No dia seguinte à visita do alfa e de seus aliados em minha cela, eu fui obrigada a tomar um banho em uma água muito gelada. Ainda estava fraca pela dose de Wolfsabe que aplicaram em minhas veias na noite anterior. Meus lábios tremiam violentamente devido ao choque do frio da água com meu corpo; não conhecia nenhum lobo que aguentaria banhar-se em uma água tão gelada, mas tinha certeza de que não era aquela água que iria me matar. Antes de entrar no banho, eu peguei a tesoura que um dos guardas me deu e a levei para o banheiro. Cortei minhas unhas como realmente havia falado que faria e, ao passar as mãos pelos meus cabelos, separei mechas por mechas e as cortei. Nunca tinha cortado o cabelo curto, mas o cabelo comprido me lembrava de Talita e me deixava igual a ela. Eu não tinha o direito de morrer parecida com ela, então mudei meu cabelo; pelo menos assim estaria um pouco diferente.
Dois guardas agarraram meus braços, um de cada lado, e me levaram para o local onde aconteceria meu julgamento. Não sabia quais eram os planos da deusa para mim, mas eu esperava que, se um dia eu reencarnasse, ela não me desse mais uma irmã gêmea e muito menos que ela nos fizesse amar o mesmo homem. Todos já estavam em seus devidos lugares, dos anciãos até a plateia que sempre deseja ver o pior acontecendo. Meu pai fazia parte do coro de anciãos e ele não poderia faltar, mesmo que fosse sua filha a ser julgada e condenada. Jonathan entrou e se sentou na cadeira destinada ao alfa; ele levantou a cabeça e, ao me ver, seus olhos ficaram espantados. — O que diabos você fez com seu cabelo? — Ele ficou tão furioso que não conseguiu se conter; afinal, eu era o retrato vivo do amor da sua vida. — Já peço perdão pelas palavras, mas o que você tem a ver com o meu cabelo? Ou eu tinha que pedir permissão ao senhor alfa para cortá-lo? — Marcelo, sua filha foi sempre tão desaforada assim? — Ele olhou para meu pai. — Você não conseguia ensinar a ela os mesmos ensinamentos que deu a Talita e Túlio? — Sinto muito, meu alfa, mas eu não tenho filha assassina; minha única filha morreu no dia do seu aniversário de dezoito anos. — Não sabia que uma alma podia ser rasgada muitas vezes, mas se eu ainda tinha alguma alma, meu pai terminou de matá-la com suas doces palavras. — Você tem mais a falar? — Jonathan se virou novamente para mim. — Só peço que você acabe logo de uma vez por todas com essa palhaçada. Você já decretou a minha morte naquela floresta, então dê logo a ordem aos seus guardas para arrancarem minha cabeça ou até que arranquem meu coração do meu peito. A não ser que o próprio alfa queira fazer isso por si mesmo. — Você não vai se defender de nenhuma das acusações? — Ele perguntou, mordendo os dentes; ele deveria estar furioso. — Ela não precisa se defender, pois ela não fez nada de errado. — Túlio entrou no tribunal; ao seu lado estava Eliot, que carregava um homem pelo pescoço. — Esse foi o desgraçado que matou Talita. — Enquanto Túlio falava, Eliot jogou o tal homem no chão aos pés do alfa. — Conte tudo que você me falou. — Meu irmão avançou no homem jogado ao chão e chutou seu abdômen. — Eu matei aquela moça; vi ela naquela floresta sozinha e chorando, achei-a um alvo fácil, mas no momento em que eu me transformei e pulei para atacá-la, de repente ela se multiplicou. Aquilo me assustou; eu agarrei o clone à minha frente pelo pescoço, mas no momento em que eu iria quebrar o pescoço daquele maldito clone, a outra se transformou e me jogou para longe do seu clone. — PARE DE CHAMAR ELA DE CLONE, SEU MALDITO. — Perdi a razão e comecei a gritar feito louca. — ELA ERA MINHA IRMÃ, minha irmã, a única que me compreendia; ela me acordava todos os dias com um beijo na testa. Eu a amava. Então não a chame de clone, seu desgraçado, pois ela era a pessoa mais autêntica que eu já conheci neste mundo. — Meu peito sangrava por dentro. — Por favor, coloque logo um fim na minha dor e me mate; talvez a deusa possa sentir um pouco de compaixão e permitir que eu veja a minha irmã após a morte. — Não fale assim, Tata; eu não conseguiria viver sem você. — Meu irmão me agarrou, mantendo-me em seus braços, e eu senti um refúgio que há dias não sentia. — Como você viu, alfa, Tamara não foi culpada de nada; o único culpado foi esse desgraçado que está à sua frente. — Não consegui mais abrir meus olhos; eu só conseguia chorar e gritar para que o alfa desse logo a minha sentença de morte. — Não posso te julgar por algo que você não teve culpa, Tamara. — Senti um leve remorso na voz de Jonathan. — Te peço desculpas por te culpar por algo que você foi tão vítima quanto Talita. Me peça o que você quiser que eu lhe darei; só não posso lhe dar a morte. — Quero minha loba de volta; você poderá trazê-la de volta? — Falei entre soluços. — O que você quer dizer com trazer sua loba de volta? — Por sua ordem, seu guarda me aplicou uma dose diária de Wolfsabe durante um mês e meio. — Chorei lembrando da presença da minha loba, que eu senti apenas uma vez. — Eu não tenho mais loba, então você poderá trazê-la de volta? — Quem foi o guarda que aplicou Wolfsabe em você diariamente? — E isso importa? Tenho certeza de que você não conseguirá me dar o que pedi, então tenho outro pedido. — O que você deseja? Mas quero que saiba que descobrirei quem fez isso contigo e eles serão punidos. Então, qual é o teu desejo? — Quero me desligar da alcateia e de todos que vivem nela; como não tenho mais uma loba, então não tenho motivo para viver no meio de lobos. Quero ir para o mundo humano.— Você não pode estar falando sério? — Jonathan perguntou, e eu disse que estava falando muito sério. — Você sabe que se desligar da alcateia é ter que se desligar de todos nela? — Eu olhei para Eliot e Túlio, que pediam para eu reconsiderar, mas eu já tinha decidido. — Desculpe. — Falei, olhando para eles. Virei meu rosto para Jonathan e disse: — Eu, Talita Marinho, quebrou agora. — Filha, não faça isso. — Meu pai pediu, vindo em minha direção. — Foi tudo um mal-entendido, não me faça perder outra filha. — Eu não sou sua filha. Pode pensar que tuas duas filhas morreram pelas mãos daquele desgraçado naquela noite, na floresta. — Apontei para o homem no chão, levantei minha cabeça novamente e mirei meus olhos em Jonathan. — Tamara, pense bem. — Jonathan falou, vindo em minha direção. — Você não pode tomar uma decisão tão séria de cabeça quente. — Ele tentou colocar as mãos em meus ombros, mas eu me afastei. — Eu, Tamara Marinho, com o poder e a misericórdia da deusa Selene, qu
Eu me via como um homem feito de concreto; não havia suavidade em mim ou no meu jeito de ser. Gostava de ter tudo em ordem; se algo saísse fora do planejado, eu enlouquecia. É por esse motivo de gostar de ter tudo em ordem que não gostei de saber que minha companheira era outra e não minha namorada Talita. Eu conhecia todos da família Marinha, sabia que Talita era gêmea, mas nunca tinha visto Tamara de perto; ela sempre foi bem reservada, nunca gostou de sair de casa, o que era o oposto de Talita, que sempre amou estar em lugares cheios. Foi assim que fiquei encantado por ela e pedi-a em namoro. — Você me ama? — Ela perguntou no momento em que a pedi em namoro. — Não, eu nunca amei ninguém, mas, pelo que vejo, não há ninguém melhor do que você para governar a alcateia ao meu lado. — E se, após eu aceitar ser sua namorada, você encontrar sua companheira? — Se ela for alguém de quem eu não me agradar, eu a rejeito, pois você tem tudo para ser minha companheira e tenho certeza de
Aquele beijo me deixou desnorteado, meu lobo vibrava dentro de mim, meu corpo formigava, e eu ainda podia sentir a eletricidade que senti pelo seu beijo. Nosso beijo não deveria ter acontecido, meu coração não podia bater da forma que batia pela irmã da minha futura lua. Me arrependi de ter aceitado o pedido de Talita para conhecer seus pais. Não deveria ter pisado meus pés naquela casa. Como vou viver minha vida ao lado de uma mulher e desejando a sua irmã? Isso era coisa que apenas um moleque faria, mas eu passaria uma borracha em meus sentimentos, me casaria com a mulher que tinha o potencial alto para governar a alcateia ao meu lado, e o que estivesse crescendo em meu peito por Tamara seria trancado por sete chaves. Escutei alguém passar próximo à porta do escritório, e meu coração voltou a bater acelerado; parecia que naquele momento nada em mim funcionava, não consegui distinguir quem estava próximo à porta pelo cheiro. — John, sou eu. — Voltei a respirar após ouvir a voz do me
Meu casamento com Talita já estava marcado para uma semana após seu aniversário de dezoito anos. Meus sogros estavam radiantes por sua filha ser a companheira do alfa, mas, ao contrário deles, meus pais não aceitaram muito bem. Eles gostavam muito de Talita, só que a vontade deles era que eu esperasse minha companheira, pois, como mamãe falava, eu só seria feliz por completo quando encontrasse aquela que fosse destinada pela deusa Selene para mim. Mas eu tinha convicção de que não existiria uma única mulher no mundo que fosse melhor que Talita. Ela compreendia bem qual seria o seu objetivo ao meu lado. Ela tinha um espírito bom, e o desejo de Talita era poder ajudar as pessoas. Ao meu lado, ela teria todo o poder que desejasse, sem precisar pedir autorização para ninguém, pois apenas uma pessoa teria mais poder do que ela, e esse seria eu. Após o dia em que fui pedir a mão de Talita, evitei ao máximo repetir a visita. Estava sempre procurando me ocupar apenas para não ir à casa del
Eu pedi para meus pais que organizassem uma bela festa para as gêmeas, já que naquela noite seria o dia em que eu pediria a mão de Talita em casamento. Estava esperando sua bola despertar. Minha mãe organizou uma festa com tudo que tinha direito e tinha certeza de que Talita amaria cada detalhe escolhido por ela. Eu não tinha como saber do que Tamara gostava, pois nunca tive o prazer de me sentar ao seu lado, nem mesmo por um segundo. Tamara sempre fugia de mim, igual a um rato que foge quando vê um gato. No nosso último encontro no escritório do pai dela, ela mal olhou para mim e ficou conversando com Túlio, como se estivesse apenas os dois ali. Eu não podia reclamar, pois ela estava tão entregue à conversa e à brincadeira entre eles que sorria; ela estava tão solta, tão leve, o que aqueceu meu coração. Eu e Tamara tivemos nosso minuto a sós; ela disse que estava com sede, o que fez Túlio levantar e dizer que iria pegar algo para beber. — Você vem comigo, Jonathan? — ele perguntou
Talita se aproximou e me abraçou. Eu ainda estava com os olhos fixos em Tamara e não conseguia acreditar que a deusa havia feito aquela palhaçada comigo. Eu queria Talita como minha lua; não iria trocar uma que todos amavam por uma que quase ninguém lembrava da existência. Se bem que, parando para pensar, era estranho a forma como meu corpo reagia a Tamara; apenas com o seu perfume, ela deixava meu lobo louco. — O que está acontecendo aqui? — Ela olhou para nós dois. — Maninha, eu não te vi durante a festa. Onde você estava? — Vim ver se Eliot estava por aqui, mas não o encontrei. — Eu rosnei ao ouvir o nome de outro homem sair da sua boca. — O que você tem, Jonathan? — Perguntou Talita. — Infelizmente, é ela! — Essa frase fez meu coração sangrar, pois ele já amava Tamara. — O que tem minha irmã? — Vi em seus olhos o exato momento em que sua ficha caiu. — Sua companheira é a minha irmãzinha? E agora, o que vamos fazer? — Talita chorou e eu a abracei. — Eu quero você, meu am
Era muito difícil viver longe de tudo que era meu. Nunca pensei que sentiria falta da alcateia, mas me enganei, pois eu sentia muita falta. Nos seis meses posteriores à minha saída da alcateia, ainda me encontrava bastante machucada. Minhas noites ainda eram assombradas pela imagem de Talita deitada no chão daquela floresta coberta de sangue; evitava dormir ao máximo só para não ter aqueles pesadelos. Sentia falta do meu irmão Túlio a cada segundo do dia. Queria ter tido a oportunidade de ter trazido comigo pelo menos meus livros no dia em que saí da alcateia, mas, pelo que eu conhecia do meu pai, sabia que ele descontou a raiva e a desilusão por perder sua filha preferida nos meus livros. Ele tentaria me fazer sentir pelo menos um pouco da dor que ele sentiu. Só que não haveria dor pior do que ver sua irmã ser morta à sua frente e você não poder salvá-la. Um ano e meio depois, eu já morava em um pequeno apartamento. Ele era bem pequeno, mas aconchegante. Tinha poucos móveis, mas era
Minha ficha demorou a cair, e mesmo eu correndo atrás de Tamara, ainda não consegui impedir que ela fosse embora para longe da nossa alcateia. Ainda vi o exato momento em que ela se despediu do guarda que estava de mãos dadas com ela no dia em que a vi na cela. Em um momento de desespero por estar perdendo sua companheira, meu lobo sentiu o cheiro de Tamara nele e o agarrou pelo pescoço. — Você é um guardinha de merda atrevido, hein? — Minha voz saiu misturada com a do meu lobo. Naquele momento, eu já nem sabia quem estava no controle do meu corpo, se era eu ou ele. — Vou cortar sua mão fora; você jamais deveria ter encostado na minha companheira. — O que diabos você acha que está fazendo? — Ouvi a voz de Túlio ao meu lado. Virei meu rosto para ele, mas não larguei o pescoço do rapaz que abraçou a minha Lua. — Ele não tem culpa da ida dela; muito pelo contrário, o único culpado aqui é você. Ela foi embora para longe de você, longe da nossa família. Eu odeio você, odeio minha famíli