Eu tinha feito um bom trabalho com o blazer e o cinto. Acabei abotoando novamente a peça, porém propositalmente com uma casa de diferença, ganhando uma pequena fenda na parte das pernas. Não vesti as mangas, amarrando-as para trás de forma a dar um laço. Por fim, arrematei tudo com o cinto de Adam, marcando minha cintura fina. Cacei na bolsa um prendedor de cabelo e fiz um coque despretensioso nos meus fios loiros. E pronto! Até parecia que eu tinha me vestido daquela forma premeditadamente, não sei por que Adam continuava com aquela cara amarrada.
- Ela é tão estilosa! – Ouvi uma voz feminina dizer, quando eu ia passando e sorri em resposta. Eu era mesmo, não era?
A sala de reuniões não era diferente de muitas das outras que eu já tinha visto – em filmes! Uma grande mesa central de madeira com poltronas acolchoadas, um telão pronto para exibir apresentações e extensas janelas de vidro com vista para o mar.
- Perdoem-me o atraso, senhores – Adam já foi logo dizendo ao se deparar com a mesa quase completa. – Creio que já devam conhecer, ao menos de fotos, e com certeza por nome, essa é Kara Milani – ele apontou pra mim e vários rostos se voltaram imediatamente na minha direção, me cumprimentando. – A partir de hoje ela estará presente em todas as nossas reuniões, como ouvinte.
Adam apontou para o sofá de couro no fundo da grande sala e eu automaticamente me dirigi para lá. Não sei o que ele esperava de mim, mas com certeza não era que eu me jogasse descontraidamente e colocasse os pés para cima, em uma posição meio deitada, meio largada. Eu teria pegado o meu celular para ignorar tudo ao redor, mas Adam ainda o mantinha com ele.
Acho que aquela foi a primeira vez que desejei não ser herdeira de tantas unidades de hotéis ao redor do mundo, uma vez que durante a reunião se passou por cada uma delas, exibindo relatórios detalhados, propostas de melhorias e avaliações de clientes.
- E por mais que tenhamos esse pequeno problema com Xangai, já era algo esperado pós-pandemia. O que realmente vem nos preocupando no momento é Londres – um dos caras mais jovens, além de Adam, ia dizendo. – É o quinto mês consecutivo em que fechamos no vermelho por baixa procura dos nossos serviços de alimentos e bebidas.
- Se continuarmos assim vamos precisar repensar manter essa unidade aberta.
- O Milani nunca fechou uma unidade! – Adam protesta. Eu levanto rapidamente os olhos em sua direção porque a maneira como ele defende a reputação dos negócios da minha família é muito admirável. Eu poderia ver Otto agindo daquela maneira. – Não será essa a primeira. Por favor, estamos falando de Londres!
- Mudamos o cardápio do restaurante há três meses, se isso fosse dar algum resultado já deveria estar se refletindo nos números – reclama um velho carrancudo.
- Podemos mudar o chef – sugere outro.
- Não vai funcionar... – intervenho e todos os olhos se voltam para mim.
Alguns rostos parecem interessados em me ouvir falar, mas a maioria parece se divertir com o fato de “uma criança” ter alguma opinião sobre negócios de gente grande. Bom, eram os meus hotéis, não eram? É claro que eu tinha uma opinião.
- Senhorita Milani, apreciamos sua boa vontade em colaborar, mas infelizmente não vejo como a sua falta de experiência nos negócios poderia agregar em planos que já viemos desenvolvendo há meses para...
- Um plano de bosta – interrompo o velho carrancudo.
- Senhorita Milani, creio que...
- Deixa-a falar – Adam se intromete.
- Qual foi a última vez em que o senhor esteve no Milani de Londres? – O desafio.
- Infelizmente o trabalho e a idade não me permitem mais viajar com tanta frequência quanto gostaria.
- Adam? E você?
- Não muito recentemente – ele admite.
- Alguém aqui esteve lá nos últimos meses? Cinco meses vocês disseram, né? Alguém esteve? – Ninguém responde, o que me encoraja a continuar. – Eu acho que estive pelo menos umas três vezes nesse tempo, e aliás, o menu novo está impecável. E o chefe Davies é um dos melhores que vocês poderiam ter.
- Então qual seria a solução que a senhorita proporia para o nosso problema? – O carrancudo continua me desafiando.
- Sei lá, colocar fogo no restaurante do Gordon Ramsay que abriu a duas quadras do nosso hotel? Acho que funcionaria por um tempo.
- Como sabe disso? – Adam me olha com alguma admiração.
- Funciona nos filmes de máfia.
- Não sobre o fogo, Kara, sobre o restaurante do Ramsay estar roubando nosso público.
- Porque eu mesma quis ir lá algumas vezes. Digo, o cara o é uma celebridade gastronômica, deve apresentar uns 30 programas de culinária ao mesmo tempo, todo turista iria querer conhecer o restaurante dele, e quando esse restaurante está a duas quadras do nosso hotel... fica meio óbvio que os hospedes não tem nenhum empecilho para jantar lá, não fica? A não ser a fila de espera, é claro... Mas turistas costumam reservar essas coisas com antecedência.
- Você nos apresenta o problema, mas não a solução.
- O que já é muito mais do que qualquer outro fez aqui, não é mesmo senhor Camargo? – Adam lhe dá um corte.
- Eu não teria problemas em apresentar a solução também... – Digo, finalmente me sentando aprumada no sofá. – Chá. – Estou prestes a continuar, frente a vários olhares curiosos. Mas Adam faz um gesto discreto para que eu me junte a ele na frente da sala e eu o faço. – O Milani de Londres já foi referência pelo seu chá, mas eu nunca entendi por que sempre servimos apenas pela manhã. Todo turista quer tomar o famoso chá das 17h ou das 19h horas e precisam se deslocar até o Hitz para ter essa experiência. Acrescentem o menu completo de chá da tarde e ofereçam um desconto para quem voltar para o jantar no dia seguinte – dou de ombros, como se aquilo fosse a coisa mais simples do mundo.
Mais tarde, quando Adam entra novamente comigo no elevador, seu olhar ainda é de admiração.
- Como teve todos aqueles insights?
- Eu frequento os meus hotéis – digo com simplicidade. – Sei a experiência que espero de cada um deles e fico um tanto decepcionada quando não tenho. Então é fácil imaginar o que se passa na cabeça dos outros turistas também. Parece que não sou apenas uma patricinha mimada, não é mesmo?
- Eu nunca disse isso.
- Mas me trata assim. – Quando o elevador para no térreo eu me detenho por alguns minutos antes de seguir em direção ao carro que aguarda para me levar pra casa. – Foi divertido. Dá próxima vez vamos falar sobre Zurique. Caramba, eu tenho um milhão de ideias sobre aquilo lá.
- Anotado.
- Você não vai almoçar no hotel?
- Ainda tenho algumas coisas para resolver antes de conseguir fazer uma pausa.
- Então acho que vai precisar disso...
Tiro o cinto e o blazer de Adam e os devolvo, fisgando um olhar de desespero em seu rosto. Depois sigo em direção a porta de saída, arrastando vários olhares a assovios comigo.
Eu nunca fui capaz de entender tão perfeitamente, quanto naquela manhã, o motivo pelo qual as pessoas reclamavam tanto de um dia de trabalho. O fato é que o dia mal tinha começado e já estava indo bem mal. A começar pelo fato de que ainda que eu tivesse levantado muito cedo, eu já estava atrasada. Então, precisei me arrumar correndo e nem mesmo tive tempo de desfrutar do café da manhã do hotel.Por sorte, no momento em que cruzei as portas de vidro que davam acesso ao prédio do escritório administrativo da Milani, uma menina sorridente vinha passando com uma bandeja de papelão com dois copos da Starbucks. Caramba, eu até imaginei que nós teríamos máquinas de café expresso para os funcionários, mas serviço de entrega de café da Starbucks era muito legal!- Obrigada! – Agradeço, feliz por consegui pegar as duas últimas unidades e automaticamente levando um dos copos aos lábios.- Hey, o que você pensa que tá... – A garota se cala e arregala ligeiramente os olhos. – Senhorita Milani! Des
Eu tinha tanta convicção de quão perfeita a minha ideia era que apenas decidi colocar em prática. Como diziam, era mais fácil pedir perdão do que pedir permissão. Sendo assim, Adam não podia nem sonhar em descobrir algo antes da hora. O que não era exatamente um problema, eu duvidava muito que qualquer um daqueles jovens tivessem acesso a ele. Agora, Sandra era a pessoa que podia colocar tudo a perder.- Eu não posso permitir que você faça isso... – ela me olhava com os olhos ligeiramente arregalados quando a procurei em sua sala para explicar. – Liberar não só o pessoal do marketing como vários outros funcionários? Eu nem tenho autoridade para isso.- Não é liberar – eu tento negociar. – É um dia de trabalho. Só que um pouco diferente.- Kara, você sabe que precisa de uma aprovação do senhor Benatti para...- Sandra... – eu sorrio e caminho até a cadeira diante dela, me sentando mesmo sem ter sido convidada. – É meu hotel. É minha empresa. É minha ideia. E você sabe que é uma excelen
Tudo bem, talvez tenha sido bom Adam ter ligado e me jogado um balde de água fria. Eu tinha organizado todo aquele evento. Se eu simplesmente desaparecesse e não saísse em nenhuma foto depois das tiradas durante o café da manhã seria, no mínimo, estranho, certo?Então eu coloquei um biquíni comportado (ao menos eu esperava que fosse) e aproveitei uma manhã de sauna, piscina e fofoca com as garotas (exceto Manu, claro, que tinha desaparecido com Pablo). Elas pareciam um pouco desconfortáveis no começo, mas nada que algumas taças de champanhe não as fizessem falar. Em pouco tempo eu já estava sabendo quem era a fim de quem, quem já tinha pegado quem e até uma história quente sobre um casal que foi visto aos amassos no almoxarifado.- E o Adam? – Me pego perguntando. – Alguma fofoca?- O Adam? – Maya estranha e eu dou de ombros.- Só curiosidade.- Ah, ele e o Otto eram bem galinhas – ela diz. – Mas nunca soube de nada de dentro do escritório. E depois que o Otto... – ela se detém repent
- E o que ele queria? - Só ser um pé no saco – reviro os olhos. – Perguntou como as coisas estavam indo e se eu estava mantendo tudo dentro do controle. Estava almoçando com Manu enquanto a atualizava sobre a situação com Luca e como Adam teve a habilidade de nos ligar exatamente no momento em que as coisas estavam ficando quentes entre nós. - Acha que ele estava te espionando? - Adam? – Eu rio. – Claro que não! - Foi meio estranho. Ele não tem acesso as câmeras do hotel? - Tem, mas eu pedi que desligassem as câmeras do terraço. Não sou louca nesse nível, Manu! - Tá, mas como o Jacob sabia exatamente onde te encontrar? - Onde mais eu estaria depois de pedir para desligarem as câmeras? – Dou de ombros. – Adam só estava dando uma de chefe chato, com aquela voz mandona e irritada dele. - Então tá. E você vai dar outra chance pro garoto? - Pro Luca? Por que não? - Sei lá, pelo que você disse só falta
~ADAM~Eu podia ter encerrado a festa de forma a fazer Kara passar vergonha. Mas eu não fiz. Ela organizou tudo pelas minhas costas, fez as coisas de uma maneira torta e piorou tudo consideravelmente ao se envolver com aquele garoto... Mas, de fato, abrir as portas do Milani para os funcionários, que nunca tiveram a oportunidade de estar lá, e registrar tudo para a nossa campanha de verão, que tinha exatamente aquele público alvo, era uma ótima ideia. E foi só por isso que pedi que o DJ iniciasse sua sequência de encerramento e avisasse que os carros estariam disponíveis para levar os funcionários em casa a partir daquele momento, fazendo com que tudo parecesse estar correndo de acordo com o previsto.O problema mesmo veio depois, ao lidar com os fotógrafos e descobrir que Kara não tinha feito um contrato de confidencialidade com eles. Isso me fez gastar um tempo e um dinhe
Quando Adam apareceu no meu quarto para informar que o jantar daquela sexta à noite tinha sido transferido para a próxima semana, me senti bastante aliviada. Quero dizer, eu sabia que era uma grande oportunidade de negócio para a Milani e Adam estava um tanto carrancudo por ter que esperar para fechar aquele contrato... Mas o fato é que eu ainda estava irritada o suficiente com ele para não querer me sentar em uma mesa de jantar, junto com estranhos, e sorrir como se tudo fosse perfeito na minha vida.Assim, passei quase o final de semana todo fugindo de Adam. O que não foi fácil, já que ele tinha finalmente resolvido levar suas coisas e se fixar no meu apartamento de vez. Pelo menos o lugar era grande o suficiente para que pudéssemos nos evitar. Afinal, eu tinha certeza de que Adam queria tanto me ver quando eu queria vê-lo.Mas, na segunda de manhã, quando o motorista veio nos buscar para lev
~ADAM~Kara me deixa completamente sem fala quando aparece na sala pronta para nosso jantar de negócios. Ela usava um vestido vermelho de lantejoulas, com a saia curta e apertada – como parecia ser a sua marca pessoal – e a parte de cima completamente fechada, incluindo mangas longas e largas. As costas estavam completamente expostas por um decote sensual em V.- Muito ousado? – Ela pergunta, me levando a estranhar. Kara Milani não me parecia do tipo de pedir opiniões. – Para um jantar de negócios?- Um pouco... – digo, fingindo olhar algo no celular apenas para conseguir tirar meus olhos dela. – Mas não é um problema... – rio. – Andei fazendo umas pesquisas... – viro o celular rapidamente para que ela possa ver o Instagram aberto. – O filho mais novo dos Arantes é meio obcecado por você.- Sério? – Ela pergun
~ADAM~- Você foi perfeita! – Elogio Kara, enquanto dirijo de volta para casa.- Duvidava de mim, tutor? – Ela pergunta, sem nem tirar os olhos do celular.- Nem por um instante. O que tá fazendo?- Agendando o tour dos Arantes... – consigo ver ela revirar os olhos rapidamente. – Eles estão hospedados no Milani da Barra?- Não, eles têm um apartamento no Rio.- E querem brincar de turistas? – Ela finalmente me olha, um tanto exasperada. – Tudo bem... vou agendar um dia bem cheio e terminar com um jantar para o casal no Milani da Barra. Aí podemos mandar um motorista para buscar o Liam e o Thiago. Acha que podemos lidar com eles? Eles são a chave pra convencer o pai, não são?Os Arantes tinham uma rede de hotéis com bastante unidades no interior do Rio de Janeiro. Não eram hotéis de luxo, mas tinham um gra