Me ajeitei no sofá com uma resistência calculada, tentando não demonstrar a mistura de insegurança e irritação que pulsava em mim. Alejandro me observava como um predador que sabia que eu estava presa ali com ele.
Meus amigos estavam lá embaixo, mas com certeza os seguranças dele não iriam deixar que subissem.
— Seu pai me disse que você era aleijada - ele repetiu, apoiando o cotovelo no encosto do sofá enquanto me olhava com aquele sorriso que me dava nos nervos.
Minha respiração ficou pesada. Odiava aquele termo, mas decidi que não daria a ele o prazer de me ver irritada ou triste.
— É mesmo? E o que você acha agora que me viu? - cruzei as pernas.
Ele inclinou a cabeça levemente, os olhos se movendo para minha perna e depois para meu rosto.
— Acho que ele exagerou. Você mancou, mas não parece ser algo incapacitante.
— Que alívio saber que passo no teste - respondi, com sarcasmo escorrendo de cada palavra.
Alejandro soltou uma risada baixa, algo entre divertido e incrédulo.
— Gosto do seu fogo, Camila. Isso vai tornar as coisas interessantes.
— Não estou aqui para te entreter, Alejandro. Ainda falta tempo para mim. Ainda não se passaram três anos.
— Bobagem... Só tem mais duas semanas para isso. - se inclinou para mim — Vamos marcar a data do casamento.
Droga! Eu ainda não me sinto pronta a casar. Eu sei que estou dentro do final do prazo, mas a ideia ainda me incomoda um pouco. Eu nem sei nada sobre ele.
— Se quer marcar o casamento, ótimo. Mas antes disso, eu preciso te conhecer melhor.
Ele arqueou a sobrancelha, como se eu tivesse dito algo completamente absurdo.
— Já passaram os três anos, Camila. Quanto mais tempo você precisa?
— Três anos em que você me ignorou. Não houve uma ligação, uma mensagem, nada... Agora você aparece e espera que eu simplesmente obedeça sem questionar?
Ele reclinou-se no sofá, parecendo considerar minhas palavras.
— Você tem um ponto. Eu deveria ter mantido contato. Mas eu sabia que você precisava de liberdade antes de... - ele fez uma pausa, um sorriso sutil no rosto — Pertencer a mim.
— Pertencer? - repeti, indignada.
— Não se preocupe, eu cuido bem do que é meu. - mexeu a cabeça e chamou uma garçonete com um gesto.
Eu ia responder algo ácido, mas a garçonete entrou na sala trazendo uma bandeja com drinques. Ela parecia nervosa, provavelmente intimidada por Alejandro e a atmosfera que ele emanava. Mal olhou pra gente.
Ao colocar a bandeja na mesinha, ela esbarrou no copo de uísque de Alejandro, derramando parte da bebida em sua camisa impecável. Ele se jogou de lado.
— Maldição! - Alejandro levantou-se abruptamente, olhando para a mancha em sua roupa.
Eu não consegui evitar. Uma risada escapou antes que eu pudesse me controlar. Ele me lançou um olhar cortante, mas isso só tornou a situação ainda mais engraçada.
— Está rindo? - perguntou, a voz baixa, mas carregada de uma ameaça que não soava tão assustadora quanto ele provavelmente esperava.
— Um pouco, sim - admiti, mordendo o lábio para tentar me recompor.
A garçonete começou a gaguejar desculpas, mas Alejandro ergueu a mão para silenciá-la. Ela fechou a boca na hora.
— Tudo bem. Pode ir.
Assim que ela saiu, ele se virou para mim.
— Engraçado, não é?
— Muito - respondi, sem hesitar.
Ele suspirou, passando a mão pelos cabelos, claramente tentando recuperar o controle.
— Voltando ao que interessa - disse, sentando-se novamente. — Vamos marcar o nosso casamento.
— Não tão rápido - cruzei os braços, recostando-me no sofá. — Primeiro, vamos conversar. Quero entender o que você espera de mim como sua esposa.
Ele me encarou por alguns segundos antes de sorrir novamente. E tem o sorriso bonito.
— Está bem, Camila. Pergunte o que quiser. - continuou a limpar a camisa com um lenço.
Olhei para ele, avaliando se estava realmente disposto a ser sincero ou se aquilo era mais um de seus jogos. Decidi arriscar. Não o conheço realmente.
— Por que aceitou esse acordo?
— Porque achei que você seria um bom complemento para mim - ele disse, sem rodeios.
— Complemento? - estreitei os olhos.
— Sim. Inteligente, bonita, com uma dose saudável de rebeldia. Tudo o que um homem como eu precisa em uma esposa.
— E como sabia que eu seria assim, se nunca entrou em contato comigo?
— Eu tenho meios - pegou o copo.
Isso me deixou curiosa.
— Que meios? Meu pai passou informações sobre mim à você?
— Até que ele respondeu algumas de minhas perguntas, mas não foi ele o principal informante - bebeu um gole grande.
— Você tem informantes? Sobre mim? - fiquei surpresa. Não de um jeito bom.
— Mas é claro que sim - deu uma risadinha — E por acaso você acha que sua liberdade vem de onde?
— Do acordo que fiz com meu pai.
— Não, não... - ele balançou a cabeça, rindo — O seu pai lhe permitiu sair para o mundo, porque eu sempre estive protegendo você.
— Me vigiando, isso sim!
— Como queira - deu de ombro.
— E o que você vai me dar em troca?
Ele se inclinou para frente, o rosto mais perto do meu do que eu esperava.
— Tudo, Camila... Desde que saiba me obedecer.
Engoli em seco, sentindo a tensão no ar, mas não recuei.
— Veremos, Alejandro. Veremos.
— Acho que você não me entendeu, Camila. - a voz dele era baixa, mas carregada de um peso que me fez prender a respiração. — Eu não estou aqui para pedir sua permissão. Estou aqui para cumprir um acordo.
— E se eu decidir desistir? - perguntei, mantendo a cabeça erguida, embora o nervosismo estivesse começando a apertar meu peito.
Ele sorriu de lado, mas não havia humor no gesto.
— Não vai desistir. Não depois de todo o tempo que perdi esperando por você.
— Esperando? Sabe o que significa essa palavra? Você nunca se deu o trabalho de me procurar ou de falar comigo nesses três anos. Como isso é "esperar"? - rebati, sentindo a irritação crescer novamente.
Ele ergueu uma sobrancelha, o sorriso desaparecendo.
— Você acha que estava completamente livre, Camila? - balançou a cabeça devagar. — Eu sabia de tudo o que você fazia. A faculdade, os amigos, até as boates que frequentava.
Meu estômago afundou. Ele não podia estar falando sério.
— Então... Você... me vigiou mesmo? - perguntei, incrédula.
Alejandro não respondeu imediatamente. Ele pegou o copo de uísque novamente, como se estivesse deliberando sobre como me responder.
— Digamos que eu tinha interesse em garantir que você estivesse segura... E que mantivesse sua palavra.
— Minha palavra? - ri com sarcasmo, balançando a cabeça. — Que piada! Eu fui jogada nesse acordo como um prêmio de consolação para você. E agora você quer me forçar a viver como... O quê? Sua esposa-troféu?
Ele deu um leve sorriso, mas havia algo sombrio nele.
— Muitas no meu mundo seriam gratos por uma posição como essa.
— Eu não sou "muitas", Alejandro.
Os olhos dele estreitaram, mas, em vez de rebater, ele fez algo que me pegou desprevenida: começou a rir.
— É por isso que eu escolhi você. Essa sua língua afiada, essa rebeldia... É até fascinante.
Parte 5...Camila— Fascinante? - cruzei os braços. — Você está começando a me irritar, sabia?— Não sabia que tinha o temperamento esquentado - disse ele, recostando-se novamente no sofá. — Essa informação não me passaram. Agora, me diga, o que você quer saber?— Quem foi o informante que você colocou para me vigiar? - disparei, sem pensar muito.Alejandro pareceu avaliar se me responderia ou não, mas acabou cedendo.— Um dos seus professores da faculdade. Professor Vasquez. Ele me devia favores.Minha mente girou. Vasquez. O professor de marketing. Ele sempre parecia interessado demais em saber sobre minha vida, perguntando sobre meu futuro, minha família...— Ele me reportava diretamente sobre seus progressos, seus horários, e qualquer problema que surgisse.— Você é inacreditável... Isso é errado - murmurei, sentindo um misto de raiva e incredulidade. — Ficar me vigiando.— Acredite, Camila. Não era só curiosidade. Era proteção.— Proteção? - minha voz subiu que ficou até fina. —
Parte 6...CamilaA noite estava quieta demais, como se o silêncio antecipasse o que eu ia fazer. As luzes amareladas do campus iluminavam o caminho pavimentado, mas eu me mantinha nas sombras, meu coração martelando no peito. Malena estava ao meu lado, os olhos atentos vasculhando o entorno como uma sentinela.— Tudo pronto? - sussurrei, minha voz quase inaudível. Ela assentiu.— O motorista do táxi está te esperando na esquina. As passagens estão no seu bolso, e minhas primas já sabem que você está a caminho.— Não seria melhor se eu me escondesse no fundo de um dos furgões de comida?— Eu chequei isso, não ia dar. Eles são param quando chegam na empresa que fornece a comida para a faculdade. Você ficaria presa lá dentro. O táxi é melhor.— E você? - olhei para ela, meu peito apertando com a culpa. — Não posso te deixar aqui sozinha com tudo isso.— Eu vou ficar bem. - Malena apertou meu braço com firmeza, me forçando a continuar andando. — Eu não posso sair agora, mas você pode. E
Parte 7...Camila— Eu sei que ela parece ser rude, mas é só o jeito dela, amiga - Malena me disse ao celular.— Parece que ela não gostou muito de ter me ajudado - eu estava no banheiro.— Não se preocupe, eu contei um pouco do motivo e ela entendeu. Clara teve uns problemas no passado com um ex namorado.— Mas será que ela não vai contar para alguém? Fiquei preocupada.— Não vai, não. Ela é de confiança, eu garanto. É só o jeito meio seco dela falar.— Letícia me pareceu mais solta.— E ela é mesmo - ouvi sua risada — Ela pode ser uma boa amiga sua também.— E por aí, falando em amiga... Alguém notou minha falta?— Até agora, não. Ainda é cedo pra isso.— Malena, eu não pensei na questão dos rivais de meu pai... Só me preocupei em escapar do casamento.— Agora já era... Você tem que seguir.— Eu sei, mas qualquer coisa, você me avisa. Eu não vou sair da pousada.— Faça isso. Eu vou ligar para o celular da Clara ou da Letícia.— Certo. Eu aguardo. - suspirei — Se cuida por aí... Eu..
Parte 8...CamilaA escada para o porão era estreita e rangia. O espaço era apertado, com caixas empilhadas e um cheiro de mofo impregnando o ar. Clara fechou a porta acima de nós com cuidado e se virou para mim.— Fique quieta. Qualquer barulho pode atrair atenção - ela sussurrou. — Eles vão dar um jeito nisso.O silêncio voltou, mas dessa vez era sufocante. Ouvi passos lá em cima, o som de portas sendo abertas e fechadas. Meu coração martelava no peito, e eu me peguei prendendo a respiração para ouvir melhor.— Eles estão procurando algo - Letícia murmurou, com os olhos arregalados.— Ou alguém - Clara corrigiu, com a voz fria e olhando pra mim.O som de passos ficou mais alto, como se estivessem descendo a escada.— Alguém está vindo! - sussurrei, meu coração quase saltando pela boca.Clara fez sinal para que ficássemos em silêncio total. Os passos pararam do lado de fora da porta. O silêncio era tão denso que eu quase podia ouvir o sangue pulsando em meus ouvidos.De repente, a po
Parte 9...AlejandroMeu telefone vibrou sobre a mesa do escritório, interrompendo minha conversa. O nome de Héctor brilhava na tela. Meus irmãos se calaram. Peguei o aparelho e atendi sem hesitar.— Olá, Héctor! Presumo que saiba da situação. - minha voz saiu firme, sem rodeios.— Sim... Eu já sei - ouvi um suspiro irritado do outro lado — Alejandro, essa garota nos desonrou. - a voz de Héctor era um misto de raiva e frustração. — Fugir desse casamento é um ato de traição. Mesmo sendo minha filha, isso não é aceitável... Eu peço desculpas pelo comportamento dela.Recostei-me na cadeira, deixando um longo silêncio se instalar. Héctor estava irritado, mas isso era exatamente o que eu precisava.— Estou cuidando disso, mas preciso de sua permissão para usar... Todos os meios necessários. - vi o sorriso de Ricardo.— Você tem carta branca. Não importa o que seja preciso, Alejandro. Faça o que for necessário. Essa união é crucial, e Camila precisa entender isso.— Não se preocupe, ela vai
Parte 10...CamilaO sol da tarde atravessava a janela da pequena pousada, iluminando o modesto quarto onde nos reunimos. A pequena mesa estava coberta por mapas, passagens de trem e anotações rabiscadas em folhas soltas. Era um caos organizado, e minha cabeça latejava com as informações.— Então é isso. - Clara apontou para um dos mapas com o dedo firme. — De Madri, você vai pegar o trem noturno até Barcelona e, de lá, o voo para Roma. É mais demorado, mas é bem melhor assim, porque confunde quem estiver procurando por você.— Verdade - Letícia disse — Falei muito rápido com Malena e sua família já sabe - ela mordeu o lábio — Inclusive, ela foi chamada para falar sobre sua fuga.— E aí? - me preocupei com Malena.— Bom, aí que ela segurou a língua até que mostraram um vídeo da gente, recebendo você na estação de trem - encolheu os ombros.— Meu Deus... E agora?— Agora que ela vai ter que segurar a onda - Clara soltou um suspiro — Meu tio não vai aceitar que ela tenha se metido niss
Parte 11...CamilaA van avançava aos trancos pela estrada, cada solavanco arrancando um grito silencioso da minha perna. O lugar onde o tiro de Diego me atingira há anos, parecia latejar como se fosse ontem. Não era só o esforço físico, era mais o estresse.Eu segurava o banco com força, tentando ignorar a dor. Do meu lado, Clara e Letícia estavam imóveis, mas seus olhos gritavam o medo que nenhuma de nós ousava colocar em palavras. Letícia mais ainda. Seu rosto estava corado.Diego nos encarava do fundo da van, um sorriso cruel emoldurando seu rosto deformado pela raiva. Ele parecia um homem possuído, consumido pelo ódio que carregava há anos.Era exatamente como eu me recordava daquele dia horrível em que ele invadiu nossa casa.— Sabe, Camila - ele disse, a voz escorrendo sarcasmo — Você e sua mãe destruíram minha vida. Ela deveria ter sido minha. Seu pai roubou tudo de mim: meu futuro, minha honra. Agora, chegou a hora de pagar por isso. Eu sou paciente, sabia que se aguardasse
Parte 12...Camila— Você não faria isso! - fiquei indignada.— E como sabe disso? - ele deu uma risadinha fria — Você não me conhece, nunca quis.— E nem você a mim - puxei o braço, mas ele foi rápido e me pegou de novo, me fazendo sentar em seu colo — Alejandro...— Como você sabe que eu nunca quis? - seu olhar parou em minha boca.Eu engoli em seco, estremecendo de leve. Estamos perto demais. Sinto o cheiro dele, sua boca perto da minha, sua voz grave. Ele estava me provocando.Tinha uma tensão entre nós, mas não era ruim. Não sei explicar.— Alejandro... - o nome dele me escapou, carregado de confusão.Não sei como me sentir agora. Estou estressada por ter reencontrado Diego após tantos anos. Eu tentei evitar pensar nele durante anos, enquanto me recuperava de sua crueldade contra uma menina de apenas doze anos.Ver Diego entrando pela porta do quarto me fez sentir um ódio, um medo, tudo junto e isso me estressou demais.Ele se inclinou um pouco mais, sua boca quase tocando a minh