Depois do café com Miles, nós dois fomos juntos para a faculdade, eu ainda estava sentindo uma mistura de empolgação e nervosismo. Como Nira, eu era estudante de moda, mas eu nunca havia frequentado uma faculdade em Paris como ela havia. Ao chegar lá, vi que a maioria dos alunos eram franceses, e eu me senti um pouco deslocada, os ouvir falando era um pouco desconfortável para meu ouvido que estava tãoa cotumado com o inglês.
Haviam várias mesas e cadeiras de madeira clara, cada uma equipada com uma pequena lâmpada e espaço para um laptop. O chão era de madeira polida, e havia um grande quadro-negro na parede da frente. A sala de aula estava tecnicamente silenciosa quando eu entrei, com apenas alguns alunos espalhados pelas mesas cochichando entre duplas, todos concentrados em seus laptops e anotações. Eu sentei em uma mesa vazia perto da janela e comecei a folhear o caderno de Nira para me preparar para a aula.
Enquanto eu lia as anotações, percebi uma garota alta e elegante entrar na sala. Ela era alta, esbelta e elegante, com um sotaque francês muito charmoso que percebi assim que me cumprimntou com dois beijos nas bochechas. Ela usava uma camisa branca de seda e calças de linho. Seus cabelos loiros estavam presos em um coque baixo e ela usava brincos de ouro
Fiquei momentaneamente confusa, tentando me lembrar do nome dela, mas então me dei conta de que era Camille, a melhor amiga de Nira. Eu sorri de volta, tentando agir naturalmente.
Durante a aula, eu tentei me concentrar no que o professor estava dizendo, mas minha mente vagava, tentando puxar algumas memórias e lembranças de Nira e sua amiga Camille. Eu me lembrei de alguns momentos, foram breves, mas não suficientes.
Mas, ao mesmo tempo, eu senti como se estivesse invadindo a privacidade de Nira, tentando reviver suas memórias e experiências. Eu me perguntei se isso era certo, mas então lembrei que, enquanto estivesse no corpo de Nira, eu deveria agir como ela e viver sua vida. E isso incluía suas amizades e relacionamentos.
— Como foi o fim de semana no cruzeiro com Miles? — sua pergunta foi sussurrada, e eu voltei minha atenção a ela.
— Foi um final de semana incrível. Eu nunca tinha feito um cruzeiro antes — respondi, tentando parecer o mais natural possível.
— Que bom que você gostou. Eu fiquei um pouco preocupada quando você não respondeu minhas mensagens — Camille disse. — Mas então lembrei que estava com Miles — piscou para mim.
— Ah, sim, desculpe por isso — respondo, tentando não invadir a privacidade de Nira.
— Sem problemas. De qualquer forma, eu queria te perguntar sobre aquela ideia que tivemos na semana passada para o nosso projeto final. Você teve alguma outra ideia desde então? — Camille perguntou, mudando de assunto.
— Na verdade, eu tive uma ideia. Eu estava pensando em fazermos algo relacionado com moda sustentável — falei, me lembrando de uma conversa que Nira havia tido com Miles sobre esse assunto.
— Eu adoro a ideia! É tão importante falar sobre isso no mundo da moda. Nós vamos arrasar, gata — comemorou, animada.
Comecei a pensar que talvez Camille fosse um bom meio para que eu conseguisse descobrir algumas coisas sobre Miles, coisas das quais eu me esforçava e não conseguia me lembrar. Tinha de haver alguma coisa, ou eu não estaria aqui. Não poderia ser um erro... Mas todas as vezes que me esforçava para lembrar dele, era tudo bonito, tudo tão...perfeito. Eles não brigavam, estavam sempre se divertindo um com o outro, estudavam juntos, desenhavam e criavam roupas incríveis. Miles inclusive montou um desfile todo no aniversário de Nira, com todas as peças dela, bem em frentre a torre Eiffel. Ele fechou a torre por uma noite, só para ela, e para que pudessem jantar apenas os dois, com velas, vinho e rosas. Eu não via nada, absolutamente nada, nenhum motivo no qual me trouxesse aqui. Penso que talvez, pela primeira vez, um erro pudesse ter sido cometido. Provavelmente ao amanhecer, eu seria Ammy de novo, seria a garota de cabelos curtos e louro, comum de Cough, em uma vida monotona, até eu querer escapar ou ter um dever a cumprir. A verdade é que eu nunca escolhia exatamente para quem ir, mas pelo menos escolhia quando. Não era sempre, e normalmente acontecia com pessoas que estavam mais proximas de mim, era meu trabalho, desde que me entendo por gente. Não restaram muitos iguais a mim, mas já fomos um grupo bem grande, cada um com uma habilidade especial, até nos separem com uma guerra que não acabara nada bem em nossa audeia. Todos tivemos que nos separar, e ainda dei sorte de continuar com alguns. Fugi com minha família pouco antes de não termos mais chances.
Mas com Nira foi tão rapido, que nem sei como meu corpo está, em vegetação, na cama, depois de um baque surpresa que me arrastou quilometros de distancia até Paris.
Depois de algumas horas, finalmente entro no refeitório da faculdade, uma enorme sala com mesas e cadeiras por toda parte, uma decoração moderna com paredes brancas e um piso de madeira clara. Há um enorme balcão com vários tipos de comida, desde sanduíches até pratos quentes, e ao lado dele, uma fila de estudantes espera para pegar suas refeições.
Vejo Miles e Camille sentados em uma mesa próxima à janela, com uma bela vista do jardim da faculdade. Eles acenam para mim, para que me junte a eles. O refeitório está barulhento com estudantes conversando e rindo ao redor, o cheiro de comida flutua no ar.
Quando me aproximei mais dos dois, pude notar Camille e Miles discutindo sobre o desfile que querem — que queremos — ir no fim de semana.
Sento-me com eles e pego minha bandeja. Observo Miles enquanto ele começa a comer, ele parece diferente do que estava de manhã. Ele está mais relaxado agora, rindo e brincando com Camille. Parece quase irreconhecível do que estava antes, tenso e curioso no café. Eu me pergunto se algo mudou ou se ele está escondendo algo. Eu tento me concentrar na conversa, mas minha mente continua voltando para Miles e para o que poderia estar acontecendo com ele.
— Nosso pai nos mostrou algumas peças da coleção que será apresentada — Camille estendeu o telefone na minha direção, para que eu conseguisse ver.
Nosso pai. Ok, ela e Miles eram irmãos, e quando busquei sobre nas memorias de Nira, eu descobri que Miles não era o filho biológico, mas os dois cresceram juntos. Camille e Nira são amigas desde o jardim de infancia, resumidamente, conhece Miles na mesma quantidade de tempo.
— Elas são lindas!
— Amor — Miles se dirige a mim, segurando minha mão —, amanhã podemos sair da aula mais cedo e continuarmos o vestido que você projetou para sábado, acho que conseguimos terminar ainda hoje.
Ele está completamente diferente, ainda não estou convencida de que algo não está errado com ele, mas decido não insistir no assunto, afinal, com meus olhos, eu só o vi uma unica vez.
— Você tem sorte, porque comigo, Miles não quer fazer nada — ela revira os olhos e ele ri, dando de ombros.
— Eu faço os desenhos bons, e Nira, ela costura muito bem — ele rebate. — Você é desajeitada e acha ruim toda vez que eu tento ajudar.
— Eu não sou tão boa assim — digo, sabendo que Nira também tem dificuldade em usar alguns tecidos e modelos de roupas na hora de usar linhas.
— Mas eu estou te ajudando com isso, você é ótima, Nira — me afirmou.
— Ok, então, enquanto os pombinhos irão terminar juntos a obra divina do senhor Miles, eu vou estudar para nosso projeto, estou um pouco ansiosa, tudo bem por você? — Camille me perguntou.
— Claro — assenti, e procurei em minha bolsa, a pasta com os artigos que Nira havia separado e os entreguei para ela.
Eu queria ficar ansiosa para amanhã e para o tempo que teria com Miles, mas provavelmente, eu seria arrancada desse erro grafico no qual fui arrastada, e acordaria com Ammy novamente. Era o certo a ser feito, eu não deveria estar aqui. Nada de vestidos, nada de melhor amiga francesa e nada de desfiles para mim.
Na manhã em que acordei, esperei ver o quarto azul, com o calor contra a pele, o canto dos passaros ao lado de fora, as ondas do mar se chocando contra as rochas. Mas, ainda sonolenta, abri os olhos devagar. Me sentei na cama, olhando ao redor do quarto que agora era meu.Eu ainda estava no corpo de Nira.Suspirei, sentindo uma mistura de desespero e resignação. Eu sabia que teria que continuar fingindo ser ela, pelo menos até encontrar uma maneira de voltar para o meu próprio corpo.Pelo menos, as duas aulas que tive pela manhã, não tive que pensar em como fingir ser Nira com Camille, e também não precisei tomar café da manhã com Miles e ter de sentir seus olhos verdes me acompanharem com um amor que inexplicavelmente eu não sentia de Nira por ele. Não que ela não o amasse, ela amava, muito. Mas eu estava vivendo com Ammy, em um corpo que não era meu. Eu não sentia nada por Miles, não da maneira que deveria, eu pouco tinha noção da vida de Nira.Apenas quando minha aula acabou, que e
Eu cheguei em meu apartamento inquieta. Estava apreensiva e preocupada com o que poderia acontecer. Eu sabia que estava no corpo de Nira por um motivo, e o que eu tinha descoberto não era nada bom. Tinha medo do que poderia acontecer se eu não conseguisse voltar ao meu corpo a tempo.Eu me sentei no sofá, tentando acalmar minha mente. Olhei para minhas mãos, as mãos de Nira, e senti um arrepio percorrer meu corpo. Eu não queria estar ali, não queria estar no corpo de outra pessoa. Mas eu sabia que precisava enfrentar a situação de frente, por mais que eu estivesse apavorada, não poderia deixar os dois sozinhos nisso, eu precisava fazer alguma coisa para intervir.Fechei meus olhos e respirei fundo, tentando me concentrar.Era difícil acreditar em algo assim, mas eu sabia que com tudo o que havia acontecido até agora, essa era uma possibilidade real. E se fosse verdade? O que aconteceria comigo e com Nira? O que aconteceria com Miles?Tentei controlar minha respiração, mas meu coração
Chegamos ao local do desfile com horas de antecedência, para nos certificarmos de que tudo estaria perfeito. Assim que chegamos, eu fiquei maravilhada com o local.O local do desfile era um palácio histórico, com arquitetura exuberante e um jardim bem cuidado. Havia cadeiras brancas organizadas em fileiras, um grande tapete vermelho e muitos fotógrafos aglomerados ao redor.Eu olhei para Camille e Miles, ainda sem acreditar que estava ali."Isso é incrível", sussurrei."E você é incrível, Nira", disse Miles, me dando um sorriso caloroso.Eu me sentia feliz por saber que era Miles ali, conversando comigo, empolgado ao meu lado, com os cabelos castanhos e os olhos azuis mais lindo do mundo. Mas me entristecia saber que ele não sabia que Nira não estava presente. Ela se lembraria de tudo o que eu quisesse deixar para ela depois. Nira estava adormecida dentro de seu corpo, enquanto eu vivia por ela.Nós seguimos o organizador até um salão luxuoso, onde fomos apresentados a outras pessoas
Odeio não saber o que estou fazendo aqui, e odeio ainda mais, saber que não estou sozinha, que divido o mesmo espaço de tempo com Hayden.Não faço mesmo, nem a mínima ideia do que o trouxe para cá. Já não o reconheço mais. Sei que entre seus planos não pode haver coisa boa, ou Hayden já teria deixado Miles viver a vida normalmente. Fico pensando em como devo fingir estar ao seu lado, para tentar enxergar onde ele quer chagar de fato. Quero saber o que ele pretende fazer, para que eu busque uma maneira de o impedir antes que tudo se perca de uma vez por todas, antes que eu volte para meu corpo original e não consiga voltar a tempo.Fecho os olhos com força, involuntariamente, e sou, sem querer, arrastada para mais uma lembrança, mas desta vez, não é uma de Nira, e sim, uma minha.Eu acabara de fazer vinte anos. Era um lindo dia ensolarado de 1861, eu estava usando um vestido de chita verde e branco, com babados e rendas na barra e nas mangas. Meus cabelos estavam presos em um tranças,
Depois de longas três horas, em que passei sentada em meu sofá, encarando a enorme vista que eu tinha da janela em minha frente, a porta de entrada soou algo como algumas batidas.Camille estava em reunião com a mãe dela em algum concerto que estavam juntas, e eu não esperava mais ninguém, principalmente depois da minha última conversa com Miles.Ainda envolvida em meus pensamentos, me levanto lentamente do sofá. A batida na porta me tira momentaneamente de minha introspecção, deixando-me curiosa e um tanto apreensiva.Com a mão estendida, seguro e giro a maçaneta, e meus olhos se arregalam de surpresa, meu corpo congela, o tempo para mais uma vez e eu não sei o que pensar, o que sentir ou o que dizer. É completamente diferente agora, e eu odeio isso, odeio muito. Minha mente luta, com palavras presas na garganta, para tentar entender se a cena que vejo é real, ou se é uma paranoia e estou criando situações irreais por me sentir assustada.Mas não, seus olhos me encaram, de uma forma
Antes mesmo de abrir os olhos, eu já sabia onde estava. O cheiro, o clima, totalmente familiares. Eu já estava tão acostumada com isso.Olhando ao meu redor, vejo o mesmo que vi por muitos e muitos anos. A cama está no centro do quarto, e ao lado desta, uma mesa de cabeceira exibe um abajur branco com desenhos de constelações. As paredes são pintadas de um azul que já se encontra quase que totalmente pálido, desbotado. Também há uma escrivaninha posicionada bem a frente da janela de vidro, onde papeis estão espalhados, onde ilustro qualquer pensamento, sentimento ou lembrança que não quero esquecer ou quero que esvaia de alguma forma.Encaro o tapete felpudo bem a minha frente. Ainda não acredito que fui lançada de volta para cá. Pela primeira vez em muito tempo, eu me senti completamente fraca, fora de controle. E agora, meu corpo doía, eu estava tão dolorida, que poderia jurar que esse corpo ficou abandonado na rua e foi atropelado incansavelmente por toneladas de caminhões.Levante
Andar a cavalo era uma das atividades que eu mais amava fazer no meu tempo livre, e acho que uma das vantagens de ainda não ter dado inicio em minhas missões, é que posso usar o tempo que ainda tenho para fazer isso.Tenho um cavalo branco que está comigo desde que sou criança. Seu nome é Lótus. Clarissa é minha melhor amiga, nós literalmente crescemos juntas, e fazemos tudo juntas. Na verdade, nós fazíamos. Agora, ando a cavalo ou sozinha ou com Hayden, raramente Clare tem olhos para outra coisa além do bonitão que fica cobiçando por aí. Ele se chama Asher, Asher Parker. Ele é mais velho que nós duas, está sempre treinando com os outros caras da sua idade, ele também ensina muitas coisas para os novatos. Acho que não existe alguém que brigue melhor que ele. Exceto Hayden, os dois andam treinando juntos ultimamente. Hayden é tão bom quanto ele, apesar de ser três anos mais novo. Estou andando a cavalo quando paro ao ver Hayden sorrindo para minha direção, se aproximando com uma espad
Ash e Hayden ficaram limpando toda a cozinha depois de jantarmos. Foi bom ignoramos a nossa realidade por esse tempo. Não posso ser egoísta e dizer que minha vida com Clare não era boa, ela era, sim. Nós duas nos divertíamos, cozinhávamos juntas, andávamos a cavalo, mergulhávamos no oceano, e tomávamos sol na beira da praia, olhamos os desenhos feitos pelas nuvens no céu... Mas também havia o lado ruim. Éramos só nós duas basicamente, e não podíamos ter envolvimento com outras pessoas por maior espaço de tempo. E não sabia de onde os livros e filmes tiram, de que pessoas que não envelhecem podem ter uma vida divertida e ir para onde quiserem, fazer o que quiserem. Eu por exemplo, amava conhecer o mundo, mas as vezes era bom ter uma casa para voltar. A irmã de Clare estava sempre em movimento, mas acho que já conheci tantos lugares, tantas vidas, que evitei de vir apenas para cá, onde sempre quis vir com Hayden, mas nunca consegui o fazer depois de perde-lo.Basicamente passamos mais d