Era só ele se aproximar que todo aquele fogo retornava. Aron, que parecia perceber o quanto ficava diferente toda vez que nos aproximávamos, enlaçou minha cintura com muita delicadeza e passou a conduzir-me pelo salão, tentando fazer com que me acalmasse, porém, todo o seu esforço era em vão, qualquer atitude dele só fazia aumentar as minhas perturbações.
— Sou muito grato por receber-me tão bem e com uma festa. Não sabia como seria meu retorno e como me receberiam. Pelas cartas de meus pais imaginava que seria bem recebido, mas foram muitos anos longe e temia de certa forma esse retorno. Era muito menino quando fui embora acompanhado de meu tutor para estudar, então sabia que muita coisa havia mudado por aqui, inclusive sobre a vossa coroação e casamento.
— Fiquei ciente de tudo o que acontecia com vossa pessoa, seus pais sempre me contavam, e é claro que também aguardava o seu retorno, porém, ele me surpreendeu. Não imaginava que seria agora e não dessa forma.
— De qual forma minha prima se refere? A quantidade de tempo que passou, e por todos imaginarem que não voltaria mais, ou pelo nosso desastroso encontro no campo? — sorriu ao perceber que eu parecia mais descontraída e sorria também, mais leve do que quando começamos a dança.
— As duas formas, com certeza. — Ambos rimos, recordando daquele momento no bosque, contudo, o riso logo transformou-se e nossos olhares fixaram-se um no outro, fazendo parecer que ele podia, de alguma forma, ler os meus mais profundos pensamentos. Se realmente pudesse ficaria surpreso, com toda a certeza desse mundo, a não ser que fossem os dele também.
Foi ali que tive a certeza de que Aron mexia comigo de uma forma que jamais imaginei. Não parecia ser somente o amor entre primos que nasceram e conviveram por algum tempo, era um sentimento maior e mais forte do que havia sentido em toda a minha vida, e percebi que estava enganada quando acreditei que amava Gerald e que ele seria o meu amor para sempre.
— Vossa Majestade está ciente sobre os planos de nossos pais para mim, quanto ao trabalho a ser feito aqui no reino?
— Eles me confidenciaram em uma de nossas reuniões sobre o seu retorno e fiquei feliz por saber que voltaria para trabalhar conosco.
— Voltei sim! Para ficar e trabalhar no reino. É do vosso agrado? Ficarei muito feliz se assim for!
— Claro que sim! Será uma honra tê-lo ao meu lado no conselho me ajudando a reinar. Após a unificação dos reinos, temos trabalhado muito mais.
— Entendo e agradeço a confiança e por me aceitar de volta. Perdoe-me, esse não é o melhor momento para conversarmos sobre isso.
— Estás certo! Deixemos esses assuntos para um novo dia, hoje devemos apenas comemorar o vosso retorno.
— Sim, e devemos comemorar também o seu reinado e o fato de como aquela prima tão pequenina se tornou essa bela e estonteante Rainha. — O chão, que havia voltado aos meus pés, sumiu novamente com aqueles galanteios vindos de Aron, me fazendo corar.
Por dentro, meu coração acelerava e sentia meu peito subindo e descendo em um ritmo desenfreado, passei a não conseguir mais controlar-me e desviei daquele negro olhar que me possuía por inteira.
Terminamos a dança, sentindo um pouco mais o calor de suas mãos e desejando que aquele momento jamais acabasse.
Nos despedimos com reverências e voltamos aos nossos lugares. A festa terminou e em nenhum outro instante que nossos olhares se cruzaram foi diferente. Havia uma cumplicidade, um desejo, um diálogo em cada olhar.
Havia a necessidade de nos comunicarmos e de estarmos perto, um observando o outro. Aquilo parecia impróprio, e ao mesmo tempo, a coisa mais certa desse mundo.
As semanas após o retorno de Aron transcorreram rapidamente, com todos os compromissos e assuntos importantes para lidar, contudo, agora havia uma nova direção para a qual meus olhos teimavam em olhar, meus pensamentos tinham novos horizontes e meu coração um novo dono. Sabia que devia preocupar-me com a forma como as coisas haviam mudado em minha vida nos últimos dias, só não sabia como reagir a tudo e manter-me firme, com os pés no chão e não nas nuvens, como parecia estar desde o momento em que acordava até quando me deitava para repousar. Até meus sonhos eram diferentes, com pitadas de um desejo ardente, que na maioria das vezes se transformava em pesadelo com a presença de meu esposo. Nem mesmo em meus sonhos aquele sentimento parecia certo, e realmente não era. Gerald não notava a minha indiferença, e quando me procurava no calor da noite, fingia estar indisposta. Não conseguia mais entregar-me ao meu próprio esposo e sabia que aquela situação não poderia durar muito tempo, l
Amar alguém sempre nos fará bem! Pensava nisso durante meu desjejum naquela manhã em que despertei muito cedo e não consegui dormir mais. Não fui capaz de aquietar meus pensamentos e desejos. Acordei sobressaltada após um belo sonho, algo me incomodava e sabia muito bem o que era. Todos chegavam devagar para se alimentar junto de sua Rainha. Aron, veio de braços dados com sua mãe Amélie, que não se cansava de conversar com ele, para colocar em dia todo o tempo que perderam enquanto ficaram separados. Sentaram-se à minha frente e, como em todos os dias após a sua chegada, o meu coração descompassado parecia que saltaria pela boca e me denunciaria sobre todos os meus sentimentos. — Um ótimo dia, minha cara prima. Passou bem a sua noite? — Aron parecia saber o quanto os meus sonhos haviam me perturbado, na verdade somente eu sabia, no entanto, a sensação que tinha era de que todos conheciam meus sonhos, ou melhor dizendo, pesadelos. — Sim! Muito bem, e vocês? — as palavras saíram sem
A mesa estava repleta de pães, doces, chás e muitas frutas. Ele ajudou-me a sentar e postou-se à minha frente, na decoração da mesa havia um exemplar belíssimo da flor de lótus, sorri ao vê-la, sempre me encantava com sua beleza. As criadas nos serviram e agradecendo, pedi para que saíssem. — Melhor assim, podemos nos servir sozinhos. Às vezes, fico sufocada com tanto cuidado. Obrigada pela flor, é a minha favorita, lembra que gostava dela desde menina? — Foi um prazer lhe fazer esse agrado e retribuir toda a acolhida. Me lembro sim, quando brincávamos pelo bosque, junto de Serena. — Ele sorriu, me deixando sem reação. — Quanto aos serviçais, imaginei que já estaria acostumada com tantos cuidados, afinal viveu assim a vida toda. — Sim, Aron, porém agora é diferente! Após minha coroação e meu casamento, esses cuidados se intensificaram, e os momentos sozinha são muito raros. — Não consegui conter o desabafo. — Deves ter vontade de fazer algo diferente em alguns momentos do dia. Se
— Oh! Muito obrigada, primo! Surpreendi-me ao lhe encontrar também, confesso que a princípio achei algo familiar em você, no entanto, só compreendi quem era quando chegamos no castelo. — Percebi naquele momento a sua confusão e me diverti um pouco com isso. — Ele sorriu divertido e à vontade com o nosso encontro e nossa conversa, que estava se tornando cada vez mais agradável. — É mesmo? Divertiu-se a minha custa? Que audácia! — tentava levar a conversa para um tom de divertimento, com o propósito de quebrar qualquer situação constrangedora entre nós dois. Deveria resistir com todas as minhas forças àquele encanto que me prendia, em respeito ao meu casamento. — Não me entenda mal, Malena, diverti-me apenas com a situação! — meu Deus, ele chamou-me de Malena… só ele me chamava assim quando éramos crianças, dizia que era o nome mais belo do mundo. — Só você me chamava apenas de Malena, lembra? — não resisti em comentar e demonstrar a ele o quanto me alegrava com aquilo. — Se não f
— Malena, ele está chamando você de Malena, filha? — minha mãe andava pelos meus aposentos, de um lado para o outro e falava sem parar para respirar, e essa foi a pergunta que desencadeou a sua revolta. — Minha mãe, ele me chamava assim quando éramos crianças! Lembra como isso era natural entre nós, não sei porque ficou tão surpresa! — na verdade sabia, no entanto não tinha certeza se era possível confessar isso a ela, que parecia já estar enlouquecendo com a possibilidade. — Vocês não são mais crianças, são adultos agora e você é uma Rainha comprometida com seu reino e com a honra de sua família, principalmente de seu esposo, jamais se esqueça disso! Imagina se Gerald o vê chamando-a assim, com tanta intimidade, o que pensará? — era a primeira vez que via minha mãe descontrolada daquela maneira. — Acalme-se, minha mãe. Estás preocupada sem razão. Nós somos primos e convivemos na infância, não há nada demais em convivermos agora. — Tentava enganar a ela e a mim mesma, sem muito suc
— Você terá que ser muito firme, Vitória. Deverá vencer, um dia de cada vez, todas as tentações que estão por vir. Eu vi o brilho nos olhos dele e tenho certeza que o seu sentimento é recíproco, o que piora muito a situação. Se ele não sentisse o mesmo, seria bem mais fácil. — A senhora acha que ele também se apaixonou por mim? — apesar de desconfiar disso, ouvir outra pessoa afirmando que percebeu o mesmo que eu, me dava uma certeza que poderia ser maravilhosa, porém devido às circunstâncias era cruel e me derrubava ainda mais. — Estou certa disso! Você também já percebeu, e sendo assim, a melhor solução é manter-se afastada. Vê-lo somente durante o trabalho e evitar outros encontros, principalmente a sós, como aconteceu hoje no jardim. — O olhar de minha mãe era de reprovação. — Não tive escolha, quando percebi, a Tia Amélie já tinha arrumado tudo. Ao contrário da senhora, ela não percebeu o que está acontecendo e quer nos ver juntos, retomando a amizade do passado. — Se ela ti
Quando convivemos com pessoas desde a infância, mantemos uma relação natural de amizade, e assim aconteceu comigo e Serena. Éramos pequenas, com mais ou menos quatro anos, quando nos conhecemos. Ela foi trazida ao reino por sua mãe Constance, que teve um relacionamento com Abdus, curandeiro do castelo que sumiu em uma noite e nunca mais retornou. Até hoje sua história de vida e a forma como desapareceu é um grande mistério. A Rainha Malena, na época, pediu a meu pai que o procurasse e assim ele o fez, porém, a procura foi inútil e nunca encontraram nenhum rastro do que poderia ter lhe acontecido. Quando elas chegaram ao castelo, Abdus as recebeu de braços abertos, era evidente a sua paixão por Constance, que até então fugia de seus sentimentos por ele, devido à negação de sua família em admitir que ela se envolvesse com um “bruxo”. Malena conheceu Constance e Serena, demonstrando muito carinho pelas duas, e todos as acolheram em respeito ao grande homem e amigo que Abdus sempre f
— Vitória, entendo perfeitamente o que a perturba… a infidelidade! Você já se sente infiel, somente com seus pensamentos, minha amiga. — É assim que me sinto e não sei mais o que fazer para anular esse sentimento de meu coração e fazer tudo voltar ao normal. — Sinto muito em lhe alertar para o fato de que você não conseguirá mais voltar ao normal, nada mais será como antes. Sua vida mudou e você deve se preparar para o que está por vir — fiquei surpresa com aquela afirmação, que na verdade já esperava, contudo ouvi-la tão claramente de minha amiga e ter aquela certeza, fez-me temer o futuro de uma forma que nunca havia acontecido antes. — Imagino que você já deve ter tido alguma visão, algum presságio do que irá me acontecer? — ela virou-se de costas para mim, e quando retornou segurava um ramo de flores amarelas. — Sinto muito, mas as previsões não são boas. Se quiseres ouvir, posso contar-lhe, porém acredito ser melhor preparar o seu ânimo. O aroma dessas flores irá lhe trazer u