Theo
Estávamos no carro há mais de três horas, não aguentava mais, sentia que já poderia fazer parte do estofado, meu corpo todo doía e ainda por cima estava irritado. Meu pai decidiu que tínhamos que nos mudar. Quando o confrontamos de o motivo dessa tragédia estar se abatendo em nossas vidas, ele se limitou a dizer somente: “Uma cidade mais calma, no interior, é o melhor lugar para criar vocês”. Só de lembrar-me disso ficava entediado. Segundo ele era para o nosso bem, mas eu e minha irmã gêmea não concordávamos, nós tínhamos nossa vida. Como desfazer de nossos amigos de repente? Com dez anos fica muito difícil se enturmar num grupo já formado e ser popular.
Ser criança é complicado, sua opinião não vale nada. E se nesse novo lugar tivesse um monte de estranhos? E se não tivesse uma pista de skate? Ficaria louco com certeza!
Tudo bem! Confesso que poderia estar exagerando, podia parecer um drama de criança, mas, para mim, naquele momento, pareceu o fim do mundo.
Depois de um tempo, que na verdade pareceu uma eternidade, chegamos enfim em frente ao meu novo lar.
Até que não era ruim, dois andares, varanda enorme, quintal grande de grama verde, tinha até uma árvore na frente com balanço, onde uma cerca branca de madeira circulava toda a casa.
Possivelmente eu poderia enumerar os contras dali se não tivesse minha atenção totalmente desviada.
Quando eu desci do carro escutei a maior algazarra nos vizinhos. Curioso, me aproximei da cerca que fazia divisa com a casa ao lado. Foi quando eu a vi: ela tinha os cabelos encaracolados e vermelhos, era tão branquinha que chegava a doer os olhos, cheia de sardas no rosto. Estava correndo pelo gramado atrás de um cachorrinho, gritando e pulando, com um vestidinho azul de bolinhas brancas que voava ao redor dela, como se fosse um anjo.
De repente ela parou, olhou diretamente pra mim. Todo o ar foi sugado dos meus pulmões. Ela tinha os olhos num verde mais lindo que já tinha visto. Quando abriu um sorriso, eu precisei me segurar para não cair.
E foi aí que percebi que as coisas iriam mudar.
Desconfiei que, afinal, não seria tão ruim morar ali.
MarinaJá vi gente dizendo que quem pratica o bullying não tem a noção do quanto machuca os outros, que pode ser uma forma para chamar atenção, que pode ser insegurança e um monte de motivos que não cabe no que ele realmente causa. Eu nunca concordei com essas “explicações”, acredito que todos que sofreram essa agressão alguma vez na vida irão me dar razão. Para mim, como todo ato intencional para magoar, ele é uma covardia, uma maldade feita exatamente com esse intuito. Machucar e humilhar...E com isso dito eu afirmo, o ensino médio é uma droga!Quem teve uma experiência boa nessa loucura não irá concordar comigo, mas vou te dizer que de longe foram os piores anos da minha vida. Essa passagem da minha história foi um inferno. Além, claro, dos hormônios adolescentes qu
TheoEu sabia que ela estaria nessa universidade, mas vê-la depois de meses, e ainda por cima tão mudada, fez com que eu perdesse a noção de tudo.Aconteceram tantas coisas nos últimos três anos que tudo virou de cabeça para baixo. Minha vida estava uma confusão, claro que nada justificava a forma como tratei Marina. Mas eu era um adolescente imaturo e facilmente influenciável.Meu pai vivia na minha cola, pressionando-me para ser alguém, que eu tinha que ter mais responsabilidade e estava na hora de virar homem, decidir o rumo da minha vida. Pode ser besteira para alguns, mas naquele momento foi como explodir minha mente. Acovardei-me, acabei procurando refúgio onde era mais seguro e fui engolido pela arrogância da minha irmã. Ela controlou meus sentimentos e atitudes. Eu sei que que fui um idiota, verdadeiro babaca, magoei a pessoa que sempre me aceit
MarinaMeu apartamento era pequeno, bem próximo ao campus, na sala tinha um sofá de três lugares, uma mesinha de centro, uma estante com meus livros favoritos e uma televisão de plasma. Cozinha americana pequena, com um armário e um fogão no cantinho. Dois quartos e um banheiro. Resolvi não dividir com ninguém, achava que para o meu estado de espírito era melhor morar sozinha mesmo.Quando pisei na sala, depois de uma tarde inteira resolvendo algumas coisas importantes da faculdade, notei algumas coisas fora do lugar. Espera aí. Tinha uma mala em cima do sofá? Olhando em volta, notei mais algumas coisas estranhas, na cozinha tinha panelas e pratos dispersos, como se alguém tivesse feito uma refeição.Peguei o guarda-chuva que deixava ao lado da porta e me armei pronta para atacar o invasor. Andei o mais silenciosamente possível no corredor que le
TheoEsse foi o dia mais feliz, de meus últimos três anos. Apesar de ter sido totalmente forçada, a proximidade com a Marina me deixou animado. Fazia muito tempo que não tinha uma conversa com ela. E como sentia falta disso. Já estava me preparando para sair, quando a vi conversando com o Lipe. O cara estava jogando charme e sorrindo, acariciou o rosto dela com as pontas dos dedos, fazendo-a rir.Eu fui andando para a porta e esbarrei nele, por querer mesmo. Se viesse tirar satisfação, que se danasse. Ela era minha, porra! Eu não ia abrir mão e deixar qualquer babaca entrar em meu caminho. O direito de colocar um sorriso em seu rosto, ou fazê-la feliz, era exclusivamente meu.Fui direto para a próxima aula, mas sentei longe, não estava no humor de aguentar ele dando em cima dela. A aula passou muito rápido, graças a Deus. Porque se eu o visse tocando-a d
Marina— Caramba, o Edu tá demorando!Ótimo, estava falando sozinha agora, devia estar parecendo louca no meio do pátio reclamando igual a uma velha. Acho até que resmunguei quando um carinha passou do meu lado e sorriu para mim.Mas, por favor, me dê um desconto, meu dia havia sido péssimo. Bem, não era verdade, foi legal até a hora do almoço. Aquela safada da Carol, dando em cima do Theo, deixou-me com os nervos à flor da pele. O engraçado foi que ele a rejeitou, por gostar de alguém, segundo o que ela nos contou. Só gostaria de saber quem era...Estava com ciúmes, eu sei. E me odiei por isso. Mas o que podia fazer? Ele era meu amigo, desde sempre, e agora estava apaixonado.Nossa, mas o que o Edu estava fazendo? Será que alguém o sequestrou? Eu só queria banho e cama. Já eram cinco horas da tarde, estav
TheoMerda!Será que podia dar tudo tão errado? A música que coloquei para ela na terça tinha surtido um efeito surpreendente. Vi em seus olhos o quanto ficou mexida e tive esperanças de que as coisas mudassem.Mas quando viu a Carol dando em cima de mim, o dia que podia ser bom foi por água abaixo. Agora Mari estava sentada na aula de Direitos Humanos com a cara fechada, me fuzilando toda vez que olhava para o meu lado. O pior que tinha uma garota — que eu nem sabia o nome — se inclinando para mim, com os seios quase saindo do decote.Ótimo, perfeito. Só me faltava essa.Eu decidi dar um tempo, porque afinal eu não podia fazer nada por ela. Na verdade, eu nem sabia por que estava tão chateada. Nós não tínhamos coisa alguma e aquele idiota do Felipe não parava de tocar e falar em seu ouvido.— Nós vamos fal
MarinaTheo me olhou e sorriu, todas as vezes que isso acontecia fazia minhas pernas virarem gelatina. Ele escondia alguma coisa, suas mãos estavam para trás e seu rosto ficou vermelho como um pimentão. Aproximou-se e me deu um beijo no rosto.— Bom dia, Mari. — Corou ainda mais, como se fosse possível.— Oi, Theo. O que você tem aí atrás?Abaixou a cabeça e começou a fazer círculos no chão com o tênis. Eu tive que rir, nunca o vi tão envergonhado. Nós éramos amigos há dois anos e ele sempre foi extrovertido. O que aconteceu para ficar assim?— É... é um presente. Não ria, ok?Eu assenti e ele me estendeu uma caixinha, num papel de presente todo amassado. Dentro da caixa havia um colar de couro com um pingente de madei
TheoNão entendia a Marina! Sério! Se estava com tanta raiva da Carol dar em cima de mim, por que dava bola para aquele idiota? Meu amigo, se olhar matasse, eu estaria durinho no chão. O Lipe atacou assim que viu uma brecha, só não teve muita sorte, mesmo percebendo que ela queria me provocar, minha ruivinha o dispensou e saiu sozinha.Agora a Carol não parava de tagarelar na cabeça da Marina. Eu juro, tinha fumaça saindo dos ouvidos dela.O professor entrou e todo mundo ficou em silêncio.— Pega aí, irmão. — Um garoto me estendeu um papelzinho.Eu abri e era do Enzo. Ele dizia o seguinte:“Cara, a Carol tá espalhando pra todo mundo que dormiu com você.”Eu olhei para ele com os olhos arregalados, que acenou confirmando. Aí me toquei, era por isso que a Marina estava