Uma criança
Uma pequena luz que ofusca o sol
Portadora do bem e do mal
Portadora de um amor imortal
Christopher Vilard
Meu telefone tocou. Quando vi o nome Lobo Intrometido na tela atendi rapidamente. Estava ansioso por notícias. Para quem não acreditava em profecias, esse assunto estava me afetando demais.
— O que tem para mim?
— Para ser honesto, nem sei o que dizer. É melhor que veja. Chego em trinta minutos no máximo.
— Ok.
Desligamos e passei os minutos prometidos andando de um lado a outro na sala. Os empregados passavam longe, nenhum deles teve coragem de falar qualquer coisa. Nem mesmo Agatha, que estava revoltada por ter uma mulher na minha vida. Ela escutou sobre a profecia e colocou na cabeça que eu a deixaria por outra mulher. O que é loucura? Já que não se perde o que nunca se teve, e ela nunca me teve.
Ela é minha fonte fixa de sangue, por isso a mantenho ao meu lado desde que foi transformada em uma loba. Uma bela morena de seios avantajados, cintura fina, penetrantes olhos castanhos e capaz de qualquer coisa por mim, na cama e fora dela.
A morena tenta me provocar de todas as formas. Tem esperança que eu a ame, como tantas outras também tem. Não as julgo. Como poderia? Sou o melhor entre os melhores.
Ouço o barulho do carro entrando e estacionando em frente a mansão. Só pode ser ele.
De repente, a porta abre e Allan entra com um embrulho nos braços. Era algo enrolado em uma manta cor de rosa. Algo com um choro estridente.
Uma suspeita me assolou ao ver o sorriso irônico brincando no rosto dele.
— Você só pode estar de brincadeira! — falei olhando o embrulho em seus braços. — Além de tudo que as pessoas dizem de mim, ainda quer que eu me torne um pedófilo?
— Relaxa, eu...
— Não vejo motivo para ficar calmo. Você me traz uma bendita escolhida que nem fala, porra! — o interrompi.
O sorriso virou uma risada nada discreta. O embrulho continuava chorando, me tirando do sério.
— Chame alguém para cuidar dela. Tenho muita coisa para te contar e ela deve estar com fome.
Nesse momento passava uma das empregadas mais velhas, que para ser sincero nem recordo o nome.
— Ei, você, venha aqui.
Ela veio e parou perto de nós.
— Pois não, Senhor Vilard?
— Leve essa criatura barulhenta e a faça parar de chorar.
— O nome dela é Alma Demise. — Allan se meteu. — Procure algo que possa alimentá-la. Faz quase doze horas que ela não come. Só consegui dar água no caminho.
Allan colocou o embrulho nos braços da mulher. Ela ia saindo, mas a impedi dizendo:
— Espere.
Sem dar satisfação, me aproximei e encarei o rosto do ser que chorava freneticamente. Os meus olhos foram guiados direto aos pequenos olhos verdes que me encaravam em um rosto angelical com poucos cabelos claros. Demorei para perceber que não havia mais barulho. Ela me encarava. E era a criatura mais perfeita que já vi. Me senti estranho. Como se eu estivesse congelado e alguém me jogasse um balde de água quente. Algo começou dentro de mim. Só não sei o que era.
— Leve-a! — me afastei quase bruscamente, mas logo tratei de recompor. Ninguém precisava saber o que nem eu entendia.
A mulher saiu tentando conversar com a criança, usando a linguagem ridícula que todo adulto idiota usa ao ver um bebê. E olhei para Allan.
— Explique-se — exigi.
Allan pegou uma garrafa de vodca e dois copos e praticamente se jogou no sofá.
— Vamos precisar de muita bebida, Drácula — disse e nos serviu.
— Você sabe que se alguém me chamar assim por sua causa, eu vou matar.... e essa morte será responsabilidade sua.
— Já parei! — bebeu um pouco e voltou ao assunto original. — Você já entendeu que aquela é a destinada, não adianta negar. Vi sua reação de agora. Então, vamos a história da minha aventura.
Cruzando as pernas e mantendo o olhar fixo na bebida, ele começou:
— Foi fácil encontrar o local e foi estranho não ter ninguém do Conselho lá. Era como se eles quisessem que nós a encontrássemos. Algo que vou deixar no meu radar. — Ele bebeu mais um pouco. — Quando a mulher abriu a porta e vi a imensa barriga foi outra surpresa. Ela mal me questionou quem eu era ou o que estava fazendo ali, foi logo entrando em trabalho de parto e eu trouxe Alma ao mundo — ele ri e coloca mais vodca no copo. — Aliás, quero ser padrinho.
— Por que a chamou de Alma Demise?
— Foi o nome que a mãe disse logo que a pegou no colo. Também foi a última coisa que ela disse. Morreu.
— E o pai?
— Não faço ideia, mas arrisco a dizer que era qualquer um. A mulher era cheia de tatuagens, morava em um apê vagabundo. Não querendo ser preconceituoso... — Ele dá de ombros. — Posso pesquisar, mas arrisco dizer que nem ela sabe quem era o pai.
— A criança tem a marca? — eu tinha tantas perguntas na cabeça que até esqueci da bebida em meu copo.
— Na verdade, não tinha. Mas algo surpreendente aconteceu quando chegou a meia noite e os seus mil anos. Eu estava tentando improvisar uma roupa e vi surgir o símbolo na pequena virilha da garotinha. O símbolo do Yin Yang está lá. Pode conferir. Não tenho dúvidas de que seja ela.
— E o que isso tudo significa? Eu vou sentir algo por ela quando se tornar uma mulher ou serei tentado por uma criança para aumentar ainda mais a minha lista de pecados hediondos? — sei que deixei transparecer desespero, mas nem tentei disfarçar.
— Esse foi o motivo que me fez atrasar; antes de vir passei na sede do Conselho. Queria saber o que eles sabiam.
— Aqueles miseráveis devem estar rindo de mim agora. Vou queimar aquela sede com todos dentro! — imaginar aqueles imbecis tento motivos para rir de mim me tirava do sério. Na minha cabeça a tal profecia, sendo real, me traria um amor carnal. E agora me aparece um bebê. Se eu me sentir atraído por um bebê juro que acabo com a minha existência medíocre, depois de matar cada um dos responsáveis dolorosamente.
— Se eu fosse você não faria isso, eles podem ser úteis, afinal foi graças a eles que soube que você só vai sentir qualquer atração física por ela depois que Alma fizer vinte e um anos.
— Como sabe que eles não mentiram?
— Não sei, mas não acho que tenham motivo para mentir. Logo, até a idade adulta dela, você vai vê-la como uma filha. Vai amá-la como uma família, antes de como sua mulher — ele novamente colocou bebida no copo. — Eles disseram que foi revelado em sonhos, assim como a profecia.
— Revelaram mais alguma coisa?
— Não para mim.
Suspiro longamente.
— Eu não quero ser pai dessa menina! — me levantei irritado com toda situação.
Porra! Era só o que me faltava.
Por que ela não apareceu logo depois de adulta? Além disso, ela era humana, para ficar comigo eu teria que transformá-la, ou seria uma relação bem curta. Que profecia mais sem sentido.Tenho certeza de que Allan resmungava em pensamento, dizendo que eu quem pedi para que a trouxesse até a mim assim que despertasse. Não preciso ler pensamentos para saber disso. O idiota me olha com um sorriso ladino e os olhos castanhos brilhando de empolgação. Esse maldito adora uma confusão. Eu bem que podia furar seus olhos. Ou arrancar alguns dentes para que deixe de sorrir feito um babaca.Realmente pedi que a trouxesse no momento em que despertasse, só que eu esperava que ela fosse despertada quando já estivesse pronta para os meus caprichos. Assim, ainda que o amor fosse uma mentira de uma profecia de merda, ainda haveria luxúria, e essa eu faria ser real. Agora... O que eu faço com esse ser humano em miniatura?Afastei a vontade de abrir a cabeça de Allan com um machado e o ouvi dizer:— Também
Por que ser princesa se posso ser heroína?Por que esperar o príncipe se posso resgatá-lo?Por que esperar o amor se posso simplesmente amar?Alma DemiseAnos depois...Sai do meu colégio tão distraída que quase não notei a grandiosa limusine parada no portão. Aquilo era muito estranho. O que um veículo daquele fazia em frente a uma escola pública? Era chamativo, mas nada mais me importava, além do meu aniversário de oito anos que aconteceria amanhã. Todas as minhas amigas iriam, até as chatas que ficam zoando o meu tamanho, por ser a mais baixinha do colégio. Quero que tudo saia perfeito e que elas me invejem.— Ainda bem que meus pais não leem pensamentos ou adeus festa — comentei com a minha melhor amiga, Lin. Uma menina linda de descendência japonesa. Ela tinha os olhos puxados, os cabelos negros e lisos, e pele branquíssima. Parecia uma boneca. Mas uma boneca mais alta que eu.— Os pais já tiveram a nossa idade e insistem em fingir que sempre foram maduros. Fingem que nunca senti
Tudo parece mais intensoMais complicado.Quem inventou a adolescência deveria ser punido.Alma Demise— Ela está acordando? — ouvi a voz da minha mãe.— O que houve? — abri os olhos e percebi que estava no meu quarto. — Como cheguei aqui?— Policiais te trouxeram. Houve uma tentativa de sequestro. Parece que era para pegar a menina que os pais ganharam na loteria.— E o coreano?— Que coreano?— Havia um homem coreano no carro. Eu vi. E havia dois lobos.— Acho que anda perdendo muito tempo com esse tal de k-pop. Ao ponto de delirar — minha mãe disse rudemente.— Eu vi, mãe! — a forma como ela debochava das minhas palavras era irritante.— O que a nossa princesa viu? — meu pai entrou no quarto.— Ela ainda está impressionada e diz que viu lobos e coreanos durante o sequestro.— Os policiais não falaram nada. — Meu pai balança a cabeça negativamente.— Vocês estão escondendo alguma coisa. Por que aquelas pessoas na limusine estavam me seguindo?— Pelo amor de Deus, que pessoas? — minh
Foram poucos minutos até o tal galpão. Não tentei lutar enquanto era levada nos ombros do brutamonte e deixada em um canto, perto de algumas caixas. O lugar sujo e cheio de coisas quebradas dava uma sensação de abandono que enchia minha mente de pensamentos nada agradáveis sobre coisas horríveis que eles podiam fazer comigo.— Vigiem a entrada. Vou ficar com ela.Mal os caras saíram, ouvi um uivo alto e barulho de coisas caindo.O brutamonte permaneceu em seu lugar, imóvel. Parecia não ter a mínima intenção de ajudar os colegas e me dar a chance de fugir. Ou será que o barulho ela feito pelos colegas dele? Eu queria que fosse um herói para me salvar, queria que fossem meus pais com a polícia.O cara só fez movimentos quando vi dois lobos entrando no lugar. Um era cinza e o outro negro, como o daquela vez em que delirei. Lobos imensos.Não tive tempo de sequer entrar em estado de pavor. Eles atacaram o homem e puxaram para fora sem muita dificuldade. Fiquei parada ouvindo os sons sinis
Quando ela chegou Trouxe um furacão Toda minha existência transformada em um brinquedo em suas mãos delicadas e cruéisNão me iludoEla pode me destruir Ela pode me fazer amarChristopher Vilard— Eu não sou o seu pai, Alma. E não vou explicar nada para você agora — declarei passando a mão no rosto, onde ela cuspiu. — Saiba apenas que você vai morar nessa casa a partir de agora. Agatha, mostre a ela o quarto que vai ocupar e chame o Dr. Diaz para cuidar dos ferimentos.Minha paciência já havia ultrapassado o limite há tempos. Só de imaginar que quase a perdi, tenho vontade de incendiar o maldito Conselho. Aqueles idiotas me fizeram ir até eles simplesmente para me desviar do que fariam. Eu devia ter desconfiado quando exigiram a presença de Allan. Se eu não tivesse escutado a conversa de um deles no telefone, poderia nunca mais vê-la.Tudo foi sorte e não quero mais contar com isso. Pouco após ouvir a ligação por acidente, Henri ligou para Allan pedindo ajuda e o ajudei a despistar
Algum tempo depois...Não pensei que fosse fácil, porém não me prepararam para o furacão em minha existência. Estou a ponto de dar umas boas palmadas em Alma. Ela ficou praticamente um mês enclausurada no quarto. Só saiu quando me dei conta que precisava fazer alguma coisa e proibi os empregados de levarem comida para ela.Quando a fome apertou, ela vai cedeu.O nosso primeiro jantar sozinhos foi um desastre, porém foi esclarecedor. Ela entrou na sala de jantar usando baby-doll preto. Algo que a cor só podia ser um protesto. Fingi nem notar. Pelo menos era mais decente que a roupa com a qual foi sequestrada, pois o short não mostrava tanto das suas coxas e a blusa cobria sua barriga.Comemos em silêncio. Um silêncio tão pesado que cheguei ao cúmulo de sentir falta dos seus gritos e reclamações.— Cansou de brincar de menina birrenta? — nem acreditei no que saiu da minha boca. Eu a estava provocando? Eu sou a porra de um homem com mil anos e estou provocando uma ninfeta? Só posso estar
Talvez você nem queiraMas alguém insiste tanto em te afastar Que o objeto acaba sendo desejado.Alma DemiseNunca pensei que pudesse sentir tanta raiva de alguém, meu corpo parecia prestes a explodir vendo meus pais me abandonarem nas mãos de um desconhecido. Quando o homem tatuado bateu na porta e entrou, pensei em colocá-lo para correr, mas não me movi, continuei deitada na mesma posição.Ele se sentou em uma poltrona que havia perto da cama e contou uma história surreal sobre uma profecia, sobre o fato de que as pessoas que achei serem meus pais terem sido contratadas para cuidar de mim. Na verdade, eles eram pais da loba que me levou até o quarto. A mulher com cara de quem vive chupando limão.Minha mãe de verdade estava morta e ninguém sabia quem era o meu pai. Chorei silenciosamente enquanto ouvia tudo. Ele tentou me fazer dizer alguma coisa, mas eu simplesmente não conseguia.Quando ele saiu, chorei muito mais... tudo que podia.Nos dias que se seguiram simplesmente não conse
— O que está acontecendo aqui? — questionou olhando de Agatha para mim.A vadia se levantou rapidamente a se agarrou a um dos braços musculosos dele.Olhei os dois com raiva. Quando ela começou a se rasgar eu já tinha entendido que queria fazer um teatro. E pelo que percebo, deu certo seu show.— Não vou entrar nesse jogo — disse e me sentei na cama. — Saiam do meu quarto.— Senhor, me perdoe, eu não quis provocá-la. Só queria saber se ela queria que lavassem suas roupas... e fui atacada.Ao ouvir a voz chorosa, acabei rindo.— Eu disse que era só uma empregada nessa casa, mas ela... ela... — e começou a chorar compulsivamente.— Você é mais que uma funcionária, é minha amiga. — Christopher parecia furioso.Apontei para ele, tremendo de raiva diante dessa situação de merda.— Esse teatro todo faria sentido se eu quisesse algo com você, seu ridículo. Basta abrir a porta que sairei — disse devolvendo o olhar de ira.— Vamos cuidar do seu rosto — ele disse para Agatha e se virou para mim