A música ecoava pelas paredes grosas, as luzes brilhavam em tons de vermelho, azul e verde, na pista de dança as pessoas se apertavam e moviam-se no ritmo das batidas.
- Hoje a casa está cheia. – Laila grita para ser ouvida.
- E a noite mal começou. – digo desanimada enquanto pego as bebidas e as entrego para os clientes no balcão.
- Se anima, noites assim rendem muitas gorjetas. – minha amiga responde animada.
- Só se for para você. – encaro seu enorme decote V e reviro os olhos.
- Não faz mal deixar que olhem. – ela dá de ombros. – Você deveria tentar, sua roupa é muito comportada para quem trabalhar no bar.
- Não quero nenhum idiota achando que tem direito de fazer alguma coisa só por causa da minha roupa.
- É para isso que temos eles. – sigo seu olhar até os homens de terno nos cantos da boate, olhos atentos e sérios observando tudo a procura de alguma confusão.
- E o que virou aquele lance com o Luís? – pergunto focando em um dos seguranças em particular.
- Você sabe como ele é, quer ter uma namorada, casar e criar uma família. – ela suspira. – Eu não sirvo para isso.
- Você nem tento Lai. – coloco uma mão sobre seu ombro e lhe olho com carinho. – Ele é um cara legal. – entrego o copo com vodka para um homem alto de olhos escuros profundos e magnéticos, ele acena e sai sem dizer nada. – Um obrigado seria o bastante. - reclamo em voz baixa.
- Eu não quero machucar ele. – sua voz sai triste e pesada, resolvo não insistir no assunto.
Copo após copo, cliente após cliente, a boate vai enchendo cada vez mais, as meninas correm de mesa em mesa tentando atender todos, atrás do bar as coisas ficavam caóticas.
- Preciso de um ar. – grito quando percebo que o movimento diminui.
Encolho meu corpo na blusa grossa assim que saio pela porta dos fundos para o beco, o vento gelado atinge minhas pernas descobertas.
- Odeio esse vestido. – reclamo pela roupa impropria para o tempo. Respiro fundo, me encosto na parede e vejo a fumaça sair por minha boca. – Que frio.
- Vamos levar você para outro lugar. – olho na direção da rua e vejo dois homens conversando animados com uma mulher.
- Vão me levar para onde? – ela pergunta com a voz embargada.
- Para um lugar onde podemos continuar com a diversão. – o outro responde animado.
Eles passam por mim sem perceber minha presença. “ Isso não é da sua conta Camille.” Digo para mim mesma.
- Vocês são amigos do meu irmão? – a moça pergunta confusa.
- Isso mesmo. – um deles responde com pressa olhando desconfiado para os lados.
- Eu não conheço vocês. – a mulher para por um segundo encarando com atenção os homens.
- Amiga, eu saio por um minuto e você já arruma confusão. – digo em voz alta saindo do beco e parando ao seu lado. – Desculpe rapazes, ela sempre fica assim quando bebe muito. – dou um sorriso amarelo e pego na mão dela. – Vamos voltar, os meninos estão te procurando. – ela me encara assustada.
- Camille. – meu nome sai de seus lábios com alivio.
- Vem Mel. – digo em voz baixa. – Vou levar você para dentro.
- Ela veio com a gente. – o homem mais baixo reclama segurando meu braço.
- Obviamente ela não sabe quem vocês são. – o encaro com nojo.
- Como você mesmo disse, ela fica confusa quando bebe muito. – um sorriso frio se abre em seus lábios finos.
- Isso não lhes da o direito de leva-la.
- Ela quis. – o outro responde com raiva.
- Que tal você vir também? – o homem baixo da um passo na minha direção segurando meu braço com força.
- Me solta.
- Não vai adiantar nada você gritar, estamos muito longe dos seguranças. – olho pela rua vazia a procura de alguém.
- Vou ter que acabar com vocês então.
- Cami... – Melissa ainda estava assustada e grogue pelo seja lá o que aqueles homens tinham dado a ela.
- Vai ficar tudo bem. – tento tranquiliza-la.
- Você vai fazer o que? Jogar os sapatos em mim? – a risada grossa do homem arranham meus ouvidos.
- Eu vou matar você se não tirar esses dedos nojentos de mim agora. – ele me encara surpreso por alguns segundos.
- Gostaria de ver você tentar, vadia.
Sinto o impacto da sua cabeça na minha assim que o certo, ele cambaleia para trás sem equilíbrio.
- Você vai morrer. – ele grita furioso, o rosto manchado de sangue.
- Duvido muito. – me coloco na frente de Melissa que parecia assustada e paralisada.
Com raiva o homem avança na minha direção com passos lentos e pesados, me desvio dos golpes o deixando mais irritado.
- Acabe logo com isso. – o outro reclama sem paciência indo na direção da mulher atrás de mim.
- Não mesmo. – me coloco na sua frente. – Mais um passo e você morre junto com o seu amigo.
- Me poupe. – ele desfere um soco na minha direção, desvio e acerto seu estomago.
- Você vai me pagar, sua puta. – ele da alguns passos vacilantes para trás com as mãos na barriga. – Você não faz ideia de quem somos. – ele ameaça.
- Vocês não sabem quem eu sou. – pego o soco inglês escondido no forro do casaco e sinto o frio do metal nos meus dedos. – Cansei de brincar. – ouço o som oco dos ossos quebrarem em seu rosto, o sangue saindo pela boca machucada, desesperado o outro homem vem em minha direção na esperança de ajudar o amigo, com um chute acerto seu peito o fazendo cair.
- Camille. – Melissa grita desesperada me fazendo virar na hora que uma garrafa acerta minha cabeça.
- Agora você vai morrer. – minha cabeça gira e dói, dou alguns passos vacilantes me apoiando na parede, respiro fundo, a visão clareando aos poucos.
- Você vai se arrepender disso. – digo furiosa. – Já faz muitos anos que ninguém me acerta assim. – sorrio.
Deixo a adrenalina e a raiva correm meu corpo, meus músculos se contraem retendo energia, sinto a força correr por mim como uma corrente elétrica, minha visão fica turva, meu corpo se move com agilidade e rapidez, sinto a textura da pele do homem sendo dilacerada com o golpe, o sangue quente nos meus dedos, o cheiro de ferro no meu rosto, ouço os ossos protestarem a medida que eram quebrados.
- Camille. – paro ofegante quando Melissa segura meu braço. – Você vai matar ele desse jeito. – ela me encara assustada e olha para o corpo caído no chão.
- Vamos sair daqui. – coloco a mão machucada no bolso da blusa de frio, seguro seu braço e a levo para a parte da frente da boate.
- Você está bem? – ela me encara preocupada assim que paramos.
- Vou ficar. - sinto a dor aumentar a medida que a adrenalina se vai. – Você esta bem? – a olho com atenção, agora Melissa parecia um pouco mais sóbria, mas seus olhos ainda brilhavam por causa da droga.
- Vou ficar.
- Finalmente achei você. – ela se ira quando um homem alto vem em nossa direção. – Tiro os olhos de você por um segundo e você some. – ele diz furioso se aproximando.
- O que você quer? – seguro o braço de Melissa a colocando atrás de mim em modo de defesa, minha mão aperta o soco inglês no bolso, os dedos doloridos.
- Quem é você? – ele me encara dos pés a cabeça, a mandíbula serrada, o corpo rígido.
- Eu perguntei primeiro. – digo ríspida. Olho ao redor para ver quantas testemunhas teria caso o matasse ali.
- Ele é meu irmão. – olho por cima do ombro e vejo a moça sair da minha proteção. – Estamos seguras com ele. – ela caminha um pouco vacilante na direção do homem. – Andrea, essa é Camille, ela estuda comigo e acabou de salvar a minha vida.
- Da próxima vez, fique de olho nela. – a dor latejante estava me deixando de mal humor.
- O que aconteceu com você? – ele dá um passo na minha direção e segura meu rosto.
- Nada que eu não possa resolver. – afasto sua mão. – Só cuide dela. – saio na noite fria desesperada para chegar em casa.
Pego o telefone e mando mensagem para Laila avisando que estava passando mal e não poderia voltar, antes de guardar o aparelho o vejo vibrar.
- Por que você não atente a porra desse telefone, Camille? – a voz furiosa do outro lado da linha faz meu coração se acalmar.
- Tentaram me matar. – respondo com tranquilidade.
- Como você está?
- Viva.
- Quantos corpos?
- Eu não matei eles. – sinto o salto afundar no gelo amontoado ao longo da calçada. – Mas se não forem para o hospital agora, acredito que não amanhecerão vivos. – levo os dedos a minha testa e sinto o corte arder.
- Você está ferida?
- Fui pega de surpresa, foi só isso.
- É melhor você descansar. – Marco respira fundo do outro lado da linha. – Você tem duas semanas mi rosa.
- Antes disso nosso pai terá a cabeça do capo em sua mesa. – vejo minha respiração virar fumaça no ar frio.
Respiro fundo e tento abafar o som alto dos clientes impacientes na fila, coloco a xicara na cafeteira industrial e vejo o liquido escuro preenche-la, a fumaça aromatizada tomando o ar.- Seu café. – coloco a frente da moça que mantinha os olhos presos a tela do computador.- Obrigada. – ela responde sem animo.- Hoje está bem cheio. – me viro e vejo meu chefe terminando de preparar um pedido e entregando a um cliente que sai assim que paga.- Segunda de manhã é sempre assim. – sorrio. – Pelo menos o tempo passa rápido.- Pensei que você amava esse trabalho. – ele brinca.- Claro que sim, esse é o melhor trabalho do mundo, posso beber todo café que conseguir, levo os doces que sobra para casa e ainda posso dormir no apartamento aqui em cima.- Trabalho melhor do que esse não há, Cami. – Conner abre um sorriso sedutor. – E você ainda tem a oportunidade de passar o dia todo comigo.- Não poderia ter mais sorte. – reviro os olhos e rio baixo.- Seus clientes preferidos chegaram. – sigo s
- Por que ainda não foram para casa? – encaro o homem alto dos pés a cabeça, os olhos escuro pareciam cansados e fundos pelas noites mal dormidas, a mandíbula rígida pela preocupação, os ombros largos tensos por carregar o peso de proteger os irmãos.- Resolvemos passar para ver a Cami, e tomar um café. – Melissa sorri para seu protetor como uma criança que finge não ter feito nada de errado.- Não vi você na Paradise ontem a noite. – os olhos escuros esmagam Bartolomeu que se encolhe levemente, se eu não estivesse acostumada com a típica discussão dos Mancini, jamais teria percebido isso.- Alguém tinha que cuidar dela. – ele indica a irmã.- Se não vão pedir mais nada, eu vou nessa. – me viro na tentativa de fugir dessa encenação.- Camille. – meu nome sai grave e lento de seus lábios, um arrepio percorre minha espinha.- Andrea. – concerto a postura e o encaro nos olhos.- Quero um expresso duplo para a viagem por favor. – a tempestade que a poucos tornava seus olhos tenebrosos hav
- Vai mesmo morar com ela? – a preocupação carregava cada palavra. -Assim eu consigo ficar mais perto deles, saber se posso mesmo fazer isso.- Você já fez isso inúmeras vezes mi rosa, o que tem de diferente agora?- Eu não sei. – me sento sobre a sombra de uma arvore. – Você disse algo a ele?- Nunca diria nada que colocasse a sua vida em perigo, mas ele está desconfiado, disse que você está demorando demais para terminar isso, vai mandar alguém atrás de você. - Marco parecia desesperado. – Não vale a pena se arriscar por essas pessoas Cami.- Me mande as coisas que você descobriu, ai eu decido se acabo logo com isso ou não. – meu irmão fica em silencio.- Ok. Mas se seus planos mudarem, eu preciso saber. Não vou conseguir te proteger se as coisas fugirem do meu controle, mi rosa.- Eu sei hermano, eu sei. – respiro fundo.- Preciso ir, não posso ficar muito tempo.- Vou ficar esperando os arquivos.- Tudo bem. Se cuida Cami. – a voz sai preocupada e temerosa.- Você também Mac. – a
Pisco os olhos para me acostumar com as luzes da boate, a música alta tocando pelas paredes, com o passar das horas o lugar enchia mais, o cheiro de álcool e perfume se misturando na multidão.“Como você está?” – mando a mensagem para Melissa.“Com dor, mas já tomei o remédio.” – a tela brilha quando a resposta chega.“Deixei comida na geladeira, tem sopa no fogão.”“Obrigada.” – a mensagem vem acompanhada por carinhas felizes.- Como está sendo morar com a princesinha Mancini? – Laila pergunta com sarcasmo. Já fazia algumas semanas que estávamos morando juntas.- Mel é um pouco mimada, devo admitir. – dou uma risada baixa. – Mas ela é uma boa pessoa.- Você não quis morar comigo quando ofereci. – minha amiga torce o nariz e diz emburrada.- Eu tive meus motivos para aceitar morar com ela. – termino de limpar os copos e os coloco na bandeja.- Ela tem dinheiro e pode te oferecer uma casa confortável. – Laila diz com sarcasmo.- Acredite, a última coisa que eu me preocupo agora é com d
Meus pensamentos se perdem no olhar distante de Camille a segundos atrás, a forma involuntária que seu corpo se encolheu com meu toque. Uma dor estranha aperta meu peito, eu não queria que ela tivesse medo de mim.- Tem certeza que está bem? – pergunto assim que a moça coloca o copo sobre minha mesa, as pedras de gelo boiando na bebida. Os olhos azuis não pareciam mais perdidos, mas também não tinham o brilho de sempre, agora eram como as pedras de gelo no whisky, frios, afiados, perigosos.- Apenas cansada. – ela solta um suspiro, a voz sobressaindo a música alta. – Sabe como é a rotina puxada. – seus lábios se contorcem em um meio sorriso desanimado. – Odeio essa roupa. – a garçonete comenta assim que um homem passa por trás tocando seu corpo. – Não precisa fazer nada. – as palavras saem com um aviso implícito assim que Cami percebe minhas intenções. – Você é dono de uma boate, sabe como são os clientes. Eu preciso ir, se precisar de mais alguma coisa é só acenar. – vejo seu corpo p
- Eu disse para não fazer nada. – percebo a presença de Camille e da outra moça atrás de mim, me viro. – Comprar a boate se enquadra nessa condição. – ela ergue a cabeça, os olhos demonstrando a tempestade que continha dentro de si.- Vocês estão bem? – analiso as duas mulheres, minha atenção redobrada na moça a minha frente. – Não podia deixar que ele agisse assim com você... – minha mente registra a última palavra com urgência. – Vocês. – corrijo.- Tire o resto da noite de folga. – sua voz sai carinhosa e cheia de atenção para a moça que permanecia escondida atrás de si. – Eu cubro seu turno. – agradecida a moça acena com a cabeça e sai apressada. – Não gosto da ideia de trabalhar para você. – os olhos azuis voltam para mim, a cabeça levantada mostrava que aquela mulher não se assustava com qualquer coisa.- Achei melhor não comentar. – aos poucos a confusão ao nosso redor diminuía.- Não confunda as coisas só porque sou amiga da sua irmã.- Sou um homem de negócios, sei separar a
Cambaleio tentando manter o equilíbrio, meu peito doendo em reposta ao chute.- Está ficando enferrujada? – sua cabeça pende levemente para o lado, os olhos verdes afiados piscando em uma tentativa inútil de parecerem inocentes. – Esses meses como a cachorrinha dos Mancini te deixou mal acostumada.- Você sempre falou demais. – recupero meu equilíbrio, o ar queimando a medida que entra nos pulmões. – O que você quer?- Estava muito entediada em casa, vim brincar. – as mãos ágeis retiram as adagas das costas e as rodam nos dedos finos, as laminas afiadas brilhando, o ar assovia com os cortes e as investidas contra mim, meus movimentos são rápidos mais um pouco lentos, minhas narinas ardem quando uma das laminas passam rente ao meu nariz.- Veneno. – observo. Tento manter o máximo de distância possível das facas.- Você é o serviço da vez, priminha. – um sorriso afiado cresce nos lábios vermelhos. O fato de ser seu alvo faz com que Dominique se dedique mais para me matar, ela usa todo s
Caminho em direção ao meu carro, as pessoas saindo da boate, aos poucos o estacionamento ficando vazio, entro para fugir do frio. Meus olhos acompanham a mulher que se encolhe no casaco grosso, sua imagem se perde no carro escuro.- Por que eu falei com ela daquele jeito? – encosto a cabeça no volante frio. – Idiota. – me repreendo.Ligo o carro e dirijo até a Paradise.- Senhor. – o segurança me encara surpreso pelo horário. – Já estamos fechando. – ele informa.- Tudo bem. Tenho as chaves das portas dos fundos. – ergo o molho de chaves.- Sim senhor. – ouço o clic da porta sendo trancada assim que entro, encaro o salão vazio e silencioso. Era estranho ver a boate vazia depois de tantas noites lotada.O som dos meus passos na escada de metal ecoa pelo lugar, entro na minha sala, tiro o paletó e o jogo no pequeno sofá de couro, pisco os olhos par se adaptarem a luz quando a ligo, sento a mesa e ligo o computador. Analiso os papeis, as informações sobre os investimentos, os gastos, os