02 – A FUGITIVA

POV: YULLI

Com dedos trêmulos, disquei seu número uma última vez. Meu corpo doía, não apenas pelos ferimentos, mas por todo peso das decisões que me trouxeram até aqui, aos portões ancestrais do clã das bruxas.

— Alô? — Sua voz grave e familiar fez meu coração apertar.

— Me perdoe, pulguento... — sussurrei direta, enquanto o vento gélido cortava minha pele. Uma lágrima teimosa escorria por meu rosto, mordi os lábios, tentando conter um soluço. — Não consegui ficar fora de confusão.

— Yulli? Onde você está? — A preocupação em seu rosnado me fez quase desistir de tudo.

— Preciso que pare de me procurar, vira-lata. — Endureci minha voz, mesmo que por dentro estivesse despedaçada. Ergui o queixo, como se ele pudesse me ver. — Siga com sua vida, encontre uma Luna e seja feliz. Não venha mais atrás de mim!

Desliguei antes que sua voz pudesse me fazer mudar de ideia. O celular encontrou seu fim sob meus pés, cada pedaço quebrado simbolizando o fim desta história. Com passos pesados, entrei na cidade chamada Fenda. Meus dedos percorreram as antigas gravuras na grande pedra ornamental contando o início da nossa história, uma história que agora também carregaria minha marca:

“Um romance proibido selou nosso destino: o amor impossível entre um poderoso rei Lycan e uma feiticeira lançou nossas espécies à beira da ruína, desencadeando uma maldição terrível sobre o nosso clã.

Desesperados por salvação, rituais eram realizados a cada década. Nas sombras da floresta, jovens feiticeiras poderosas eram sacrificadas aos Deuses, seus gritos ecoando enquanto os sacerdotes buscavam uma forma de nos libertar.

Resta apenas uma esperança: encontrar a chave de libertação para quebrar a maldição e salvar nosso povo da extinção.

Mas até que ela seja encontrada, o sangue continuará a ser derramado, e a linha entre salvação e destruição ficará cada vez mais tênue."

Atravessei o corredor do conselho com passos firmes, mesmo sentindo o peso dos olhares sobre mim. Os guardas, ao me reconhecerem, arregalaram os olhos em espanto, afinal, não era todo dia que uma traidora voltava por vontade própria. Parei diante deles e ergui meus braços em rendição.

— Anunciem ao feiticeiro supremo que Yulli Fireveil retornou — declarei com o queixo erguido e um olhar desafiador, completei: — A noiva traidora do clã das bruxas está pronta para seu julgamento e para enfrentar as consequências de seus atos!

Me vi ajoelhada em um chão frio e úmido, os ossos do meu corpo dolorido pelo despertar da marcar, sentia a raiz daquele maldito pacto absorvendo minhas forças vitais. Tentei me erguer, mas algo me puxou de volta impedindo, olhei ao redor, vendo correntes apertadas em torno dos meus pés e punhos, brilhando com uma energia que queimava minha pele e repelia qualquer tentativa de acessar o meu poder.

— Precisa mesmo de tudo isso? — Indaguei nervosa, sentindo seus olhos sobre mim, avaliando-me, ergui os punhos mostrando as algemas que marcavam minha pele, criando feridas profundas em minha carne.

— Sabemos que sim. — Drevan torceu o nariz com desgosto, parando diante de mim.

Com um movimento brusco, puxou a corrente que prendia meus pulsos, forçando meu corpo a contorcer-se, a inclinar-se em sua direção, até que nossos rostos estivessem a milímetros de distância. Seu olhar intenso cravado ao meu, cruel e dominador.

— Vim de bom grado, se fosse fugir não teria retornado, querido noivo. — Retruquei com sarcasmos gotejando raiva.

Drevan se agachou diante de mim, tão próximo que sua magia negra empesteava o ar. Seus dedos esguio e gélidos apertaram minhas bochechas, fazendo meus dentes rangerem de dor.

— Deveria se sentir honrada, minha adorável noiva... — sussurrou ele com perversidade. — Por ter o privilégio de ser escolhida por mim.

Seus olhos percorreram meus lábios com luxúria revoltando, a arrogância em sua voz causando-me náuseas.

— De todas as mulheres que já possuí — continuou ele, apertando ainda mais meu rosto — você foi a única que deixou uma marca. — Seu sorriso cruel despertou lembranças que me fizeram tremer. — Seus beijos permanecem em minha memória.

— Única que sobreviveu às suas atrocidades! — Gritei, arrancando meu rosto de suas mãos e cuspindo nele com todo o desprezo que sentia.

Drevan limpou o rosto devagar. Seus olhos negros faiscaram com uma fúria assassina enquanto seu sorriso se desfazia. O tapa veio violento, cortando o canto de minha boca. Antes que pudesse reagir, seus dedos envolveram meu pescoço, apertando, cravando na pele, roubando meu ar.

— Isso... termine logo com isso. — murmurei, sentindo a escuridão me envolver.

— Buscando a saída mais fácil? — sua gargalhada ecoou sinistra. — Não minha adorável Yulli, nós temos um casamento para firmar.

Com brutalidade, agarrou meus cabelos e puxou minha cabeça para trás, seus dedos se enroscando na base da minha nuca. Sem aviso, invadiu minha boca com sua língua asquerosa. O gosto amargo de sua presença queimava minha garganta, fazendo todo meu ser gritar em repulsa. Quando finalmente me libertou, jogou-me ao chão com violência.

Ofegante, tentei limpar a boca nos ombros, desesperada para apagar o rastro nojento de seus toques. Meus punhos se fecharam enquanto a fúria dentro de mim queimava cada vez mais intensa.

— Hora de oficializar nossa união! — anunciou ele, acenando para as empregadas. — Te vejo no altar, feiticeira.

Como uma boneca sem vida, fui entregue aos cuidados das criadas. Elas rasgaram minhas roupas com tesouras afiadas e limparam meus ferimentos sem gentileza, cada toque fazendo-me conter gemidos de dor. O vestido de noiva foi praticamente forçado em meu corpo, enquanto cobriam com maquiagem os hematomas, presentes do meu futuro marido. Finalizaram com um batom vermelho, cílios bem-marcados e um coque alto, deixando alguns fios dourados emoldurarem meu rosto.

Diante do espelho, não pude negar, estava linda. A maquiagem realçava o tom único de púrpura dos meus olhos. Em outro momento, se fosse com o lobo que verdadeiramente tinha meu coração este seria o dia mais feliz da minha vida. Mas as correntes em meus pulsos me lembravam da cruel realidade.

Os guardas me arrastaram sem cerimônia até o santuário sagrado, onde as sacerdotisas abençoavam as uniões dos feiticeiros. No altar, Drevan me aguardava em seu elegante terno preto, seus olhos negros brilhando com uma mistura de prazer e crueldade.

— Sorria, minha querida, hoje é o dia do seu casamento! — provocou ele, com um sorriso malicioso.

— A morte me parece mais convidativa — retruquei, recebendo seu olhar furioso em resposta.

A sacerdotisa começou o ritual, recitando as palavras de união até chegar ao momento decisivo:

— Enfim a profecia se cumprirá — declarou ela solenemente. — Se alguém tiver algo contra esta união, fale agora ou cale-se para sempre.

De repente, as portas do santuário explodiram em uma onda de poder primitivo. Um rosnado feroz ecoou pelas paredes, fazendo o ar vibrar e os presentes estremecerem. Por entre a poeira e destroços, surgiu ele, imponente em seu terno azul, cada passo seu uma declaração de domínio absoluto.

Keenan avançou com a elegância fatal de um predador alfa, mãos nos bolsos em uma falsa demonstração de casualidade. Seus olhos esverdeados cintilavam predatório, percorrendo o ambiente com uma intensidade. Um sorriso perigosamente sedutor brincava em seus lábios, uma aura de poder selvagem emanava de cada movimento seu.

— Eu tenho muitas objeções a este casamento — sua voz, rouca e profunda com um toque sedutor como pecado, reverberou pelo santuário. O chão tremeu sob seus pés, respondendo à sua presença dominante. Erguendo o olhar desafiador, suas pupilas dilataram fixas em sua presa. — Vocês têm algo que me pertence, e vim reivindicar o que é meu!

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