- Acredita em espíritos, Pedro? – Perguntei, temerosa.- Claro que não! – Ele garantiu, retirando meus braços gentilmente de seu corpo e indo em direção à lixeira.Assim que abriu a tampa, Pedro mexeu no interior da mesma, retirando de dentro um filhote de cachorro.- Meu Deus! – peguei o pequeno cão de suas mãos – Quem teve coragem de fazer isto?- É muito novinho... Deve ter nascido há poucos dias! – Pedro tocou a cabeça do animal, alisando.Procurei sua genitália e constatei:- É uma menina!- Uma fêmea. – Corrigiu.- Menina! – Insisti – Fêmea é muito impessoal.- Mas... É um cachorro. O correto é fêmea e macho.- É a minha menina! – Pus o filhote dentro da minha roupa, aconchegando a mim.- Ela estava na lixeira, Clara! Tinha lixo junto...- É um bebezinho, Pedro! Vou levar para casa.- Alguém a abandonou aqui. Por que não doaram? Como há pessoas más neste mundo!- Acredite, há... E muitas – suspirei, não conseguindo evitar pensar no meu pai – Mas ela teve sorte... – olhei o anima
- Hum... Eu consigo visualizá-lo como advogado. É sério, comprometido, inteligente... Ao menos acho que é – levantei os ombros – Tem cara de que estuda muito e tira boas notas. Defesa ou acusação?- Acusação?- Tomara que eu nunca faça nada errado nesta vida... Não queria ser acusada pelo doutor Moratti. – Comecei a rir, tirando onda com a cara dele – Doutor Moratti soa bem, não acha? Imponente... Dá até medo!- Você não vale nada, Clara! – Ele acabou quebrando um pouco o semblante sisudo, rindo.- Valho sim. E se você tivesse dinheiro, aposto que me comprava. Mas não tem suficiente. E se eu fosse sua... Ah, você não me venderia, “doutor Moratti”. – Brinquei.- E de quem você é, Clara Versiani? – Os olhos dele ficaram sérios e estávamos bem próximos um do outro, na esquina da rua, onde do outro lado ficavam os táxis.Eu poderia dizer que era de Patrick Huxley e seria para sempre... Mas por algum motivo as palavras não saíram da minha boca. E acredito que foi por conta da seriedade com
- Pai, eu não fui num Motel. Pode perguntar ao Jason...Joaquim riu, de forma debochada:- Acha que acredito em você?- Acredite no que quiser! – Falei, entredentes, tão baixo que mal escutei minha própria voz.- O que você disse? – Ele gritou, fazendo com que eu e minha mãe saltássemos, assustadas.Eu não repeti. Não queria levar uma bofetada.- Posso ir para o meu quarto? – Pedi.- Sim, pode. Depois que jogar esta bola de pêlos e pulgas na rua.O olhei, tentando conter as lágrimas:- É uma filhotinha! Por favor... Eu prometo que ela não irá incomodar. Limparei xixis e cocôs... Não a deixarei chorar... E comprarei tudo que ela for comer.- Não! Jogue fora este bicho.- Não posso! Ela... É minha.Renan apareceu na cozinha:- O que houve?- Clara encontrou um cachorro. Seu pai quer que ela jogue fora. – Minha mãe explicou resumidamente.Renan alisou Pipeline:- Pai, é só um cachorro.- Bichos incomodam... Mais do que pessoas. Vai entrar no CIO e os cachorros invadirão nosso pátio. Ela
- Ele cuidou do seu ferimento.- Eu estava na casa dele e não sabia onde ficava a caixa de primeiros socorros.- Ele a pediu em casamento com um band-aid no seu dedo. – Ela riu.- Porque você o obrigou. – Ri.- Por que você é tão assim? – Ela bufou.- Tão assim como?- Insegura... Estúpida.Arqueei a sobrancelha na direção dela, confusa pela forma como ela me definiu.- Oi!Nós duas olhamos para Anastácia. Não contive a expressão de desagrado:- Oi! – Revirei os olhos, mal respondendo.- Viu Pedro por aqui? – ela olhou em volta.- Não... Deveria?- Não sei... Estou perguntando porque você é a namorada dele.- Sou namorada dele. Não nascemos grudados. Sou bem tranquila quanto a isso. Não o sufoco. – A olhei seriamente.Anastácia deu de ombros:- Talvez ele não esteja bem... Sempre tem os dias que ele se fecha em si mesmo, como você deve saber.- Sim... – Fingi saber, completamente perturbada com o que ela havia dito.- Por conta do que houve com os pais... Afinal, quem não teria seus d
Naquela mesma noite, fiz uma carta para minha mãe, usando letras recortadas, já que se fosse datilografada, imaginariam que pudesse ser eu a autora.Escrevi um pequeno texto dizendo tudo que eu admirava nela: sua força, sua doçura, a forma como se doava, abrindo mão de si mesma em nome de todas as pessoas. Ressaltei a beleza de seus olhos azuis e tristes e os cabelos curtos e sedosos, bem como o corpo esbelto. E por fim, expliquei que sempre a admirei de longe, mas esperava que algum dia pudéssemos nos conhecer melhor, deixando claro que eu seria capaz de lhe dar a felicidade que ela sempre mereceu... Que bastava ela querer. Por fim, assinei simplesmente “Seu Admirador Secreto”.Não havia tempo hábil para colocar a carta no correio e caso o fizesse, corria o risco de meu pai pegar antes dela, o que traria problemas. Colei o selo, já que eu tinha vários guardados e esperei o melhor momento de colocá-la na caixa de correspondências.Na manhã seguinte, acordei mais cedo e me certifiquei
Quando cheguei em casa minha mãe já tinha voltado do supermercado e estava preparando a jantar. E Flora e Renan ainda estavam no mundo do Super Mario Bros.O jantar foi servido e estava perfeito, como sempre. Minha mãe era uma ótima cozinheira. E meu pai, como de costume, não estava presente na hora da refeição.Depois que eu e Flora terminamos de lavar a louça, ela foi para o meu quarto.- Mãe, o que era a carta que tinha na caixa de correio? – Perguntei, como quem não queria nada.- Era... Só uma conta. – Ela não me olhou.Sorri, dando um beijo nela e indo para meu quarto, certa de que ela não contaria para o meu pai.- Acho que Pedro não irá acampar. – Falei ao deitar na cama.- Talvez ele apareça. – Flora falou do chão, onde minha mãe havia feito uma cama para ela, num colchão reserva.- Perdi meu namorado de mentira! – Lamentei.- Viu? Eu disse que deveria dar uma chance para ele.- Pedro gosta de Anastácia. Que parte você não entendeu que o namoro de mentira é por causa dela? El
POV PEDROEu nem acreditava que tinha faltado o curso de Inglês e deixado de ministrar o de Informática naquela sexta-feira. Sem contar o fato de deixar minha avó sozinha, depois a semana conturbada e difícil que tivemos.Cheguei a torcer para acontecer algum imprevisto no meio do caminho para que eu não chegasse há tempo e o ônibus partisse sem mim. Mas não tive a sorte!Fui dos últimos a chegar e praticamente todos já estavam no interior dos ônibus grandes e espaçosos, próprios para viagens longas e confortáveis. Eu não esperava menos daquele colégio, já que a mensalidade era caríssima.Várias turmas de Ensino Médio e apenas quatro professores acompanhando, sendo que dois deles eram um casal. A parte boa é que eu era responsável e sabia me cuidar muito bem. Mas não podia dizer o mesmo de todos os estudantes... Principalmente de uma certa garota que não tinha nada na cabeça.Não havia como adivinhar em qual dos dois ônibus ela estava. Então contei com a sorte e entrei no primeiro del
Senti alguém batendo no meu ombro e abri os olhos, depois de um cochilo. Era Anastácia:- Acorda, meu amor! Chegamos! – sorriu.“Meu amor?” Arqueei a sobrancelha, confuso, enquanto retirava os fones e olhava para trás, percebendo um garoto no lugar de Clara no último banco enquanto ela levantava com Flora, indo em direção à saída do ônibus. Sequer olhou para trás.Levantei e peguei minha mochila e estava saindo quando Anastácia me puxou, encarando-me:- Eu não estou mais com Jason.Eu ri, de forma sarcástica:- E alguma vez esteve?Anastácia enrugou a testa, confusa com minha pergunta. Demorou um pouco a responder:- Você sabe que sim!- Sinceramente, que bom para você que não está mais com ele. Eu acho que Jason gosta de Clara e a usou para fazer ciúme.- Clara que fez isto! Ela o usou para fazer ciúme a Jason! Eles são como nós... Estavam juntos há um bom tempo, mas não se acertam.- Vai ver ele não tem o tal ponto luminoso no ombro esquerdo. Assim como você também não tem.- O quê