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Ela não entende espanhol

POV CLARA

- Você sabe o que acaba de me dizer? – Ele perguntou seriamente, como se eu tivesse cometido um crime.

- Fo-da-se. – Sussurrei no ouvido dele, de forma lenta, me contendo para não rir.

O garoto não disse mais nada, ficou ali, fingindo realmente ser um cabide. Bem que ele poderia ser mais divertido, já que era “bonitinho”. Alto... Demais da conta, ao menos para mim. Olhos castanhos, maxilar bem definido, cabelos castanho-escuros lisos e bem penteados, levemente arrepiados. Magro! Certamente debaixo daquela camiseta preta, lisa, sem nenhum detalhe, só havia ossos. A boca dele era bem desenhada e os lábios grossos. Eu diria que grande demais para o tamanho da face. E que porra de dentes milimetricamente enfileirados?

- Você usou aparelho? – Perguntei.

Ele me olhou, demorando a responder:

- Não! Por quê?

- Filho de dentistas?

- Não! - Estreitou os olhos. – Por quê?

- Seus dentes...

- O que tem os meus dentes?

- São perfeitos, típicos de quem usou aparelho. Deveria sorrir mais, Cabide!

- Não gostei de apelido que me botou. Não somos amigos, íntimos e sequer conhecidos. Então, por favor, evite forçar uma aproximação como se me conhecesse a vida inteira.

O encarei seriamente. “Cabide, azedo!”

- Caralho, você só tem 17 anos. Por que tanto mal humor?

- Não estou de mal humor. Só não achei legal você me apelidar de “cabide”.

Poderia ser “esqueleto”. Será que ele iria gostar mais? Ok, realmente os apelidos não eram legais. Mas os ombros dele eram definidos e largos... Que me chamaram muito a atenção. E não, eu nunca reparei nos ombros de ninguém. Mas os dele... Bem, eram “os dele”.

- Meia-noite! – Flora gritou, vindo até mim.

Nos abraçamos e começamos a gritar e pular. Enfim, eu tinha dezoito anos. Era de maioridade. Poderia ir embora de casa, morar sozinha, casar, ter filhos, assinar minhas próprias coisas... E ir para cadeia, segundo meu pai.

A minha vida inteira sonhei em ter dezoito anos. E o dia chegou. E até então nada havia mudado. Mas só fazia um minuto que eu tinha dezoito.

- Pablito, não vai me dar um abraço? – Gritei para ele, que me pegou pelas costas e levantou-me, pulando comigo de forma fofa.

- ¡Felicidades, hermosa! Creo que a los dieciocho ya puedes besar en la boca.

O uruguaio era bonito. Corpulento, embora baixo. Usava uma camisa estampada branca com azul de mangas curtas e calça jeans. Era moreno, cabelos praticamente raspados e tinha barba e cavanhaque.

Suspirei, entristecida! Eu não gostava de homens que usavam barba. Aliás, nunca havia beijado um. E também não ficava com rapazes que vestiam camisa estampada, embora adorasse cores.

Olhei para minhas amigas, implorando resgate e elas entenderam. Logo deixaram os dois rapazes que estavam grudados nelas e vieram me parabenizar, obrigando Pablito a me soltar.

Os acompanhantes das minhas amigas também vieram me parabenizar. Só faltou o cabide. O olhei e ele continuou sentado, com cara de quem havia comido limão com sal.

Abri os braços e parei na frente dele:

- Ei, eu acabei de fazer dezoito!

Imaginei que me ignoraria ou mandaria eu me foder. Mas não! Foi educado e levantou, me dando um abraço com seus braços longos.

Ele usava um perfume bom, com cheiro delicado. Não era forte, como os dos garotos que geralmente eu ficava.

- Feliz aniversário. – Ele sussurrou no meu ouvido.

- Feliz aniversário para você também.

Logo nos soltamos e ele sorriu:

- Falta um mês para o meu aniversário.

- Certamente não nos veremos quando chegar o dia. Então... Eu já lhe felicitei. E olha que legal, fui a primeira! – Brinquei – A propósito, sou Ana Clara. Mas pode me chamar de Clara. – Estendi a mão para ele.

- Pedro – pegou minha mão e riu – Pode me chamar de qualquer coisa, menos Cabide.

Começamos a rir e apertamos as mãos. Dei um beijo no rosto dele, sentindo sua bochecha lisa e macia. Deu vontade de tocar para me certificar se ainda não havia crescido a sua barba. Nunca beijei alguém do sexo masculino com o rosto tão macio... Exceto crianças.

- Ele fica de mal humor quando não vê a ex. – O amigo dele explicou, debochando.

- Hum, você teve uma namorada, Pedro! – dei um tapinha na barriga dele – Isso quer dizer que você não dever ser um cara tão ruim quanto eu pensei.

- “Tão ruim”? O que a fez pensar que eu sou ruim?

Suspirei:

- Ruim não, sem senso de humor.

- Eu tenho senso de humor! Só não vivo disso, como você.

Vi o bolo passando entre a multidão da pista, junto do espumante Chandon. Ah, eu sonhei tanto com aquele dia, em que tudo aquilo seria para mim, no Baccarath!

A vela que havia sobre o bolo foi acesa assim que o garçom o pôs sobre a pequena mesa, brilhando intensamente, como se fosse explodir. Éramos oito e recebemos quatro taças, o que era um absurdo frente ao preço que pagamos pelo camarote.

Claro que teve o “Parabéns a você” e depois insisti no “É big”. Na hora de apagar a vela, peguei o pequeno bolo redondo coberto com muito glacê e coloquei na frente de Pedro:

- Vamos assoprar juntos. Não esqueça de fazer o seu pedido!

- Não... Pode assoprar sozinha. Eu... Estou de boa.

- Vamos, assopre! – Insisti, percebendo que ele estava sem jeito.

Contei até três e assopramos ao mesmo tempo, a vela se apagando por completo.

Pablo abriu o espumante, enchendo as taças.

- Ela queria ter aberto o espumante. – Pedro falou para o paraguaio.

- Las mujeres no saben abrir espumantes. Solo beberlos.

Tentei traduzir mentalmente: “As mulheres não sabem abrir espumantes... Só bebê-los!” Acho que era aquilo. Que machista, Pablito!

Passei a mão em duas taças, para garantir que eu e Pedro bebêssemos ao menos o espumante do nosso aniversário. Pablo pegou outra e por sorte Flora foi rápida e também conseguiu uma.

Entreguei uma das taças a Pedro, que recusou:

- Não posso beber! – Mostrou o carimbo no pulso.

- Eu digo que você pode. Tenho dezoito e me responsabilizo por você.

- Duvido que se responsabilize por si própria, com pode se responsabilizar por mim?

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