Parte 10...CamilaO sol da tarde atravessava a janela da pequena pousada, iluminando o modesto quarto onde nos reunimos. A pequena mesa estava coberta por mapas, passagens de trem e anotações rabiscadas em folhas soltas. Era um caos organizado, e minha cabeça latejava com as informações.— Então é isso. - Clara apontou para um dos mapas com o dedo firme. — De Madri, você vai pegar o trem noturno até Barcelona e, de lá, o voo para Roma. É mais demorado, mas é bem melhor assim, porque confunde quem estiver procurando por você.— Verdade - Letícia disse — Falei muito rápido com Malena e sua família já sabe - ela mordeu o lábio — Inclusive, ela foi chamada para falar sobre sua fuga.— E aí? - me preocupei com Malena.— Bom, aí que ela segurou a língua até que mostraram um vídeo da gente, recebendo você na estação de trem - encolheu os ombros.— Meu Deus... E agora?— Agora que ela vai ter que segurar a onda - Clara soltou um suspiro — Meu tio não vai aceitar que ela tenha se metido niss
Parte 11...CamilaA van avançava aos trancos pela estrada, cada solavanco arrancando um grito silencioso da minha perna. O lugar onde o tiro de Diego me atingira há anos, parecia latejar como se fosse ontem. Não era só o esforço físico, era mais o estresse.Eu segurava o banco com força, tentando ignorar a dor. Do meu lado, Clara e Letícia estavam imóveis, mas seus olhos gritavam o medo que nenhuma de nós ousava colocar em palavras. Letícia mais ainda. Seu rosto estava corado.Diego nos encarava do fundo da van, um sorriso cruel emoldurando seu rosto deformado pela raiva. Ele parecia um homem possuído, consumido pelo ódio que carregava há anos.Era exatamente como eu me recordava daquele dia horrível em que ele invadiu nossa casa.— Sabe, Camila - ele disse, a voz escorrendo sarcasmo — Você e sua mãe destruíram minha vida. Ela deveria ter sido minha. Seu pai roubou tudo de mim: meu futuro, minha honra. Agora, chegou a hora de pagar por isso. Eu sou paciente, sabia que se aguardasse
Parte 12...Camila— Você não faria isso! - fiquei indignada.— E como sabe disso? - ele deu uma risadinha fria — Você não me conhece, nunca quis.— E nem você a mim - puxei o braço, mas ele foi rápido e me pegou de novo, me fazendo sentar em seu colo — Alejandro...— Como você sabe que eu nunca quis? - seu olhar parou em minha boca.Eu engoli em seco, estremecendo de leve. Estamos perto demais. Sinto o cheiro dele, sua boca perto da minha, sua voz grave. Ele estava me provocando.Tinha uma tensão entre nós, mas não era ruim. Não sei explicar.— Alejandro... - o nome dele me escapou, carregado de confusão.Não sei como me sentir agora. Estou estressada por ter reencontrado Diego após tantos anos. Eu tentei evitar pensar nele durante anos, enquanto me recuperava de sua crueldade contra uma menina de apenas doze anos.Ver Diego entrando pela porta do quarto me fez sentir um ódio, um medo, tudo junto e isso me estressou demais.Ele se inclinou um pouco mais, sua boca quase tocando a minh
Parte 13...Camila— Não chore. Você já tem idade para assumir seus problemas.— Eu sei disso, não sou criança - respondi esfregando os olhos.— Então pare de agir como uma, porra!Eu tentei sair do colo dele, mas Alejandro me segurou pela cintura.— Olha, você não tem que ficar com raiva e nem me cobrar nada - fiquei indignada.— Você ainda não me viu com raiva - respondeu me jogando deitada no banco e veio por cima de mim — Mas vai ter oportunidade para isso, quando for minha mulher. - ele riu de um modo até diabólico. — Você não faz ideia do quanto eu me controlei para não fazer um assassinato coletivo - prendi a respiração.— Não precisa ser rude assim...Ele me cortou, parecendo mais raivoso.— Rude? Se eu não tivesse chegado a tempo, aquele canalha, filho da puta, teria feito horrores com você, só para atingir seu pai. - segurou meu rosto — Você teria arruinado sua vida e de outras pessoas também. Não pode ser infantil assim, Camila.Eu abri e fechei a boca de imediato. Eu sei q
Parte 14...AlejandroQuando eu soube que o infeliz do Diego já estava no encalço de Camila, fiquei furioso, quase fora de mim. Só não me estressei mais, porque Ricardo já estava com tudo acertado.Eu não ia deixar que novamente Diego causasse problemas para ela. Ainda me incomoda muito o que aconteceu no passado e não posso tirar minha parte da culpa.Quando cheguei até a pousada, foi a maior sorte que Diego apenas tinha conseguido pegar Camila há pouco tempo.Se ele tivesse desaparecido com ela, eu teria muito mais trabalho para descobrir onde estava escondida. E até encontrar seu esconderijo, quem sabe que diabos ele teria feito com ela.Me importei mais com Camila do que deveria e Diego acabou escapando. Mas eu o conheço, ele não vai parar. O ódio que ele nutre pelo pai de Camila é grande demais.Agora ainda tem as duas garotas. De certo o pai delas vai querer que eu devolva as filhas de imediato, mas ainda tenho que saber até que ponto elas se envolveram com essa burrice de Camil
Parte 1...CamilaEu tinha acabado de chegar de uma consulta na clínica de sempre, mas era só uma rotina. Como minha perna estava me incomodado um pouco, eu achei melhor falar com o médico.Eu ainda sentia o eco das palavras do médico na consulta, enquanto o carro percorria as ruas que levavam de volta à nossa casa. A dor na perna era incômoda, mas suportável. O doutor, como sempre, reforçava que eu precisava manter os exercícios de fisioterapia. Às vezes, eu me perguntava se ele achava que eu era menos teimosa do que realmente sou.Eu só parei com a terapia, tempos atrás, porque não estava me incomodando. Acho que esses dias eu exagerei na natação.Assim que entrei na sala de estar, minha mãe estava sentada no sofá, bordando alguma peça de roupa como fazia quando queria distrair a mente. Ela ergueu os olhos e sorriu com ternura, mas não parou o bordado.— Como foi no médico, querida? - ela perguntou, sem desviar as mãos do trabalho.— Nada demais. Ele só reclamou da minha falta de p
Parte 2...CamilaEu estava saindo da cozinha e ao passar em frente do escritório de meu pai, parei ao ouvir a voz de minha mãe.— Eu sei da importância desse acordo, meu marido... Mas você não acha que ela deveria poder escolher?— Escolher o quê, Valéria? - a voz de meu pai era seca — Nossa filha é aleijada.— Pelo amor de Deus, homem, não fale assim dela - encostei o ouvido na porta ao ouvir minha mãe retrucar — Camila não é aleijada.— E ela manca porque motivo, então? - ouvi um som forte, como uma cadeira sendo arrastada — É um charme dela?Ouvir aquilo me deixou triste. Meu pai nunca aceitou meu problema, que nem mesmo foi criado por mim. Aliás, se existe um culpado disso dentro dessa família, ele é quem deve se sentir assim. Eu fui uma vítima.— Por que você tem que ser frio dessa forma, Hector? Ela é sua filha. Sua única filha!O silêncio que se seguiu foi tão cortante quanto as palavras do meu pai. Encostei a mão na maçaneta, hesitando entre entrar e enfrentar aquela discussã
Parte 3...Três anos depois...CamilaA música pulsava no meu corpo, uma batida forte e animada que parecia combinar perfeitamente com o ritmo da minha vida nos últimos três anos. Malena estava ao meu lado, rindo de algo que um dos nossos colegas tinha dito, e eu não podia deixar de sorrir. Essa era a liberdade que eu tinha decidido abraçar, mesmo sabendo que meu tempo estava contado.Minha taça de vinho rosé já estava pela metade quando senti Malena puxar meu braço.— Vem dançar, Camila! - ela gritou, se inclinando para que eu ouvisse.— Eu já tô indo! - retruquei, apontando para a taça como desculpa e depois para a perna.Ela revirou os olhos, mas foi para a pista mesmo assim. Eu gostava de observá-la se soltar. Malena era minha constante, meu porto seguro nesses anos de independência. Apesar de nunca sair muito, quando ela se jogava, era para valer. E eu também não era de viver em festas e boates, apenas quando tinha um bom convite. Me dediquei mesmo a fazer bom proveito de minha