DANIEL GUIOU EDUARDO até a entrada de uma tubulação de concreto perdida no meio de uma espécie de esgoto a céu aberto e mandou que ele se preparasse para o cheiro. O lugar fedia a excremento e um líquido amarronzado escorria de dentro do tubo de aproximadamente um metro e meio de circunferência. — Dá para andar abaixado por essa tubulação. — Indicou Daniel. — Ela leva até a galeria de esgoto e, de lá, você vai ver uma escada de ferro que vai dar nos fundos do galpão. A entrada fica escondida por umas caixas velhas e entulhos de obra. Você vai poder entrar sem ser visto. Eduardo estava confiante naquele plano de surpreender o meliante antes que a polícia acabasse atirando em sua cunhada e se preparou para entrar no tubo após acender a lanterna do seu celular. — Espera aí mesmo. Se eu não voltar em uns vinte minutos ou se ouvir tiros, sai daqui e avisa a Janete e a Priscila. Daniel acenou que sim e passou as mãos nos cabelos castanhos quando viu Eduardo entrar pela tubulação e desapa
NA NOITE DO BAILE FUNK e do sequestro de Jéssica Castilho, Eduardo foi levado até a delegacia regional e passou horas sentado diante do delegado para, entre outras coisas, prestar seu depoimento sobre tudo que tinha acontecido desde que chegara ao bairro de Paraisópolis. Por sua interferência em assunto policial, o sargento Gomes queria que ele fosse punido ao colocar a vida da vítima em risco, mas Renato Castilho conseguiu convencê-lo do contrário e deixar aquele assunto para lá, uma vez que sua filha estava segura agora. A intervenção do sogro, no entanto, não impediu que ele levasse uma bela de uma bronca do delegado, que o chamou de irresponsável para baixo o fazendo tremer em sua cadeira. Para os Castilho, todavia, o garoto tinha salvado o dia e foi recebido como herói na casa do Campo Belo onde a família da namorada morava. A notícia sobre a batida policial malfadada na comunidade do Paraisópolis estampou as capas da maioria dos jornais e sites de notícia no dia seguinte e as me
O MÊS DE FÉRIAS escolares do meio do ano não foi o mesmo dos anteriores para Janete porque, daquela vez, ela tinha a responsabilidade de estagiar na S&C durante meio período e a única viagem a que ela se deu o direito de fazer foi com a família para o litoral norte, num dos finais de semana de junho. O seu irmão mais velho tinha conseguido uma folga das competições de surfe que vinha participando desde o começo do ano e apareceu na casa de veraneio para dar um “oi”. A casa estava na família há algumas gerações e costumava ser a sede das reuniões anuais dos Castilho desde os anos setenta, quando então o velho patriarca Jaime organizava várias orgias regadas a sexo, drogas e Rock N’ Roll. A reunião daquele ano estava marcada para agosto, no mês de aniversário de Janete, e prometia ser tão agitada quanto a dos anos anteriores. Todos costumavam ficar muito ansiosos perto daquela data, mas, naquele ano, Janete não estava muito animada a participar por estar namorando sério desta vez. Com
O RETORNO DAS AULAS no mês de julho deu início à preparação para o campeonato intercolegial com o qual Janete e as suas colegas de classe estavam envolvidas desde o início do ano na data de inscrição, mas, devido as suas novas ocupações, a garota precisou entrar em um acordo com sua tia Elisa para poder jogar. Na semana que antecedia os primeiros treinos da equipe de vôlei feminino do colégio Batista Genari, ela fez uma ligação ainda em casa, evitando levar assuntos pessoais para o trabalho. — O torneio começa em duas semanas, tia, mas eu preciso me reunir com a equipe antes para os treinos. — Janete estava em seu quarto numa tarde após o expediente no prédio da Suares & Castilho. Estava tensa e andava de um lado para outro descalça, sentindo com os dedos dos pés os pelos felpudos do tapete branco em que pisava. — Sabe que não posso liberar você do estágio nesses dias só porque é minha sobrinha, não é, Janete? — resmungou a mulher com voz impaciente. — Não seria bom exemplo para os d
NA VÉSPERA DA PRIMEIRA partida entre o seu time e o terceiro ano do Colégio Paulo Dantas, Janete mal conseguiu pregar os olhos durante a noite e teve que tomar algumas latas de energético antes de sair de casa para aguentar o cansaço. Mathias, o motorista da família, a levou de carro até o Jardim Paulista e a garota estava elétrica ao encontrar as amigas na concentração. Tratou de largar a bolsa onde trazia os materiais esportivos sobre o banco chumbado ao centro do vestiário e começou a tirar a calça jeans que vestia. Rafaela já exibia em seu corpo curvilíneo o novo uniforme personalizado feito para a equipe e a cor amarela do conjunto de regata e short de malha curto lhe caía bem sobre a pele marrom. — Esses novos uniformes ficaram muito irados! Tem o meu nome atrás! — E ela virou de costas em frente ao espelho toda feliz, tirando o cabelo encaracolado da frente e se encurvando inteira para ver o nome estampado sobre o número sete no reflexo. Talita e Juju também já começavam a ves
A SEGUNDA PARTIDA contra o time de uniforme azul do Alves Alcântara seria o último daquela manhã e Janete teve que esperar na arquibancada junto dos primos e dos seus irmãos o início do jogo. O ginásio estava ainda mais cheio do que na manhã anterior e a presença de Jonathan Castilho entre os espectadores causou um furor por ali, uma vez que ele era reconhecidamente um dos surfistas de maior destaque entre o público jovem. Tirando selfies e dando autógrafos em camisetas, o rapaz curtiu bastante o seu momento de fama entre os seus admiradores, mas estava ali mesmo para torcer para a sua família. Tinha estado ao lado da irmã caçula Jéssica, dos primos Cleber — irmão gêmeo de Cleide e filho da chefe de Janete, Elisa —, Pedro e Micaela na torcida por Priscila, cujo time em quadra enfrentava a sensação do intercolegial Aline Ferreti, a principal estrela do primeiro ano do Colégio Paulo Dantas, e o surfista sofreu como todos eles. Apesar dos esforços, o segundo ano do Batista Genari não con
NO INÍCIO DAQUELA NOITE, como tinha prometido, Eduardo visitou a namorada em casa e todos os mal-entendidos foram resolvidos entre eles. Após se desculpar pela forma meio brusca que a tinha tratado na ligação mais cedo, o rapaz alegou que só estava preocupado que o seu chefe o visse no telefone na hora do trabalho e que não era a sua intenção ser rude com ela. — Eu não vou te trocar por ninguém. Não seja exagerada! — disse ele, após uma crise de carência em que ela ficou fazendo manha dizendo que ele a ia abandonar. Os dois ficaram de agarramento do sofá por um tempo aproveitando que a família dela estava dispersa em outros cômodos, mas quando a chance surgiu, eles foram para o quarto onde transaram até pouco antes do horário de ele ir embora. Parecia estar tudo bem entre eles novamente. Janete acompanhou o namorado até a garagem, onde ele já ia sair com o seu Golf, quando o farol do Volvo de Renato piscou duas vezes do lado de fora indicando que estava pronto a estacionar. O homem
DEPOIS DA VISITA DE GABRIEL, Janete achou melhor desligar o telefone celular e a garota ficou amuada o restante do domingo em seu quarto. Estava evitando contato com o namorado e achava melhor que a próxima conversa entre eles fosse pessoalmente. Queria olhar em seus olhos para tentar entender a razão que o havia levado a servir de espião para o seu pai e ela não abria mão disso. Naquela segunda-feira, Janete acordou indisposta, mas sabia que não podia deixar o seu time de vôlei na mão. Tomou um banho quente logo cedo, empurrou alguma coisa para dentro do estômago e compensou a falta de alimento por mais da metade do domingo. Viu Renato caminhando pela casa e fez de tudo para evitá-lo. Sentiu enjoo só de pensar em ter que olhar para ele depois do que tinha descoberto, por isso, se despediu da mãe e saiu de fininho sem dar maiores satisfações de porque não ia falar com o pai naquela manhã. Enquanto Mathias a levava até o Jardim Paulista de carro, Janete conferiu o celular e viu oito m