DonatelaO hospital estava mergulhado em um silêncio pesado, como se até as paredes soubessem do risco que pairava no ar. O cheiro forte de desinfetante parecia grudar na pele, misturado à ansiedade que escorria pelos corredores.Donatela Bianchi entrou com a postura impecável de quem queria ser vista como parte da família preocupada, mas seu sorriso discreto escondia o veneno que lhe fervia sob a pele.Os saltos dos seus sapatos de couro fino estalaram no chão como pequenos tiros, chamando atenção apenas dos enfermeiros que a observaram de relance. Ela trajava um blazer claro, elegante, os cabelos loiros presos com perfeição — a encarnação da irmã solidária.Seu olhar percorreu rapidamente o corredor até encontrar a figura imponente de Enrico, parado à porta de um dos quartos, falando em voz baixa com um médico. O rosto dele estava fechado, os olhos injetados de tensão.Donatela fingiu ajeitar a bolsa no ombro, soltando um suspiro alto o suficiente para parecer emocionada.— Po
Giulia e EnricoDois dias se passaram. O hospital, que antes parecia um campo de batalha, agora respirava uma estranha calma. Mas a paz era apenas superficial — Giulia sabia disso. Ela estava deitada na cama, o corpo ainda fraco, sentindo a vida pulsar em si e em seu ventre, onde seu bebê crescia protegido. O soro gotejava lentamente ao lado, e o leve zumbido dos aparelhos preenchia o silêncio do quarto.Na poltrona próxima à janela, Enrico parecia um leão em cativeiro. Vestia uma camisa branca, com as mangas dobradas até os cotovelos, revelando os antebraços fortes cobertos de veias saltadas. O laptop descansava em suas pernas, os dedos digitando com uma rapidez quase agressiva. Dois celulares vibravam em uma mesa próxima, ao lado de uma xícara de café esquecida. Guilhermo, por vezes, entrava e saía do quarto sem anunciar-se, entregando papéis, falando baixo, repassando informações que Giulia mal conseguia entender. Nomes. Endereços. Gravações. Peças de um quebra-cabeça que Enrico mo
Tensão na mansão Giulia sentia seu corpo frágil, mas o calor da mão de Enrico sobre sua cintura a sustentava enquanto subiam os degraus da mansão. Finalmente, estavam em casa. Ou era o que deveria ser... mas a atmosfera pesada e abafada logo denunciou que algo estava errado. Enrico empurrou a porta da frente e, antes mesmo de adentrarem o salão, Giulia estacou. O coração dela quase parou. Ali, em pé no centro do saguão, como se fosse o legítimo dono da casa, estava Victorio. O sorriso distorcido nos lábios dele, misto de loucura e certeza, fez Giulia instintivamente se encolher contra Enrico. Ele não deveria estar ali. Não poderia estar ali. A segurança da mansão era reforçada, quase impenetrável. Como ele tinha conseguido entrar? — Victorio — a voz de Enrico saiu carregada de ódio, mais fria do que aço. — Como diabos você entrou? Victorio deu de ombros, zombeteiro. — Quem quer que ame de verdade, sempre encontra um caminho — respondeu ele, com um brilho insano nos olhos f
O herdeiroMeu nome é Enrico, sou o próximo Don da família Grecco, tenho 27 anos e essa é a história da minha vida, de como eu virei capo e como foi tudo até aqui. Na verdade, minha história não foi muito diferente dos outros herdeiros da máfia, mas eu sempre quis que fosse. Assim eu não ia experimentar esse sofrimento que carrego dentro do peito. Como um doce dado para uma criança e arrancado logo em seguida. Só que junto com o doce, tinha meu coração arrancado dentro do peito e vivia ou sobrevivia quebrado. Dizem que o sofrimento transforma as pessoas, faz com que elas deixem de acreditar nas coisas do alto e só olhem para o próprio umbigo, que elas deixem de ter esperança, de sonhar. Eu nunca almejei herdar o trono do meu pai, mas como primogênito, não teve outro jeito. Só se sai da máfia morto, e eu preferia viver fingindo que estava tudo bem e sem exercer meu verdadeiro propósito, além de conviver com o vazio do luto, do que perder a vida.Sempre invejei o meu irmão Giancarlo, e
GIULIAMeu nome é GIULIA, tenho vinte e um anos, morena da cor do pecado, com olhos castanhos claros e cabelos cheios com ondas e encaracolados. Muito abençoada pelo cara lá de cima e hoje eu vou contar como o meu conto de fadas virou meu pesadelo pessoal de um dia para o outro. Eu cresci achando que o mundo era meu, que eu podia fazer qualquer coisa que eu quisesse, e nem precisava me esforçar para isso. Meus pais sempre me deixaram viver assim, tendo tudo na minha mão, no topo do mundo, ainda mais sendo filha única e mais ainda fazendo parte de uma família importante da Itália.Meu pai sempre disse ser um empresário bem-sucedido e que eu não precisava me preocupar com nada a não ser comigo. Eu vivi nessa ilusão até acabar a minha faculdade, o curso que eu escolhi com tanto carinho e que achava mesmo que ia seguir na minha carreira, abrir meu próprio negócio. A minha vida era resumida em tecido e linha, analisar as mulheres, os panos que as cobriam e imaginar o quanto eu podia melh
Giulia De repente, sinto as minhas mãos molhadas e olho para baixo e acabo percebendo que, o aperto que eu fazia questão de dar na mão do tal homem, chegou até mesmo a arrancar um pouco de sangue, por causa do detalhe que eu tinha no meu anel, como se um pingente com a lateral cortanteGIULIA - MEU DEUS, DESCULPA! NÃO SABIA QUE ESTAVA TE APERTANDO ASSIM TANTO.ENRICO - Anda, vamos voltar para dentro.GIULIA - Para dentro? Mas nós não estamos dentro do hotel?Agora, neste momento, percebo que posso ter fugido para um futuro desconhecido. Olho sem entender para o homem, sombrio à minha frente, no meu coração, acredito que ele é o meu cavaleiro de armadura brilhante, mas também não sei no que me estou prestes a me meter e isso também é assustador.Enrico: - Temos de voltar para Itália, onde eu mando e posso te manter em segurança.Giulia - Não, Itália não, o meu pai e este meu... como posso dizer, ex noivo, vivem lá. Eles podem me pegar, o meu pai tem dinheiro e ontem, me disse que está
EnricoFoi como se eu tivesse visto a Patrízia naquela mulher, não sei explicar porquê, mas foi exatamente isso que sentiEla era frágil, estava assustada, com um casamento que nunca lhe tinha passado pela cabeça e, no entanto, tinha a coragem de enfrentar o mundo simplesmente para seguir o seu coração Sim . . . Como acontecia quando eu estava com a minha Patrizia, como senti naquela noite, vendo a mulher que viria a ser minha esposa, ser torturada pelo meu pior inimigo, com o olho inchado, roxo de tanto levar pancada, ser humilhada, à mercê daquele desgraçado. Assim como me transformei num monstro e arranquei a traqueia dele com as minhas próprias mãos, fui atrás do covarde que se atreveu a olhar para aquela mulher como se fosse a sua presa. Ordenei ao Guilhermo que a levasse para o meu carro, o que ela fez contra a sua vontade, afinal, não nos conhecíamos, mas o medo fez com que ela concordasse quase que de imediato, depois eu me encontrei novamente com ela, depois de ter dado o m
Guilhermo Não posso negar a minha história com o Enrico, mas admito que tudo o que passamos juntos serviu para que a gente pudesse se tornar mais forte, para que o nosso elo fosse inquebrávelEu cresci com ele, nossas mães tiveram parto praticamente na mesma época e a minha, foi ama de leite do EnricoMeu nome é Guilhermo e sou filho do Conselheiro da Camorra. Meu pai era o braço direito do chefe da Máfia Siciliana e digo era porque morreu em um dos embates com nossos inimigos Quando eu era criança, morria de inveja do Enrico, achava que ele tinha a vida que na verdade, eu merecia e não ele. Sempre tendo a atenção de todos, protegido por todos, as melhores coisas simplesmente caiam sobre as suas mãos, na minha mente, ele simplesmente não merecia a vida que tinhaAté completar os seus treze anos e ter que fazer aquela viagem misteriosa. Ele podia levar apenas uma pessoa, no caso, eu, seu amigo com também treze anos. Lógico, eu sempre soube nossas origens e para onde os nossos caminho