Tristan
Quando se passa a viver dentro de um inferno o seu fogo já não surte o mesmo efeito da dor que se carrega dentro do peito. Portanto, sorrir é algo que já não consegue se fazer e o amor… esse apodreceu em algum lugar dentro do coração. Você não vive realmente, apenas existe. Mas tem um lado bom nisso tudo. A fraqueza jamais te alcançará.
Meu nome é Tristan Tybalt, eu sou o Alfa de uma alcateia temida que vive no sul da Inglaterra. Mas para chegar até aqui perdi a pessoa mais valiosa da minha vida. A companheira com quem planejei um futuro sólido, com filhos e muito amor. Desde então, passo a maior parte do meu tempo no meu império instalado em uma cidade entre os humanos. E só regresso para a Maldagam, uma floresta negra onde habitamos desde sempre em casos extremos como o dessa noite.
— Alfa!
Um lupino fala abaixando os seus olhos em sinal de respeito a minha autoridade, e aproxima-se para me receber. Contudo, não esboço qualquer reação ao seu gesto. Apenas o olho firme de onde estou.
— Onde ele está? — inquiro com um tom áspero e frio até, entregando-lhe o meu sobretudo negro, e o meu chapéu para adentrar uma vila simples no meio da floresta. Um lugar construído por nossos ancestrais, protegido pelos espíritos da floresta, além de sentinelas fortes o suficiente para garantir a segurança do meu povo.
A minha presença aqui pode trazer esperança, mas também desespero para alguns membros da alcateia. Isso depende muito dos acontecimentos. Contudo, especialmente essa noite não trago paz para nenhum deles. Bem no meio do terreno onde alguns rituais acontecem está Lachlan, um Beta que deveria manter a ordem desse lugar na minha ausência. No entanto, uma atitude sua poderá trazer uma guerra sangrenta para o nosso vilarejo e ele deverá receber uma severa punição por isso.
— Alfa, por favor tenha misericórdia dele!
Lorena, sua irmã caçula intercede. No entanto, ela conhece bem as nossas regras e sabe que eu não devo protegê-lo. Mesmo sabendo que Lachlan é o meu amigo de infância. Mesmo tendo um vínculo inesquecível com ele, é meu dever impor a regras desse lugar ou tudo estará perdido.
— Leve-o para o meu escritório! — ordeno, ignorando a súplica da jovem loba e caminho com passos firmes para a maior casa desse lugar.
Ao entrar aqui, sinto o impacto das lembranças dolorosas que esse lugar me traz. Os seus gritos, o chão vermelho banhado com o seu sangue, a nuvem negra que logo me cobriu, trazendo um inverno obscuro e permanente para a minha vida. Fecho as mãos em punho e me forço a ir para uma cadeira, que fica bem no centro da enorme sala iluminada algumas por luzes amarelas, dando ao ambiente o poderio que agora percorre a minha corrente sanguínea. Não demora para Lachlan ser arrastado para o centro da minha sala e logo ele é forçado a se ajoelhar diante de mim. Encaro um par de olhos amarelos determinados por míseros segundos em silêncio.
Ele sabe que esse será o seu fim.
— Diga-me, Lachlan, por quê? — pergunto baixo, porém, com autoridade e sem retirar o meu olhar de juiz de cima dele.
— Eles mereceram. Eles destruíram a minha família…
— Eu pedi que não fizesse nada! — Um tom gélido sai da minha boca. — Era uma ordem e você deveria ter executado como tal.
— Alfa, eu sei que não deveria. Mas eu não consegui me conter. Ela era só uma criança…
— E quantas crianças você matou essa noite por conta de uma vida? — rujo, o interrompendo.
Lachlan balbucia.
— Me diga, algumas daquelas mortes trouxe a sua irmã de volta?
O observo trincar o maxilar.
— Quando eles mataram a Kyran, você…
— NÃO OUSE TOCAR NO NOME DA MINHA ESPOSA! — brado, o fazendo engolir as suas palavras. — Você massacrou um povo inteiro por causa de uma única vida, Lachlan. E deverá ser punido por isso.
O Beta abaixa a sua cabeça. Ele sabe que errou e dignamente ele assente, aceitando a sua punição.
— Lachlan Ryder, você será sentenciado a deixar dessa alcateia. Viverá sobre a sombra do esquecimento e será odiado entre os povos, exilado de Maldagan e de suas proximidades. — Determino a sua sentença, sentindo um aperto no meu coração. Contudo, mantenho-me firme, enquanto observo a sua cabeça se abaixar em vergonha e os seus ombros caírem sem qualquer reação.
Para um lobo, o exilio é como a sua própria morte. Dificilmente Lachlan sobreviverá lá fora sem um grupo para protegê-lo.
Forço-me a continuar.
— Seu nome será mencionado como um traidor e assassino pelas gerações. E você será a vergonha dessa alcateia. — Encerro a sua sentença e com um gesto de cabeça, ele é arrastado para fora da sala.
Desde que Kyran fora arrancada de mim, jurei para mim mesmo que traria a paz para o povo de Maldagan e para as cidades próximas a ela. E pela primeira vez sinto que falhei com a minha promessa. Isso me rasga outra vez por dentro e torna o meu inferno ainda mais rigoroso, queimando as minhas entranhas sem qualquer piedade.
— Alfa, precisa de algo? — desperto quando um Lupino fala e me dou conta de que todas já se foram.
— Eu preciso de um banho e de uma bebida forte — respondo com secura na voz e subo as escadas para ir direto para o meu quarto. Um cômodo igualmente frio e silencioso, mas que reflete os risos e sussurros que ela espelhou por esse lugar. As lembranças de momentos felizes, os gracejos e carinhos. Sinto que irei desmoronar a qualquer momento.
Respiro fundo.
Um banho quente e demorado deve acalmar essa tempestade que destrói tudo dentro de mim. Penso, livrando-me das minhas roupas e minutos depois, estou debaixo de um chuveiro que se assemelha a uma cascata. E a água logo começa a aquecer o meu corpo. Mas não por dentro, porque nada é capaz de aplacar esse gelo que habita dentro de mim.
TristanAlgumas horas depois...— Tristan? — Atlas, um dos ômegas mais próximos a mim fala assim que adentra a sala, onde uma mesa farta de café da manhã está exposta. — A quanto tempo, meu amigo? — Ele cantarola com ínfimo prazer, porém, apenas aponto uma cadeira para ele do outro lado da mesa.— O que o traz aqui tão cedo, Atlas? — inquiro, servindo-me uma xícara de café e ele faz o mesmo em seguida.— Eu preciso de um favor, Alfa. — Arqueio as sobrancelhas e aguardo que ele continue. — É sobre o ataque em Maldócia… — fala, referindo-se ao massacre na vila dos feiticeiros.— O que tem Maldócia?— É que, temos uma sobrevivente. — Confesso que essa informação me pegou de surpresa.— E?— Se você pudesse levá-la para a cidade consigo…— Fora de cogitação. — O corto determinado.— Alfa, se o Senhor pudesse protegê-la. — Ele insiste.— E por que eu faria isso? — ralho com desdém.— Hazel não tem mais ninguém, Alfa. Todos que ela amava e confiava morreram. E se ela ficar aqui, com certeza
Hazel— Logo dias negros estarão por vir, criança. — A voz envelhecida de minha avó preenche repentinamente a sala de estar, onde as minhas irmãs discutem animadas sobre o que vestir para as festividades da colheita.Uma noite muito divertida nos aguarda, mas Magdalena Mor está falando sobre escuridão, enquanto fita a noite que começa a cair, através de uma janela retangular de vidros transparentes. Devo dizer que é um contraste muito grande diante da alegria dos moradores de Maldócia, ma pequena cidade que fica ao sul da floresta mais tenebrosa da Inglaterra. Contudo, nunca tivemos problemas com os moradores de lá e esse é mais um motivo para não compreender a visão de uma senhora de cabelos grisalhos no canto da sala.— Uma nuvem negra ameaça a existência dos moradores de Maldócia. — Ela continua.— Vovó, por que não se senta um pouco? — peço, tocando com carinho nos seus ombros, para guiá-la até uma cadeira confortável. Entretanto, ao me afastar dela, sinto o leve aperto dos seus d
HazelOfegante, fito a porta do quarto e corro para fechá-la com chave. Respiro fundo algumas vezes e olho para as paredes de vidro, me perguntando se realmente estou segura nessa casa. Outro grito ecoa e esse parecia refletir uma grande dor. E curiosa, giro a chave lentamente na fechadura, abrindo apenas uma brecha da porta, para bisbilhotar o corredor vazio.— NÃO! — Outro grito surge na porta em frente a minha e me pergunto se devia ir até lá ajudá-lo.Céus, você está na casa dele, Hazel. Ajudá-lo é o mínimo que deveria fazer agora. Minha consciência aconselha-me e trêmula, respiro fundo, saindo do quarto com cautela para ir até a porta do quarto da frente.— Se… Senhor… Tristan? — gaguejo ao chamá-lo.Sim, estou muito nervosa. A verdade, é que Atlas, o lobo que me resgatou falou-me um pouco sobre esse homem. Ele é um Alfa poderoso. É temido por todos, é rígido e intolerante em suas decisões.“Não o olhe nos olhos”. Ele disse. “E não diga nada, deixe que eu mesmo falo com ele”.E a
TristanEnquanto ofego violentamente, observo a maldita feiticeira sair do meu quarto. E só após ela fechar a porta do cômodo, aproximo-me mais da janela para respirar o ar frio da noite, em uma tentativa frustrante de me acalmar. As lembranças dolorosas do maldito sonho voltam a preencher a minha cabeça, e elas me atormentam como faz todas as noites desde que tudo aconteceu.Ainda consigo ouvir os sons dos seus gritos de desespero chamando o meu nome, como a porra de um filme de terror. A minha respiração pesa dentro do meu peito igualmente aquela noite, comprimindo os meus pulmões tão rudemente, que chega a me impedir respirar. Portanto, luto em busca de ar, mas ele se recusa a encher os meus pulmões.Lembro-me que à medida que eu corria em seu socorro, sentia o desespero preencher a minha alma e rasgá-la como se fosse um simples pedaço de papel. Eu jurei protegê-la de tudo e todos, mas cheguei tarde demais. E ao entrar dentro da sala de nossa casa, vi o meu mundo tão mágico e cheio
Tristan— Bom dia, Alfa! — Latifa diz assim que adentro a sala, porém, encontro uma mesa farta como pedi, mas todas as cadeiras estão vazias.— Onde ela está? — pergunto tão friamente, acomodando-me em uma cadeira. Entretanto, a jovem sequer chega a me responder, pois logo Hazel adentra o cômodo, trazendo uma bandeja pesada nas suas mãos.Franzo o cenho, encarando-a com dureza.— O que pensa está fazendo? — Praticamente rujo para a garota, que estanca diante da mesa.— Não é óbvio, Alfa? — Ela responde atrevida, fazendo o meu sangue ferver. — Eu estou servindo a mesa.Seguro mais um rugido.— Quero que largue isso agora, Hazel! — rosno. Entretanto, a feiticeira me lança um olhar petulante, soltando uma respiração consternada.— Escute, eu lhe sou muito grata por me aceitar aqui na sua casa e por me proteger também. Agradeço por me dar um lugar confortável e quente para dormir, mas não estou acostumada a receber algo sem dar algo nada em troca.— Nesse caso, não seria lhe dado, Hazel e
HazelNão importa o quanto eu corra, a sua presença maligna não para de me acompanhar e os meus esforços jamais me salvarão da sua ira ferina. A mata escura e densa não me ajuda muito. Socorro! Tenho vontade de gritar, mas eu sei que o meu grito atrairá aquele a quem estou lutando com todas as minhas forças para escapar. Ele consegue sentir o meu cheiro e pior, consegue ouvir os meus sons, principalmente os sons da minha respiração. Não importa quão escondida eu esteja. Eu sei que ele me encontrará e que logo encontrarei o meu fim.Extremamente ofegante, paro a beira de um precipício e o desespero que me preenche parece partir a minha alma ao meio.Cautelosa, me viro para o encarar o meu fim. Ele tem um par de olhos vermelhos em cólera e as suas presas que me avisam claramente que eu não escaparei do seu ataque. A fera sabe que não tenho uma saída. Portanto, os seus paços de caçador são lentos e intimidantes, enquanto avalia a sua vítima. E com um salto o lobo parece se agigantar sob
HazelNa manhã seguinte…— Não importa, Atlas! Eu quero que investigue mais a fundo! — Escuto Tristan gritar ao telefone, enquanto os seus passos pesados ecoam pelo piso do corredor, me avisando que logo ele entrará no meu campo de visão. — Eu preciso ter certeza da verdade. Só então tomarei uma decisão.Ele adentra o cômodo e os nossos olhos se encontram. Contudo, abaixo imediatamente o meu olhar e fito o meu prato, onde tem uma fatia de bolo que ainda não toquei.— Tudo bem! Assim que tiver algo quero que me avise, não importa a hora. — Ele encerra a ligação e se acomoda a mesa. No entanto, ao segurar o talher, percebo um arranhão na sua pele e me pergunto como o conseguiu? — Preciso que fique dentro de casa hoje, Hazel. — Tristan avisa de repente, me fazendo erguer os meus olhos.— Por quê?— Porque eu estou dizendo que você não pode sair! — ruge e eu sei que ele quer me causar medo. Mas a verdade, é que essa sua atitude grosseira e feroz está me deixando com raiva.— Então agora e
TristanA cerca de um ano e meio quando perdi a minha companheira e consequentemente assumi a posição de líder da alcateia, perdi também a minha paz e a minha vontade de viver só preexistiu após assumir os cuidados com o meu povo. Mas foi aqui no meio dos humanos que encontrei um sentido para viver. Foi exatamente aqui que construí o meu império. Mas tudo isso tinha uma finalidade, encontrar alguém que eu nunca vi na minha frente, que se quer sei os detalhes da sua fisionomia, a fim de fazer-se cumprir uma profecia de décadas.Uma Santa. A quanto tempo não ouço falar sobre uma? A verdade, é que eu sinto que os deuses nos abandonaram nesse mundo e desde então, estamos matando nos aos outros. Desperto dos meus pensamentos quando o telefone começa a tocar em cima da minha mesa.— Senhor Tybalt? — Anabela, minha assistente humana diz assim que a atendo. — O Senhor Weylin deseja vê-lo.— Tudo bem, Bella. Deixe-o entrar.— Sim, Senhor!— E Bella, não quero ser importunado por ninguém.— É