A FESTA NO TERRAÇO da suíte presidencial organizada pelos patrocinadores de Jonathan já estava pegando fogo quando Janete e Rarissa desceram do elevador. O prédio do hotel onde ambas estavam hospedadas desde a tarde anterior era um dos mais luxuosos da ilha toda e costumava receber muitas celebridades ao longo do ano. Havia cerca de cinquenta convidados no terraço e um grupo de garçons não parava de trabalhar, levando bebidas para cada um dos quatro cantos da badaladíssima comemoração.
Janete estava trajando o único vestido de festa que havia colocado na mala antes de sair de casa, pensando justamente num momento como aquele de celebração e, estava estonteante. A saia era curta bem acima da metade das coxas e deixava as suas costas nuas com duas alças finas sustentando a frente, onde o busto avolumado ficava bastante evidente pelo decote. Seus cabelos estavam soltos e ela tinha passado um batom escuro nos lábios. Se serviu de champanhe assim que pisou na festa e pensou que ninguém ali iria lhe pedir a carteira de identidade.
Eles que ousem! Sou a irmã do dono da festa!
Rarissa tinha apostado num modelo menos provocativo que a amiga, mas estava igualmente linda em seu vestido branco justo sem alças, valorizando o belo par de seios médios. Assim como Janete, se serviu de uma taça de champanhe assim que o primeiro garçom cruzou a sua frente lhe oferecendo e ela sentiu o nariz formigar quando tomou a bebida.
— Olha lá o seu irmão. Vamos cumprimentá-lo.
Janete aceitou a sugestão da amiga e foi com ela abrindo espaço pela multidão de bajuladores até Jonathan. Suzana, a sua namorada, estava agarrada a ele aproveitando os holofotes dos fotógrafos que registravam a festa. A garota de pele preta e de brilhantes olhos cor de jabuticaba teve que ceder o seu espaço para Janete que colou nele já começando a ser fotografada ao seu lado.
— Essa é a minha irmãzinha, a Janete. Ela sempre apoiou a minha carreira no surfe e com certeza faz parte do meu sucesso. — comentou o rapaz loiro sorridente aos jornalistas, segurando o ombro da irmã.
— Um sorriso para a lente, Janete! — Sugeriu um dos fotógrafos.
— Abraça o campeão! — Recomendou outro já acionando o flash da sua câmera.
Janete estava muito à vontade ali, mas começou a sentir um frio na barriga só em pensar em ver o seu rosto estampado na maioria dos sites e jornais de cobertura esportiva na manhã seguinte ao lado de Jonathan.
Vou morrer de vergonha, pensou, modesta.
Um alvoroço teve início na suíte presidencial quando o famoso DJ “Maverick” apareceu para comandar a sua própria picape e ele ofereceu a primeira música ao campeão do dia.
— Essa é especial para o meu amigo Jonathan Castilho, o campeão do Hangloose Pro Contest deste ano!
O som da música eletrônica ecoou no terraço do hotel e todos os presentes começaram a pular e dançar efusivamente. Entre uma bandeja de bebida cara e outra, já se podia ver sob as luzes estroboscópicas que coloriam o ambiente a distribuição de alguns comprimidos de ecstasy entre os convidados e a festa tomou um tom ainda mais alegre. Em época de competição, Janete sabia que o irmão procurava ficar limpo de entorpecentes, mas que ele era dado a certas experimentações depois dos campeonatos, principalmente, na hora de comemorar. O próximo torneio só rolaria em março daquele ano e ele não se negou a tomar a pílula que lhe foi oferecida, começando a curtir ainda mais a sua festa.
O segundo instante de euforia da noite se deu quando um jogador de futebol brasileiro que jogava na Europa resolveu aparecer de surpresa para comemorar a vitória de Jonathan. Janete e Rarissa se viram boquiabertas quando o craque revelado no time do Santos há alguns anos surgiu no terraço com dois seguranças particulares e se dirigiu até Jonathan, próximo ao DJ “Maverick”. Com o microfone em mãos após a diminuição do volume da música e tocando o ombro do surfista, ele falou em alto e bom som a todos os presentes:
— Eu estou de férias. Estava curtindo uma praia vizinha aqui perto e não pude deixar de parabenizar pessoalmente essa revelação do surfe que é o Jonathan. Esse moleque ainda vai brilhar muito! — O rapaz loiro deu um riso nervoso ainda cheio de si pelos elogios e um pouco alto pelo efeito do ecstasy que tinha tomado. Em seguida, continuou ouvindo o jogador de futebol: — Eu sou de Santos, sempre vivi em praia e o mar é a minha segunda casa depois dos gramados. Torço muito pelo surfe brasileiro e sei bem do potencial do nosso Johnny “Bravo” aqui.
O jogador abraçou Jonathan a seguir e um alvoroço tomou os demais convidados que não podiam perder a chance de tirar fotos ao lado do craque do Barcelona.
— Ninguém vai acreditar que eu estive na mesma festa que o Ney Junior se eu não tirar uma foto com ele! Vem amiga, me acompanha! — E Rarissa puxou Janete, começando a se infiltrar na multidão diante do craque de futebol.
Algum tempo depois da foto com o jogador de futebol que tinha sido negociado para o time espanhol numa das transações mais caras da história, as meninas o viram se despedir do homenageado e sair pela porta como tinha entrado, envolto em muita badalação. Janete e Rarissa, então, voltaram para a pista e dançavam alegremente entre os convidados quando foram abordadas.
— Duas vezes no mesmo dia? É muita coincidência!
As meninas viram o cara que tinha entrevistado Janete para o seu canal de Youtube mais cedo, ali sorridente, segurando um copo de vodca. Elas o cumprimentaram.
— Você também foi convidado ou entrou de penetra? — indagou Janete, um pouco mais solta sob efeito do álcool.
Ele se aproximou bem perto da orelha esquerda dela e sussurrou:
— Não conta pra ninguém, mas na verdade eu sou agente secreto. Tem um segurança desacordado lá fora na entrada da festa nesse momento.
Ela riu alto, incapaz de controlar o seu próprio humor. Rarissa não estava tão bêbada, mas estava atenta à conversa quando ouviu a amiga dizer:
— E o que um agente secreto lindo como você está fazendo numa festa como essa? — Ela estava começando a jogar o seu charme. O sorriso no rosto dele demonstrava que estava curtindo aquela faceta menos tímida da garota.
— Estou procurando uma jovem milionária paulista que anda arrasando na pista de dança. Preciso prendê-la por excesso de beleza. Você a viu por aí?
Janete juntou os dois pulsos diante do corpo para simular uma rendição e, então, voltou a sussurrar a ele:
— Eu vi sim. Ela está bem diante de você. Pode me prender todinha, seu agente secreto.
Os dois continuaram por algum tempo naquela encenação e, depois de passarem algum tempo juntos na pista de dança, entre conversas ao pé do ouvido e passadas de mão oportunas um no outro, nenhum deles conseguiu resistir por mais tempo. Estavam exalando química.
— Amiga! Curte o restante da festa sem mim. — disse Janete ao ouvido de Rarissa que bebia uma caipirinha no balcão do bar, acompanhada por um dos fotógrafos da festa que a cortejava há vinte minutos. — O youtuber dos esportes radicais vai me levar para o quarto dele no décimo andar pra gente… Conversar um pouquinho.
Rarissa sabia exatamente a que tipo de conversa Janete estava se referindo e, então, a liberou:
— Vai sim, amiga. Ele é uma delícia. Depois me conta como foi.
A herdeira dos Castilho piscou para ela, depois, deu uma corridinha afobada até Henrique que já a esperava na porta da saída do terraço. Os dois seguiram de mãos dadas até o elevador e de lá sumiram rumo aos andares inferiores. Rarissa não via muito futuro naquela conversa com o tal fotógrafo, mas o deixou continuar falando enfadonhamente sobre suas coberturas jornalísticas para A Gazeta, jornal onde trabalhava. Naquele momento, ela invejou fortemente Janete e começou a se coçar de curiosidade para saber os detalhes do que ia rolar entre os dois.
HENRIQUE ESTAVA DIVIDINDO um dos quartos do hotel com o editor de vídeos do seu canal do Youtube, mas, naquele momento, ele sabia que Fred não estaria lá. O garoto tinha ido fazer algumas filmagens noturnas da ilha e só voltaria mais tarde. Janete sentia que eles mal podiam esperar para chegar ao quarto para liberar aquele desejo súbito que haviam sentido um pelo outro durante a festa e, quando adentraram o lugar, se jogaram logo na cama de lençóis brancos. Henrique arrancou a sua própria camiseta e já abaixou a calça jeans surrada que usava. A garota viu um mastro enorme surgir de dentro da cueca boxer que ele estava vestindo e salivou. Olha o tamanho desse pau, pensou ela admirada, já o vendo subir sobre o seu corpo e começar a despi-la. O vestido não fez qualquer resistência na pele de Janete e logo estava sendo jogado de lado. O loiro mirou entre as suas pernas como que tentando adivinhar o que teria por trás da sua calcinha branca que a cobria e, então, começou a deixá-la compl
A CONSTRUTORA SUARES & CASTILHO possuía um complexo de quatro torres espelhadas de trinta andares cada localizado na região industrial de Moema, um dos bairros mais nobres de São Paulo. Os prédios podiam ser vistos de longe refletindo, em geral, a luz solar da manhã e emergiam do chão imponentes, causando uma sensação de metrópole futurista à cidade que não parava por nada sob seus pés. A primeira torre — a sudoeste — tinha sido construída ainda nos anos oitenta, quando o patriarca da família Castilho, o velho e argucioso Jaime, filho de imigrantes espanhóis, vira no ramo da construção civil a grande oportunidade de quadruplicar a já milionária herança que possuía. Sob a b****a da, na época, modesta empresa, o grande centro de Moema se vira completamente modificado pelas construções arrojadas da construtora Castilho e, logo a fama de “a construtora do futuro” se espalhou por toda grande São Paulo, ganhando o país na década seguinte. A morte de Jaime Castilho na segunda metade dos ano
UM MÊS E MEIO APÓS a sua contratação, Janete foi chamada para a sua primeira reunião da diretoria principal da empresa e aquela foi uma das raras vezes que viu o próprio pai em seu trabalho. João Suares tinha convocado a reunião para discutir os novos planejamentos financeiros que a Suares & Castilho projetava para o próximo semestre e, por isso, precisava de toda a equipe financeira presente, incluindo os estagiários. Além de Janete, o time era formado por sua tia Elisa, a assistente Mariana, o técnico em TI Michael Mantovanni e os seus dois aprendizes, Gabriel Souza e Marco Túlio, ambos com dezesseis e dezessete anos respectivamente. A sala de reunião era um auditório com pé-direito alto que possuía seis fileiras de cadeiras para os espectadores em forma de arco côncavo, com o palco onde João falaria com um microfone à frente. Havia uma espécie de púlpito de onde ele comandava o Macbook que gerava as imagens pelo projetor e, atrás dele, um telão de quase dez metros de comprimento mo
NOS MESES SEGUINTES, a relação entre Janete e Eduardo evoluiu de uma amizade momentânea para um namoro admitido e era cada vez mais comum ver os dois juntos nos eventos sociais que a moça ainda se dava ao luxo de participar. A sua vida como estagiária na Suares & Castilho ainda era bastante agitada com a pressão de metas a serem batidas, envios de relatórios para a diretoria, apresentações semanais de resultados financeiros e muitas reuniões com a equipe da sua tia Elisa. Por conta das chamadas de atenção costumeiras em público e pelos casuais destemperos da mulher nos dias que antecediam o fechamento de resultados, Janete passou a encarar a, até então, tia preferida, como uma verdadeira carrasca empresarial com quem gostaria de estabelecer devida distância nos próximos encontros de família. O pior é que a reunião anual na casa de veraneio dos Castilho está chegando. Nem quero pensar como vai ser horrível! pensou ela ligeiramente desgostosa. Eduardo passou a buscar Janete quase todos
NA SEMANA SEGUINTE, Janete se viu sem muito tempo para encontrar o namorado e começou a entender o significado das palavras “hora-extra” no trabalho. Como aprendiz, ela sabia que tinha assegurado o direito de não poder trabalhar além da jornada estabelecida em seu contrato, mas Elisa quis passar por cima disso mantendo a sobrinha no escritório muito além de horário padrão. A Suares & Castilho estava em negociação para fechar o contrato com um importante grupo farmacêutico holandês que queria abrir um complexo de pesquisas avançadas em São Paulo e todos os setores — incluindo aquele que Elisa gerenciava — estavam em polvorosa para fazer tudo certo até que a assinatura dos europeus estivesse, enfim, no papel. Sabia-se que a conta do grupo holandês também estava sendo disputada pela Monterey e pela Constrular — a terceira construtora mais rentável do pais — e o velho CEO não estava a fim de perdê-la. Beto, que até então estava enfiando as caras em todos os projetos para tomar a frente do
QUANDO GUILHERMINA e Wilson voltaram para a sala, atraídos por vozes exaltadas e preocupadas, Eduardo e Janete estavam terminando de se vestir abotoando calças e terminando de amarrar cadarços. A garota estava muito aflita e as suas mãos tremiam segurando o iPhone que atendera há menos de dez minutos. — Mãe, pai, eu prometo que explico tudo na volta. Eu preciso levar a Jane de carro até a Zona Sul. — Zona Sul? A essa hora, filho? — Wilson olhou para o relógio na parede da sala. Batia mais de meia-noite. — Eu explico tudo na volta. Prometo. Eduardo viu a namorada se despedir dos seus pais meio que no automático e ela tomou a frente abrindo a porta para começar a descer as escadas do sobrado. Os cães das casas vizinhas começaram a latir ao ouvir a movimentação incomum àquela hora e intensificaram os ganidos quando o Golf deu marcha a ré na rua e saiu da garagem. O rapaz era ótimo condutor de veículos e aprendera cedo a dirigir para ajudar o pai a consertar os carros que chegavam na o
DANIEL GUIOU EDUARDO até a entrada de uma tubulação de concreto perdida no meio de uma espécie de esgoto a céu aberto e mandou que ele se preparasse para o cheiro. O lugar fedia a excremento e um líquido amarronzado escorria de dentro do tubo de aproximadamente um metro e meio de circunferência. — Dá para andar abaixado por essa tubulação. — Indicou Daniel. — Ela leva até a galeria de esgoto e, de lá, você vai ver uma escada de ferro que vai dar nos fundos do galpão. A entrada fica escondida por umas caixas velhas e entulhos de obra. Você vai poder entrar sem ser visto. Eduardo estava confiante naquele plano de surpreender o meliante antes que a polícia acabasse atirando em sua cunhada e se preparou para entrar no tubo após acender a lanterna do seu celular. — Espera aí mesmo. Se eu não voltar em uns vinte minutos ou se ouvir tiros, sai daqui e avisa a Janete e a Priscila. Daniel acenou que sim e passou as mãos nos cabelos castanhos quando viu Eduardo entrar pela tubulação e desapa
NA NOITE DO BAILE FUNK e do sequestro de Jéssica Castilho, Eduardo foi levado até a delegacia regional e passou horas sentado diante do delegado para, entre outras coisas, prestar seu depoimento sobre tudo que tinha acontecido desde que chegara ao bairro de Paraisópolis. Por sua interferência em assunto policial, o sargento Gomes queria que ele fosse punido ao colocar a vida da vítima em risco, mas Renato Castilho conseguiu convencê-lo do contrário e deixar aquele assunto para lá, uma vez que sua filha estava segura agora. A intervenção do sogro, no entanto, não impediu que ele levasse uma bela de uma bronca do delegado, que o chamou de irresponsável para baixo o fazendo tremer em sua cadeira. Para os Castilho, todavia, o garoto tinha salvado o dia e foi recebido como herói na casa do Campo Belo onde a família da namorada morava. A notícia sobre a batida policial malfadada na comunidade do Paraisópolis estampou as capas da maioria dos jornais e sites de notícia no dia seguinte e as me