De volta à cabine, durante o almoço, Joana surpreendeu-se que Maximiliano - no lugar de exigir silêncio enquanto comia, como seu pai fazia - quis saber mais do que ela sabia preparar. — Sei fazer bolos, tortas, curtidos, licores, reaproveitar alimentos — respondeu apontando para a sopa dele, pousada na escrivaninha. — Onde aprendeu tudo isso? — Como minha mãe, minha madrinha e com as freiras do convento. — E o que mais sabe fazer? — Costurar, fazer compras para casa, limpar, todas as funções para manter a casa em harmonia — Joana sorriu satisfeita por ter algo a ser exaltado, algo que daria orgulho a Maximiliano. Podia não ter a beleza deslumbrante de Dalila, mas superava a irmã na administração dos afazeres domésticos e em todos os talentos exigidos pela sociedade. — Também toco piano e sei um pouco de francês, espanhol e inglês. Sou formada em licenciatura e dou aulas de catequese na escola religiosa... Dava aulas. Maximiliano, diante da série de atributos que Joana possuía, po
O som de um disparo o acordou Maximiliano, de quatorze anos, no meio da noite. Levantou assustado e andou pelo corredor que levava à sala, as costas praticamente grudadas na parede para não ser visto por ninguém. Chegando perto do arco que levava ao recinto, ele viu com temor cinco homens uniformizados da polícia de Sanmarino com armas em punho. Um deles apontava sua arma em direção ao seu pai, os olhos extremamente arregalados de choque. Logo Maximiliano se deu conta que Fabiano, seu pai, segurava com esforço o corpo inerte e sangrando da esposa, Milene. — Mãe? — Sua voz saiu fraca, quase um murmúrio. Tentou se aproximar, mas foi puxado para trás por Fernando, seu irmão cinco anos mais velho. Fernando também tinha acordado com o barulho do disparo. O irmão colocou o dedo indicador sobre os próprios lábios, em um sinal de que Maximiliano deveria ficar em silêncio. Entretanto, ele encontrava-se muito assustado para calar-se, seu coração batia descontrolado no peito. — Fê, mamãe..
Movendo-se com cuidado, Maximiliano saiu da cama sem despertar Joana. Mas, no lugar de se afastar e se vestir para voltar ao comando do barco, parou um instante ao lado dela, admirando seu rosto adormecido. Parecia um anjo, doce, suave... Inspirou fundo, anjos podiam ser tentadores? Ajeitou a coberta sobre ela, inclinou-se e a beijou suavemente antes de se afastar para se vestir. Ao recolher suas roupas, pegou o vestido dela e o apertou em seus dedos voltando a observar Joana em seu sono. Colocou a peça no encosto da cadeira e moveu-se até o armário acima da cama, abrindo-o e buscando no canto um pacote azul com fita roxa em volta. Colocou o objeto sobre a escrivaninha junto com um bilhete antes de sair. ~*~ Horas depois, quando a noite dominava o lado de fora, Joana despertou confusa, piscando e esfregando os olhos para sair do sono. Tateou a mesinha até acender o abajur, iluminando o suficiente para envolver o corpo com o lençol da cama e seguir até o banheiro. Foi ao retornar p
De longe, observando Maximiliano ensinar a noiva a conduzir o barco, Beto confabulava sobre o comportamento do capitão do Diablo com Lucas. — Nunca vi o capitão tão grudado em uma mulher — Beto comentou vendo o Gonzalez abraçado a Joana, como fazia sempre que ela estava fora da cabine, provavelmente dentro também, mas de forma bem mais íntima. — É noiva dele — Lucas pontuou, ignorando a cena romântica para apreciar a paisagem ao redor do barco. — Ele nunca trouxe a outra aqui. — Trouxe uma vez. — Digo, de dia, para todos conhecerem, para cozinhar para nós. — Ele também não trouxe essa — Lucas retrucou, pontuando em seguida: — Ela subiu atrás dele e cozinha por opção, não porque ele pediu. O que agradeço — acrescentou contente por não cozinhar e nem suportar os pratos horríveis preparados pelos outros tripulantes. Desde que Joana assumiu a cozinha comia como um rei pela primeira vez desde que nasceu. — Dá no mesmo — Beto desdenhou ainda impressionado pelo comportamento de Maximi
Com o sol iluminando as águas claras do porto, a manhã em Sanmarino prometia paz e sossego, até avistarem um barco com pintura em preto e vermelho, que acreditavam ter sido apreendido em outro país, atracar. Reconhecendo a imponente embarcação denominada Diablo, crianças e adultos, eufóricos com a visão que imaginavam nunca mais ter, saíram correndo, saudando com gritos de felicidade os tripulantes, principalmente seu capitão. — Capitão Maximiano! Capitão Maximiliano! Minutos depois, Maximiliano desceu surpreso com a recepção, causando o mesmo efeito em quem o via. Seu aspecto impressionou os homens e causou suspiros ainda mais apaixonados das mulheres. O costumeiro jeito altivo e arrogante foi realçado por um traje elegante, típico dos ricos da cidade. No entanto, foi à mulher ao seu lado, usando uma camisa masculina com cinto destacando sua silhueta, e com o braço do capitão firme em sua cintura que chamou ainda mais atenção. Acompanhado por Baltasar, Lucas e Beto, a frente dos
Maximiliano também se dividia em sentimentos contraditórios, principalmente em relação ao seu noivado, mas optava por não expressa-los nem a si mesmo. Ainda assim, conforme seguia até a casa/escritório do advogado, também diminuía a alegria com seu retorno a Sanmarino. Dois motivos fizeram sua felicidade inicial esmorecer: Por encontrar a casa dos Savoia às escuras, sem ninguém em seu interior, adiando seus planos de oficializar o noivado e iniciar a vingança contra a ex. E pela falta de informações sobre o que aconteceu aos amigos que ficaram em terra, de como os guardas de Queiroz aproveitaram a notícia de que havia sido preso para capturá-los e sumir com eles sem deixar rastro. Encontrou o velho amigo parecendo esgotado física e mentalmente, mas mesmo assim entretido com vários documentos, trabalhando incansavelmente em busca de informações sobre o paradeiro de Maximiliano e seus amigos. — Donato, que aconteceu com os meus amigos? — Soltou após entrar no pequeno escritório do H
Recanto Dourado seguia agitada com a preparação do casamento, por toda a fazenda havia movimentação incessante para que a cerimônia naquela tarde fosse perfeita e sem falhas como exigia Kassandra. Foi fácil para Maximiliano e Joana passarem despercebidos entre os convidados ao chegarem poucos minutos antes da hora marcada. De certa maneira Joana agradecia não ser envolvida no rebuliço dos preparativos, embora logo estaria em um maior. Vencida a melancolia da rejeição agora nascia uma nova, por Dalila estar certa pela primeira vez. Tinha inveja da irmã, pois ela conquistou o coração de dois homens maravilhosos, enquanto ela, Joana, só tinha um acordo pensou observando a aliança que recebeu antes de descer do barco naquela manhã. Uma aliança que foi comprada para sua irmã. Ao seu lado, com o braço prendendo-a pela cintura, Maximiliano disfarçava o incomodo pela tensão que sentia no corpo de Joana. Quase pensou em desistir de participar daquele circo quando ela questionou sobre não ire
Inquieto, Maximiliano começou a andar pelos convidados, observando a rica decoração, a profusão de comes e bebes desfilando de um lado para o outro, carregados em finas bandejas de pratas por funcionários elegantes, trajando uniforme com o brasão da casa Orleans. A fazenda de escravos em festa, pisoteando o sangue de seus trabalhadores em nome do pão e circo, Maximiliano concluiu com amargura. Nos meses que passou naquela casa participou somente de uma festa, porém, foi tratado como parte da criadagem da casa. Não tinha se incomodado. Sempre gostou de estar no meio da bagunça, dos processos, de entrar em ação em vez de ser um mero espectador. O que não gostou foi de Kassandra humilhando-o frente aos seus ricos convidados, mencionando a morte dos seus pais quando o marido estava longe e rindo. Por isso, entornou uma taça de vinho tinto no belíssimo vestido branco que ela usava na ocasião. Indo para uma área menos agitada da festa, teve vontade de estar com a taça na mão naquele momen