O desespero tomava conta de Noah, um homem geralmente calmo. Lia se preocupou ao vê-lo assim.
— Nos localizaram. – disse Lia, a voz baixa e carregada de angústia. — Não, não, não. Que droga! Não era para isso acontecer. O que vamos fazer? – gritou Noah, correndo para a beirada da cobertura, tentando confirmar a posição dos agentes e buscar uma rota de fuga. — Eu não sei! Você sempre cuidou de mim e de tudo quando eu não conseguia fazer! Eu não quero morrer, Noah! Não quero! – Lia chorava, o pânico transbordando em cada palavra. — Não chore. Isso não vai ajudar em nada – respondeu Noah, lançando-lhe um olhar rápido antes de voltar a escanear os arredores.. — "Não chore"? – A voz dela tremia – É só isso que tem para dizer? Diga algo, por favor! Me diz qual é o plano! Fala que vamos sair dessa, que vamos sobreviver! Que droga, Noah, me diz o que vai acontecer! Lia, incapaz de conter o medo, inquieta, andava de um lado para o outro, os soluços tornando sua respiração irregular, mas não encontrava uma saída para a situação A paciência de Noah se esgotou. Os helicópteros se aproximavam, o barulho das hélices ficando cada vez mais alto. Lia falava sem parar. O cansaço extremo o atingia como um peso esmagador. O estresse se elevou até que a tensão explodiu. — MAS DÁ PRA PARAR DE FALAR?! De perguntar tanto?! Eu estou tentando pensar! Você não está ajudando em nada! Lia se calou por alguns segundos. Noah respirou fundo, tentando formular uma estratégia. Sua mente, porém, estava exausta. Tudo parecia um beco sem saída, seu raciocínio já não era mais o mesmo. — Eu não quero morrer, só isso – disse Lia, sua voz agora fraca. – Você sempre esteve ao meu lado quando eu não conseguia seguir sozinha. Eu nunca te agradeci. — Não é hora para isso, Lia. Por favor... — Cala a boca... Eu não sei por que... ou se você realmente me ama. Não sei se foi real ou só algo que parecia ser o melhor para nós. Mas eu sinto de verdade que eu deveria agradecer… então eu agradeço, por cada momento, cada riso, cada um dos… Noah correu até Lia e a envolveu em um abraço apertado. Os olhos dela estavam encharcados. — Não fale essas coisas, sua idiota. Eu gosto de você. Isso nunca ficou claro para você? Eu já te fiz mal alguma vez? Antes de você, eu nem sabia o que era amar de verdade, mas te proteger sempre foi natural para mim. Vamos superar isso juntos, mesmo contra todas as probabilidades. Presta atenção no que eu digo... Eu te amo. Lia soluçou. — Mas nós realmente não temos chances, não é — Não fale assim. Estamos fracos, sozinhos, mas vamos conseguir fugir. Só não desista... Por favor. Lia saiu dos braços de Noah, afastando-se enquanto ainda chorava, a cada passo para trás, lágrimas caiam de seu rosto. Ela abaixou a cabeça, olhando para o chão. — Eu sei que você me ama. E isso torna tudo muito mais difícil... Eu sinceramente sei que fez tudo que pôde, obrigado por tudo. Me desculpa. Me perdoa mesmo. — Como assim? Pelo quê? — Por isso... — Isso...? Espera… meus braços...? Mas... o que você fez? — Me desculpa. Eu realmente não vejo outra saída. Eu vou sobreviver a qualquer custo. Noah tentou se mover, mas seu corpo não respondia. Não sabia como, mas sabia que Lia o havia paralisado. A compreensão atingiu Noah como uma lâmina gelada. Em um instante, todas as lembranças passaram por sua mente. A sensação de que algo sempre estava errado, de que havia sinais que ele ignorou. Essa era sua última tentativa desesperada. — Eu... eu sabia. Sempre disse que te amei, mas algo em mim gritava para não confiar em você. Agora percebo... Você nunca me pediu para confiar em você, não é? Lia hesitou, apenas mantendo o olhar às suas lágrimas caídas no chão. — Você não estava bravo? Com raiva? Vai me deixar fazer isso sem reagir? — Idiota. Eu tenho escolha? Me diga? O que é? Paralisia? Você despertou uma segunda habilidade? Parabéns. Mas claramente não confiava em mim, pelo menos não para contar. É realmente triste. Então é assim que termina? Eu morrendo, e você fugindo sozinha. — Você me ama tanto assim para reagir desse jeito? Sem grito? sem ódio? — Meu erro foi não ter confiado no meu instinto... Meu amor foi maior. Eu realmente me arrependo agora. — Não me culpe, por favor. — Não importa mais. A culpa foi minha – disse Noah, num tom baixo e derrotado. Lia encarou Noah, podia ver nos olhos a decepção dele. Mesmo assim ela precisava perguntar. — Você… pode simplesmente me transferir tudo? Não quero ter que fazer isso. — Você terá que fazer. Afinal, essa é sua decisão. — Por favor, Noah... — Sem isso agora, Lia! SE APRESSE E FAÇA! – Vociferou Noah. Lia, chorando, aproximou-se do corpo imóvel de Noah. Com seu poder, cortou dois dedos dele. O sangue pingava, ela o armazenou em um pequeno cálice de ar. Abruptamente o bebeu. A energia de Noah invadiu seu corpo, invadindo cada célula de seu corpo, uma força que nunca havia sentido antes. Seu corpo brilhava em finas linhas esverdeadas. O ritual estava completo. — Eu levaria você comigo se pudesse... Você sabe que eu não queria te deixar para morrer. Mas você não vai conseguir se mover agora. Não tenho como... — Sem desculpas, Lia. Apenas vá. Sobreviva. Ao menos faça isso valer a pena. Adeus. Lia correu até ele, e o beijou. — Adeus... Eu também te amo. Lia andou de costas até a beirada da cobertura, sem tirar os olhos de Noah, e então saltou, planando no ar como se voasse. Com os poderes de Noah e os seus próprios, escapar não seria difícil. Noah, ainda imóvel, apenas observou sua silhueta desaparecer. As luzes dos helicópteros iluminavam a escuridão. Os passos dos inimigos se aproximavam. Ele se sentia esmagado por uma avalanche de emoções: tristeza, solidão, abandono... Mas, acima de tudo, arrependimento. — "Se eu soubesse, teria feito diferente?" – pensava Noah depressivo. – "Depois de tudo que fiz... Esse é meu fim? Eu tinha tantos planos para nós dois... Acabar assim é inadmissível. Eu deveria ter sido melhor. Mas agora... O que posso fazer? Nada?" — Pensativo? Ela te abandonou, não foi? – disse o Capitão Branco, que acabara de chegar. – Depois de tudo que fez por ela, te deixou para morrer. Irônico e cruel, não acha? Bom, já conversamos antes. Sei que não voltará atrás. Você é um homem morto agora. Mas eu o admiro... Por se entregar ao amor. Eu nunca cometeria esse erro de novo. Enfim, agora fale, quais suas últimas palavras? Noah permaneceu calado, mergulhado nos próprios pensamentos. — Nenhuma palavra? Quem diria? Para um homem que falava tanto... – O Capitão sacou a arma e apontou para Noah. – Diga algo antes de morrer, pirralho. Sabe o quão decepcionante isso é? Você tinha potencial. Noah ergueu os olhos e, numa mistura imensa de sentimentos, seus olhos ainda lacrimejavam, e num fio de voz, sussurrou: — Eu me arrependo. — Maravilhoso. Agora você pode ir em paz. Nos últimos segundos, flashes de sua vida passaram por sua mente. Antes que pudesse ver o brilho do projétil, suas pupilas ficaram claras expandindo rapidamente até seus olhos ficarem brancos, emitindo uma luz intensa e ofuscante. Raios cortaram o céu, iluminando a escuridão, trovões estremeceram a noite, foi como se o próprio universo gritasse ao seu redor. A realidade tremulou. O mundo ficou pequeno diante da energia que pulsava dele como uma estrela prestes a explodir. Tudo vibrava, o chão parecia pulsar, e por um instante, o tempo hesitou. Então todos puderam ouvir um grito que ecoou por todo o território: — EU NÃO QUERO MORRER! O mundo silenciou por um instante. Momentaneamente calmo, E então, ouviu-se um único disparo… Noah estava morto.Lia nunca poderia imaginar o quão drástica seria a mudança que a vida lhe reservaria. Desde o seu nascimento, o destino a colocou em um caminho cheio de desafios. Cresceu protegida, cercada pelo carinho e atenção de sua mãe, mas, ironicamente, sempre foi exposta à crueldade do mundo. Desde pequena, testemunhava decisões insensatas de pessoas ao seu redor, atos de egoísmo e destruição. Embora, na época, não compreendesse completamente o significado do que via, essas memórias ficaram gravadas em sua mente. Com o tempo, ela aprenderia a interpretar cada cena, a compreender a verdadeira face do mundo. Ainda muito jovem, Lia já possuía uma visão realista da vida. Foi forçada a amadurecer cedo, a encarar a realidade sem ilusões. E quando teve a oportunidade de tomar suas próprias decisões, acreditou estar preparada. Aos treze anos, começou um novo capítulo de sua vida ao ser transferida para um colégio com melhor estrutura e recursos. A chance de construir um futuro promissor estava a
A busca pela perfeição é uma jornada cruel. Quando se tenta algo diversas vezes e continua a falhar vez após vez, parece totalmente incompreensível, e o desespero se instala. Cada tentativa frustrada parece sussurrar que nunca será bom o suficiente, porque a dificuldade continua a aumentar exponencialmente. O caminho é repleto de dores, angústias, decepções e traições. Alguns desistem. Outros persistem. E alguns poucos desafiam todos os limites para se tornarem algo maior. Noah pertencia a esse último grupo. Mas, por mais que superasse obstáculos, havia uma área em que sempre fracassava: o amor. Ele nem sempre foi forte. No início, era apenas um garoto frágil, sem coragem ou entusiasmo para aprender qualquer coisa. Sofria na infância, como tantas outras crianças esquecidas em um orfanato sem recursos, ele também não era muito inteligente, não se diferenciava em praticamente nada de qualquer outra criança daquele lugar. Chorava, sentia fome, era alvo dos mais velhos, tudo que ele p
Noah começou pedindo esmolas enquanto não encontrava uma forma de conseguir dinheiro suficiente para sobreviver. Não conhecia nada de verdade, exceto o que tinha lido em livros, mas nem sempre se pode confiar no que se lê. Então, buscou conhecimento nas ruas, observando tudo ao redor, procurando comida onde podia e dormindo em becos, protegendo-se da chuva da forma que fosse possível. Para seu infortúnio, entrou em uma área que não deveria. Aqueles que controlavam o local ficaram visivelmente irritados com sua presença. Poderia ter ido embora calado e seguro, mas seu erro foi xingar um homem com o pavio extremamente curto. O sujeito o ameaçou e correu em sua direção. Desesperado, Noah também correu. Era rápido, mas, comparado a um adulto, não o suficiente. Ao ver uma chance, virou em uma esquina para tentar se esconder, mas era tarde demais: havia entrado em um beco sem saída. O homem o alcançou com facilidade, percebendo que Noah estava encurralado e sozinho, foi então que saco
Noah não era um homem de agir sem pensar, mas naquele momento ele o fez. Impulsionado ao máximo por sua habilidade, correu em direção à moça com uma força de vontade e determinação que dominavam todo o seu corpo. Sua velocidade era impressionante, e sua visão mal conseguiu acompanhar os próximos movimentos. Antes do impacto, no último instante, Noah saltou, seus braços se fechando ao redor dela. O mundo girou quando se lançaram para longe, o rugido do carro passando tão perto que ele sentiu o deslocamento do ar. Então, um estrondo, o carro se espatifou contra uma árvore, o som do impacto foi devastador. Lia estava ensanguentada, seus braços e pernas tinham arranhões do impacto contra o chão. Noah sentiu sua energia se espalhar, pronta para protegê-la… mas algo resistiu. Como uma barreira invisível, uma força estranha anulou sua habilidade, deixando-a vulnerável no último segundo. Felizmente, seus ferimentos não eram graves. Noah, por outro lado, mal conseguia se manter de pé. Nunca
Lia estava tão imersa em suas próprias perguntas e dúvidas que se esqueceu de explicar como estava praticamente intacta, considerando seu corpo aparentemente frágil. — O quê? Do que está falando? – disse Lia, forçando um sorriso nervoso enquanto desviava o olhar. – Deve ter batido a cabeça muito forte, mas a Sophia disse que estava bem. A Sophia é a médica dona desta casa, caso esteja se perguntando. — Não estou interessado. Quero saber sobre você. Já testei embutir meu poder para proteger outras pessoas algumas vezes. Às vezes funcionava bem, outras nem tanto. Mas nunca senti meu poder ser rejeitado. Então, sem drama ou teatro. Apenas me diga... Lia permaneceu calada. Seus olhos buscaram os de Noah, mas tudo o que encontravam era o peso de um julgamento silencioso. Sentia o corpo rígido, como se cada célula temesse dizer a coisa errada. Era péssima em mentir quando pega de surpresa. Se tentasse, talvez Noah fosse embora sem dizer nada. Ainda assim, tentou mudar de assunto.
Os próximos dias foram bem planejados. Noah alugou uma pequena casa afastada da cidade para que ambos pudessem usar e demonstrar suas habilidades sem o risco de serem vistos. Lia tirou uns dias de descanso de seus estudos para focar. A princípio, sentiu-se estranha, até um pouco triste, nunca havia negligenciado seus estudos de propósito. Mas, naquela ocasião, os dias passavam tão rápido que ela mal tinha tempo ou disposição para abrir um livro. Cada dia, um aprendia um pouco das habilidades do outro, ajudando-se mutuamente. As falhas e erros levavam a muitos sorrisos e brincadeiras, apesar do temperamento arrogante de Lia, que começava a aparecer. Noah, no entanto, lidava bem com isso. Já estava acostumado aos mais diferentes tipos de personalidade ao longo da vida. — O que vamos tentar aprender hoje, Noah? — Eu realmente não sei. Já treinamos intensamente por cinco dias desde que chegamos aqui… Estou um pouco cansado. Não podemos apenas dormir mais hoje? — Bom, tudo bem. Eu vou
Os dias seguintes passaram tão rápido quanto os anteriores. Vivendo juntos, começaram a se acostumar com as manias um do outro. O treino já não era tão intenso como antes, pois Lia parecia estar exausta. Ela não tinha forças para manter o mesmo ritmo, e Noah não entendia o motivo. Ele preparava refeições nutritivas o suficiente para treinarem todos os dias, mas supôs que fosse apenas por conta do período dela. Sem querer causar constrangimento, preferiu não perguntar. Apenas questionava se Lia queria treinar e em quais horários, mas ela nunca explicava o porquê de sua fadiga. Lia já não dormia direito havia várias noites. A falta de descanso afetava seus treinos e seu humor. Como dormiam em quartos separados, Noah nem desconfiava do real problema. Ela se sentia perdida, como se estivesse presa em uma tempestade de emoções que não sabia nomear. Cada vez que tentava entender, acabava mais confusa e frustrada consigo mesma. Já havia se apaixonado antes, mas su
No dia seguinte, Lia e Noah deveriam estar completamente recuperados. Lia abriu os olhos como quem desperta de um pesadelo. Assustada, levantou-se bruscamente, tentando entender onde estava. Ao notar que não era sua cama, um calafrio percorreu seu corpo. Seu peito subia e descia rapidamente, como se lutasse para conter uma ansiedade repentina. O quarto estava silencioso, mas sua mente era um campo de batalha. Pensamentos colidiam violentamente. Olhou ao redor. Os lençóis estavam levemente bagunçados, o cheiro sutil de Noah ainda pairava no ar, misturado ao seu. Com algum esforço, lembrou-se do que fizera na noite anterior. As memórias vieram de forma abrupta. Levou a mão aos olhos, desacreditada. Processar aquilo não era fácil, ainda mais despertando tão bruscamente. Mas, mesmo em plena consciência, ela não saberia como reagir. — Não acredito... Não deveria... Por que fiz isso? Eu dormi aqui? – murmurou, passando as mãos pelo corpo para se certificar