O homem que o montava conseguiu controlá-lo a ponto de não cair, já eu não tive a mesma sorte, e em minha queda rolei entre as pedras que ficavam no caminho. Imediatamente, ele desmontou e veio socorrer-me, e logo atrás meu guarda vinha apressado para ajudar-me também.
— Sinto muito, senhorita! Não imaginei que haveria mais alguém cavalgando por aqui. Machucou-se muito? — O homem ajudou-me, e ao levantar percebi que meu pulso doía e minha face parecia sangrar. O guarda veio em minha direção também para me proteger do desconhecido, mas fiz um sinal para que ficasse onde estava.
— Oh! Ainda não sei. Não há problema, eu estava correndo demais e meu cavalo assustou-se com o seu. Também peço que me desculpe pelo ocorrido.
Quando consegui levantar o meu olhar, parei ao constatar a beleza daquele misterioso homem. Seus traços fortes e perfeitos, aquele negro olhar que parecia familiar e de súbito me perdi naquele momento, encantada por um belo sorriso que fez com que minhas pernas perdessem as forças, a ponto de quase cair novamente, sendo amparada por braços fortes e acolhedores.
— Cuidado! Não vai querer cair de novo e machucar-se ainda mais! — sua voz firme era ainda mais perturbadora.
— Agradeço pela ajuda! Tenho que voltar, porém, acredito que não vou conseguir mais montar, se puder acompanhar-me até o castelo, serei muito grata e lhe recompensarei quando chegarmos lá.
— Não há necessidade de me recompensar, de forma alguma. Ficarei feliz em ajudar-lhe. Vive, então, no castelo?
— Sim! Percebo que não me reconheces, não deve ser dessa região. De onde está vindo?
— Venho de longe, muito longe.
— Entendo! Quando chegarmos ao castelo descobrirá quem sou.
— Muito bem, então! Será da mesma forma comigo. — Ele sorriu e percebi que não sabia como reagir àquele sorriso.
Como aquilo era possível? Quem era aquele misterioso homem? Senti, uma vez mais, que o conhecia, no entanto não conseguia lembrar de onde!?
Era a primeira vez que meus sentimentos me deixavam confusa. Nunca havia sentido algo tão forte e, ao mesmo tempo, tão perturbador. Não sabia como reagir, apenas aceitei a ajuda para montar novamente e dessa vez estava no cavalo de um estranho, sendo escoltada por um guarda real que não parecia gostar nem um pouco daquela situação. Apreensivo, levava o meu cavalo e, ao chegar mais perto dos outros guardas, o ouvi pedindo atenção para que todos ficassem alertas a qualquer movimento estranho do homem que me ajudava.
Sentada à frente dele, no cavalo, sentia a sua respiração e também o calor de seus braços que me envolviam para que eu não caísse, enquanto ele segurava as rédeas. Cavalgamos devagar, e como havia corrido para longe da clareira, demoramos um pouco para chegar ao castelo, e além disso, o tempo pareceu andar lento, devido a toda aquela energia que sentia. Pela primeira vez em minha vida, não sabia como me comportar, não sabia como agir diante daquele homem que conheci abruptamente em uma curva do bosque. Em um acidente inesperado minha vida havia mudado, em um átimo, tudo parecia estar diferente e meus sentimentos bagunçados em uma mistura de calor, encantamento, formigamento e uma sensação de acolhimento que nunca havia sentido antes.
Quando chegamos ao castelo, o homem ajudou-me a desmontar e um guarda correu para avisar que eu precisava de ajuda e havia me machucado.
— Muito obrigada pela ajuda e por me trazer até aqui em segurança. Não sei como posso lhe compensar, contudo, se precisar de estadia antes de seguir viagem, as portas do castelo estão abertas a você.
— Eu que agradeço, mas já cheguei ao meu destino e percebo agora que estava esse tempo todo com a Rainha.
— Sim, sou a Rainha Vitória Malena, e você quem é? E o que veio fazer por aqui? — ele sorriu, como se achasse graça de minhas dúvidas.
— Já nos conhecemos há um bom tempo, não nos lembramos devido às mudanças de nossa idade. Vossa Majestade ainda não me reconhece, contudo, agora que sei quem é, consigo notar muito bem a semelhança com aquela pequena menina que deixei por aqui.
Percebi que além dos guardas, outras pessoas vinham para ajudar, entre elas estavam minha tia Amélie, que ao ver o homem misterioso correu em nossa direção e parecia emocionada.
— Meu filho, você voltou? — ela gritou com lágrimas nos olhos.
— Minha querida mãe. Estou de volta! Quantas saudades! — ele também parecia muito emocionado e agora entendia tudo.
Os dois se abraçaram e, enfim, percebi quem era aquele homem que havia causado o meu acidente e, ao mesmo tempo me ajudado, era meu primo Aron. Ele estava de volta, após anos vivendo longe havia retornado para junto de sua família.
— Você é o meu primo? Meu primo Aron? — ainda estava surpresa com aquela constatação.
— Sim, minha querida! Meu filho está de volta. Não é uma grande alegria? — Tia Amélie estava exultante.
— Sim, minha tia. Que grande alegria! — e que bela surpresa.
— E vocês se encontraram sem saber quem eram, pelo que estou percebendo.
— Nossa Rainha machucou-se em um acidente no bosque e a ajudei a retornar, ela precisa de ajuda para recompor-se. Foi um grande infortúnio esse acidente ter sido causado por mim! — ele não parava de sorrir e eu não conseguia tirar os meus olhos dele.
— Claro! Estou percebendo agora que está machucada querida. Vamos entrar, suas damas e Serena a ajudarão. Sente-se bem? Algo está doendo? — minha tia mudou sua alegria para a preocupação ao reparar em meus ferimentos.
— Apenas o meu pulso e os cortes no rosto, mas não é nada demais. — Sinceramente, nem conseguia sentir dor, estava feliz pelo retorno inusitado de Aron.
Minhas damas de companhia apareceram e me levaram em direção aos aposentos. Ao ser levada por elas, despedi-me rapidamente e pude ouvir mãe e filho conversando animados enquanto me afastava. Quando entrei na sala de banho, minha dama de companhia Gisela ajudou a me limpar, trocar as roupas sujas, e meus ferimentos foram cuidados por Serena. Estava inteira de novo, no entanto, sentia como se um pedaço de mim tivesse sido arrancado, era algo novo para mim, algo além de tudo o que pensava já ter sentido.
Após me ajudar, Serena parecia curiosa em perguntar-me o que havia acontecido:
— Você está diferente, Vitória. Como se esse acidente tivesse mudado algo em você. Só não consegui entender ainda o que pode ser, entenderei em breve, estou certa disso? — Serena era sensitiva, não somente por ser curandeira, ela era muito especial.
— Posso começar lhe contando o que aconteceu e sobre o que estou sentindo. Sei que entenderás melhor do que eu e poderá ajudar-me.
— Pois então, conte-me logo e lhe ajudarei no que for possível! — sorrimos de mãos dadas e foi assim que comecei a relatar todos os acontecimentos do dia.
Estava ali, com minha melhor amiga, que era como uma irmã para mim. Sabia que naquele momento ela seria a única que poderia me entender de verdade, até mais do que eu mesma.
Aron foi recebido por todos com muita alegria, seus pais, Serafim e Amélie, estavam ansiosos com a sua chegada, contudo, não sabiam ao certo quando isso aconteceria.
Fiquei sabendo depois que planejaram uma grande festa em comemoração ao seu retorno para a noite seguinte, devido a longa viagem e ao acidente, seria melhor todos descansarem naquela noite.
O dia tinha sido uma surpresa com o prenúncio de que muitas novidades ainda estavam por vir.
— Vossa Majestade Rainha Vitória Malena Forense Trineth, aceita o Senhor Gerald Lowell, Marquês de Burlet, como seu legítimo esposo? — Aceito! — estava segura de minha decisão. — Senhor Gerald Lowell, Marquês de Burlet, aceita Vossa Majestade Rainha Vitória Malena Forense Trineth, como sua legítima esposa? — Sim, aceito! — Gerald sorriu para mim em cumplicidade. O atual Bispo do reino Dom Charles, nos abençoava em uma bela cerimônia e comemoração que foi festejada durante dois dias. Gerald, agora meu esposo, havia me conquistado com sua gentileza e cuidado. Sempre muito carinhoso e atencioso, demonstrava desde que nos conhecemos o interesse por cortejar-me, e numa certa manhã, após um passeio em sua companhia, confidenciei aos meus pais que apreciava estar com ele e que o achava muito charmoso. Isso foi o suficiente para que meus pais, Anthony e Felícia, passassem a planejar uma futura união, que foi de absoluto interesse de Gerald e de sua família também. Após vários encontros
— Que indelicadeza a minha, nem lhe perguntei se estás melhor. Espero que estejas bem. Como se sente após o acidente com o cavalo? — Obrigada! Estou somente um pouco dolorida. Serena examinou-me, fez os curativos necessários e me medicou, preciso apenas repousar um pouco. — Não queria que meu esposo percebesse em meu semblante que algo havia mudado e o quanto estava transtornada com aquela mudança.— Fico mais tranquilo, minha querida. Deixarei então que repouse para que se sinta melhor ao amanhecer, afinal, teremos um grande baile amanhã em comemoração à chegada de vosso primo. — Ele parecia não perceber o que eu tentava esconder, se percebia disfarçava muito bem.— Grata, meu querido. Amanhã estarei melhor e renovada para a festa! — Ficarei em meus aposentos essa noite, sozinha será mais fácil você descansar. Bom repouso, minha Rainha — beijando-me a testa Gerald saiu de meus aposentos, me deixando com meus mais novos e confusos sentimentos. Tínhamos dois aposentos para que houves
— Agradeço, Gerald. Desejo que meu retorno seja mesmo apreciado por todos, e no que puder contribuir ao reino e ao vosso reinado, cara prima, será uma grande honra. — Tentava me manter firme, no entanto, por dentro, queimava de angústia sempre que aqueles profundos olhos negros me fitavam. Toda aquela cortesia entre os dois me incomodava. Não eram certos aqueles pensamentos, e se não fossem por eles, com certeza não estaria me sentindo daquela forma, era mesmo a culpa que me consumia. Meu marido Gerald sempre foi gentil e educado com todos, inclusive comigo. Isso sempre me agradou muito, desde que nos conhecemos, apreciava sua beleza e elegância, além de seus galanteios encantadores. Tudo estava perfeito até o retorno de meu primo. Até surgirem aqueles pensamentos impróprios, aquele calor, aquele formigamento que sentia por todo o meu corpo. Acreditei a princípio que fossem apenas coisas da minha imaginação, mas ali, naquele momento sentada ao seu lado, estava claro que era real, e
Era só ele se aproximar que todo aquele fogo retornava. Aron, que parecia perceber o quanto ficava diferente toda vez que nos aproximávamos, enlaçou minha cintura com muita delicadeza e passou a conduzir-me pelo salão, tentando fazer com que me acalmasse, porém, todo o seu esforço era em vão, qualquer atitude dele só fazia aumentar as minhas perturbações.— Sou muito grato por receber-me tão bem e com uma festa. Não sabia como seria meu retorno e como me receberiam. Pelas cartas de meus pais imaginava que seria bem recebido, mas foram muitos anos longe e temia de certa forma esse retorno. Era muito menino quando fui embora acompanhado de meu tutor para estudar, então sabia que muita coisa havia mudado por aqui, inclusive sobre a vossa coroação e casamento.— Fiquei ciente de tudo o que acontecia com vossa pessoa, seus pais sempre me contavam, e é claro que também aguardava o seu retorno, porém, ele me surpreendeu. Não imaginava que seria agora e não dessa forma.— De qual forma minha
As semanas após o retorno de Aron transcorreram rapidamente, com todos os compromissos e assuntos importantes para lidar, contudo, agora havia uma nova direção para a qual meus olhos teimavam em olhar, meus pensamentos tinham novos horizontes e meu coração um novo dono. Sabia que devia preocupar-me com a forma como as coisas haviam mudado em minha vida nos últimos dias, só não sabia como reagir a tudo e manter-me firme, com os pés no chão e não nas nuvens, como parecia estar desde o momento em que acordava até quando me deitava para repousar. Até meus sonhos eram diferentes, com pitadas de um desejo ardente, que na maioria das vezes se transformava em pesadelo com a presença de meu esposo. Nem mesmo em meus sonhos aquele sentimento parecia certo, e realmente não era. Gerald não notava a minha indiferença, e quando me procurava no calor da noite, fingia estar indisposta. Não conseguia mais entregar-me ao meu próprio esposo e sabia que aquela situação não poderia durar muito tempo, l
Amar alguém sempre nos fará bem! Pensava nisso durante meu desjejum naquela manhã em que despertei muito cedo e não consegui dormir mais. Não fui capaz de aquietar meus pensamentos e desejos. Acordei sobressaltada após um belo sonho, algo me incomodava e sabia muito bem o que era. Todos chegavam devagar para se alimentar junto de sua Rainha. Aron, veio de braços dados com sua mãe Amélie, que não se cansava de conversar com ele, para colocar em dia todo o tempo que perderam enquanto ficaram separados. Sentaram-se à minha frente e, como em todos os dias após a sua chegada, o meu coração descompassado parecia que saltaria pela boca e me denunciaria sobre todos os meus sentimentos. — Um ótimo dia, minha cara prima. Passou bem a sua noite? — Aron parecia saber o quanto os meus sonhos haviam me perturbado, na verdade somente eu sabia, no entanto, a sensação que tinha era de que todos conheciam meus sonhos, ou melhor dizendo, pesadelos. — Sim! Muito bem, e vocês? — as palavras saíram sem
A mesa estava repleta de pães, doces, chás e muitas frutas. Ele ajudou-me a sentar e postou-se à minha frente, na decoração da mesa havia um exemplar belíssimo da flor de lótus, sorri ao vê-la, sempre me encantava com sua beleza. As criadas nos serviram e agradecendo, pedi para que saíssem. — Melhor assim, podemos nos servir sozinhos. Às vezes, fico sufocada com tanto cuidado. Obrigada pela flor, é a minha favorita, lembra que gostava dela desde menina? — Foi um prazer lhe fazer esse agrado e retribuir toda a acolhida. Me lembro sim, quando brincávamos pelo bosque, junto de Serena. — Ele sorriu, me deixando sem reação. — Quanto aos serviçais, imaginei que já estaria acostumada com tantos cuidados, afinal viveu assim a vida toda. — Sim, Aron, porém agora é diferente! Após minha coroação e meu casamento, esses cuidados se intensificaram, e os momentos sozinha são muito raros. — Não consegui conter o desabafo. — Deves ter vontade de fazer algo diferente em alguns momentos do dia. Se
— Oh! Muito obrigada, primo! Surpreendi-me ao lhe encontrar também, confesso que a princípio achei algo familiar em você, no entanto, só compreendi quem era quando chegamos no castelo. — Percebi naquele momento a sua confusão e me diverti um pouco com isso. — Ele sorriu divertido e à vontade com o nosso encontro e nossa conversa, que estava se tornando cada vez mais agradável. — É mesmo? Divertiu-se a minha custa? Que audácia! — tentava levar a conversa para um tom de divertimento, com o propósito de quebrar qualquer situação constrangedora entre nós dois. Deveria resistir com todas as minhas forças àquele encanto que me prendia, em respeito ao meu casamento. — Não me entenda mal, Malena, diverti-me apenas com a situação! — meu Deus, ele chamou-me de Malena… só ele me chamava assim quando éramos crianças, dizia que era o nome mais belo do mundo. — Só você me chamava apenas de Malena, lembra? — não resisti em comentar e demonstrar a ele o quanto me alegrava com aquilo. — Se não f