Eu assinei aquele contrato idiota que fazia valer a vontade do meu irmão, é claro. Era isso ou aprender a trabalhar com coisas como... sei lá, eu nunca precisei nem arrumar minha cama ou lavar um copo sozinha, não faço ideia de com o que eu poderia trabalhar. Seriam só dois anos. Esse era o tempo que eu levaria até terminar a faculdade e poder responder pelo meu dinheiro, minhas ações da Milani e pelos meus próprios atos.
- Eu andei pensando muito nos últimos dias... Precisamos definir algumas coisas. Algumas regras.
Adam tinha me convidado para almoçar no restaurante do Milani de Copacabana. Era nosso hotel conceito no Brasil e o único que agregava, além de quartos para hospedes tradicionais – que normalmente ficavam pouco tempo - uma ala inteira para hospedes de longo prazo, que normalmente eram alugados semestralmente ou anualmente e funcionavam como verdadeiros apartamentos, mas com os privilégios de ter café da manhã gratuito, serviço de quarto por 24 horas, camareira todos os dias, além de outros privilégios. A cobertura dessa ala era o único local que tinha uma cliente vitalícia: eu mesmo.
- Diga – respondi, sem tirar meus olhos da tela do meu celular.
- Pode colocar isso de lado, por favor?
Eu levanto rapidamente os olhos para ele, e volto a baixar para o meu celular. Por mais que sua expressão fosse o mais neutra possível, eu poderia dizer que estava com raiva.
- Não sei se sua geração é meio lenta, mas eu consigo prestar atenção em duas coisas ao mesmo tempo.
Mal me dou conta de quando o celular sai voando da minha mão e vai parar em posse de Adam. Ele avalia a tela desbloqueada por um breve instante, um sorrisinho se formando em seu rosto. Mas não demora muito para que ele coloque o aparelho, virado para baixo, próximo a ele na mesa.
- Hey! – Protesto. – Isso é particular!
- Regra número um: sem celular durante as refeições que faremos juntos.
- Refeições que faremos juntos? – Desdenho. – Como se isso fosse se repetir com frequência.
- Alguma frequência, já que vamos morar juntos.
- O quê? – Preciso me controlar para não gritar. Os olhares se voltando na minha direção me alertam que talvez eu não tenha tido tanto sucesso nisso.
- Regra número dois: - ele me ignora totalmente. – Se vai mandar fotos dos seus peitos para alguém ao menos censura o seu rosto. A gente vai ter uma grande dor de cabeça se nudes da princesinha Milani vazarem por aí. E aliás, não precisa colocar esses filtros, eles já são bem... agradáveis.
- Por mais que o maior desejo da minha vida sempre tenha sido ouvir de alguém o quando os meus peitos são... agradáveis, será que... Ah, oi Jacob!
- Boa tarde, Kara! Digo, senhorita Milani, Kara... Mais vinho?
- Sim, obrigada.
Tento não rir de Jacob, um dos garçons mais jovens, devido ao seu desconforto por ter ouvido a conversa sobre meus peitos e tremido tanto que derramou vinho na toalha de mesa.
- Tenham uma boa refeição – ele diz, antes de se retirar.
- Morar juntos. – Automaticamente me volto para Adam. – Podemos voltar para essa parte?
- É óbvio, não? Como poderei cuidar de você se não estivermos próximos?
- Olha... vamos esquecer essa bobagem de “cuidar de mim”? A gente sabe muito bem que eu sei me cuidar sozinha. Eu tenho tudo o que preciso aqui no Milani.
- Menos supervisão, não é mesmo? – Viro uma boa quantidade do meu vinho porque tenho certeza de que não vou gostar do que vem pela frente. – Liguei para sua faculdade, você está quase perdendo o semestre porque mal aparece para as aulas.
- Foi um semestre difícil – digo, me referindo a morte do meu irmão.
- O final do semestre passado foi difícil – ele concorda. – Eles basicamente te deixaram passar por pena. Esse semestre você tem faltado para ir a bares e festas.
- É isso que você quer, que eu prometa que não vou mais matar aula? Ok, eu prometo.
- E você também vai começar um estágio comigo, na área administrativa da Milani. De segunda a sexta, das oito da manhã ao meio-dia. E em horários extras quando tivermos reuniões.
Dessa vez nos calamos quando um novo garçom vem servir nossos pratos. Eu já tinha provado cada um dos pratos daquele restaurante, da entrada a sobremesa. Mas as massas eram especialmente saborosas. Não resisto em dar uma garfada tão logo o garçom se afaste.
- Ok – volto ao assunto. Não tinha por que eu relutar, até porque eu sabia que esse era um desejo de Otto já há algum tempo e provavelmente Adam apenas o estava colocando em prática. – Mas alguma coisa, tutor?
Ele revira os olhos com o desdém que coloco na palavra.
- Muitas – ele admite. – Vamos precisar rever muitos dos seus hábitos. Você agora é o rosto da Milani e definitivamente não queremos alguém nos representando que seja conhecida por gastos extravagantes e por fazer strip-tease em boates depois de beber e fazer sei lá mais o que...
- Eu não uso drogas – deixo claro. – Já usei – admito. – Mas não é minha praia.
- Mas o que temos de mais urgente para definir é: meu apartamento ou o seu?
- O quê? – Estranho. Eu definitivamente estava acostumada a ouvir aquela frase durante jantares regados de muita bebida, não durante um almoço com apenas duas taças de vinho.
- Para morar. Meu apartamento ou o seu?
- Ambos – respondo. – Você no seu, eu no meu. – Eu também estava acostumada a dar essa resposta em outro contexto.
- Isso não é uma opção.
- É claro que é.
- Você sabe que eu posso te obrigar, não sabe? Estou sendo legal em te dar uma escolha porque esse almoço definitivamente está fazendo meu dia mais feliz, mas é muito improvável que eu continue agindo assim no futuro, então... Meu apartamento ou o seu?
- Eu não vou sair do Milani, isso não faz nem sentido. Você mesmo disse que eu sou a cara desse hotel agora.
- Eu me mudo o quanto antes.
- Tem outros apartamentos vazios, sabe... Você não precisa ficar exatamente, no meu.
- Quantos quartos vazios tem no apartamento, Kara?
Penso rapidamente.
- Três... Não, dois, se não contar o que eu uso como ampliação do closet.
- Acho que isso já responde o seu questionamento. Eu vou me mudar para o seu apartamento. Ou melhor, nosso apartamento.
- Quer saber, Adam... Você está fazendo um ótimo papel como Otto. É tão pé no saco quanto ele era.
Ainda que mal tenha tocado na minha comida, me levando e deixo o restaurante, irritada. Eu deveria supor que o melhor amigo do meu irmão fosse tão implacável comigo quanto ele possivelmente era nos negócios.
- Ele é 10/10! – Manu me devolve meu iphone, que exibia uma foto de Adam sem camisa durante um jogo de futebol.Eu tinha encontrado o Instagram dele, é claro. Não que tivesse muita coisa por lá, ele parece ser do tipo mais reservado nas redes sociais. Mas aquela foto em específico me chamou atenção, assim como chamou de Manu. Era impossível não reparar no corpo sarado e super desenhado de Adam.- Ele é chato! – Afirmo.Minha melhor amiga e eu estávamos deitadas em espreguiçadeiras acolchoadas na praia, embaixo de grandes guarda-sóis que tinham a função de não deixar a minha pele alva fazer cosplay de tomate cereja em menos de cinco minutos. Meus longos cabelos loiros estavam amarrados em um coque despretensioso e grandes óculos escuros escondiam meus olhos.Por mais que o Milani tivesse uma praia privativa, Manu e eu gostávamos de ficar em uma área pública, próximo de um excelente ponto para surfistas e uma área onde sempre havia garotos jogando vôlei. Era, no mínimo, agradável aos ol
Eu tinha feito um bom trabalho com o blazer e o cinto. Acabei abotoando novamente a peça, porém propositalmente com uma casa de diferença, ganhando uma pequena fenda na parte das pernas. Não vesti as mangas, amarrando-as para trás de forma a dar um laço. Por fim, arrematei tudo com o cinto de Adam, marcando minha cintura fina. Cacei na bolsa um prendedor de cabelo e fiz um coque despretensioso nos meus fios loiros. E pronto! Até parecia que eu tinha me vestido daquela forma premeditadamente, não sei por que Adam continuava com aquela cara amarrada.- Ela é tão estilosa! – Ouvi uma voz feminina dizer, quando eu ia passando e sorri em resposta. Eu era mesmo, não era?A sala de reuniões não era diferente de muitas das outras que eu já tinha visto – em filmes! Uma grande mesa central de madeira com poltronas acolchoadas, um telão pronto para exibir apresentações e extensas janelas de vidro com vista para o mar.- Perdoem-me o atraso, senhores – Adam já foi logo dizendo ao se deparar com a
Eu nunca fui capaz de entender tão perfeitamente, quanto naquela manhã, o motivo pelo qual as pessoas reclamavam tanto de um dia de trabalho. O fato é que o dia mal tinha começado e já estava indo bem mal. A começar pelo fato de que ainda que eu tivesse levantado muito cedo, eu já estava atrasada. Então, precisei me arrumar correndo e nem mesmo tive tempo de desfrutar do café da manhã do hotel.Por sorte, no momento em que cruzei as portas de vidro que davam acesso ao prédio do escritório administrativo da Milani, uma menina sorridente vinha passando com uma bandeja de papelão com dois copos da Starbucks. Caramba, eu até imaginei que nós teríamos máquinas de café expresso para os funcionários, mas serviço de entrega de café da Starbucks era muito legal!- Obrigada! – Agradeço, feliz por consegui pegar as duas últimas unidades e automaticamente levando um dos copos aos lábios.- Hey, o que você pensa que tá... – A garota se cala e arregala ligeiramente os olhos. – Senhorita Milani! Des
Eu tinha tanta convicção de quão perfeita a minha ideia era que apenas decidi colocar em prática. Como diziam, era mais fácil pedir perdão do que pedir permissão. Sendo assim, Adam não podia nem sonhar em descobrir algo antes da hora. O que não era exatamente um problema, eu duvidava muito que qualquer um daqueles jovens tivessem acesso a ele. Agora, Sandra era a pessoa que podia colocar tudo a perder.- Eu não posso permitir que você faça isso... – ela me olhava com os olhos ligeiramente arregalados quando a procurei em sua sala para explicar. – Liberar não só o pessoal do marketing como vários outros funcionários? Eu nem tenho autoridade para isso.- Não é liberar – eu tento negociar. – É um dia de trabalho. Só que um pouco diferente.- Kara, você sabe que precisa de uma aprovação do senhor Benatti para...- Sandra... – eu sorrio e caminho até a cadeira diante dela, me sentando mesmo sem ter sido convidada. – É meu hotel. É minha empresa. É minha ideia. E você sabe que é uma excelen
Tudo bem, talvez tenha sido bom Adam ter ligado e me jogado um balde de água fria. Eu tinha organizado todo aquele evento. Se eu simplesmente desaparecesse e não saísse em nenhuma foto depois das tiradas durante o café da manhã seria, no mínimo, estranho, certo?Então eu coloquei um biquíni comportado (ao menos eu esperava que fosse) e aproveitei uma manhã de sauna, piscina e fofoca com as garotas (exceto Manu, claro, que tinha desaparecido com Pablo). Elas pareciam um pouco desconfortáveis no começo, mas nada que algumas taças de champanhe não as fizessem falar. Em pouco tempo eu já estava sabendo quem era a fim de quem, quem já tinha pegado quem e até uma história quente sobre um casal que foi visto aos amassos no almoxarifado.- E o Adam? – Me pego perguntando. – Alguma fofoca?- O Adam? – Maya estranha e eu dou de ombros.- Só curiosidade.- Ah, ele e o Otto eram bem galinhas – ela diz. – Mas nunca soube de nada de dentro do escritório. E depois que o Otto... – ela se detém repent
- E o que ele queria? - Só ser um pé no saco – reviro os olhos. – Perguntou como as coisas estavam indo e se eu estava mantendo tudo dentro do controle. Estava almoçando com Manu enquanto a atualizava sobre a situação com Luca e como Adam teve a habilidade de nos ligar exatamente no momento em que as coisas estavam ficando quentes entre nós. - Acha que ele estava te espionando? - Adam? – Eu rio. – Claro que não! - Foi meio estranho. Ele não tem acesso as câmeras do hotel? - Tem, mas eu pedi que desligassem as câmeras do terraço. Não sou louca nesse nível, Manu! - Tá, mas como o Jacob sabia exatamente onde te encontrar? - Onde mais eu estaria depois de pedir para desligarem as câmeras? – Dou de ombros. – Adam só estava dando uma de chefe chato, com aquela voz mandona e irritada dele. - Então tá. E você vai dar outra chance pro garoto? - Pro Luca? Por que não? - Sei lá, pelo que você disse só falta
~ADAM~Eu podia ter encerrado a festa de forma a fazer Kara passar vergonha. Mas eu não fiz. Ela organizou tudo pelas minhas costas, fez as coisas de uma maneira torta e piorou tudo consideravelmente ao se envolver com aquele garoto... Mas, de fato, abrir as portas do Milani para os funcionários, que nunca tiveram a oportunidade de estar lá, e registrar tudo para a nossa campanha de verão, que tinha exatamente aquele público alvo, era uma ótima ideia. E foi só por isso que pedi que o DJ iniciasse sua sequência de encerramento e avisasse que os carros estariam disponíveis para levar os funcionários em casa a partir daquele momento, fazendo com que tudo parecesse estar correndo de acordo com o previsto.O problema mesmo veio depois, ao lidar com os fotógrafos e descobrir que Kara não tinha feito um contrato de confidencialidade com eles. Isso me fez gastar um tempo e um dinhe
Quando Adam apareceu no meu quarto para informar que o jantar daquela sexta à noite tinha sido transferido para a próxima semana, me senti bastante aliviada. Quero dizer, eu sabia que era uma grande oportunidade de negócio para a Milani e Adam estava um tanto carrancudo por ter que esperar para fechar aquele contrato... Mas o fato é que eu ainda estava irritada o suficiente com ele para não querer me sentar em uma mesa de jantar, junto com estranhos, e sorrir como se tudo fosse perfeito na minha vida.Assim, passei quase o final de semana todo fugindo de Adam. O que não foi fácil, já que ele tinha finalmente resolvido levar suas coisas e se fixar no meu apartamento de vez. Pelo menos o lugar era grande o suficiente para que pudéssemos nos evitar. Afinal, eu tinha certeza de que Adam queria tanto me ver quando eu queria vê-lo.Mas, na segunda de manhã, quando o motorista veio nos buscar para lev