POV CLARA
- Eu... Vou ao banheiro. – Avisei Artemis, levantando do meu assento.
Segui pelo corredor e fui ao banheiro que tinha ao final dele. Sentei-me na privada do pequeno espaço e abri minha bolsa. Dela retirei um analgésico, para aliviar minha dor de cabeça... Um Dramin, para acabar com o enjoo... Um Betina, para melhorar a tontura e completei com dois Valium, para terminar com a minha existência, de uma forma branda. Eu só queria dormir. E nunca mais acordar.
Assim que ingeri o último comprimido, voltei para o meu assento.
- Como é a sensação de estar livre e voltando para casa? – Artemis perguntou-me, com um sorriso.
Peguei a mão dele e forcei um sorriso:
- Sabe que é engraçado depois de onze anos descobrir que não sei o que é “casa”? Porque embora eu amasse a Austrália... Nunca me senti como estando em casa.
Despertei na enfermaria do aeroporto, sentindo uma leveza no corpo que parecia que havia morrido e despertado em outra dimensão. Olhei para o lado da maca e vi Artemis, com a cabeça abaixada, as mãos nas têmporas, parecendo preocupado.- Pelo visto... Não morri! – Brinquei.Ele me olhou, parecendo bem brabo:- Não mesmo! E não morrerá... Ao menos não enquanto eu estiver ao seu lado.- Eu... Não sei do que está falando.- Joguei a porra dos seus remédios fora. Onde conseguiu aquilo tudo?- Na farmácia... Do aeroporto.- Se tentar se matar de novo, eu mato você.Comecei a rir e ele não se deu ao trabalho de sequer mover os lábios, com olhar recriminador na minha direção:- Isso não é engraçado.Sentei-me na maca e abaixei a cabeça:- Prometo não f
- O conheço o suficiente para saber que ele jamais me perdoaria... – Sorri, olhando para o céu – Acho que vou gostar do Hawaii. Você já esteve lá?- Eu não! O máximo que cheguei foi na Austrália.- Se eu pedisse para você assinar antes de partir um documento dizendo que não me sequestrará por anos, me obrigando a fazer suas vontades, vivendo só para satisfazê-lo enquanto tudo que me dá em troca é dor e sofrimento... Assinaria? – Sorri sem jeito, sendo o mais sincera possível.Artemis me abraçou e aos poucos fui deitando a cabeça em seu peito:- Tudo isto passou, Clara. Você é livre, mulher! Em breve voltará a usar seu sobrenome de solteira e tudo que sobrará é a triste lembrança do tempo que passou ao lado de Patrick.- Ficaram marcadas na alma... E foram onze longos an
Eu já estava no Hawaii quando soube que Sophie Huxley havia morrido, ao Artemis me mostrar uma pequena nota num jornal online australiano. Não que Patrick fosse importante no país, mas Sophie era considerada uma socialite, já que sempre tentou frequentar a alta classe.- Ela não caiu da escada... – Falei, preocupada, sentindo uma onda de frio, num ambiente a quase 30°C, passando pelo meu corpo – Foi ele.- Clara... Patrick pode ser violento, traiçoeiro, ciumento, possessivo... Mas assassino? Eu nasci praticamente com ele... Nos criamos juntos. Eu sei o quanto ele sempre amou a mãe.- Patrick matou a própria mãe! O psicopata busca uma posição de superioridade, quer demonstrar que tem o poder e controle e faz isso degradando e humilhando suas vítimas. Alguns sentem essa sensação com a tortura, outros com o momento do assassinato e tem quem vá ma
- Não importa onde esteja, irei encontrá-la, Clara.- Não tenho medo de você.- Será que seu irmão também não tem?Senti meu coração acelerar:- Do que está falando?- O que você achou do seu sobrinho? É um lindo bebê, não?Meu Deus! Do que Patrick estava falando? Sentei-me na areia, pois minhas pernas tremiam tanto que já não me mantinham de pé. O pesadelo havia voltado à minha vida.- Vai dizer que você não conheceu ainda o filho de Renan? - Não... Eu... Não fiquei em Noriah Norte.- Ah, Clara, eu fico tão feliz em ouvir isto. Por um momento achei que pudesse ter ficado lá e estar no Hawaii somente a trabalho. Isto quer dizer que está morando nos Estados Unidos?- Patrick, é a minha vi
Naquele mesmo ano parti para República Dominicana com uma equipe de filmagem que faria um documentário sobre Mick Fanning, o campeão mundial de surf de 2009. Achei interessante a proposta, já que Mick havia sido ofuscado por seu antecessor e sucessor, que era, incrivelmente, a mesma pessoa: Kelly “Hell” Slater, que a cada vez que dizia que iria se aposentar, levava uma taça de melhor do mundo, abocanhando o título em 2008, 2010 e 2011.Se era meu maior sonho ir para República Dominicana acompanhada de pessoas que eu mal conhecia? Não, não era. Mas era um lugar pequeno e certamente ninguém ouvira falar de Clara Huxley por lá.Quando comentei sobre minha decisão com Artemis, logo ele achou que pudesse ser por conta de Patrick. E embora fosse, eu não queria preocupá-lo, até porque me sentia razoavelmente segura.Patrick me fez voltar a falar com meu irmão, embora aquela não fosse sua intenção. Só queria me botar medo... Quando no fim me fez um bem enorme lembrar que eu ainda tinha famíli
Já havia reservado um hotel pela internet quando ainda estava na República Dominicana. Não tinha um telefone, mas compraria um laptop.O hotel ficava numa esquina. Tinha quatro andares com sacada em cada quarto. Mas era pequeno e não dispunha de nenhuma área de lazer. A parte térrea tinha um pequeno cômodo onde ficava a recepção. E o restante era comercial.Cittá de Alepo, na Síria, era a segunda maior cidade do país, o que me possibilitaria encontrar um emprego que fizesse com que eu nunca mais pensasse em mim mesma.Não demorou para que eu encontrasse uma equipe de repórteres dos Estados Unidos. Inicialmente pedi emprego como fotógrafa. Além de ser me negado, olharam meu currículo e ainda riram do tipo de trabalho que eu fazia.Claro que não precisavam me dizer em palavras que pensavam que uma mulher que transitava por países onde haviam as mais belas paisagens, onde surfistas perfeitos desfilavam quase sem roupa com seus belos corpos segurando pranchas caras e estilizadas, com logo
Cheguei com meus três colegas na saída do aeroporto e nos abraçamos, de forma coletiva.- Já sabe o que vai fazer daqui para frente? – Jacques perguntou.- Talvez... Viajar para lugares bonitos. – Ri.- Aposto que vai voltar a fotografar rapazes sarados e cabeludos em praias paradisíacas... Acho que este sempre foi seu forte, “Querido inferno”. – Tata me abraçou com força.- Querido inferno... – Jacques fez careta e tocou minha cabeça, enquanto olhava para baixo para encontrar meus olhos – Deveria ter usado o pseudônimo de “Pequeno inferno”... Combinaria mais com você... Minha pequena grande mulher.- Serei eternamente grata à vida por tê-los colocado no meu caminho – suspirei – Os anos que passamos serão lembrados para sempre... Me tornei humana e mulher de verdade na Síria.- Você é pequena só no tamanho... Mas gigantesca no talento e no coração. – Tata sorriu e ajeitou uma mecha dos meus cabelos – Ainda ouviremos falar muito de você, Clara. Não tenho dúvidas de que será premiada pe
Artemis riu:- Você é louca!Eu ri e segui escorada na janela, olhando para tudo sem ver nada. Meus olhos tinham se acostumado com a neutralidade do cinza e parecia que as cores já não me faziam mais tão bem.- Eu preciso ver ele uma última vez... Para poder seguir em frente. – Falei.- Patrick? – A voz de Artemis saiu quase num grito.- Pedro Moratti.- Como assim?- Eu segui em frente... E me perdoei.- Então não precisa mais dele.- Já se passaram 19 anos.- Exatamente. E vocês ficaram juntos somente dois. Tem certeza de que ainda há o que falarem?- Eu mandei uma mensagem para ele uma vez, explicando os motivos que me levaram a fazer o que fiz. Certamente Pedro leu e resolveu não me mandar uma resposta. E creio que isso aconteceu porque ele não me perdoou.- E você disse que se perdoou. Por que precisa do perdão dele agora? Não pode voltar tanto tempo depois e remexer nesta história. Não passa pela sua cabeça que ele já pode ter esquecido? Talvez Pedro tenha filhos... Ou até netos